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Hidrocistoma: conduta cirúrgica na lesão palpebral cística

Resumos

Relato de caso de hidrocistoma palpebral e apresentação de técnica cirúrgica na conduta terapêutica dos tumores císticos benignos da pálpebra. Os hidrocistomas são tumores benignos relativamente frequentes nas pálpebras, principalmente, na pálpebra inferior, com maior prevalência no sexo feminino e a partir da quarta década de vida. O diagnóstico é clínico e, em casos de lesão única, a conduta cirúrgica é o tratamento de escolha. Deve-se descrever melhor a técnica cirúrgica utilizada, pois traz bons resultados estéticos e menor risco de recidiva.

Glândulas sudoríparas; Hidrocistoma; Hidrocistoma; Hidrocistoma; Neoplasias palpebrais


This report describes the case of a hidrocystoma of the eyelid and the surgical technique used in the therapeutical management of benign cystic lesions of the eyelids. Hidrocystomas are relatively common benign lesions of the eyelids, principally the lower eyelid. They are more common in females over thirty years of age. Diagnosis is clinical and when there is a single lesion, surgery is the treatment of choice. The surgical technique used should be described in greater detail, since it offers good esthetic results and a low risk of recurrence.

Eyelid neoplasms; Hidrocystoma; Hidrocystoma; Hidrocystoma; Hidrocystoma; Sweat glands


CASO CLÍNICO

Hidrocistoma: conduta cirúrgica na lesão palpebral cística* * Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.

Abelardo de Souza Couto JúniorI; Gabrielle Macieira BatistaII; Ícaro Guilherme Donadi Ferreira CalafioriIII; Vinícius Cristófori RadaelIV; Wilker Benedeti MendesV

IDoutor; professor titular da cadeira de Oftalmologia da Faculdade de Medicina de Valença Rio de Janeiro (RJ), Brasil; coordenador da Residência Médica de Oftalmologia do Instituto Benjamin Constant - Ministério da Educação; professor da pós-graduação em Oftalmologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SOB) - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

IIAcadêmicos de Medicina da Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

IIIAcadêmicos de Medicina da Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

IVPós-graduando de Oftalmologia do Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

VResidente de Cirurgia-Geral da Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Abelardo Couto Junior Av. Nossa Senhora de Copacabana, 1120, Gr 901 22060 000 Rio de Janeiro - RJ E-mail: soluc@ig.com.br / gabriellemacieira@yahoo.com.br

RESUMO

Relato de caso de hidrocistoma palpebral e apresentação de técnica cirúrgica na conduta terapêutica dos tumores císticos benignos da pálpebra. Os hidrocistomas são tumores benignos relativamente frequentes nas pálpebras, principalmente, na pálpebra inferior, com maior prevalência no sexo feminino e a partir da quarta década de vida. O diagnóstico é clínico e, em casos de lesão única, a conduta cirúrgica é o tratamento de escolha. Deve-se descrever melhor a técnica cirúrgica utilizada, pois traz bons resultados estéticos e menor risco de recidiva.

Palavras-chave: Glândulas sudoríparas; Hidrocistoma/cirurgia; Hidrocistoma/diagnóstico; Hidrocistoma/etiologia; Neoplasias palpebrais

INTRODUÇÃO

O hidrocistoma é uma forma cística de adenoma de glândula sudorípara produzido por proliferação de glândulas secretórias apócrinas ou écrinas.1,2 Apresenta-se sob a forma de uma ou mais lesões de tamanhos variáveis, localizadas, em geral, no segmento cefálico e, preferentemente, na face: fronte, regiões malares e palpebrais (glândulas de Moll), sendo canto externo da pálpebra inferior a maior incidência.3 Sua patogenia parece resultar da obstrução do conduto sudoríparo logo acima do enovelado glandular, em plena derme profunda, devido a um processo inflamatório ou a um trauma.4

O hidrocistoma é uma lesão palpebral benigna que se diferencia em dois tipos histológicos: apócrino e écrino.5,6

O hidrocistoma apócrino ou cisto de Moll é afecção da margem palpebral e ocorre, em geral, após obstrução do ducto secretório apócrino da glândula de Moll (glândula sudorípara apócrina e écrina).2 São vesículas translúcidas, arredondadas, pequenas, não dolorosas, com conteúdo líquido.1,5,7

O hidrocistoma écrino ou cisto sudoríparo é originário da glândula sudorípara écrina, também glândula de Moll, sendo uma afecção rara. Geralmente, apresenta-se como várias vesículas cutâneas na pálpebra inferior.5

A localização preferencial do cisto de Moll é próximo aos cílios e à via de drenagem lacrimal, ao passo que do hidrocistoma écrino é sobre a pele da pálpebra.8

De acordo com as observações em estudo realizado na Faculdade de Medicina de Botucatu, os hidrocistomas acometem, sobretudo, indivíduos do sexo feminino a partir da quarta década de vida, como lesão única, fato concordante com outros relatos da literatura.6,8,9 Ocorrem mais nas pálpebras inferiores. 10

O tempo decorrido desde o aparecimento da lesão até o diagnóstico clínico varia de um a cinco anos, ressaltando-se que esse dado é pouco preciso devido ao fato de não se observar, em muitos casos, o início do crescimento da lesão, provavelmente, em função de a mesma ser assintomática.10 Devido a esse fato, a busca de tratamento, na maioria dos casos, pode estar relacionada a motivos estéticos.6

O diagnóstico, inicialmente, é clínico, seguido de confirmação histopatológica.6,8

Histologicamente, o hidrocistoma apócrino apresenta na derme vários espaços císticos grandes, com projeções papilíferas, sendo revestido por duas camadas de células secretoras. As células mais internas são colunares e mostram citoplasma eosinofílico com expansões bulboapicais típicas, com decapitação para o lúmen, PAS positivo e granulodiastase resistentes.11

Já o hidrocistoma écrino apresenta-se como cisto de retenção ductal, caracterizado, histologicamente, por apenas uma cavidade cística na derme, parcialmente colapsada, sem projeções papilares, delimitado por uma ou duas camadas de pequenas células epiteliais cuboides; algumas vezes, os cistos apresentam secreção marrom devido à lipofucsina secretada pelas células delimitantes, adquirindo a aparência clínica de nevus azul ou melanoma.11

Diagnósticos diferenciais: molusco contagioso, carcinoma basocelular nódulo-cístico, hidroadenoma, nevo nevocítico, nevo azul, siringoma disseminado, hordéolo, calázio, cisto epidérmico.12

O objetivo dos autores é apresentar a conduta cirúrgica no tratamento de tumores císticos palpebrais com a respectiva técnica cirúrgica.

RELATO DE CASO

Mulher, SHO, 34 anos, branca, casada, do lar, natural de Valença (RJ).

QP: "Bolinha no olho"

HDA: Paciente relata início, há 10 anos, de pequena lesão pustulosa, indolor, em epicanto externo de pálpebra inferior de olho direito (OD). Há cinco anos, provocou trauma na lesão e, a partir disso, notou crescimento mais rápido da mesma, associado a dor de pequena intensidade. Procurou ambulatório de oftalmologia do Hospital-Escola da Faculdade de Medicina de Valença (RJ) com queixa de diminuição do campo visual em olho direito devido à presença da lesão. Nega outros sintomas.

HPP: HAS, nega DM ou outras comorbidades.

HF: Pai falecido aos 68 anos por IAM, mãe HAS e DM.

HS: Tabagista 16 maços/ano, etilista social.

Exame oftalmológico:

Acuidade visual: normal em ambos os olhos(AO).

Motilidade ocular extrínseca: sem alterações.

Reflexos pupilares: preservados AO.

Biomicroscopia: Presença de tumoração transluminescente em canto externo da pálpebra inferior de olho direito (Figura 1).


Hipótese diagnóstica: hidrocistoma.

Conduta: exérese cirúrgica e estudo histopatológico.

Diagnóstico histopatológico: hidrocistoma apócrino.

Procedimento cirúrgico/técnica: Foi feita anestesia infiltrativa perilesional com xilocaína a 2% mais adrenalina 1:200.000, seguindo-se incisão cutânea suprajacente à lesão cística sem aprofundar o bisturi, com o intuito de não perfurar a lesão e permitir a dissecção total da mesma. Posteriormente, rebatendo-se os bordos cutâneos, realizou-se a dissecção total da lesão até sua base, sempre com divulsão da tesoura e sem secção (Figura 2). Finalmente, a lesão foi totalmente excisada sem que ocorresse perfuração da cápsula cística. Em seguida, fezse cauterização do leito, secção de pele excedente e sutura com fio nylon 6.0 com pontos separados (Figura 3).



No procedimento cirúrgico, retirou-se lesão cística única, arredondada, translúcida, medindo aproximadamente 1,2cm no seu maior diâmetro, sem ruptura de sua cápsula (Figura 4).


O estudo de cortes histológicos da lesão revela estrutura de parede cística revestida ora por epitélio cúbico, ora por epitélio pavimentoso simples, predominantemente. A parede apresenta vasos congestos e, por vezes, discreto infiltrado de células mononucleares. Ausência de sinais de malignidade. A análise histopatológica sugere diagnóstico de hidrocistoma apócrino (Figura 5).


A paciente em estudo foi avaliada sete dias após excisão da lesão, apresentando cicatrização total, prosseguindo-se com a retirada dos pontos. Segue em acompanhamento há oito meses sem apresentar indícios de recidiva.

DISCUSSÃO

Os hidrocistomas palpebrais são lesões relativamente frequentes e de fácil tratamento.

O caso em estudo neste trabalho mostra paciente do sexo feminino acometida com lesão cística única, translúcida em epicanto externo de pálpebra inferior de olho direito, com clínica, evolução e diagnóstico concordantes com outros casos relatados na literatura.6,8,9

A exérese cirúrgica é o tratamento de escolha para lesão única.13 A técnica cirúrgica para retirada da lesão não foi encontrada descrita em relatos de caso da literatura.

Os diagnósticos clínico e anatomopatológico foram concordantes.

Tanto a descrição macroscópica cirúrgica quanto a anatomopatológica são compatíveis com as definições de hidrocistoma apresentadas pela literatura.3,5,12

Neste estudo, foi descrita técnica com objetivo de retirada completa da lesão sem ruptura de sua parede cística. Para isso, utilizou-se incisão cirúrgica cutânea sobre o cisto sem aprofundar, justamente, com o intuito de não perfurar a lesão e permitir a dissecção total da mesma. Caso ocorra a perfuração da lesão cística, é importante retirar a cápsula por completo que, provavelmente, remete às camadas de células secretoras descritas anteriormente no estudo hitopatológico. É provável que tal detalhe cirúrgico evite a recidiva do cisto.

Recebido em 24.04.2009.

Aprovado pelo Conselho Editorial e aceito para publicação em 01.07.2009.

Conflito de interesse: Nenhum

Suporte financeiro: Nenhum

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  • Endereço para correspondência:
    Abelardo Couto Junior
    Av. Nossa Senhora de Copacabana, 1120, Gr 901
    22060 000 Rio de Janeiro - RJ
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    Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de Valença - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Set 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Aceito
      01 Jul 2009
    • Recebido
      24 Abr 2009
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