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Metástase de seminoma em região orbital em cão - relato de caso

[Metastatic seminoma in the orbital region in a dog - case report]

RESUMO

O seminoma é uma neoformação testicular originária de células germinativas de ocorrência comum em cães, com maior prevalência em animais senis. Em geral, o comportamento biológico do seminoma canino é benigno. Relata-se neste trabalho um caso de seminoma com metástase em região orbital em um cão com 14 anos de idade. O animal foi atendido com queixa de aumento de volume em órbita esquerda, com posterior detecção de nódulo testicular. A punção aspirativa por agulha fina da massa orbital sugeriu tratar-se de linfoma de alto grau, contudo o diagnóstico definitivo de seminoma difuso foi estabelecido pela avaliação histopatológica, a qual revelou tratar-se de neoplasia maligna pouco diferenciada, sendo o diagnóstico de seminoma difuso confirmado pelo exame imunoistoquímico. Relatos de seminomas metastáticos em cães são incomuns. Objetivou-se com este trabalho relatar um caso de seminoma anaplásico difuso em cão cujo foco principal de metástase ocorreu em região orbital, além de descrever e discutir as dificuldades diagnósticas encontradas.

Palavras-chave:
neoplasias testiculares; citologia; oncologia veterinária; canino

ABSTRACT

Seminoma is a testicular neoformation originating from germ cells, commonly occurring in dogs. With higher prevalence in senile animals, the biological behavior of canine seminomas generally benign. This case reports seminoma with mestastasis in the orbital region in a 14-year-old dog. The animal was treated with a complaint of increased volume in the left orbit, and later a nodule in the testicle was discovered. Fine-needle aspiration of the orbit mass initially indicated a high-grade lymphoma. The definitive diagnosis of diffused seminoma was established by histopathological examination, resulting in poorly differentiated malignant neoplasia. Finally, the diagnosis was confirmed through immunohistochemistry, being the result compatible with diffused seminoma. Metastatic seminomas reported in dogs are quite uncommon. In this work we report a case of diffused anaplastic seminoma in dogs, where the main focus of metastasis was observed in the orbital region, and we also describe and discuss the difficulties encountered in the diagnostic.

Keywords:
testicular neoplasm; cytology; veterinary oncology; canine

INTRODUÇÃO

Em cães machos, as neoplasias que acometem o sistema reprodutor são as mais frequentes; dentre essas, as testiculares destacam-se pela maior ocorrência. Em geral, são benignas e associadas com frequência ao criptorquidismo. (Maclachlan e Kennedy, 2002MACLACHLAN, N.J.; KENNEDY, P.C. Tumors of the genital systems. In: MEUTEN, J.D. Tumors in domestic animals. 4.ed. Iowa: Iowa State Press, 2002. p 563-565.; Sorribas, 2009SORRIBAS, C.E. Manual de emergências e afecções frequentes do aparelho reprodutor em cães. São Paulo: Medvet, 2009. cap.9, p.103-105.; Apparício e Vicente, 2015; Daleck e Nardi, 2016DALECK, C.R.; NARDI, B.A. Oncologia em cães e gatos. 2.ed. Rio de Janeiro: Roca, 2016. p.557-560.). As mais comuns, baseadas na origem celular, são os tumores de células de Sertoli (sertolioma), os tumores do epitélio germinativo (seminomas) e os tumores de células de Leydig (leydigocitomas ou tumores intersticiais). Os sertoliomas (tumores hormônio-secretores) e os seminomas são mais descritos em animais criptorquidas. Esses animais apresentam com frequência o testículo direito retido e acometimento neoplásico. Os leydigocitomas afetam, em geral, testículos alojados em bolsa escrotal (Maclachlan e Kennedy, 2002; Sorribas, 2009; Apparício e Vicente, 2015; Daleck e Nardi, 2016). Cães com neoplasias intersticiais que cursam com aumento de testosterona podem apresentar hérnias perineais, adenoma e hiperplasia de glândula perinefal. Há predisposição etária e racial associada ao desenvolvimento de tumores testiculares, visto que cães idosos, com idade média de nove a 11 anos de certas raças, tais como Boxer e Pastor-Alemão, são mais predispostos. A maioria das neoplasias testiculares em cães não apresenta metástases (menos de 15% dos casos), diferentemente do comportamento metastático observado comumente no seminoma em homens (Maclachlan e Kennedy, 2002; Sorribas, 2009; Apparício e Vicente, 2015; Daleck e Nardi, 2016).

O seminoma é derivado das células germinativas formadoras do epitélio espermatogênico, localizadas dentro dos túbulos seminíferos, e não possui caráter de liberação hormonal (Carlton e MacGavin, 1998CARLTON, W.W.; MCGAVIN, D.M. Patologia veterinária especial de Thomson. 2.ed. Porto Alegre: Artmed, 1998. p.578-579.). A distinção entre as formas malignas e benignas depende da avaliação histológica e do acompanhamento da evolução clínica. A infiltração de células na túnica albugínea, no epidídimo e no cordão espermático é uma importante característica de malignidade (Maclachlan e Kennedy, 2002MACLACHLAN, N.J.; KENNEDY, P.C. Tumors of the genital systems. In: MEUTEN, J.D. Tumors in domestic animals. 4.ed. Iowa: Iowa State Press, 2002. p 563-565.; Santos e Alessi, 2010SANTOS, R.L.; ALESSI, A.C. Patologia veterinária. São Paulo: Roca, 2010. cap.15, p.855-880.).

O seminoma é classificado histologicamente em difuso e intratubular. O seminoma intratubular é caracterizado por proliferação neoplásica de células germinativas nos túbulos, sem invasão da membrana basal. Caso a proliferação neoplásica cause o rompimento desses túbulos, o tumor é classificado como seminoma difuso (Santos e Alessi, 2010SANTOS, R.L.; ALESSI, A.C. Patologia veterinária. São Paulo: Roca, 2010. cap.15, p.855-880.). O diagnóstico das neoplasias testiculares pode ser realizado por meio de citologia aspirativa por agulha fina (CAAF), análises histológicas e imunoistoquímica. O tratamento das neoplasias testiculares em cães geralmente é a orquiectomia bilateral, e o prognóstico é favorável. Em casos de metástases, os órgãos mais acometidos incluem linfonodos inguinais e sublombares, pulmões e diversos órgãos abdominais, havendo mudança de prognóstico para reservado a ruim em casos metastáticos (Maclachlan e Kennedy, 2002MACLACHLAN, N.J.; KENNEDY, P.C. Tumors of the genital systems. In: MEUTEN, J.D. Tumors in domestic animals. 4.ed. Iowa: Iowa State Press, 2002. p 563-565.; Raskin e Meyer, 2011RASKIN, R.; MEYER, D. Citologia clínica de cães e gatos. 2.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p.300-303.; Daleck e Nardi, 2016DALECK, C.R.; NARDI, B.A. Oncologia em cães e gatos. 2.ed. Rio de Janeiro: Roca, 2016. p.557-560.).

As características citológicas do seminoma incluem população de células redondas, dispostas individualmente (ocasionalmente em pequenos agregados), com elevada relação núcleo:citoplasma, e citoplasma moderada a intensamente basófilo, com limites bem definidos, semelhantes a células linfoides gigantes. A atividade mitótica é geralmente elevada (incluindo figuras de mitose atípicas) e com critérios de malignidade nuclear (anisocariose, células multinucleadas com anisocariose intracelular, cromatina reticular a grosseira e grumosa, nucléolos proeminentes, múltiplos e atípicos). Pequenos linfócitos podem ser observados (Peleteiro et al 2011PELETEIRO, C.M.; MARCOS, R.; SANTOS, M. et al. Atlas de citologia veterinária. Portugal: Lidel, 2011. p.196-197.). O exame histopatológico revela células poliédricas, muito grandes, núcleo vesicular e nucléolos evidentes, citoplasma escasso com figuras de mitoses bizarras e numerosas, podendo apresentar agregados de linfócitos. (Maclachlan e Kennedy, 2002MACLACHLAN, N.J.; KENNEDY, P.C. Tumors of the genital systems. In: MEUTEN, J.D. Tumors in domestic animals. 4.ed. Iowa: Iowa State Press, 2002. p 563-565.; Raskin e Meyer, 2011RASKIN, R.; MEYER, D. Citologia clínica de cães e gatos. 2.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. p.300-303.).

RELATO DO CASO

Em dezembro de 2015, foi atendido, no hospital-escola de medicina veterinária, um cão da raça Fox Terrier, macho, não castrado, com 14 anos de idade, com queixa de aumento de volume em região orbital esquerda (Fig. 1). Segundo a proprietária, o animal foi submetido a procedimento cirúrgico (enucleação do olho esquerdo), devido à glaucoma há cerca de três anos e meio. Na ocasião anterior, o bulbo ocular removido foi substituído por um implante sintético. A proprietária relatou que o aumento de volume se iniciou há cerca de 15 dias antes da consulta de dezembro de 2015. O cão apresentou aumento de volume na cavidade ocular esquerda, apatia e incômodo no local.

Figura 1
Fotografia do atendimento clínico do paciente. A) Vista rostral do aumento de volume periorbital do lado esquerdo. Notar grande massa medindo 8cm, causando marcada assimetria e deformidade facial. B) Vista lateral esquerda (perfil) evidenciando marcado abaulamento periocular esquerdo.

Ao exame físico, o paciente apresentava-se alerta, com linfonodos submandibulares aumentados de tamanho, mucosas normocoradas e temperatura retal, frequência cardíaca, frequência respiratória dentro dos parâmetros de normalidade. Percebeu-se aumento de volume de aproximadamente 8cm, de consistência firme, com áreas macias em região periorbital esquerda, com secreção serossanguinolenta e dor à palpação. O animal apresentava doença periodontal em grau avançado, secreção purulenta em gengiva e mucosa oral e halitose, além disso, o paciente exibia dificuldade respiratória por via nasal, mantendo a respiração por via oral. Adicionalmente, verificou-se um nódulo perianal de aproximadamente 1cm, com consistência firme e não aderido.

Foi solicitado exame de CAAF das massas em cavidade orbital e nódulo perianal, hemograma e exames radiográficos de crânio e prescreveu-se tratamento inicial à base de dipirona (25mg/kg/TID/5 dias), além de limpeza diária da região edemaciada. Três dias após o atendimento inicial, o animal retornou para reavaliação, quando, então, observou-se nódulo com cerca de 3cm no testículo esquerdo, sendo realizada CAAF do nódulo testicular e dos linfonodos poplíteo esquerdo e submandibular. O animal não era criptorquida.

Os resultados das CAAFs do nódulo perianal e da massa em cavidade orbital foram, respectivamente, compatíveis com adenoma hepatoide e linfoma de alto grau, e observou-se, na massa em cavidade orbital, amostra com hipercelularidade e predomínio de células redondas grandes, a qual apresenta cromatina grosseira, nucléolos múltiplos e evidentes, basofilia citoplasmática, discreta vacuolização citoplasmática, além de grande quantidade de figuras de mitose atípicas (Fig. 2). Nos linfonodos e no nódulo em testículo, os resultados das CAAFs foram, nesta ordem, compatíveis com linfonodos reativos e do nódulo em testículo. Não foi observado, na amostra analisada, material compatível com inflamação ou neoplasia, sugerindo-se biópsia. Indicou-se o tratamento quimioterápico como paliativo, porém o tratamento solicitado não foi realizado.

Uma semana depois, na segunda reavaliação, o animal apresentou piora clínica aparente. A proprietária relatou que não estava conseguindo administrar as medicações prescritas e que o animal exibia anorexia e sinais de dores intensas, além de dificuldade respiratória. Ao exame físico, o animal manifestava dispneia e aumento do volume da massa facial em relação à data da última avaliação. Devido ao agravamento do quadro clínico e ao prognóstico desfavorável, o tutor optou pela eutanásia. Após o óbito, o cadáver foi encaminhado para ser necropsiado em um laboratório de patologia veterinária vinculado a um hospital escola veterinário.

Figura 2
Fotomicrografia de citologia aspirativa por agulha fina realizada em neoformação periorbital de cão. A) Amostra hipercelular com predomínio de células redondas grandes, apresentando cromatina grosseira, nucléolos múltiplos e evidentes, basofilia citoplasmática, discreta vacuolização citoplasmática, além de grande quantidade de figuras de mitose (seta); objetiva de 100x. B) Nota-se população monomórfica de células redondas, coloração Giemsa; objetiva de 40x.

A neoformação da região orbital esquerda se infiltrava por toda a face lateral, estendendo-se no subcutâneo até 1,5cm abaixo de arco zigomático, plano nasal e região temporal esquerda, incluindo invasão em seios paranasais. Havia aderência óssea marcante, com pequenas áreas de osteólise. A neoformação exibia superfície natural irregular pardacenta, com aspecto multilobulado; ao corte, apresentava superfície pardacenta, homogênea e compacta, de consistência macia, com áreas friáveis e raros focos de necrose hemorrágica puntiformes. A neoformação envolvia, de forma aderente, a prótese de resina odontológica que fora posta no local da enucleação.

Figura 3
Aspectos macroscópicos do seminoma metastático em cão durante a necropsia. A) cavidade abdominal. Linfonodo sublombar intensamente aumentado de tamanho (seta). B) superfície de corte do linfonodo sublombar. Notar superfície compacta homogênea e amarronzada.

À necropsia, observou-se nódulo medindo 4,5 x 4,8 x 4,0cm na linha média da região sublombar caudal aos rins (Fig. 3A e 3B); no crânio, foram observadas perfurações milimétricas no osso nasal e abaixo do osso orbital esquerdo, onde a neoplasia se infiltrava. Durante a necropsia, foram coletados fragmentos de linfonodos sublombar, testículo, neoplasia em cavidade ocular, massa intra-abdominal (linfonodo sublombar) e úmero (medula óssea). Esse material foi fixado em formol e encaminhado para exame histopatológico.

A avaliação histopatológica do nódulo testicular revelou células poliédricas arranjadas de forma sólida difusa, apresentando moderado citoplasma eosinofílico, núcleo grande ovalado e nucléolo evidente, pleomorfismo moderado a severo, bem como anisocitose e anisocariose moderados a elevados, com figuras de mitose atípicas, e quadro morfológico compatível com seminoma difuso. A massa da cavidade ocular era constituída por proliferação neoplásica de células arredondadas a poliédrica, arranjadas de forma sólida difusa, apresentando moderado citoplasma eosinofílico, núcleo grande ovalado e nucléolo evidente, pleomorfismo moderado a severo, bem como anisocitose e anisocariose moderados a elevados e índice de mitose elevado com figuras de mitose atípicas, sendo compatível com neoplasia maligna pouco diferenciada. Observou-se infiltração de células neoplásicas nos vasos linfáticos. Já na massa intra-abdominal (linfonodo sublombar), foi observada proliferação atípica de células arredondadas ou poliédricas, com núcleos arredondados, moderadamente cromáticos, vesiculares, com volumoso citoplasma levemente eosinofílico. A neoplasia exibia arranjo difuso e obliterando quase totalmente o linfonodo sublombar. Havia ainda moderado pleomorfismo celular, anisocariose e anisocitose, sendo os achados anatomopatológicos e histológicos compatíveis com o quadro de seminoma metastático. Adicionalmente, fragmento de medula óssea e linfonodos não revelaram alterações dignas de nota.

Para conclusão diagnóstica, realizaram-se exames imunoistoquímicos, com os seguintes anticorpos: anti-Oct-3/4, anti-CD117, anti-CD3 e anti-CD20, com o intuito de diferenciar a neoplasia entre seminoma e linfoma. Houve imunomarcação das células neoplásicas com os anticorpos anti-Oct-3/4 (marcador de seminoma, clone C-10), anti-CD117, proto-oncogene C-KIT ou proteína tirosina (igualmente marcador de seminoma) (Fig. 4). Já com os anticorpos anti-CD3 (marcador de linfomas de células T) e anti-CD20 (marcador de linhagem linfoide), não houve imunomarcação das células neoplásicas. O diagnóstico imunoistoquímico foi seminoma difuso.

Figura 4
Fotomicrografia do seminoma mestastático. A) Imunomarcação positiva para CD117 das células neoplásicas da massa periocular. B) Imunoistoquímica com anticorpo anti-Oct-3/4 evidenciando forte imunomarcação das células neoplásicas. Objetivas de 40x.

DISCUSSÃO

Na literatura, há poucos relatos de seminoma em cães com comportamento maligno. O primeiro caso de metástases de seminoma em cão foi descrito em 1987, por Hogenes e colaboradores, tendo as metástases ocorrido em cérebro e olho; havia ainda edema de córnea e glaucoma secundário no olho esquerdo. No presente caso, o nódulo testicular foi observado na necropsia, com focos de metástases em cordão espermático, rede testicular, vísceras abdominais e torácicas e gânglios linfáticos. Outro relato foi descrito em 2001, quando o cão apresentou diversas lesões cutâneas e focos metastáticos de seminoma em olhos, peritônio, fígado, cordão espermático e escroto, os quais foram confirmados por meio de exames histopatológicos. O animal morreu três meses após o aparecimento das metástases sistêmicas (Takiguch e Hashimoto, 2001). Recentemente em um cão, foi descrito um caso incomum de metástase acometendo palato mole, base da língua e pericárdio, confirmada após a necropsia (Lucas et al., 2012LUCAS X.; RODENAS, C.; CUELLO, C. et al. Unusual systemic metastases of malignant seminoma in a dog. Reprod. Dom. Anim., v.47, p.59-61, 2012.. Em 2015, foi descrito um caso incomum de seminoma difuso maligno em testículo criptorquídico com metástase óssea em um cão (Dugat et al., 2015DUGAT, D.R.; MEDICI, E.L.; ROCHAT, M.C. et al. An unusual case of metastatic seminoma in a dog. Am. Anim. Hosp. Assoc. v.51, p.401-406, 2015.).

No caso aqui descrito, os sítios metastáticos foram os linfonodos sublombares e a região orbital. Segundo a literatura, um dos principais fatores predisponentes para as neoformações testiculares é o criptorquidismo, entretanto tal condição não foi verificada no presente caso. O prognóstico para tumores testiculares advém da presença ou não de metástases, associada ao grau de disseminação e ao estado fisiológico do animal. O tratamento recomendado pela literatura é a orquiectomia bilateral em associação com um programa de tratamento com fármacos quimioterápicos quando há metástases (Daleck e Nardi, 2016DALECK, C.R.; NARDI, B.A. Oncologia em cães e gatos. 2.ed. Rio de Janeiro: Roca, 2016. p.557-560.).

Entre os protocolos quimioterápicos, foi relatado uso da bleomicina (10mg/m², subcutâneo, SID, por quatro dias, depois uma vez por semana, durante 16 semanas), com redução do volume da metástase na primeira semana, sem recidiva de metástases depois de 12 meses do início do diagnóstico (Spugnini et al., 2000SPUGNINI, P.; BARTOLAZZI, A.; RUSLANDER, D. Seminoma with cutaneous metastases in a dog. J. Am. Anim. Hosp. Assoc.,v.36, p.253-256, 2000.). Vale ressaltar que o diagnóstico inicial do relato aqui descrito foi equivocado (linfoma), contudo medidas terapêuticas não foram adotadas.

Em resumo, os resultados dos exames realizados foram que, na citopatologia, a neoformação da cavidade orbital foi compatível com linfoma de alto grau em razão das células redondas e grandes, lembrando linfoblastos. Na histopatologia, o resultado de neoplasia maligna pouco diferenciada foi dado, o que demonstra a dificuldade para diagnosticar as metástases em comparação ao diagnóstico de tumor primário. Quanto ao diagnóstico, o caso se mostrou desafiante, pois a neoformação em cavidade orbital possuía características citológicas semelhantes a tumores de células redondas, a exemplo do linfoma. Como agravante, a neoformação testicular era pequena (< 3cm) e a citologia foi inconclusiva. Há relatos na literatura em que, em homens, as metástases podem ser morfologicamente diferentes do tumor primário (Gerber, 1985GERBER, W.L. Testicular neoplasms. B. Clinical, diagnostic, and therapeutic features. In: Genitourinary Oncology, ed. Culp DA and Loening SA, 1985. p. 346-381., citado por Hogenesch, 1987HOGENESCH, H.; WHITELEY, E.H.; VICINI, S.D.; HELPER, C.L. Seminoma with metastases in the eyes and the brain in a dog. Vet. Pathol., v.24, p.278-280, 1987). O caso descrito por Hogenesch et al. (1987) se assemelhou ao caso descrito neste trabalho, pois a neoformação testicular era pequena (1cm), sendo detectada apenas na necropsia; na avaliação histopatológica da massa, também foi encontrado infiltrado de linfócitos.

Outro caso de diagnóstico complexo na citologia foi descrito por Spugnini et al. (2000SPUGNINI, P.; BARTOLAZZI, A.; RUSLANDER, D. Seminoma with cutaneous metastases in a dog. J. Am. Anim. Hosp. Assoc.,v.36, p.253-256, 2000.), os quais relataram dificuldades de definição da linhagem celular e, após CAAF em alguns nódulos da pele, obtiveram resultados equivocados de cisto sebáceo e lipoma. No relato apresentado por Takiguchi et al. (2001TAKIGUCHI, M.; IIDA, T.; KUDO, T.; HASHIMOTO, A. Malignant seminoma with svstemic metastases in a dog. J. Small Anim. Pract., v.42, p.360-362, 2001.), o resultado histológico da metástase que ocorreu em pele foi diagnosticado erroneamente como neoplasia epitelial, e a neoplasia testicular foi observada após 37 dias da apresentação clínica inicial dos nódulos cutâneos. Após análise dos casos descritos na literatura, foram observadas descrições de mudanças morfológicas que podem ocorrer nas metástases de seminoma, indicando que cães com neoplasias testiculares e outras massas devem ser observados com cautela.

No caso relatado neste artigo, foi necessária a utilização do exame de imunoistoquímica para avaliar os fragmentos do testículo e da massa em face, só então obtendo o diagnóstico final de seminoma difuso metastático.

CONCLUSÃO

No presente caso, foram utilizados diversos métodos diagnósticos, iniciando-se pela CAAF, seguida de exame histológico e, por fim, pelo exame imunoistoquímico. Alguns resultados foram conflitantes e imprecisos, obtendo-se confirmação das metástases em região periorbital apenas com os resultados imunoistoquímicos. Apesar de o seminoma ser considerado de baixo risco metastático, pode ser fatal por exibir quadro clínico variado em virtude dos diversos sítios de metástases descritos na literatura e, por vezes, ter o foco primário detectado tardiamente, tendendo à demora e/ou à falha diagnóstica. Pacientes com seminoma devem ser avaliados quanto ao desenvolvimento de metástases e acompanhados periodicamente, como é padrão em neoplasias com alto potencial metastático.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    07 Jul 2017
  • Aceito
    18 Dez 2018
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