Acessibilidade / Reportar erro

ESTUDO COMPARATIVO DA DOR PÓS-OPERATÓRIA ENTRE AS TÉCNICAS CIRÚRGICAS LICHTENSTEIN E LAPAROSCÓPICA NO TRATAMENTO DA HÉRNIA INGUINAL UNILATERAL NÃO RECIDIVADA

RESUMO

Racional:

Existem diversas opções de tratamentos cirúrgicos para hernia inguinal; entretanto, não existe consenso na literatura sobre qual técnica cirúrgica promove menor dor pós-operatória.

Objetivo:

Comparar a intensidade de dor pós-operatória entre as técnicas cirúrgicas de Lichtenstein e a laparoscópica pré-peritoneal transabdominal no tratamento da hérnia inguinal unilateral não-recidivada.

Métodos:

Foram incluídos 60 pacientes, dos quais 30 foram operados pela técnica de Lichtenstein e 30 pela laparoscópica pré-peritoneal transabdominal. A intensidade da dor foi avaliada por meio da escala visual analógica nos dias 2, 10 e 30 de pós-operatório. A taxa de recidiva, a presença de dor crônica e parestesia local foram avaliadas com 12 meses de pós-operatório.

Resultados:

A análise dos dados demonstrou que existem diferenças significantes nos níveis de dor entre as técnicas cirúrgicas. Não houve diferença entre o nível de dor com dois dias. Entretanto, com 10 e 30 dias, o nível de dor foi significativamente menor para os operados pela técnica laparoscópica pré-peritoneal transabdominal, comparado à de Lichtenstein. Além disso, apesar de não haver casos de reincidência para ambas as técnicas, 32% dos pacientes operados por Lichtenstein relataram dor crônica e parestesia local 12 meses depois da operação, comparado a 3,6% da técnica laparoscópica pré-peritoneal transabdominal.

Conclusão:

Há diferenças entre as técnicas cirúrgicas, com o procedimento laparoscópico pré-peritoneal transabdominal promovendo níveis de dor pós-operatória (10 e 30 dias) e dor crônica (12 meses) significativamente menores, quando comparado ao procedimento Lichtenstein.

DESCRITORES
Dor pós-operatória; Escala visual analógica; Hérnia inguinal; Laparoscopia

ABSTRACT

Background:

There are several surgical treatment options for inguinal hernia; however, there is no consensus on the literature identifying which surgical technique promotes less postoperative pain.

Aim:

To compare the intensity of postoperative pain between the surgical techniques Lichtenstein and transabdominal pre-peritoneal laparoscopy for the treatment of unilateral primary inguinal hernia.

Methods:

Were included 60 patients, of which 30 were operated through the Lichtenstein technique and 30 patients through the transabdominal pre-peritoneal laparoscopy. The pain levels were evaluated through the analogue visual scale for 2, 10 and 30 days after the surgery. Additionally, the recurrence rate and the presence of chronic pain and paresthesia were evaluated 12 months after the surgery.

Results:

Overall, the data analysis showed significant differences on pain levels between the surgical techniques. There were no significant differences between the pain levels for day 2. However, for 10 and 30 days after the surgery, the pain levels were significantly lower for the patients operated through the transabdominal pre-peritoneal laparoscopy technique compared to the Lichtenstein technique. Furthermore, despite no recurrent hernias for both surgical techniques, 32 % of patients operated through the Lichtenstein technique reported chronic pain and paresthesia 12 months after the surgery, compared with 3,6% of patients operated through the transabdominal pre-peritoneal laparoscopy technique.

Conclusion:

There are differences between the surgical techniques, with the transabdominal pre-peritoneal laparoscopy procedure promoting significantly lower postoperative pain (10 and 30 days) and chronic pain (12 months) compared to the Lichtenstein procedure.

HEADINGS
Pain, postoperative; Visual analog scale; Hernia, inguinal; Laparoscopy

INTRODUÇÃO

O tratamento cirúrgico da hérnia inguinal é um dos procedimentos médicos mais realizados, com mais de 20 milhões de operações em todo o mundo anualmente1111 Keller J, Muo C-H, Lan Y-C, Sung F-C, Lo F-E, Chiang K-Y, et al. A nation-wide population-based study of inguinal hernia repair incidence and age-stratified recurrence in an Asian population. Hernia. 2015;19(5):735-40.. No Brasil, de março de 2015 a março de 2016 foram operados pelo Sistema Único de Saúde 117.090 casos de hérnia inguinal unilateral pela via aberta e 901 casos por laparoscopia1919 SUS. Ministério da Saúde - Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS) 2016. Available from: http://www2.datasus.gov.br/SIHD/consultas.
http://www2.datasus.gov.br/SIHD/consulta...
. Atualmente, diversas técnicas cirúrgicas estão disponíveis para o tratamento da hérnia inguinal55 Bosi HR, Guimaraes JR, Cavazzola LT. Robotic assisted single site for bilateral inguinal hernia repair. ABCD, Arq Bras Cir Dig 2016;29(2):109-11.,1010 Iuamoto LR, Kato JM, Meyer A, Blanc P. Laparoscopic totally extraperitoneal (TEP) hernioplasty using two trocars: anatomical landmarks and surgical technique. ABCD Arq Bras Cir Dig 2015;28(2):121-3.,1515 Palermo M, Acquafersca PA, Bruno M, Tarsitano F. Hernioplasty with and without mesh: analysis of the immediate complications in a randomized controlled clinical trial. ABCD, Arq Bras Cir Dig 2015;28(3):157-60.. No entanto, duas são geralmente aceitas como as melhores: a técnica aberta sem tensão de Lichtenstein e os procedimentos laparoscópicos44 Bittner R, Schwarz J. Inguinal hernia repair: current surgical techniques. Langenbeck's Arch Surg 2011;397(2):271-82.. A escolha da técnica mais apropriada era baseada na taxa de reincidência da hérnia. No entanto, com os avanços tecnológicos, a proporção de hérnias recidivadas é similar entre a laparoscopia e as operações abertas77 Eker HH, Langeveld HR, Klitsie PJ, van't Riet M, Stassen LP, Weidema WF, et al. Randomized clinical trial of total extraperitoneal inguinal hernioplasty vs Lichtenstein repair: a long-term follow-up study. Arch Surg 2012;147(3):256-60.,1212 McCormack K, Scott N, Go P, Ross S, Grant A. Laparoscopic techniques versus open techniques for inguinal hernia repair (review). Cochrane Database of Systematic Reviews. 2003;1(1):CD001785.. Portanto, outras complicações pós-operatórias estão sendo utilizadas para determinar qual procedimento é mais apropriado.

A dor pós-operatória é reconhecida como um dos maiores problemas relacionados ao tratamento da hérnia inguinal, pois afeta diretamente a qualidade de vida dos pacientes88 Eklund A, Montgomery A, Bergkvist L, Rudberg C. Chronic pain 5 years after randomized comparison of laparoscopic and Lichtenstein inguinal hernia repair. Br J Surg 2010;97(4):600-8.,1616 Poobalan AS, Bruce J. A review of chronic pain after inguinal herniorrhaphy. Clinc J Pain 2003;19(1):48-54.. Existe, no entanto, falta de coerência na literatura sobre qual técnica utilizada para o tratamento da hérnia inguinal apresenta menor dor pós-operatória. Há estudos que reportam maior dor pós-operatória crônica em pacientes tratados com a técnica aberta de Lichtenstein. Outros descreveram que a técnica laparoscópica promove menor incidência de dor aguda e no pós-operatório, formação de edema, e volta mais rápida às atividades cotidianas33 Amid PK. Lichtenstein tension-free hernioplasty: its inception, evolution, and principles. Hernia. 2004;8(1):1-7..

Assim, o objetivo deste estudo foi comparar a intensidade da dor pós-operatória entre as técnicas aberta de Lichtenstein (LC) e a laparoscópica transabdominal pré-peritoneal (TAPP) para o tratamento da hérnia inguinal unilateral não-recidivada.

MÉTODOS

Desenho do estudo e participantes

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Goiânia (Projeto número 28150514.2.3001.5081) estando de acordo com a resolução 466. Todos os pacientes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Este foi um estudo clínico prospectivo para avaliar os níveis de dor após o tratamento cirúrgico da hérnia inguinal unilateral não-recidivada. Ao todo 60 pacientes foram recrutados. A escolha do procedimento cirúrgico foi feita aleatoriamente, em que os 30 primeiros atendidos no ambulatório do Hospital da Santa Casa de Misericórdia de Goiânia, Goiânia, GO, Brasil, agendados pela Secretaria Municipal de Saúde, foram operados pela técnica aberta de LC e os 30 pacientes seguintes pela TAPP. Os critérios de inclusão foram: idade entre 18-70 anos, risco cirúrgico de Goldman nível I ou II e o diagnóstico de hérnia inguinal unilateral não-recidivada. Os critérios de exclusão foram: operação prévia em abdome inferior; indivíduos susceptíveis como índios, exército e prisioneiros; não retorno do paciente no acompanhamento pós-operatório em qualquer etapa; operações de urgência; e procedimentos cirúrgicos adicionais como herniorrafia umbilical, prostatectomia e colecistectomia, entre outros. Entre todos os pacientes, dois foram excluídos do grupo LC por não completarem o pós-operatório de 12 meses e dois excluídos do grupo TAPP por não comparecerem no pós-operatório de 30 dias. Foram também coletados, para todos os pacientes, dados sobre o gênero, idade, índice de massa corporal e classificação de Nyhus da hérnia, assim como o tempo operatório, a incidência de edema e o uso de medicamento analgésico.

Procedimentos cirúrgicos

Todos os procedimentos foram realizados pelo mesmo cirurgião. Os pacientes fizeram exames pré-operatórios padrão da rotina hospitalar. Todos os pacientes receberam alta hospitalar um dia após o procedimento cirúrgico, com exceção de um que permaneceu dois dias no hospital devido à drenagem de seroma em bolsa escrotal.

Técnica de Lichtenstein (LC)

Paciente era posicionado em decúbito dorsal horizontal sob raquianestesia. Após antissepsia com clorexidine e colocação de campos estéreis, fez-se uma incisão obliqua na região inguinal de cerca de 7 cm, na bissetriz do ângulo formado pela prega inguinal e a borda externa do músculo reto anterior do abdome, com abertura da parede por planos até canal inguinal. Seguiu-se dissecção do canal inguinal lateralmente até arcada inguinal e medialmente até reto abdominal; isolamento do funículo espermático com dreno de penrose número um; e identificação, isolamento e tratamento do saco herniário. Foi realizado reforço da parede posterior do canal inguinal, abaixo e acima do anel inguinal profundo, com tela de polipropileno de 12x4 cm, fixada com náilon 2-0 no tubérculo púbico, arcada inguinal e tendão conjunto. A síntese da parede foi feita por planos: teto do canal inguinal com náilon 2-0; subcutâneo com categute simples 3.0; pele com náilon 4-0.

Técnica laparoscópica: transabdominal pré-peritoneal (TAPP)

Para o procedimento TAPP, o paciente era posicionado em decúbito dorsal sob anestesia geral, com leve Trendelenburg. Subsequentemente, foi confeccionado pneumoperitônio com agulha de Veress ao nível do umbigo e introduzido três trocárteres, sendo um de 10 mm ao nível da cicatriz umbilical, e dois de 5 mm, um na linha hemiclavicular direita na altura do umbigo e outro na mesma posição do lado esquerdo. O peritônio foi incisado logo acima da borda superior do anel inguinal profundo e mobilizado lateralmente até a espinha ilíaca anterossuperior, medialmente até o tubérculo púbico e inferiormente até o canal deferente. Tela de polipropileno de 18x12 cm foi então inserida através do trocarte de 10 mm, e fixada, em sua borda superior, no púbis em direção à espinha ilíaca anterossuperior, com fio de poliéster 2-0. Uma vez fixada a tela, o peritônio era reposicionado sobre a mesma com fio poliéster 2-0, a fim de reperitonizar o local.

Retorno pós-operatório

Os pacientes eram operados por meio de um dos procedimentos e a dor pós-operatória foi avaliada pela escala visual analógica (EVA) nos dias 2, 10 e 30 de pós-operatório. A taxa de recidiva, a presença de dor crônica e parestesia foram também avaliadas 12 meses após o procedimento cirúrgico.

As informações sobre a dor pós-operatória foram anotadas pelos pacientes no dia 2; o cirurgião que operou realizou a avaliação de rotina da dor nos dias 10 e 30 de pós-operatório, e a recidiva ou dor crônica nos 12 meses após o procedimento cirúrgico. A taxa de recidiva foi avaliada através do exame físico e a dor crônica apenas pela sua presença ou ausência, sem aferir intensidade.

Análise estatística

Primeiramente, foi feita uma análise descritiva das variáveis: gênero, idade, índice de massa corporal, classificação de Nyhus da hérnia, incidência de edema e uso de medicamento analgésico. Para as variáveis categóricas, foi utilizado o teste do Qui-quadrado e para os valores numéricos o teste-t. ANOVA de medidas repetidas foi utilizada para comparar a dor pós-operatória nos dias 2, 10 e 30 após o procedimento cirúrgico. As interações significantes foram também analisadas por meio do teste post-hoc Tukey´s HSD. Para a ANOVA, os pressupostos de homogeneidade da variância e normalidade foram avaliados por meio dos gráficos de dispersão e curvas normais dos residuais, respectivamente. As análises estatísticas foram todas realizadas no software IBM SPSS Statistics versão 20 (Chicago, USA).

RESULTADOS

Análise descritiva

Entre o número total de 56 pacientes incluídos na análise, 51 eram homens e cinco mulheres, com idade entre 26-69 anos. Não houve diferenças significativas para as variáveis gênero, idade, índice de massa corporal e a duração da operação (Tabela 1). No entanto, houve diferenças significativas na incidência de edema e no uso de medicamentos analgésicos, onde a técnica LC promoveu maior incidência destas variáveis (Tabela 1).

TABELA 1
Características dos pacientes, das técnicas cirúrgicas e complicações pós-operatórias.

Níveis de dor pela escala visual analógica

A ANOVA demonstrou que os pacientes operados por TAPP tiveram nível de dor pós-operatória significativamente menor do que os operados pelo procedimento LC (p<0,05, Tabela 2). Não houve diferenças significativas nos níveis de dor pós-operatória entre os procedimentos cirúrgicos avaliados no dia 2 (p>0,05, Tabela 3). O nível médio de dor foi de 3±0,4 para o procedimento TAPP e 4±0,5 para o procedimento LC (Figura 1). Para o dia 10 de pós-operatório, o nível de dor foi significativamente menor para o procedimento TAPP (1,4±0,2) comparado ao procedimento LC (2,8±0,4) (p< 0,05, Tabela 3). Do mesmo modo, para o dia 30 de pós-operatório, o nível de dor também foi menor para o procedimento TAPP comparado ao LC. Para o grupo de pacientes operados por TAPP a média do nível de dor foi de 0,4±0,1 e para o grupo LC foi de 1,3±0,3 na EVA (Figura 1). No retorno de 12 meses pós-operatório, não foram diagnosticadas hérnias recidivadas (Tabela 1). No entanto, o percentual de pacientes com dor crônica e parestesia foi maior para o grupo operado pelo procedimento LC (32%) comparado ao procedimento TAPP (3,6%).

TABELA 2
Resultados estatísticos da ANOVA de medidas repetidas para os níveis de dor de pacientes operados pelos procedimentos Lichtenstein (LC) e laparoscópico (TAPP) para o tratamento de hérnia inguinal.
TABELA 3
Resultados estatísticos da ANOVA de medidas repetidas para os níveis de dor de pacientes operados pelos procedimentos Lichtenstein (LC) e laparoscópico (TAPP) para cada dia de pós-operatório.

FIGURA 1
Nível de dor para as técnicas cirúrgicas LC e TAPP

DISCUSSÃO

A dor pós-operatória é um dos principais fatores na escolha da técnica cirúrgica para o tratamento da hérnia inguinal. Este estudo verificou que pacientes submetidos ao procedimento TAPP apresentaram níveis de dor significativamente menores, comparado aos submetidos ao LC, para 10 e 30 dias de pós-operatório. Dor crônica e parestesia também estavam presentes em menor porcentagem para o procedimento TAPP (3,6%) comparado ao LC (32%). Adicionalmente para o procedimento TAPP, a ocorrência de edema e o uso de medicamento analgésico foi significativamente menor. No entanto, não foi encontrado nenhum caso de hérnia recidivada para ambos os procedimentos com 12 meses de pós-operatório.

No Brasil, quase que 100% dos procedimentos cirúrgicos para o tratamento de hérnia inguinal, realizados pelo Sistema Único de Saúde em 2015/2016, foram feitos por meio da técnica aberta1919 SUS. Ministério da Saúde - Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS) 2016. Available from: http://www2.datasus.gov.br/SIHD/consultas.
http://www2.datasus.gov.br/SIHD/consulta...
. Além da baixa taxa de recidiva, o procedimento Lichtenstein pode ser realizado em menor tempo cirúrgico e com custo comparado aos procedimentos laparoscópicos44 Bittner R, Schwarz J. Inguinal hernia repair: current surgical techniques. Langenbeck's Arch Surg 2011;397(2):271-82.. Existem, no entanto, complicações pós-operatórias relacionadas às técnicas abertas, e a dor pós-operatória está entre as mais importantes. Estudos anteriores demonstraram níveis de dor mais altos em pacientes operados por técnicas abertas como a Lichtenstein1313 Myers E, Browne KM, Kavanagh DO, Hurley M. Laparoscopic (TEP) Versus Lichtenstein Inguina Hernia Repair: A Comparison of Quality-of-Life Outcomes. Wor J Surg 2010;34(12):3059-64.,1818 Schmedt C, Sauerland S, Bittner R. Comparison of endoscopic procedures vs Lichtenstein and other open mesh techniques for inguinal hernia repair: a meta-analysis of randomized controlled trials. Surg End Int Tec 2005;19(2):188-99.. No entanto, a grande maioria dos trabalhos avalia a dor nas primeiras 48 h, período em que os pacientes ainda estão sob o efeito dos analgésicos utilizados na anestesia. Neste trabalho a dor aguda foi avaliada também com 10 e 30 dias de pós-operatório, mostrando que são nestes períodos que a dor é mais acentuada na técnica LC do que na técnica TAPP. Assim, pacientes operados por procedimentos laparoscópicos, neste e em outros estudos, reportaram nível de dor pós-operatória significativamente menor, comparado às técnicas abertas.

Dor crônica é definida como um valor na EVA acima de zero, que dura por mais de três meses após o procedimento cirúrgico, e é descrito por pacientes como dor sempre presente. A dor crônica pode ser causada por danos aos nervos durante a operação. Pode estar relacionada também ao posicionamento da tela no canal inguinal1616 Poobalan AS, Bruce J. A review of chronic pain after inguinal herniorrhaphy. Clinc J Pain 2003;19(1):48-54.,1717 Rehman SU, Khan AA, Shamim B, Saleem R, Shahzadi M, Khan ZA. Chronic groin pain after inguinal hernioplasty. J Rawalpindi Med Coll 2014;18(2):237-9.. Além da dor pós-operatória menor, o procedimento laparoscópico utilizado neste estudo promoveu dor crônica significativamente menor em 12 meses, 3,6%, comparado a 32% com o procedimento Lichtenstein. Do mesmo modo, em outro estudo, o nível de dor foi duas vezes maior para pacientes operados pela técnica aberta de Lichtenstein comparado a técnica TAPP11 Aasvang EK, Gmaehle E, Hansen JB, Gmaehle B, Forman JL, Schwarz J, et al. Predictive risk factors for persistent postherniotomy pain. J Amer Soc Anesthe 2010;112(4):957-69. e outras técnicas laparoscópicas como a laparoscopia totalmente extraperitoneal e a laparoscopia transinguinal pre-peritoneal88 Eklund A, Montgomery A, Bergkvist L, Rudberg C. Chronic pain 5 years after randomized comparison of laparoscopic and Lichtenstein inguinal hernia repair. Br J Surg 2010;97(4):600-8.,99 Garg P. Lichtenstein hernioplasty versus totally extraperitoneal laparoscopic hernioplasty in treatment of recurrent inguinal hernia: a prospective randomized trial. Ann Surg 2009;250(3):504..

A taxa de recidiva foi por muitos anos o principal fator na escolha da melhor técnica cirúrgica para o tratamento da hérnia inguinal. A incorporação da tela na operação livre de tensão foi o fator singular, responsável pela diminuição dramática da taxa de hérnia recidivada22 Amid PK, Shulman AG, Lichtenstein IL. Open "tension-free" repair of inguinal hernias; The Lichtenstein technique. Eur J Surg 1996;162(6):447-53.. A técnica de Lichtenstein é considerada como o padrão-ouro no tratamento de hérnia inguinal e é atualmente referência mundial. Ela diminuiu a taxa de recidiva para menos de 1%, independente da experiência do cirurgião33 Amid PK. Lichtenstein tension-free hernioplasty: its inception, evolution, and principles. Hernia. 2004;8(1):1-7.. Neste estudo nenhum paciente foi diagnosticado com hérnia recidivada em 12 meses de pós-operatório. Um ano, no entanto, é tempo curto para determinar a taxa de recidiva, mas alguns estudos relataram que o risco de recidiva é similar e baixo para ambas as técnicas cinco anos após a operação, quando uma tela com tamanho apropriado é utilizada 88 Eklund A, Montgomery A, Bergkvist L, Rudberg C. Chronic pain 5 years after randomized comparison of laparoscopic and Lichtenstein inguinal hernia repair. Br J Surg 2010;97(4):600-8.,1414 Neumayer L, Giobbie-Hurder A, Jonasson O, Fitzgibbons Jr R, Dunlop D, Gibbs J, et al. Open mesh versus laparoscopic mesh repair of inguinal hernia. New Eng J Med 2004;350(18):1819-27..

CONCLUSÃO

A técnica TAPP promoveu dor pós-operatória e crônica significativamente menor. O procedimento laparoscópico TAPP foi seguro e confiável no tratamento da hérnia inguinal, com taxa de recidiva semelhante à técnica aberta de Lichtenstein. Adicionalmente, o procedimento laparoscópico demonstrou vantagens claras com relação à dor pós-operatória e crônica, parestesia, ocorrência de edema e uso de medicamento analgésico. Assim, o procedimento laparoscópico TAPP deve ser considerado como método apropriado para o tratamento da hérnia inguinal unilateral não-recidivada.

REFERENCES

  • 1
    Aasvang EK, Gmaehle E, Hansen JB, Gmaehle B, Forman JL, Schwarz J, et al. Predictive risk factors for persistent postherniotomy pain. J Amer Soc Anesthe 2010;112(4):957-69.
  • 2
    Amid PK, Shulman AG, Lichtenstein IL. Open "tension-free" repair of inguinal hernias; The Lichtenstein technique. Eur J Surg 1996;162(6):447-53.
  • 3
    Amid PK. Lichtenstein tension-free hernioplasty: its inception, evolution, and principles. Hernia. 2004;8(1):1-7.
  • 4
    Bittner R, Schwarz J. Inguinal hernia repair: current surgical techniques. Langenbeck's Arch Surg 2011;397(2):271-82.
  • 5
    Bosi HR, Guimaraes JR, Cavazzola LT. Robotic assisted single site for bilateral inguinal hernia repair. ABCD, Arq Bras Cir Dig 2016;29(2):109-11.
  • 6
    Chung L, Norrie J, O'Dwyer PJ. Long-term follow-up of patients with a painless inguinal hernia from a randomized clinical trial. Br J Surg. 2011;98(4):596-9.
  • 7
    Eker HH, Langeveld HR, Klitsie PJ, van't Riet M, Stassen LP, Weidema WF, et al. Randomized clinical trial of total extraperitoneal inguinal hernioplasty vs Lichtenstein repair: a long-term follow-up study. Arch Surg 2012;147(3):256-60.
  • 8
    Eklund A, Montgomery A, Bergkvist L, Rudberg C. Chronic pain 5 years after randomized comparison of laparoscopic and Lichtenstein inguinal hernia repair. Br J Surg 2010;97(4):600-8.
  • 9
    Garg P. Lichtenstein hernioplasty versus totally extraperitoneal laparoscopic hernioplasty in treatment of recurrent inguinal hernia: a prospective randomized trial. Ann Surg 2009;250(3):504.
  • 10
    Iuamoto LR, Kato JM, Meyer A, Blanc P. Laparoscopic totally extraperitoneal (TEP) hernioplasty using two trocars: anatomical landmarks and surgical technique. ABCD Arq Bras Cir Dig 2015;28(2):121-3.
  • 11
    Keller J, Muo C-H, Lan Y-C, Sung F-C, Lo F-E, Chiang K-Y, et al. A nation-wide population-based study of inguinal hernia repair incidence and age-stratified recurrence in an Asian population. Hernia. 2015;19(5):735-40.
  • 12
    McCormack K, Scott N, Go P, Ross S, Grant A. Laparoscopic techniques versus open techniques for inguinal hernia repair (review). Cochrane Database of Systematic Reviews. 2003;1(1):CD001785.
  • 13
    Myers E, Browne KM, Kavanagh DO, Hurley M. Laparoscopic (TEP) Versus Lichtenstein Inguina Hernia Repair: A Comparison of Quality-of-Life Outcomes. Wor J Surg 2010;34(12):3059-64.
  • 14
    Neumayer L, Giobbie-Hurder A, Jonasson O, Fitzgibbons Jr R, Dunlop D, Gibbs J, et al. Open mesh versus laparoscopic mesh repair of inguinal hernia. New Eng J Med 2004;350(18):1819-27.
  • 15
    Palermo M, Acquafersca PA, Bruno M, Tarsitano F. Hernioplasty with and without mesh: analysis of the immediate complications in a randomized controlled clinical trial. ABCD, Arq Bras Cir Dig 2015;28(3):157-60.
  • 16
    Poobalan AS, Bruce J. A review of chronic pain after inguinal herniorrhaphy. Clinc J Pain 2003;19(1):48-54.
  • 17
    Rehman SU, Khan AA, Shamim B, Saleem R, Shahzadi M, Khan ZA. Chronic groin pain after inguinal hernioplasty. J Rawalpindi Med Coll 2014;18(2):237-9.
  • 18
    Schmedt C, Sauerland S, Bittner R. Comparison of endoscopic procedures vs Lichtenstein and other open mesh techniques for inguinal hernia repair: a meta-analysis of randomized controlled trials. Surg End Int Tec 2005;19(2):188-99.
  • 19
    SUS. Ministério da Saúde - Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS) 2016. Available from: http://www2.datasus.gov.br/SIHD/consultas
    » http://www2.datasus.gov.br/SIHD/consultas
  • Fonte de financiamento:

    não há
  • Número do Ensaio Clínico:

    RBR-68p3h5

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2017

Histórico

  • Recebido
    04 Fev 2017
  • Aceito
    07 Jul 2017
Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva Av. Brigadeiro Luiz Antonio, 278 - 6° - Salas 10 e 11, 01318-901 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (11) 3288-8174/3289-0741 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistaabcd@gmail.com