RESUMO
Racional: Das anastomoses do trato gastrointestinal, as do esôfago têm especial interesse devido às varias peculiaridades anatômicas e mesmo sistêmicas.
Objetivo: Avaliar retrospectivamente os resultados comparando a sutura mecânica e manual na anastomose esofagogástrica cervical no tratamento do megaesôfago.
Métodos: Foram estudados 92 pacientes com diagnóstico de megaesôfago avançado com condições clínicas de serem submetidos à operação. Todos foram submetidos à mucosectomia esofágica, sendo realizada anastomose do coto esofágico com o tubo gástrico no nível cervical. Para a realização desta anastomose, foram divididos em dois grupos: grupo A (n=53) com sutura mecânica circular terminolateral; grupo B (n=39) com sutura manual em dois planos terminolateral. No período pós-operatório foi realizada avaliação precoce, com análise das complicações locais e sistêmicas, e tardia (média 5,6 anos) com análise da deglutição.
Resultados: Avaliação precoce: a) deiscência da anastomose esofagogástrica, n=5 (9,4%) no grupo A vs. n=9 (23,0%) no grupo B (p=0.0418); b) estenose da anastomose esofagogástrica n=8 (15,1%) no grupo A vs. n=15 (38,4%) no grupo B (p=0.0105); c) infecção pulmonar n=5 (9,4%) no grupo A vs. n=3 (7,6%) no grupo B (p=1.000); d) derrame pleural n=5 (9,4%) no grupo A vs. n=6 (15,4%) no grupo B (p<0.518). A avaliação tardia demonstrou que 86,4 a 96,0% dos pacientes apresentaram critérios 4 e 5 de SAEED, demonstrando deglutição efetiva e sem diferença significante entre os grupos.
Conclusão: A anastomose esofagogástrica pela sutura mecânica é mais adequada que a manual com pequena incidência de complicações locais e, na avaliação em longo prazo, a deglutição demonstrou ser adequada em ambos os grupos e com qualidade semelhante.
DESCRITORES: Acalásia esofágica; Anastomose cirúrgica; Técnicas de sutura
ABSTRACT
Background: Among the anastomoses of the gastrointestinal tract, those of the esophagus are of special interest due to several anatomical or even general peculiarities.
Aim: Evaluate retrospectively the results comparing mechanical vs. manual suture at cervical esophagogastric anastomosis in megaesophagus treatment.
Methods: Were included 92 patients diagnosed with advanced megaesophagus with clinical conditions to undergo the surgery. All underwent esophageal mucosectomy, performing anastomosis of the esophagus stump with the gastric tube at the cervical level. In order to make this anastomosis, the patients were divided into two groups: group A (n=53) with circular mechanical suture, lateral end; group B (n=39) with manual suture in two sides, lateral end. In the postoperative period, an early evaluation was performed, analyzing local and systemic complications and late (average 5.6 y) analyzing deglutition.
Results: Early evaluation: a) dehiscence of esophagogastric anastomosis n=5 (9.4%) in group A vs. n=9 (23.0%) in group B (p=0.0418); b) stenosis of esophagogastric anastomosis n=8 (15.1%) in group A vs. n=15 (38.4%) in group B (p=0.0105.); c) pulmonary infection n=5 (9.4%) in group A vs. n=3 (7.6%) in group B (p=1.0000.); d) pleural effusion n=5 (9.4%) in group A vs. n=6 (15.4%) in group B (p<0.518). Late evaluation showed that 86.4-96% of the patients presented the criteria 4 and 5 from SAEED, expressing effective swallowing mechanisms without showing significant differences among the groups.
Conclusion: Cervical esophagogastric anastomosis by means of mechanical suture is more proper than the manual with lower incidence of local complications and, in the long-term evaluation, regular deglutition was acquired in both suture techniques in equal quality.
HEADINGS: Esophageal achalasia; Anastomosis, surgical; Suture techniques
INTRODUÇÃO
Das anastomoses do trato gastrointestinal, as do esôfago ainda se revestem de especial interesse em razão de várias peculiaridades, sejam anatômicas ou mesmo gerais, que as distinguem dos outros segmentos do trato digestivo5,14,15,18. Com isso as deiscências anastomóticas apresentam maior incidência o que faz prolongar a permanência e os custos hospitalares, com maior sofrimento dos doentes e também guarda relação com o surgimento de estenoses que é outro óbice que acompanha a cirurgia do esôfago5,18. Por sua vez, a sutura mecânica demonstrando maior segurança, precisão e rapidez, predispõe à menor incidência de fístula anastómotica, como tem sido demonstrado em várias séries da literatura, sejam em afecções benignas ou malignas, podendo assim melhorar a qualidade de vida 2,4,5,9,20,21,30. Esta preferência se justifica pela menor isquemia, necrose tecidual menos extensa e neoangiogênese mais acentuada 4,15,18,32.
Por ser o megaesôfago avançado de origem chagásica afecção que compromete a contratilidade do esôfago devido à desnervação plexular, predispõe que o seu portador apresente grande comprometimento da sua deglutição, com consequente desnutrição. Além disso, pela estase alimentar que ocorre ao longo dos anos, também pode induzir a evolução para câncer5,17.
Assim, como já tem sido demonstrado há vários anos e por vários autores, a melhor terapêutica é a esofagectomia sem toracotomia13, por atuar diretamente na fisiopatologia sendo a técnica transmediastinal proposta por Pinotti, a mais utilizada5,8,22,23. Mais recentemente com o advento da cirurgia minimamente invasiva, se fez com que esta ressecção possa ser realizada por videolaparoscopia12,29. Análise mais crítica demonstrou, entretanto, que a ressecção esofágica por via transmediastinal não é isenta de complicações que podem contribuir com grande morbidade na evolução pós-operatória8,10,19. Isto pode ocorrer, já que o megaesôfago avançado por apresentar periesofagite, faz com que fique aderido às estruturas nobres do mediastino e, assim, durante a dissecção pode predispor lesões.
Isto fez com que Aquino et al.3,6, propusessem a técnica da mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular e transposição do estômago por dentro da túnica muscular do esôfago para reconstrução do trânsito digestivo e anastomose do estômago com o coto do esôfago cervical pela técnica de sutura manual. Com isto demonstraram menor índice de complicações em relação à esofagectomia sem toracotomia, por não transgredir o mediastino durante a dissecção do esôfago.
Em outro estudo, Aquino et al.1 demonstraram as vantagens da sutura mecânica em relação à manual da anastomose esofagogástrica cervical, pela pequena frequência de fístula anastomótica em pacientes com megaesôfago avançado mas submetidos somente à esofagectomia transmediastinal.
Assim, surgiu a ideia de realizar este estudo, comparando a sutura manual e a mecânica ao nível da anastomose esofagogástrica cervical em pacientes submetidos à mucosectomia esofágica por megaesôfago avançado.
O objetivo deste estudo foi avaliar retrospectivamente os resultados precoces e tardios da sutura mecânica em relação a manual ao nível da anastomose esofagogástrica cervical em uma série de pacientes submetidos à mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular, por megaesôfago avançado.
MÉTODO
Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética institucional sob o número 1.277.805
Casuística
No período compreendido entre janeiro de 1996 a dezembro de 2017, foram avaliados retrospectivamente 92 pacientes com megaesôfago avançado no Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital Celso Pierro da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas, SP Brasil. Dos pacientes estudados houve predominância de homens (n=69, 75,0%) com idade variável entre 23 a 62 anos (média 48,5)
Avaliação pré-operatória
Clínica
Todos referiam disfagia progressiva desde sólidos para líquidos e emagrecimento com tempo variável de cinco a 15 anos, sendo que 79 (85,9%) também referiam regurgitações intermitentes e com maior frequência nos últimos seis a 24 meses. Sessenta e três (68,4%) eram tabagistas de 20 cigarros/dia por tempo variável de 12 a 26 anos, e 51 (55,4%) etilistas de duas a cinco doses/dia de destilado por 11 a 15 anos.
A imunofluorescência para doença de Chagas foi positiva em 83 (90,2%). Em 19 pacientes (20,6%) a avaliação clínica e nutricional demonstrou que tinham perda de mais do que 10% do peso ideal, sendo submetidos a nutrição por sonda nasoenteral por tempo variável de 18 a 33 dias previamente ao ato cirúrgico.
Radiológica
Em todos os pacientes o estudo radiológico contrastado do esôfago demonstrou megaesôfago grau III em 38 (41,3%) e grau IV em 54 (58,7%), segundo a classificação de Rezende et al.25.
Endoscópica
Em todos os pacientes evidenciou aumento do diâmetro do órgão com mucosa do esôfago distal apresentando esofagite grau A a C de Los Angeles e sem evidência de neoplasia em nenhum dos pacientes.
Manométrica
Este exame foi realizado em 28 pacientes (30,4%), sendo que em todos foi demonstrada aperistalse do corpo do esôfago e diminuição do relaxamento do esfíncter inferior do esôfago.
Técnica cirúrgica
Em todos realizou-se mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular, segundo a técnica padronizada por Aquino et al.3,6. Na anastomose cervical os pacientes foram divididos em dois grupos A e B
No grupo A foram incluídos 53 pacientes; foi realizada sutura mecânica com o aparelho circular DHC 29 mm; a ogiva era fixada no coto do esôfago cervical e o aparelho introduzido pela face anterior do estômago para se fixar na ogiva; a face anterior do estômago por onde o aparelho foi introduzido era suturada com a técnica mecânica com aparelho linear 75 mm.
No grupo B foram incluídos 39 pacientes; a sutura foi manual em dois planos com fio de Vicryl 3-0®, sendo o primeiro contínuo e total no estômago e esôfago e o segundo em pontos separados sendo seromuscular no estômago e muscular no esôfago.
Avaliação pós-operatória
Complicações clínicas
Foram notadamente as cardiovasculares, respiratórias e infecciosas. O diagnóstico delas foi baseado na evolução clínica diária e com a realização de exames laboratoriais e de imagens pertinentes, quando necessário.
Complicações locais
Estavam relacionadas principalmente com deiscência e estenose da anastomose do esôfago cervical com o tubo gástrico. Em relação à deiscência e a consequente fístula, o diagnóstico foi clínico pela saída de secreção gástrica e/ou salivar pela região cervical até geralmente o 7º dia de pós-operatório. A partir deste dia, não havendo sinal de fístula foi realizado Raio-X contrastado para avaliar se houve extravasamento de contraste pela anastomose. Quando isso não ocorreu, foi liberada a dieta via oral. Em relação à estenose da anastomose o diagnóstico foi clínico pela disfagia, principalmente a partir do 30º dia de pós-operatório e comprovado por Raio-X contrastado ao nível da anastomose e endoscopia digestiva alta para evidenciar em ambos os exames se houve diminuição do diâmetro da anastomose.
Deglutição
Nos pacientes em que se conseguiu realizar seguimento em longo prazo, a deglutição foi avaliada em 1, 3, 5 e 10 anos, baseado nos critérios de Saeed et al.28, sendo: 0 - não deglute nada ; 1 - deglute líquido com dificuldade, mas não deglute pastoso e nem sólido; 2 - deglute líquido normalmente, pastoso com dificuldade e não deglute sólido; 3 - deglute líquido e pastoso normalmente, mas sólido com dificuldade; 4 - deglute líquido e pastoso normalmente, eventual dificuldade para deglutir sólido; 5 - deglutição normal .
Também foram avaliados outros sintomas que pudessem ter relação ao ato cirúrgico realizado, principalmente regurgitação.
Análise estatística
Para comparação foi utilizado o teste de qui-quadrado ou o teste exato de Fisher, quando necessário, com nível de significância de 5%.
RESULTADOS
Na avaliação precoce até com 30 dias de pós-operatório, 14 pacientes (15,2%) apresentaram fistula da anastomose esofagogástrica na região cervical, sendo significantemente menor no grupo A (Tabela 1); um paciente deste último grupo foi indicado reoperação precoce devido a ter apresentado já no segundo dia de pós-operatório, sendo realizado drenagem ampla da região cervical e mediastinal com boa evolução. Nos outros 13 pacientes em que a fistula da anastomose ocorreu entre o 4º e 7º dia de pós-operatório o tratamento foi conservador com drenagem local da região cervical e suporte nutricional com dieta enteral pela jejunostomia havendo o fechamento da fistula entre o 14º e 23º dias de pós-operatório. Assim, não havendo mais secreção digestiva pela região cervical, foi solicitado a realização de Raio-X contrastado, o qual não evidenciando nenhum extravasamento de contraste ao nível da anastomose, era introduzida dieta oral, inicialmente líquida com substituição progressiva para pastosa e sólida, segundo a aceitação dos pacientes16. Esta conduta também foi realizada nos outros 78 pacientes em que não apresentaram fistula da anastomose sendo a dieta oral introduzida a partir do 70 dia após Raio-X contrastado não ter evidenciado nenhum extravasamento de contraste; todos esses pacientes também apresentaram boa aceitação da dieta de maneira progressiva.
Oito (8,6%) entre o 5º e 9º dia apresentaram infecção pulmonar, sem haver diferença significante entre os grupos (Tabela 1). Com exceção de um do grupo B, que evolui a óbito por choque séptico, todos os demais apresentaram boa evolução com tratamento clínico específico.
O derrame pleural de pequeno a médio volumes esteve presente em 11 pacientes (11,9%), mas sem diferença significante entre os grupos (Tabela 1); em cinco - três do grupo A e dois do B - houve necessidade de drenagem de tórax com boa evolução; nos demais a evolução também foi adequada com o tratamento conservador.
Entre o 30º e 48º dias de pós-operatório, 23 pacientes (25,0%) começaram a apresentar sintoma de disfagia alta e progressiva, sendo confirmada por estudo radiográfico contrastado e endoscopia digestiva alta a estenose da anastomose esofagogástrica cervical, sendo significantemente maior no grupo B (Tabela 1). Em todos esses pacientes foi realizada dilatação endoscópica variando de 4-15 sessões com boa evolução.
A avaliação em médio e longo prazos foi realizada em 71 pacientes, sendo 37 (69,8%) do grupo A e 34 (87,1%) do B, com tempo variável de 1 a 10 anos (média 5,6).
Em relação à deglutição, 86,4% a 96,0% apresentaram critérios 4 a 5 de Saeed et al.28 com tempo de avaliação entre 1 a 10 anos e sem haver diferença significante entre os dois grupos; também demonstrou-se que nos quatro períodos estudados que os critérios de deglutição foram semelhantes em ambos os grupos (Tabela 2).
A regurgitação intermitente e esporádica, presente com incidência não desprezível, não apresentou diferença significante entre os grupos e foi controlada com orientação alimentar (Tabela 3). Constataram-se dois pacientes, um de cada grupo com barretização do coto esofágico, mas sem significância estatística, com diagnostico realizado no 3º e 5º ano de pós-operatório; eles foram acompanhados periodicamente com endoscopia digestiva alta .
A maioria dos pacientes em ambos os grupos referiram aumento de peso.
DISCUSSÃO
Ao longo da história cirúrgica mundial, as estenoses, fístulas e deiscências resultantes das anastomoses entre vísceras do aparelho digestivo fizeram jus ao temor de sua presença, pois frequentemente evoluem com excessiva morbidade e não raro com a morte. Assim, a controvérsia sobre o melhor tipo de sutura permanece até os dias atuais1,5,20,21.
Sendo o esôfago o segmento do tubo digestivo que apresenta maior incidência de deiscências de anastomoses pelas peculiaridades já lembradas, procura-se com o emprego da sutura mecânica, pelas vantagens oferecidas por ela principalmente na cervical melhorar os resultados1,5,8,14,18,19,30. Isto ficou bem evidente neste estudo, pois os pacientes do grupo da sutura mecânica apresentaram incidência significantemente menor de deiscência da anastomose esofagogástrica em relação ao grupo da sutura manual, após a realização da mucosectomia esofágica.
Outro fato a ser lembrado é que a sutura mecânica, por ser dupla e invertida, poderia predispor a estenose da anastomose esofagogástrica em até três a cinco vezes em relação à manual, como tem sido demonstrado por vários autores1,4,15,19,20,31. Isto é justificável pelo fato da maioria dos pacientes desses estudos terem sido submetidos à esofagectomia por câncer e assim, com menor diâmetro do coto esofágico cervical a ser anastomosado tornando-se imperativo a utilização de grampeadores de tamanhos menores. Esse fato ficou bem evidenciado por Wong et al.33 quando correlacionaram o diâmetro dos grampeadores com a incidência de estenose. Esses autores demonstraram que quando utilizaram aparelhos com diâmetro de 25 mm, a incidência de estenose foi de 25% e diminui para 12% com o uso de grampeadores de 29 a 33 mm. Recentemente Honda et al.14 também demonstraram em revisão da literatura comparando a sutura manual com a mecânica em 1.407 pacientes submetidos à anastomose esofagogástrica, relação entre o diâmetro do grampeador e o grau de estenose da anastomose esofagogástrica.
Devido que no megaesôfago avançado a luz do coto esofágico a ser anastomosado é maior, pode se usar aparelhos de maior diâmetro, reduzindo assim, provavelmente a incidência de estenose. Este fato também ficou evidente neste estudo, pois embora esta complicação esteve presente nos pacientes dos dois grupos, ela foi significante menor nos pacientes em que foi realizado a sutura mecânica, sendo este fato justificável por ter sido utilizado em todos o aparelho circular 29 mm.
Outro fato a se lembrar é que dos 23 pacientes que apresentaram a estenose da anastomose esofagogástrica 14 (60,8%) apresentaram previamente fístula, e esta relação entre deiscência anastomótica e estenose é frequente, devido à fibrose que ocorre na linha de sutura após o fechamento da fistula anastomótica1,5,11,14,18,19. Apesar de ter havido retardo na deglutição normal destes pacientes eles tiveram boa evolução após as dilatações endoscópicas e referindo estarem atualmente satisfeitos com o ato cirúrgico.
A técnica realizada da mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular com transposição do estômago por dentro desta túnica foi de grande validade, pois evitou transgredir o mediastino e assim impediu a potencial lesões das estruturas nobres ali presentes. Estas complicações entretanto são referidas quando se utiliza esofagectomia transmediastinal e apesar de serem de pouca frequência, quando presentes, apresentam grande morbidade8,19,22,23. Nenhum paciente deste estudo apresentou qualquer complicação mediastinal. Entretanto alguns evoluíram com derrame pleural, mas de baixa incidência em ambos os grupos e facilmente debelado pelo tratamento conservador e ou drenagem de tórax.
Pelo fato da mucosectomia esofágica ser operação de grande porte e a maioria dos pacientes de ambos os grupos serem tabagistas de longa data justificou-se que oito apresentassem infecção pulmonar, e, apesar do tratamento clínico específico, um do grupo B morreu por choque séptico. Este fato já tem sido extensivamente relatado nas esofagectomias, seja por afecções benignas ou malignas5,8,18,19,23,30.
Na avaliação em longo prazo com média de 5,6 anos todos referiram estarem satisfeitos com o ato cirúrgico com resgate da deglutição com critérios 4 e 5 de Saeed et al.28. Isto fez com que a maioria dos pacientes referissem aumento de peso além de estimulá-los a retornarem às atividades laborais de rotina. A disfagia para sólidos em alguns pacientes de ambos os grupos quando presente era intermitente, também foi de baixa frequência e sem diferença significante entre os grupos.
A regurgitação de 25% em ambos os grupos, apesar de não desprezível, foi esporádica e para alimentos sólidos, mas resolvida após adequada orientação alimentar. Ela é descrita em até 50% nos que realizam transposição gástrica para substituição do esôfago3,4,5,6,8,18,19,20,23,30. É geralmente consequente à estase gástrica e com orientação alimentar adequada, geralmente há adaptação.
Outro fato a ser lembrado é que um paciente de cada grupo evoluiu no pós-operatório tardio com barretização do coto esofágico cervical. Esta alteração geralmente é consequente ao refluxo ácido e biliar do estômago transposto devido à estase24,26,27. Apesar dela ser de baixa incidência não pode deixar de ser valorizada pela possiblidade deste epitélio comprometido evoluir para adenocarcinoma17,27. Por esta razão, é importante a realização de seguimento em longo prazo com endoscopias digestivas periódicas24,27.
Dúvida que sempre esteve presente era o que poderia ocorrer em longo prazo com pacientes submetidos à mucosectomia esofágica quanto a que poderia haver possibilidade da túnica muscular do esôfago mediastinal evoluir com fibrose e consequente compressão do estômago, comprometendo a evolução. A análise pós-operatória com o tempo médio de seguimento de 5,6 anos demonstrou que todos evoluíram bem, sem apresentar qualquer sintoma que sugerisse essa compressão. Essa constatação já foi relatada em outros estudos realizados por estes autores, mas com menor número de pacientes e com anastomose esofagogástrica cervical com sutura manual. A realização de exames de imagens por tomografia de tórax evidenciou que a permanência da túnica muscular no mediastino posterior parece não ter comprometido a transposição gástrica para reconstrução do trânsito digestivo após a mucosectomia esofágica3,7.
CONCLUSÃO
Mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular para o tratamento do megaesôfago avançado é procedimento adequado pelo baixo índice de complicações pleuropulmonares, ausência de complicações mediastinais e com resgate adequado da deglutição em longo prazo. A sutura mecânica da anastomose esofagogástrica cervical é mais adequada por ter apresentado complicações anastomóticas significantemente menores que a técnica manual.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
20 Dez 2019 -
Data do Fascículo
2019
Histórico
-
Recebido
26 Maio 2019 -
Aceito
06 Ago 2019