INTRODUÇÃO
As variações anatômicas da artéria hepática são comumente encontradas durante exames radiológicos e operações abdominais1 , 8. Estima-se que o índice de variação atinja até 45% da população8. Prevalência tão significativa confere a esse tipo de variação grande importância médica, e justifica o cirurgião conhecê-la para evitar lesões iatrogênicas.
O esquema arterial habitual é a artéria hepática comum ascender do tronco celíaco8; contudo, por variações embriológicas esse arranjo pode mudar. Essas variações, da mais para a menos prevalente, são: 1) a artéria hepática direita ascender da artéria mesentérica superior; 2) a artéria hepática esquerda ascender da artéria gástrica esquerda; 3) os dois fatos ocorrerem simultaneamente; e 4) a artéria hepática comum ascender da artéria mesentérica superior.
Neste artigo, é relatada ocorrência da última situação. De acordo com a literatura pesquisada, não há consenso quanto ao critério de designação dessa variação. Por isso, ela pode ser descrita de duas maneiras: considerar que se trata de um tronco hepatomesentérico - de onde se originam a artéria mesentérica superior e artéria hepática comum -, ou pode-se dizer que a artéria hepática comum surge como ramo da artéria mesentérica superior.
O objetivo deste trabalho é apresentar um caso e ressaltar as prevalências das posições anômalas das artérias hepáticas e suas possíveis implicações.
RELATO DO CASO
Foi observado em um cadáver masculino artéria hepática comum originando-se da artéria mesentérica superior, situada 3,5 cm inferolateralmente ao tronco celíaco, formando um tronco hepatomesentérico. Os demais ramos do tronco celíaco eram habituais e exibiam o trajeto típico (Figura 1).
A) fotografia da cavidade abdominal do cadáver com alguns vasos em evidência: veia renal esquerda (seta dupla), tronco celíaco (seta simples) e o tronco hepatomesentérico (assinalado por *); B) ilustração da mesma foto, com destaque para o tronco hepatomesentérico (assinalado por *).
DISCUSSÃO
Variações da artéria hepática têm base embriológica10. Durante o desenvolvimento intra-uterino, há a formação de quatro vasos esplâncnicos ventrais, conectados por uma anastomose ventral longitudinal. Com a maturação destes, as duas raízes centrais degeneram. Assim, a primeira e a quarta raízes, que formarão respectivamente o tronco celíaco e a artéria mesentérica superior, permanecem anastomosadas. Se a separação entre elas ocorre em nível diferente da normal, qualquer vaso do tronco celíaco pode ser deslocado para artéria mesentérica superior. Tal situação é exibida no relato de caso: com a separação anômala das raízes houve a formação de um tronco hepatomesentérico e outro gastroesplênico.
Vários trabalhos1 , 2 , 3 , 4 , 5 , 6 , 7 , 8 , 9 , 10 , 11 relatam diferentes variações. O mais representativo deles é o de Hiatt et al.5 com amostra de 1000 pessoas. A variação aqui apresentada (artéria hepática comum + artéria mesentérica superior) é pouco comum com ocorrência média de 2%. Tal valor está de acordo também com os valores achados em outros artigos que vão desde 1,6% a 3,5%.
AGRADECIMENTO
Os autores agradecem a Priscilla Ely Vieira Hattori, técnica do Laboratório de Anatomia da Universidade Federal da Grande Dourados (Dourados, Mato Grosso do Sul) pelo apoio logístico oferecido para a redação desta Carta ao Editor.
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Fonte de financiamento: não há
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Nov-Dec 2014
Histórico
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Recebido
29 Ago 2013 -
Aceito
21 Ago 2014