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Crescimento de crianças diabéticas em controle ambulatorial em hospital universitário

Resumos

Com o objetivo de estudar o crescimento de pacientes com diabetes mellitus tipo 1 (DM1) acompanhados no Ambulatório da Disciplina de Diabetes do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ, foram avaliados, em corte transversal, 34 crianças e adolescentes com média (±DP) de 12±3,7 anos de idade, sendo 19 do sexo masculino. A idade de início do DM1 era de 7,8±4,1 anos e a duração da doença 4,2±3,1 anos. A mediana (variação) da relação altura para idade representada por unidades de desvio-padrão, escore Z, (Z A/I), foi de -0,05 (-1,8 a 1,1). Apenas 8,8% e 20,6% do grupo tiveram Z A/I menores que -1,5 e -1, respectivamente. O Z A/I mostrou-se significativamente diferente entre os subgrupos de <FONT FACE=Symbol>£</FONT>5 anos (SG1) e de >5 anos de doença (SG2), sendo, respectivamente: 0,26 (-1,47 a 1,10) e -0,77 (-1,88 a 0,73); p=0,03. SG1 e SG2 diferem também na idade de início do DM1 que é maior nos pacientes do SG1, respectivamente: 9,2±3,9 anos e 5,2±3,3 anos; p=0,01 Houve correlação negativa do Z A/I com o tempo de doença no grupo geral (r=-0,47; p<0,01). Quando o grupo foi subdividido por índice de hemoglobina glicada (hemoglobina glicada / máximo valor da normalidade) em controle adequado (<1,33) e não adequado ( > ou = 1,33), observamos diferença do Z A/I entre grupos, respectivamente: 0,29 (-1,69 a 0,85) e -0,43 (-1,88 a 1,10); p=0,02. A mediana do escore Z para peso em relação à idade (Z P/I) foi de 0,04 (-1,64 a 1,53). Apenas dois pacientes tiveram seus índices de massa corporal no percentil 85. Em conclusão, os escores de desvio padrão de altura para idade dos pacientes em controle ambulatorial, com tratamento convencional, mostraram correlação com o tempo de doença, sendo mais comprometidos nos pacientes com maior tempo de doença e controle glicêmico não adequado.

Diabetes; Crianças diabéticas; Crescimento; Escore Z


The aim of this study was to evaluate the growth of patients with type 1 diabetes mellitus (DM1), under 18 years of age, followed at the outpatient Diabetes Unit of the Pedro Ernesto University Hospital - State of Rio de Janeiro University. The cross sectional study included a total of 34 patients, 19 male, chronologic age of 12±3.7y (mean±SD), age at diagnosis of DM 7.8±4.1y and duration of DM 4.2±3.1y. The median (range) of standard deviation score (SDS) of height for age (SDS H/A) was -0.05 (-1.8 to 1.1). Only 8.8% and 20.6% of the patients had SDS H/A <-1.5 and -1, respectively. Even with similar chronologic age patients with <FONT FACE=Symbol>£</FONT>5y (SG1) had a greater SDS H/A than patients with >5y (SG2) of duration of DM, respectively: 0.26 (-1.47 to 1.10) vs. -0.77 (-1.88 to 0.73); p=0.03. Patients of the SG1 had a higher age on diagnosis of DM than patients of the SG2, respectively: 9.2+3.9 vs. 5.2±3.3y; p=0.01. The SDS H/A correlated with duration of DM1 (r=-0.47; p<0.01). Patients with appropriate control (glycated hemoglobin index - GHI <1.33) and non appropriate control (GHI <FONT FACE=Symbol>³</FONT>1.33) had SDS H/A significantly different, respectively: 0.29 (-1.69 to 0.85) vs. -0.43 (-1.88 to 1.10); p=0.02. The median of SDS of weight for age (SDS W/A) of this sudy was 0.04 (-1.64 to 1.53). Only two patients had BMI on the 85 percentile. In conclusion, the greater duration of DM1 the lesser was SDS H/A of patients with conventional treatment. Patients with appropriate control had better growth.

Diabetes; Diabetic children; Growth; Z Score


artigo original

Crescimento de Crianças Diabéticas em Controle Ambulatorial em Hospital Universitário

Edna F. Cunha

Gildásio R. Silva Jr.

Eliete L.S. Clemente

Marília B. Gomes

Departamento de Pediatria e

Disciplina de Diabetes e Metabologia

do Hospital Universitário Pedro

Ernesto, Universidade do Estado do

Rio de Janeiro - UERJ,

Rio de Janeiro, RJ.

Recebido em 18/12/98

Revisado em 06/05/99 e12/08/99

Aceito em 26/08/99

RESUMO

Com o objetivo de estudar o crescimento de pacientes com diabetes mellitus tipo 1 (DM1) acompanhados no Ambulatório da Disciplina de Diabetes do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ, foram avaliados, em corte transversal, 34 crianças e adolescentes com média (±DP) de 12±3,7 anos de idade, sendo 19 do sexo masculino. A idade de início do DM1 era de 7,8±4,1 anos e a duração da doença 4,2±3,1 anos. A mediana (variação) da relação altura para idade representada por unidades de desvio-padrão, escore Z, (Z A/I), foi de -0,05 (-1,8 a 1,1). Apenas 8,8% e 20,6% do grupo tiveram Z A/I menores que -1,5 e -1, respectivamente. O Z A/I mostrou-se significativamente diferente entre os subgrupos de £5 anos (SG1) e de >5 anos de doença (SG2), sendo, respectivamente: 0,26 (-1,47 a 1,10) e -0,77 (-1,88 a 0,73); p=0,03. SG1 e SG2 diferem também na idade de início do DM1 que é maior nos pacientes do SG1, respectivamente: 9,2±3,9 anos e 5,2±3,3 anos; p=0,01 Houve correlação negativa do Z A/I com o tempo de doença no grupo geral (r=-0,47; p<0,01). Quando o grupo foi subdividido por índice de hemoglobina glicada (hemoglobina glicada / máximo valor da normalidade) em controle adequado (<1,33) e não adequado (>=1,33), observamos diferença do Z A/I entre grupos, respectivamente: 0,29 (-1,69 a 0,85) e -0,43 (-1,88 a 1,10); p=0,02. A mediana do escore Z para peso em relação à idade (Z P/I) foi de 0,04 (-1,64 a 1,53). Apenas dois pacientes tiveram seus índices de massa corporal no percentil 85. Em conclusão, os escores de desvio padrão de altura para idade dos pacientes em controle ambulatorial, com tratamento convencional, mostraram correlação com o tempo de doença, sendo mais comprometidos nos pacientes com maior tempo de doença e controle glicêmico não adequado. (Arq Bras Endocrinol Metab 1999;43/5: 344-350)

Unitermos: Diabetes; Crianças diabéticas; Crescimento; Escore Z

ABSTRACT

The aim of this study was to evaluate the growth of patients with type 1 diabetes mellitus (DM1), under 18 years of age, followed at the outpatient Diabetes Unit of the Pedro Ernesto University Hospital - State of Rio de Janeiro University. The cross sectional study included a total of 34 patients, 19 male, chronologic age of 12±3.7y (mean±SD), age at diagnosis of DM 7.8±4.1y and duration of DM 4.2±3.1y. The median (range) of standard deviation score (SDS) of height for age (SDS H/A) was -0.05 (-1.8 to 1.1). Only 8.8% and 20.6% of the patients had SDS H/A <-1.5 and -1, respectively. Even with similar chronologic age patients with £5y (SG1) had a greater SDS H/A than patients with >5y (SG2) of duration of DM, respectively: 0.26 (-1.47 to 1.10) vs. -0.77 (-1.88 to 0.73); p=0.03. Patients of the SG1 had a higher age on diagnosis of DM than patients of the SG2, respectively: 9.2+3.9 vs. 5.2±3.3y; p=0.01. The SDS H/A correlated with duration of DM1 (r=-0.47; p<0.01). Patients with appropriate control (glycated hemoglobin index - GHI <1.33) and non appropriate control (GHI ³1.33) had SDS H/A significantly different, respectively: 0.29 (-1.69 to 0.85) vs. -0.43 (-1.88 to 1.10); p=0.02. The median of SDS of weight for age (SDS W/A) of this sudy was 0.04 (-1.64 to 1.53). Only two patients had BMI on the 85 percentile. In conclusion, the greater duration of DM1 the lesser was SDS H/A of patients with conventional treatment. Patients with appropriate control had better growth. (Arq Bras Endocrinol Metab 1999;43/5: 344-350)

Keywords: Diabetes; Diabetic children; Growth; Z Score

O DIABETES MELLITUS (DM) é a doença endócrinometabólica mais comum da criança e do adolescente. Estudo realizado em São Paulo mostrou uma incidência na faixa etária até os 14 anos de 7,6 por 100.000 habitantes por ano (1).

Sendo a avaliação do crescimento, segundo a Organização Mundial de Saúde (2), a melhor medida simples para definir o estado da saúde e nutricional da criança, justifica-se porque o crescimento da criança diabética foi sempre objeto de estudo. À publicação de Mauriac de 1934 (3), relatando o caso de uma menina de 10 anos, diabética desde os 4, com nanismo e hepatomegalia, seguiram-se diversos trabalhos comparando o crescimento de crianças diabéticas com o de crianças normais da mesma população, com irmãos não diabéticos ou com o gêmeo homozigoto saudável do par, demonstrando, na época, a nítida influência da doença na redução da estatura final (4,5).

Nos últimos anos os autores têm procurado elucidar a existência ou não de correlações da evolução da altura com: controle metabólico medido pela hemoglobina glicada, tempo de duração da doença e idade ao início clínico do diabetes (6-10).

O conhecimento de maior prevalência de doença celíaca e tireoidite em crianças diabéticas (11-13), condições capazes de afetar negativamente o crescimento, tem sido difundido apontando para sistematização da investigação, diagnóstico e tratamento dessas doenças a tempo de evitar ou corrigir desvios, permitindo que o adolescente alcance seus potenciais normais como adulto.

Ainda que o DCCT (6) não tenha mostrado diferença em termos de altura para os grupos com tratamento convencional ou intensivo, os reflexos dos achados daquele trabalho, no que se refere a complicações crônicas microvasculares, foram capazes de chamar atenção de quantos tratam de crianças e adolescentes diabéticos, para a necessidade de controle glicêmico o mais próximo da normalidade com o que, raramente, serão encontrados desvios da evolução da altura para níveis fora da faixa de normalidade.

O objetivo de nosso trabalho foi avaliar a repercussão do DM no crescimento de crianças e adolescentes cm tratamento regular convencional em ambulatório de diabetes de hospital público universitário, examinando as possíveis relações com parâmetros clínicos e laboratoriais: tempo de duração do DM, idade no início clínico da doença, sexo, controle glicêmico (avaliado por hemoglobina glicada) e dose de insulina empregada.

PACIENTES E MÉTODOS

De um total de 86 pacientes, classificados como portadores de DM do tipo 1 (DM1) de acordo com os critérios estabelecidos pela American Diabetes Association - ADA (14), foram estudados os menores de 18 anos em número de 34 (19 do sexo masculino e 15 do feminino), atendidos regularmente durante o ano de 1997 no ambulatório de diabetes do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ com idade cronológica de 12±3,7 (4-17) anos, idade no diagnóstico do DM1 7,8±4,1 (1-15) anos e duração da doença 4,2±3,1 anos (24 dias-13 anos), cujo diagnóstico obedeceu aos critérios do NDDG (15).

Os pacientes foram submetidos a uma investigação clínica e colhidos os seguintes dados: idade, idade no início do DM1, duração da doença, maturação sexual pelos critérios de Tanner, índice de massa corporal (IMC), dose de insulina, número de aplicações ao dia, número de consultas por ano.

As medidas antropométricas foram realizadas por um único observador durante a visita ao ambulatório.

O índice de massa corporal (IMC) foi calculado dividindo-se peso (Kg) pela altura ao quadrado (m2). Utilizou-se como padrão de referência do IMC o estudo americano de percentis de IMC de crianças de 5 a 17 anos de idade (16); os parâmetros de estudo nacional (17) foram também utilizados para comparação dos resultados em ambas avaliações. Considerou-se sobrepeso o IMC correspondente a ³ ao percentil 85 e < que 95 e obesidade se ³ ao percentil 95.

As relações altura para idade e peso para idade foram avaliadas através do escore Z, número de unidades de desvio-padrão correspondentes ao afastamento da mediana da referência, respectivamente, Z A/I e Z P/I. As curvas de crescimento utilizadas como referência foram as desenvolvidas pelo National Center of Health Statistics (NCHS) e Center for Disease Control (CDC) com dados do Pels Research Institute e US Health Examination Surveys, disponíveis no programa Epinut do EpiInfo 6.04b.

A hemoglobina glicada foi determinada pela técnica de cromatografia líquida de alta performance, no aparelho L-9100 Merck Hitachi, sendo o valor de referência 2,6 a 6,2%. Quando havia duas ou mais determinações de hemoglobina glicada em cada paciente, consideramos a média para análise estatística. Para classificação do controle glicêmico, em adequado e não adequado, utilizamos o índice de hemoglobina glicada dividindo-se a média da hemoglobina glicada do paciente pelo limite superior da normalidade do método, como utilizado por Chase (18), assim, no presente trabalho <1,33 foi considerado controle adequado e ³1,33, não adequado.

A análise estatística foi realizada através dos programas SPSS (versão 7.0) e EpiInfo (versão 6.04b). Para comparação entre grupos quando as variáveis não apresentavam distribuição normal utilizamos o teste de Mann Whitney ou Kruskal-Wallis, nas demais comparações foram utilizados os testes de t de Student. Para análise de variáveis categóricas utilizamos o teste de qui-quadrado e o teste exato de Fisher. No estudo das correlações utilizamos a regressão linear univariada e em "stepwise". Os dados são apresentados como média ± desvio padrão (DP) ou mediana e variação (mínimo-máximo). Consideramos como significante um valor de p< 0,05.

RESULTADOS

O grupo geral era constituído de: dois (6%) pré-escolares, 16 (47%) escolares e 16 (47%) adolescentes, segundo classificação Pediátrica por faixa etária (19) (Tabela 1). Pelos critérios de Tanner 10 (29,5%) pacientes eram pré-púberes, 13 (38,2%) estavam em puberdade incompleta e 11 (32,3%) em puberdade completa.

Estratificando-se o grupo geral, arbitrariamente, quanto à duração do DM1, em subgrupos (SGs) de até 5 e mais de 5 anos de doença, a média±DP de idade no primeiro subgrupo (SG1) composto de 23 pacientes (13M / 10F) foi de 11,5±4,0 anos e no segundo (SG2), com 11 pacientes (6M / 5F) foi de 13,l ±2,7 anos; p=0,34. A idade de início do DM1 foi maior no SG1 quando em comparação ao SG2, respectivamente: 9,2±3,9 anos e 5,2±3,3 anos; p=0,01. A duração do DM1 nos subgrupos 1 e 2 apresentou diferença significativa como esperado, respectivamente: 2,4±1,4 anos e 8±2,2 anos; p=0,0003 (Tabela 1).

A dose de insulina /kg /dia utilizada pelos pacientes foi de 0,83 (0,18-2,1) U/kg/dia, não havendo diferença entre os SGs 1 e 2 (Tabela 1).

O Z P/I do grupo geral foi de 0,04 (-1,64 a 1,53) não havendo diferença entre os sexos e SGs 1 e 2. Não houve Z P/I abaixo de -3 ou -2. Não houve correlação significativa do Z P/I com a duração do diabetes.

Quanto ao IMC, considerando-se o grupo geral, houve uma tendência a ser maior no sexo feminino que no masculino, respectivamente: 19,91 (15,95 - 26,77) e 17,72 (14,76 - 25,62); p=0,05, ressaltando-se que não houve diferença significativa das idades entre os sexos, respectivamente: 14 (6-17) e 12 (4-17); p=0,50. Nos pacientes maiores de 11 anos, o IMC foi significativamente maior no sexo feminino que no masculino, respectivamente: 21,16 (19,04 - 26,77) e 18,52 (15,47 - 25,62); p=0,006.

Apenas duas adolescentes (5,8%) tiveram IMC no percentil 85. No sexo masculino, nenhum paciente atingiu o percentil 85 do IMC. O escore de desvio padrão do IMC (Z IMC) mostrou-se menos negativo no sexo feminino que no masculino, respectivamente, -0,10 (-0,70 a 1,10) e -0,6 (-1,10 a 0,7); p=0,004.

O Z A/I do grupo geral foi de -0,05 (-1,88 a 1,10) sendo maior no SG1 em relação ao SG2, respectivamente: 0,26 (-1,47 a 1,10) e -0,77 (-1,88 a 0,73); p=0,03. Houve correlação do Z A/I com o tempo de duração do DM1 (r=-0,47; r2 = 0,22; p<0,01) (Figura 1). No modelo de regressão múltipla stepwise com Z A/I como variável dependente e tempo de duração do DM1, média de hemoglobina glicada e dose de insulina/kg/dia como variáveis independentes, a única variável independente significativa foi o tempo de duração do DM1 (r=-0,44; r2=0,20; p=0,008).


Observamos que os pacientes com controle glicêmico adequado, medido pelo índice de hemoglobina glicada, tiveram Z A/I mais positivos dos que os de controle não adequado, respectivamente: 0,29 (-1,69 a 0,85) e -0,43 (-1,88 a 1,10); p=0,02. Como subgrupos, os pacientes de controle glicêmico adequado e não adequado apresentaram diferenças significativas na idade cronológica: (10,5±4,1 anos e 13,5±2,6 anos; p=0,03), duração do DM1: (2,9±2,2 anos 5,5±3,5 anos; p=0,02) e dose de insulina/kg/dia: [0,6 (0,1-1,5) U/kg/dia e 1,1 (0,3-2,1) U/kg/dia; p=0,004] (Tabela 2). O percentual de pacientes em puberdade variou nos dois subgrupos, sendo 52,9% no primeiro e 88,2% no segundo, p=0,02.

DISCUSSÃO

A avaliação do crescimento merece destaque especial no acompanhamento clínico de crianças diabéticas. Os resultados de estudos publicados na literatura, referentes a crescimento de crianças diabéticas, são conflitantes nas afirmações da redução do ganho em altura, alcance do alvo genético da altura final e nas correlações da altura alcançada com controle glicêmico, com a duração do DM e com a idade de início da doença (6,9,20-22).

A ausência de registro de dados como cálculo do alvo genético e Z A/I do início clínico da doença bem como o fato de ter sido o presente estudo transversal, não nos permitiram garantir se houve, no grupo, uma redução do Z A/I durante a evolução do DM1. Os achados indiretos, no entanto, de correlação negativa do Z A/I com tempo de duração do DM (Figura 1) e médias significativamente diferentes de Z A/I nos subgrupos com até 5 ou mais de 5 anos de doença sugerem que os pacientes apresentam redução do ganho estatural com a evolução da doença. Ressaltamos que no estudo atual, arbitrariamente, escolhemos o limite de 5 anos para a subdivisão do grupo utilizando o mesmo prazo recomendado, pela ADA, para início de pesquisa de complicações crônicas em diabéticos do tipo 1, púberes e pós púberes (23). O tempo de dois anos de evolução da doença tem sido utilizado, por alguns, como limite para subdivisão do grupo evitando, desta forma, que o período de honey moon funcione como elemento complicador na interpretação das correlações (24).

A associação do Z A/I com controle glicêmico foi estudada, de forma indireta, comparando-se os subgrupos de controle adequado e não adequado, encontrando-se melhor crescimento entre os pacientes do primeiro subgrupo (Figura 2). Vários autores com estudos de seguimento, por tempo prolongados e/ou até que a altura final fosse atingida, mostraram que o controle glicêmico correlaciona-se com escores de DP da altura (7,9); no estudo de Berlin, que assinalou uma associação da redução do Z A/I com controle glicêmico pré e pós-puberal, a média de perda da altura final chegou a 2,9cm no sexo masculino e 2,3cm no feminino (9). O DCCT, onde o controle adequado de um dos subgrupos foi mantido com tratamento intensivo, não conseguiu demonstrar influência significativa sobre o crescimento (6). O estudo de Mortensen (8) abrangendo 2873 crianças e adolescentes, no entanto, mostrou correlação do Z A/I tanto com a duração do DM quanto com o controle glicêmico. Recentemente Salerno (21), em estudo retrospectivo de 62 pacientes, assinala redução do ganho estatural na evolução de pacientes diabéticos, embora, sem relação com a duração do DM, controle metabólico e necessidades de insulina. Em nosso estudo, o subgrupo de controle não adequado diferenciou-se do adequado não só por apresentar Z A/I menor mas por maior idade cronológica, maior duração do DM e uso de maior dose de insulina / kg / dia. A maior dose de insulina empregada, possivelmente, está relacionada à maior proporção de pacientes em puberdade neste subgrupo.


Quanto ao crescimento em relação ao peso não houve pacientes atingindo limites de Z P/I de -2 e -3, que caracterizam, teoricamente, desnutrição nos graus moderado e grave, respectivamente (25).

O IMC, avaliado por escore de DP, mostrou-se significativamente maior no sexo feminino como descrito entre não diabéticos e diabéticos após o início da puberdade (17,24). Comparando-se os percentis de IMC do nosso grupo, avaliado por parâmetros norte-americanos (16) e nacionais (17), observamos que o percentual de sobrepeso e/ou obesidade aumenta de 6,6% para 23,5%, respectivamente (Figura 3). Destacamos que o estudo brasileiro evidenciou valores de IMC da amostra inferiores aos observados na população americana com mais de 7 anos de idade mas semelhantes, quando em comparação, à faixa etária até os 6 anos. Justifica-se, portanto, o maior percentual de sobrepeso e obesidade entre nossos pacientes, quando avaliamos pelo estudo brasileiro, uma vez que apenas 4 (11,8%) de nossos pacientes tinham idades inferiores a 7 anos. Seguindo a ressalva feita pelos autores do estudo nacional (17) de que aqueles dados servem para comparações entre estudos e que seu uso para triagem e monitoramento é desaconselhável pela ampla variação, optamos por utilizar a tabela de IMC americana como referência para este trabalho. A avaliação do nosso grupo pelo estudo norte-americano, portanto, mostrou apenas duas adolescentes de 17 e 16 anos com IMC no percentil 85 caracterizando sobrepeso, ambas em puberdade completa, tempo de duração do DM , respectivamente, de 2 e 5 anos e uso de doses de insulina de 0,46 e 1,90 Unidades / kg / dia. Os índices de hemoglobina glicada díspares: 1,15 e 2,11, respectivamente, são a expressão de controle glicêmico adequado da primeira paciente e não adequado na segunda, ao mesmo tempo que explicam necessidades de doses muito diferenciadas de insulina.


Nossos pacientes até o momento não eram submetidos, dentro da rotina anual do serviço, à investigação de tireoidite e ou doença celíaca, sendo importante considerar a validade de ampliarmos a pesquisa laboratorial incluindo anticorpos para diagnóstico dessas condições e função tireoidiana, como indicado por diversos autores (12,13,26,27).

As dificuldades que encontramos na obtenção dos dados antropométricos do início da doença e do cálculo do alvo genético, de alguns pacientes, levou-nos a concluir que os serviços que se dedicam ao atendimento da criança diabética necessitam ter modelos de fichas de seguimento rigorosamente previstos para anotação dos dados capazes de permitirem, a qualquer momento, inferir da normalidade ou dos desvios do crescimento e ou desenvolvimento. A uniformidade do registro desses dados e dos regularmente constantes do controle, como hemoglobina glicada, médias de glicemias capilares, intercorrências etc., possibilitaria que trabalhos multicêntricos pudessem responder às questões sobre crescimento e desenvolvimento de nossos diabéticos.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho foi realizado com auxílio do CNPq (processo 522953/96-4).

Agradecemos a colaboração da Dra. Anna Gabriela Fuks e do Dr. Marcus Vinícius Leitão de Souza, residentes de Endocrinologia do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ, que participaram da rotina do ambulatório de Diabetes na época do estudo.

Endereço para correspondência:

Edna F. Cunha

Disciplina de Diabetes e Metabologia

Hospital Universitário Pedro Ernesto

Boulevard 28 de Setembro no 87, 3o andar

20551-030 Rio de Janeiro, RJ.

Fax: (021) 254-0272

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Ago 2006
  • Data do Fascículo
    Out 1999

Histórico

  • Aceito
    26 Ago 1999
  • Recebido
    18 Dez 1998
  • Revisado
    12 Ago 1999
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