RESUMO
Racional: O cisto pilonidal é infecção da pele e do tecido subcutâneo, secundário à inflamação crônica, com maior frequência na região sacrococcígea, e associado à presença de pelos nesta região. O tratamento é eminentemente cirúrgico.
Objetivo: Demonstrar os resultados do tratamento endoscópico de cisto pilonidal.
Método: Estudo prospectivo, com 67 pacientes que tiveram como indicação cirúrgica o diagnóstico de cisto pilonidal. Os equipamentos utilizados foram o fistuloscópio Meinero, um obturador, um eletrodo monopolar, uma escova e pinça endoscópica.
Resultados: Dos 67 pacientes 67% (n=45) eram homens e 33% (n=22) mulheres, com média de idade de 25 anos (17-45). O tempo cirúrgico teve com média 40 min (20-120) e o tempo médio de cicatrização de quatro semanas (3-12). Complicações cirúrgicas ocorreram em 7% da amostra (n=5) e recidivas da doença em 9% (n=6).
Conclusão: O tratamento endoscópico do cisto pilonidal é viável e apresenta bons resultados cirúrgicos.
DESCRITORES: Laparoscopia; Cisto pilonidal; Procedimentos cirúrgicos minimamente invasivos
ABSTRACT
Background: The pilonidal cyst is an infection of the skin and the subcutaneous tissue, secondary to a chronic inflammation with a greater frequency in the sacrococcygeal region, and associated to the presence of hair. The treatment is eminently surgical.
Aim: To demonstrate the endoscopic treatment of pilonidal cyst.
Method: Prospective study with 67 patients who had as surgical indication the diagnosis of pilonidal cyst. They were submitted to a surgical procedure from June 2014 to March 2018. The equipment used was the Meinero fistuloscope, a shutter, a monopolar electrode, a brush and endoscopic forceps.
Results: Of the 67 patients, 67% (n=45) were male and 33% (n=22) female, with a mean age of 25 years (17-45). Surgical time in average was 40 min (20-120) and mean healing time of four weeks (3-12). Surgical complications were presented in 7% cases (n=5) and recurrences in 9% (n=6).
Conclusion: The endoscopic treatment of the pilonidal cyst is feasible and presents good surgical results.
HEADINGS: Laparoscopy; Pilonidal cyst; Minimally invasive surgical procedures
INTRODUÇÃO
O cisto pilonidal é doença da pele e tecido subcutâneo bem conhecida, ocorrendo predominantemente em homens com idade média de 30 anos e incidência de 26 casos por 100.00018. A doença apresenta sintomas complexos, caracterizados por quadros assintomáticos até lesões dolorosas localizadas na região sacrococcígea6. A causa não está completamente elucidada; no entanto, alguns fatores de risco como a obesidade, higiene pessoal inadequada, histórico familiar e longos períodos em posição sentada estão associados a maior ocorrência da doença19.
O tratamento é essencialmente cirúrgico, verificando-se grande diversidade de técnicas que incluem a remoção do cisto por meio de procedimentos de retalho, como observado nos métodos de Karydakis e Limberg1 modificado. Além disso, outras técnicas menos invasivas como curetagem da cavidade com aplicação de fenol4 ou mesmo a utilização de laser são comumente empregadas2,8,16. As técnicas menos invasivas constituem-se como alternativa aos métodos de excisão cirúrgica, apresentando vantagens como menor dor no período pós-operatório, retorno precoce do paciente às suas atividades e menores cicatrizes13.
O tratamento endoscópico minimamente invasivo do cisto pilonidal (EPSiT) proposto por Meinero et al.11 baseia-se no tratamento da fístula anal por vídeo, e para tanto utiliza um fistuloscópio, um obturador, um eletrodo monopolar, escova e fórceps. A técnica é subdividida em duas etapas caracterizadas pela fase do diagnóstico e fase operatória. A diagnóstica destina-se a identificar e caracterizar o cisto bem como identificar cavidades secundários contendo abcessos11,18. Alternativamente Milone (2014)15 modificou a técnica, utilizando histeroscópio e solução salina.
O objetivo deste trabalho foi demonstrar a efetividade do tratamento endoscópico minimamente invasivo.
MÉTODOS
Este estudo foi aprovado pelas comissões de ética em pesquisa nas instituições argentina e brasileira, e os pacientes forneceram o termo de consentimento livre e esclarecido antes da realização do procedimento cirúrgico.
Características do estudo
Trata-se de um estudo prospectivo, realizado no período de junho de 2014 a março de 2018, compreendendo pacientes com quadros sintomáticos de cisto pilonidal que deram entrada no Hospital Provincial de Rosário em Santa Fé na Argentina e no Hospital Santa Izabel em Salvador no Brasil.
Técnica cirúrgica
A técnica endoscópica foi executada conforme o método idealizado por Meinero et al. (2014)11, utilizando o fistuloscópio de Meinero (Karl Storz GmbH - Tuttlingen, Alemanha, Figura 1A). Os pacientes foram submetidos à raquianestesia e o procedimento teve início em posição pronada, com as nádegas separadas com auxílio de adesivos, e o cirurgião posicionado entre as pernas do paciente.
A) Fistuloscópio Karl-Storz; B) exploração do cisto; C) aspecto cirúrgico final do procedimento; D) pós-operatório após 15 dias
O procedimento tem início com a fase de identificação e caracterização da extensão do cisto, bem como de cavidades secundárias por meio da inserção do fistuloscópio com infusão de glicina ou manitol na abertura espontânea do cisto (Figura 1B). A seguir, o cisto é aberto com auxílio de jato destes líquidos a fim de identificar pelos e eliminar tecidos danificados. Os pelos presentes no trato são removidos com auxílio do fórceps e o tecido granular é tratado por meio do eletrodo monopolar13. Todo tecido granular é destruído e removido, os pelos retirados e, em seguida, o trato é limpo e ficando cavidade aberta para facilitar a drenagem (Figuras 1C e 1D).
RESULTADOS
As características dos pacientes e os resultados obtidos estão na Tabela 1.
Entre o período de junho de 2014 a março de 2018 foram selecionados 67 pacientes, dos quais 67% eram homens e com idade média de 31 anos (17-45). O procedimento cirúrgico durou em média 40 min; os pacientes receberam alta no mesmo dia após a realização do procedimento e o tempo médio de cicatrização foi de quatro semanas (3-12).
Complicações maiores não foram observadas; no entanto, cinco casos apresentaram complicações menores tais como sangramento e dor por período prolongado. A taxa de cura foi de 91%, verificando-se que cinco pacientes apresentaram recidiva e nenhum outro caso de falha no tratamento ou persistência do cisto.
DISCUSSÃO
Embora o cisto pilonidal tenha sido descrito há mais de 150 anos6, e apesar do tratamento ser majoritariamente cirúrgico existem diversas técnicas cirúrgicas descritas na literatura que incluem a excisão do cisto, técnicas de retalho e mais recentemente técnicas minimamente invasivas9. Stauffer et al. (2018)17 por meio de revisão sistemática identificaram pelo menos 14 estratégias terapêuticas para o tratamento do cisto e sua recorrência.
Nesse cenário, Meinero et al.11 empregaram a técnica de tratamento da fístula anal assistida por vídeo para o tratamento da doença pilonidal, visando evitar um dos maiores inconvenientes dos procedimentos que objetivam a remoção da área infectada por excisão que é a cicatrização da ferida cirúrgica, aberta ou fechada. Em ambos os casos o período pós-operatório necessita da realização de curativos, o que aumenta o tempo necessário para a cura, além de causar dor10,11.
A técnica endoscópica para o tratamento do cisto pilonidal ocasiona menor dor pós-operatória, rápida cura e menor tempo para o retorno às atividades diárias. Além disso, ela apresenta grande eficiência nos casos de recorrência do cisto.
O tratamento endoscópico requer menor tempo operatório se comparado aos métodos de excisão; a técnica de retalho de Limberg1 leva em média 54 min, enquanto que a de Karydakis1 48 min (Tabela 2). A utilização do laser demonstrou ainda menor tempo cirúrgico16; no entanto, há maior recidiva e falhas no tratamento se comparado às outras técnicas.
A técnica endoscópica apresenta vantagens em relação às outras menos invasivas que são realizadas às cegas, o que explica a maior ocorrência de recidivas. O tratamento endoscópico é favorecido pela observação do interior do cisto, possibilitando ao cirurgião identificar o local dos pelos, bem como de tecidos danificados, contribuindo para a maior taxa de sucesso9.
O tempo necessário para cicatrização após a técnica EPSiT foi menor do que outras abordagens cirúrgicas, apresentando ainda menor número de complicações. Segundo Bernier et al. (2015)3 cerca de 10-30% dos pacientes submetidos a mais de um tratamento cirúrgico poderão evoluir para cronicidade. O tratamento endoscópico está associado com baixa ocorrência de recorrência15, sobretudo se comparado às técnicas menos invasivas7.
As complicações associadas ao tratamento EPSiT observadas neste estudo foram de 7%, verificando-se sangramento autolimitado em três pacientes e dois relataram dor por período prolongado, necessitando uso de analgésicos. Nenhum paciente demonstrou complicações como necrose ou seroma durante o acompanhamento. Dor prolongada necessitando de analgésicos foi descrita em dois (22%) pacientes por Chia et al (2015)5 e por Meinero et al11 em 9.7%. Desta forma as complicações observadas neste estudo são comparáveis ou melhores às demais experiências constantes na literatura5.
Segundo Umesh et al (2018)20 as técnicas de excisão podem comprometer a fáscia sacral e serem associadas à maior morbidade e aumento do tempo de cicatrização; por outro lado, o uso do fistuloscópio reduz essas circunstâncias, e ele apresenta menores cicatrizes.
Dentre os diversos tratamentos para o cisto pilonidal, a técnica EPSiT apresenta-se como alternativa segura; no entanto, sua utilização depende de equipamento específico, o que pode limitá-la13. Milone et al. (2014)14 descreveram procedimento semelhante, utilizando um histeroscópio para a realização da operação assistida por vídeo. Este procedimento utiliza ainda solução salina para auxiliar a distensão do cisto.
Dodaro e Renda (2014)7 esclarecem que o fistuloscópio de Meinero pode ser também utilizado para tratamento de fístulas anais, além de cisto pilonidal, o que contribui para reduzir os custos e a curva de aprendizagem necessárias à execução da técnica.
Esta técnica empregada com pioneirismo no Brasil e na Argentina, representa alternativa segura e reprodutível para o tratamento do cisto pilonidal, permitindo ainda que o paciente retome suas atividades diárias em curto período de tempo e de maneira mais estética, pois resulta em poucas cicatrizes se comparada a outros tratamentos.
CONCLUSÃO
O tratamento endoscópico para o tratamento do cisto pilonidal demonstrou grande segurança e eficiência. A técnica oferece benefícios como bons resultados, tempo reduzido de recuperação e baixo índice de complicações.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
21 Out 2019 -
Data do Fascículo
2019
Histórico
-
Recebido
14 Out 2018 -
Aceito
16 Jan 2019