Acessibilidade / Reportar erro

Infecção experimental de cães com amostras de Babesia canis isoladas em Minas Gerais

Dog experimental infection of Babesia canis isolated in Minas Gerais State

Resumo

The objective of the present study was to evaluate parasitemia and packed cell volume patterns of dogs experimentally inoculated with two isolates of Babesia canis: one from Belo Horizonte (BH) and the other from Lavras (Lv), Minas Gerais State, Brazil. Both isolates showed similar patterns, with the peak of parasitemia occurring three days post-infection. From the fourth day, parasitemia was detected in low levels (0.01%) with small periodical increases. The packed cell volume decreased after the parasitemia beginning, with oscillations during the experimental period. All dogs remained apparently normal, except one, which had been inoculated with the BH isolate and presented classical clinical signs of babesiosis (weakness, anemia, hemoglobinuria and depression). The results suggest that the studied isolates have low pathogenicity, and point to the need for further studies aiming to characterize the subspecies of Brazilian isolates.

Dog; Babesia canis; experimental infection


Dog; Babesia canis; experimental infection

Cão; Babesia canis; infecção experimental

COMUNICAÇÃO

[Communication]

Infecção experimental de cães com amostras de Babesia canis isoladas em Minas Gerais

[Dog experimental infection of Babesia canis isolated in Minas Gerais State]

K.A. Bicalho1, L.M.F Passos1, M.F.B Ribeiro2*

1Escola de Veterinária da UFMG

2Instituto de Ciências Biológicas da UFMG

Caixa. Postal 486

31270-910 - Belo Horizonte, MG

*Autor para correspondência

Recebido para publicação em 22 de outubro de 2001

Recebido para publicação, após modificações, em 22 de abril de 2002

Atualmente são reconhecidas três subespécies de Babesia canis: Babesia canis canis, encontrada na Europa e transmitida por Dermacentor reticulatus, Babesia canis vogeli, encontrada no Nordeste da África e Norte da América, transmitida por Rhipicephalus sanguineus e Babesia canis rossi, encontrada no Sul da África e transmitida por Haemaphysalis leachi. (Uilemberg, 1986; Uilemberg et al., 1989; Lewis et al., 1996; Lobbeti, 1998; Carret et al., 1999). Apesar da similaridade morfológica, relatos sugerem que as duas primeiras subespécies possuem de baixa a moderada patogenicidade, com animais apresentando parasitemia transiente e infecção inaparente, enquanto que B. canis rossi possui alta patogenicidade, que induz doença fulminante, com aumento exponencial da parasitemia (Schetters et al., 1997).

No Brasil, o carrapato trioxeno R. sanguineus é considerado o transmissor da B. canis (O’Dwyer, 2000) e até o presente momento não existem estudos que identifiquem subespécies desse parasito. O objetivo deste trabalho foi avaliar a parasitemia e as alterações do volume globular em cinco cães infectados experimentalmente com amostras de B. canis isoladas em Minas Gerais, uma proveniente de Belo Horizonte e outra de Lavras.

Foram utilizados cães esplenectomizados, com idade inferior a um ano, criados em isolamento desde o nascimento e sorologicamente negativos para B. canis pela reação de imunofluorescência indireta (RIFI). Três animais foram inoculados com a amostra de Belo Horizonte e um inoculado com a de Lavras, todos por via endovenosa, com aproximadamente 2,0x107 hemácias parasitadas. Os animais foram acompanhados diariamente durante 21 dias, exceto um cão inoculado com a amostra de Belo Horizonte, acompanhado por 28 semanas. Nesse período, foram examinados esfregaços com sangue capilar e venoso (coloração Giemsa) e determinado o volume globular (VG). Um animal foi mantido como controle negativo.

Os resultados mostraram que as primeiras hemácias parasitadas foram detectadas entre dois e três dias após a inoculação (PI), observando-se um pico de parasitemia no terceiro dia ( =9,12± 6,34%). A partir do quarto dia ocorreu redução drástica da parasitemia, tornando-se um achado inconstante devido aos seus baixos níveis (<0,01%). Na Tab. 1 são mostrados dados referentes às parasitemias e VG. Pela amplitude observou-se que a parasitemia foi maior no sangue capilar. Os animais apresentaram valores normais de VG no início do experimento. Após o pico de parasitemia esses valores foram reduzidos, não se observando valor inferior a 13%. Os cães permaneceram aparentemente normais, exceto um, inoculado com a amostra de BH, o qual apresentou sinais clínicos clássicos de babesiose (fraqueza, anemia, hemoglobinúria e depressão).

Na Fig. 1 são mostradas as médias semanais da parasitemia capilar e venosa e do VG do cão inoculado com a amostra de Belo Horizonte acompanhado por 28 semanas. A parasitemia do sangue capilar foi sempre superior à do sangue venoso (P< 0,05), e variou de 0,01 a 2,34% no sangue capilar e de 0,01 a 0,24% no sangue venoso. Após o pico de parasitemia, a presença de Babesia nos esfregaços sangüíneos passou a ser inconstante, não obedecendo a um padrão de comportamento. A partir da 17a semana PI não foi detectada parasitemia nos esfregaços. O VG, com valores normais no início do experimento, apresentou queda brusca após o início da parasitemia e oscilou durante o período de acompanhamento do animal. A média semanal do VG variou de 17,71 a 34,51%. O animal permaneceu aparentemente normal.


As amostras de B. canis causaram baixa parasitemia. Esse perfil associado à ausência de manifestações clínicas dos animais foi semelhante ao descrito por Assis (1993), que utilizou um isolado de B. canis de São Paulo, e por Ribeiro et al. (1990), que utilizaram um isolado de B. canis de Belo Horizonte. Estes resultados e os valores de hematócrito observados sugerem que as amostras existentes nesse meio são de baixa patogenicidade, provavelmente causando infecções inaparentes. Como no Brasil o único vetor de B. canis descrito é o R. sanguineus, e não existem estudos de caracterização molecular relatando a ocorrência de subespécies, sugere-se que a amostra estudada seja B. canis vogeli, que apresenta virulência semelhante à da B. canis canis (Shaw et al., 2001). O presente estudo aponta a necessidade de novas pesquisas para identificação das subespécies de B. canis presentes no Brasil.

Palavras-chaves: Cão, Babesia canis, infecção experimental

ABSTRACT

The objective of the present study was to evaluate parasitemia and packed cell volume patterns of dogs experimentally inoculated with two isolates of Babesia canis: one from Belo Horizonte (BH) and the other from Lavras (Lv), Minas Gerais State, Brazil. Both isolates showed similar patterns, with the peak of parasitemia occurring three days post-infection. From the fourth day, parasitemia was detected in low levels (0.01%) with small periodical increases. The packed cell volume decreased after the parasitemia beginning, with oscillations during the experimental period. All dogs remained apparently normal, except one, which had been inoculated with the BH isolate and presented classical clinical signs of babesiosis (weakness, anemia, hemoglobinuria and depression). The results suggest that the studied isolates have low pathogenicity, and point to the need for further studies aiming to characterize the subspecies of Brazilian isolates.

Keywords: Dog,Babesia canis, experimental infection

  • ASSIS, C.B. Estudo de aspectos hematológico, bioquímico e imunológico em cães não esplenectomizados e esplenectomizados inoculados com Babesia canis. 1993. 93f. Tese (Doutorado). Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Estadual Paulista, UNESP, Botucatu, SP
  • CARRET, C.; WALAS, F.; CARCY, B. et al. Babesia canis canis, Babesia canis vogeli, Babesia canis rossi: differentiation of the three subspecies by a restriction fragment lenght polymorphism analysis on amplified small subunit ribossomal RNA genes. J. Eukaryot Microbiol, v.46, p.298-303, 1999.
  • LEWIS, B.D.; PENZHORN, B.L.; LOPEZ-REBOLLAR, L.M. et al. Isolation of South African vector-specific strain of Babesia canis Vet. Parasitol, v.63, p.9-16, 1996.
  • LOBETTI, R.G. Canine babesioses. Comp. Cont. Educ. Pract. Vet., v.20, p.418-430, 1998.
  • ODWYER, L.H.O. Diagnóstico de hemoparasitas e carrapatos de cães provenientes de áreas rurais em três mesorregiões do Estado do Rio de Janeiro, Brasil. 2000. 97f. Tese (Doutorado). Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
  • RIBEIRO, M.F.B.; PASSOS, L.M.F.; LIMA, J.D. et al. Freqüência de anticorpos fluorescentes anti- Babesia canis em cães de Belo Horizonte, Minas Gerais. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec, v.42, p.511-517, 1990.
  • SCHETTERS, T.P.M.; MOUBRI, K.; PRÉCIGOUT, E. et al. Different Babesia canis isolates, different diseases. Parasitology, v.115, p.485-493, 1997.
  • SHAW, S.E.; DAY, M.J.; BIRTLES, R.J. et al. Tick - borne infectious diseases of dogs. Disponível em Acesso em 9 de fevereiro de 2001.
  • UILEMBERG, G. Highlights in recent research on tick-borne diseases of domestic animals. J. Parasitol., v.72., p.485-491, 1986.
  • UILEMBERG, G.; FRANSSEN, F.F.J.; PERIÉ, N.M. et al. Three groups of Babesia canis distinguished and a proposal for nomenclature. Vet. Q, v.1, p.33-40, 1989.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Mar 2003
  • Data do Fascículo
    Out 2002

Histórico

  • Recebido
    22 Out 2001
  • Revisado
    22 Abr 2002
Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária Caixa Postal 567, 30123-970 Belo Horizonte MG - Brazil, Tel.: (55 31) 3409-2041, Tel.: (55 31) 3409-2042 - Belo Horizonte - MG - Brazil
E-mail: abmvz.artigo@gmail.com