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Efeitos de um programa de fonoterapia da voz em grupo de pacientes com disfonia: estudo piloto

RESUMO

Objetivo

Identificar os efeitos de um programa de fonoterapia da voz em grupo de pacientes com disfonia, por meio de avaliações perceptivo-auditiva e autopercepção vocal.

Métodos

Estudo-piloto de ensaio clínico não controlado, com amostra de conveniência. O estudo contou com 22 participantes com diagnóstico otorrinolaringológico de disfonia. Dentre eles, 15 mulheres e sete homens, com média de idade de 59,4 ± 12,53. Foram realizadas dez sessões de terapia fonoaudiológica em grupos de cinco a seis pessoas, com abordagens diretas e indiretas, baseadas no Programa Integral de Reabilitação Vocal (PIRV). Os participantes foram avaliados individualmente, antes e após a realização do programa terapêutico. A avaliação incluiu análise de autopercepção com a Escala de Sintomas Vocais (ESV) e perceptivo-auditiva da qualidade vocal com a escala Grade, Roughness, Breathness, Asteny, Strain, (GRBAS), realizadas por fonoaudiólogos especialistas em voz.

Resultados

Após o programa terapêutico, observou-se diferença significativa na pontuação de grau geral de alteração da ESV (p=0,002) e também nas subescalas Limitação (p=0,002) e Emocional (p=0,006), indicando autopercepção de redução dos sintomas vocais após intervenção. No entanto, destaca-se que não foram encontrados resultados significativos na comparação pré e pós-tratamento com relação à qualidade vocal.

Conclusão

O programa de fonoterapia da voz teve efeitos estatisticamente significativos em relação aos sintomas vocais autorrelatados, sinalizando um caminho promissor de abordagem eclética para a terapia vocal em grupo.

Palavras-chave:
Treinamento da voz; Disfonia; Reabilitação; Distúrbios da voz; Voz

ABSTRACT

Purpose

To identify the effects of a phonotherapy program in a group of patients with dysphonia through auditory-perceptual and vocal self-perception assessments.

Methods

Pilot study: an uncontrolled clinical trial with a convenience sample. Twenty-two patients with an otorhinolaryngological diagnosis of dysphonia participated in the study, including 15 women and 7 men, with a mean age of 59.4 ± 12.53, who underwent 10 speech therapy sessions in groups of 5 to 6 people, with direct and indirect therapy based on the Comprehensive Vocal Rehabilitation Program (CVRP). Patients were individually assessed before and after the therapeutic program, the assessment included auditory-perceptual analysis with the Vocal Symptoms Scale (VSS) and auditory-perceptual analysis of voice quality GRBAS, performed by speech-language pathologists specializing in voice.

Results

After the therapeutic program, there was a significant difference in the score for the general degree of change in the VSS (p=0.002), and also in the limitation (p=0.002) and emotional (p=0.006) subscales, indicating selfperceived reduction in vocal symptoms after intervention. However, no significant results were found in the pre- and posttreatment comparison regarding vocal quality.

Conclusion

The study demonstrated that the voice therapy program had statistically significant effects in relation to self-reported vocal symptoms, thus signaling a promising path for an eclectic approach to group vocal therapy.

Keywords:
Voice training; Dysphonia; Rehabilitation; Voice disorders; Voice

INTRODUÇÃO

No atendimento em grupo, o vínculo promovido entre os participantes e o terapeuta promove a construção de conhecimento em contexto social, o que transforma o espaço terapêutico em um ambiente de ressignificação dos processos patológicos, podendo auxiliar na diminuição de sentimentos negativos em relação à voz(11 Law T, Lee KY-S, Ho FN-Y, Vlantis AC, van Hasselt AC, Tong MC-F. The effectiveness of group voice therapy: a group climate perspective. J Voice. 2012 mar;26(2):e41-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2010.12.003. PMid:21550777.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2010....
) e na promoção de hábitos vocais saudáveis(22 Abrahamsson M, Millgard M, Havstam C, Tuomi L. Effects of voice therapy: a comparison between individual and group therapy. J Voice. 2018 jul;32(4):437-42. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2017.06.008. PMid:28732752.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2017....
). Portanto, nesse tipo de abordagem, é fundamental que seja realizado um programa terapêutico eficaz, com a combinação entre abordagens diretas e indiretas(33 Ruotsalainen JH, Sellman J, Lehto L, Jauhiainen M, Verbeek JH. Interventions for treating functional dysphonia in adults. Cochrane Database Syst Rev. 2007 jul;3:CD006373. PMid:17636842.).

Na saúde pública hospitalar brasileira, se faz necessária a otimização de recursos e, portanto, a prática de terapia em grupo é comum aos mais diversos atendimentos em saúde(44 Ribeiro VV, Panhoca I, Dassie-Leite AP, Bagarollo MF. Grupo terapêutico em fonoaudiologia: revisão de literatura. Rev CEFAC. 2012 dez;14(3):544-52. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011005000131.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011...
). Na Fonoaudiologia - especificamente na área de voz -, o atendimento em grupo tinha, inicialmente, enfoque na demanda, contudo, ao longo do tempo, foi percebida a riqueza da troca de experiências entre os pacientes a respeito de suas dificuldades com a disfonia(55 Costa BOID, Silva POC, Pinheiro RSDA, Silva HFD, Almeida AAFD. Estágio de prontidão de pacientes com disfonia comportamental pré e pós-terapia de voz de grupo. CoDAS. 2017 ago;29(4):e20160198. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172016198. PMid:28813072.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/2017...
).

A avaliação multidimensional da voz inclui a avaliação fonoaudiológica por meio das análises perceptivo-auditiva e acústica, avaliação otorrinolaringológica com a análise qualitativa e quantitativa de imagens laríngeas e, por fim, a autoavaliação do paciente sobre o impacto da disfonia na qualidade de vida(66 Ferreira LP, Constantini AC, Nemr K. Determinantes dos distúrbios de voz e a anamnese na clínica vocal. In: Lopes L, Moreti F, Ribeiro LL, Pereira EC, editores. Fundamentos e atualidades em voz clínica. Rio de Janeiro: Thieme Revinter Publicações; 2019. p. 1-8.). Nesse contexto, a terapia em grupo traz benefícios, não necessariamente na qualidade vocal, mas também na propriocepção, uma vez que, durante a realização de exercícios, o paciente adquire a percepção sobre a sua voz individualmente e em conjunto com os outros componentes do grupo(77 Vilela FC, Ferreira LP. Voz na clínica fonoaudiológica: grupo terapêutico como possibilidade. Distúrbios Comun. 2006 ago;18(2):235-43.,88 Diaféria G, Madazio G, Pacheco C, Takaki PB, Behlau M. Clima de grupo na terapia vocal de pacientes com doença de Parkinson. CoDAS. 2017 set;29(4):e20170051. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172017051. PMid:28876371.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/2017...
). Consequentemente, é importante que o fonoaudiólogo faça avaliações que analisem a opinião do paciente em relação à própria voz, ao longo do processo terapêutico.

Sendo assim, foi criado um programa terapêutico baseado no Programa Integral de Reabilitação Vocal (PIRV)(99 Behlau M, Pontes P, Vieira VP, Yamasaki R, Madazio G. Presentation of Comprehensive Vocal Rehabilitation Program for the treatment of behavioral dysphonia. CoDAS. 2013 out;25(5):492-6. http://dx.doi.org/10.1590/S2317-17822013000500015. PMid:24408556.
http://dx.doi.org/10.1590/S2317-17822013...
), para estruturar uma abordagem eclética abrangente, de acordo com a alta demanda de pacientes com perfil etiológico diverso de um ambulatório de voz associado ao serviço de otorrinolaringologia de um hospital do Sistema Único de Saúde (SUS) da cidade de Porto Alegre (RS). Neste cenário, o presente estudo-piloto teve como objetivo identificar os efeitos de um programa de fonoterapia da voz em grupo de pacientes com disfonia, por meio de avaliações perceptivo-auditiva e autopercepção vocal.

MÉTODOS

Participantes

Este estudo foi um ensaio clínico não controlado, com amostra de conveniência, aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - CEP - UFCSPA, nº 1.788.628. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Fizeram parte do estudo 22 adultos com diagnóstico otorrinolaringológico prévio de disfonia, sendo posteriormente alocados em grupos, de acordo com a classificação das disfonias de Behlau et al.(1010 Behlau M, Azevedo R, Pontes P. Voz: o livro do especialista. Rio de Janeiro: Revinter; 2001. Conceito de voz normal e classificação das disfonias; p. 66-86.). A utilização dessa classificação possibilita maior homogeneidade em comparação ao diagnóstico otorrinolaringológico, já que considera o nível de envolvimento do comportamento vocal na base da disfonia, como hábitos parecidos, condições de trabalho semelhantes, entre outros. Destes sujeitos, sete (31,8%) eram homens e 15 (68,2%), mulheres. Após a avaliação médica inicial, os participantes foram encaminhados ao programa de terapia vocal em grupos, localizado no ambulatório de voz integrado ao setor de Otorrinolaringologia da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Foram incluídos indivíduos com mais de 18 anos, que não tinham realizado terapia vocal previamente. Foram excluídos aqueles que não deram seguimento ao tratamento e que apresentaram distúrbios neurológicos, cognitivos e/ou psiquiátricos que inviabilizavam a aplicação do protocolo.

Caracterização de amostra

As características do grupo de participantes do estudo estão especificadas na Tabela 1, com informações obtidas na anamnese. Para o agrupamento, optou-se pela classificação de Behlau et al.(1010 Behlau M, Azevedo R, Pontes P. Voz: o livro do especialista. Rio de Janeiro: Revinter; 2001. Conceito de voz normal e classificação das disfonias; p. 66-86.) (Quadro 1).

Tabela 1
Caracterização da amostra
Quadro 1
Caracterização dos grupos

Procedimentos

Escala de sintomas vocais

Como instrumento de autoavaliação dos sintomas vocais, foi utilizada a Escala de Sintomas Vocais (ESV)(1111 Moreti F, Zambon F, Oliveira G, Behlau M. Cross-cultural adaptation, validation, and cutoff values of the Brazilian version of the voice symptom scale: VoiSS. J Voice. 2014 jul;28(4):458-68. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2013.11.009. PMid:24560004.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2013....
,1212 Deary IJ, Wilson JA, Carding PN, Mackenzie K. VoiSS: a patient-derived voice symptom scale. J Psychosom Res. 2003 mai;54(5):483-9. http://dx.doi.org/10.1016/S0022-3999(02)00469-5. PMid:12726906.
http://dx.doi.org/10.1016/S0022-3999(02)...
), composta por 30 questões. Os participantes responderam ao questionário individualmente, acompanhados apenas pelo avaliador. Cada questão da escala possui cinco opções de resposta, com a seguinte pontuação: nunca = 0 pontos; quase nunca = 1 ponto; às vezes = 2 pontos; quase sempre = 3 pontos e sempre = 4 pontos. Para obter o escore geral, é feita a soma simples das pontuações de todas as questões, tendo como ponto de corte o valor de 16 pontos(1313 Moreti F, Zambon F, Behlau M. Voice symptoms and vocal deviation self-assessment in different types of dysphonia. CoDAS. 2014 jul/ago;26(4):331-3. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/201420130036. PMid:25211694.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/2014...
).

Avaliação perceptivo-auditiva

O instrumento utilizado para a avaliação da qualidade vocal foi a escala GRBAS(1414 Hirano M, Mccormick KR. Clinical examination of voice. Viena: Springer; 1981.), sendo G (grade, grau geral de alteração), R (roughness, rugosidade ou rouquidão), B (breathness, soprosidade), A (asteny, astenia ou fraqueza) e S (strain, tensão). Cada item varia de 0 a 3: 0 corresponde a ausente, 1 a grau leve, 2 a grau moderado e 3 a grau intenso.

Registro e gravação das vozes

Foi solicitado aos participantes que ficassem em pé e realizassem a emissão da vogal /a/ sustentada e um trecho de fala encadeada (contagem de 1 a 10). O registro foi efetuado individualmente, em um ambiente silente e com gravador digital, modelo Sony LCD-PX440, mantendo a distância de cinco centímetros na emissão da vogal sustentada e na emissão da fala automática.

Avaliação dos juízes

Foram selecionados três juízes fonoaudiólogos com título de especialista em voz e experiência clínica de, no mínimo, oito anos na área, que receberam um CD com as gravações numeradas de forma aleatória, sem identificação dos participantes quanto a nome, gênero, idade, patologia e momento da intervenção. Então, os juízes colocavam seu nome no início da folha e escreviam o número da gravação correspondente ao lado da tabela da GRBASI.

Programa terapêutico vocal

O programa terapêutico vocal teve como base o estudo de Behlau et al.(99 Behlau M, Pontes P, Vieira VP, Yamasaki R, Madazio G. Presentation of Comprehensive Vocal Rehabilitation Program for the treatment of behavioral dysphonia. CoDAS. 2013 out;25(5):492-6. http://dx.doi.org/10.1590/S2317-17822013000500015. PMid:24408556.
http://dx.doi.org/10.1590/S2317-17822013...
), em sua proposta do PIRV, tendo como principais fundamentos a orientação dos participantes, a psicodinâmica e o treinamento vocal.

O programa previa iniciar as sessões com a promoção de conhecimento sobre higiene vocal e mudanças na emissão para a produção vocal mais saudável. Para essa finalidade, foram escolhidas abordagens indiretas(1515 Stemple JC, Lee L, D’Amico B, Pickup B. Efficacy of vocal function exercises as a method of improving voice production. J Voice. 1994 set;8(3):271-8. http://dx.doi.org/10.1016/S0892-1997(05)80299-1. PMid:7987430.
http://dx.doi.org/10.1016/S0892-1997(05)...
), utilizando recursos como folhetos informativos, explicação sobre anatomia do sistema fonatório e exibição de vídeos educativos sobre hábitos vocais saudáveis.

Na abordagem direta de voz, foram utilizadas técnicas de respiração, sons facilitadores da emissão e exercícios de trato vocal semiocluído, com o intuito de promover projeção vocal e ajuste glótico (Quadro 2).

Quadro 2
Programa terapêutico

A intervenção foi realizada durante dez semanas, com frequência de uma sessão semanal de trinta minutos; cada técnica foi aplicada com duração de três minutos, conduzida por duas fonoaudiólogas, ambas especialistas na área de voz, que participaram de todas as sessões nos quatro grupos. Após as dez sessões, os participantes foram reavaliados, seguindo os mesmos protocolos.

Os participantes foram orientados a realizar em casa a mesma sequência de cinco exercícios praticados na sessão de terapia, cada um deles durante três minutos, duas vezes ao dia. No início de cada sessão, eram questionados individualmente em relação à realização dos exercícios em casa e se houve dificuldade na sua execução.

Análise estatística

As variáveis qualitativas e quantitativas ordinais foram apresentadas em frequência e percentual e a normalidade dos dados foi verificada com o teste de Shapiro-Wilk. A análise inferencial para comparação dos resultados pré e pós-terapia foi feita com o teste t de Student para amostras pareadas. Para a análise dos achados da escala GRBAS e para a análise individual das questões da ESV, a concordância intra-avaliadores foi mensurada por meio do Coeficiente de Correlação Intraclasse. Foi realizado o teste de Correlação de Postos de Spearman para as escalas ESV e GRBAS, porém, não houve nenhum resultado significativo. O Coeficiente de Correlação Intraclasse foi aplicado para verificar a homogeneidade das avaliações dos juízes em relação à qualidade vocal e apresentou confiabilidade excelente (Tabela 2). Assim sendo, optou-se por analisar o valor mais prevalente entre os juízes ou o valor intermediário, quando as três avaliações divergiram. O nível de significância adotado foi de 5% (p≤0,05) e as análises foram realizadas no programa Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 23.0.

Tabela 2
Avaliação intrajuízes - Coeficiente de correlação intraclasse

RESULTADOS

Escala de sintomas vocais

As médias do valor de grau geral de alteração estiveram acima do valor de corte, tanto pré-terapia, quanto pós-terapia. No entanto, observou-se diferença estatisticamente significativa na comparação dos períodos, indicando que, após a intervenção, obteve-se redução dos sintomas vocais. Nas subescalas, também foram observados valores acima do ponto de corte(1616 Behlau M, Madazio G, Moreti F, Oliveira G, Santos LDMA, Paulinelli BR, et al. Efficiency and cutoff values of self-assessment instruments on the impact of a voice problem. J Voice. 2016 jul;30(4):506.e9-18. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2015.05.022. PMid:26168902.
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) antes e depois da terapia, sendo os valores de corte: 11,5 para o componente de Limitação, 1,5 para o componente Emocional e 6,5 para o componente Físico. Os resultados da avaliação com a ESV podem ser observados na Tabela 3.

Tabela 3
Comparação dos resultados pré e pós-terapia vocal da Escala de Sintomas Vocais com as subescalas

Escala GRBAS

Não foram encontrados resultados significativos na comparação entre pré e pós-tratamento, indicando que não houve mudança na qualidade vocal após a intervenção. Os dados sobre os parâmetros da escala GRBAS de grau geral, rugosidade, soprosidade, astenia e tensão estão descritos na Tabela 4.

Tabela 4
Comparação dos resultados da escala GRBAS pré e pós-intervenção

DISCUSSÃO

Este estudo visou identificar os efeitos de um programa de fonoterapia em grupos de pacientes com disfonia atendidos em ambiente hospitalar SUS nos parâmetros de avaliação perceptivo-auditiva e sintomas vocais autorrelatados.

Com relação aos dados de caracterização dos participantes, a literatura(44 Ribeiro VV, Panhoca I, Dassie-Leite AP, Bagarollo MF. Grupo terapêutico em fonoaudiologia: revisão de literatura. Rev CEFAC. 2012 dez;14(3):544-52. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011005000131.
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) versa sobre a importância do agrupamento de sujeitos de acordo com demandas terapêuticas semelhantes, para que, assim, haja harmonia na troca de experiências entre os participantes. Portanto, buscou-se agrupar os participantes de acordo com a classificação de Behlau et al.(1010 Behlau M, Azevedo R, Pontes P. Voz: o livro do especialista. Rio de Janeiro: Revinter; 2001. Conceito de voz normal e classificação das disfonias; p. 66-86.), a fim de promover maior homogeneidade, apesar dos diferentes diagnósticos otorrinolaringológicos dos sujeitos, visto que o ambulatório de onde eram referenciados é vinculado a um hospital de alta complexidade.

Em relação à Escala de Sintomas Vocais, foram observadas diferenças estatisticamente significativas no grau geral de alteração, sugerindo que os participantes tiveram modificações na sua percepção de situações cotidianas em relação ao uso da voz. A literatura sugere que a terapia em grupo pode ser eficaz para reduzir fatores de risco vocal(1717 Tasca GA, Francis K, Balfour L. Group psychotherapy levels of interventions: a clinical process commentary. Psychotherapy. 2014 mar;51(1):25-9. http://dx.doi.org/10.1037/a0032520. PMid:24059738.
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), podendo generalizar os conhecimentos adquiridos durante sua realização para as situações de trabalho e vida social.

Houve, também, mudança significativa na subescala de Limitação, o que sugere melhora na funcionalidade e se relaciona com a definição de dificuldades comunicativas percebidas por Deary et al.(1212 Deary IJ, Wilson JA, Carding PN, Mackenzie K. VoiSS: a patient-derived voice symptom scale. J Psychosom Res. 2003 mai;54(5):483-9. http://dx.doi.org/10.1016/S0022-3999(02)00469-5. PMid:12726906.
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) em sua proposição da escala ESV, justamente por serem queixas frequentes na clínica de voz e situações fundamentais nas relações sociais dos pacientes. A subescala Emocional apresentou mudanças, indicando benefícios psicológicos da terapia. Estudo(1717 Tasca GA, Francis K, Balfour L. Group psychotherapy levels of interventions: a clinical process commentary. Psychotherapy. 2014 mar;51(1):25-9. http://dx.doi.org/10.1037/a0032520. PMid:24059738.
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) sugere que a participação na terapia em grupo pode reforçar a autorreflexão e aumentar a sensação de segurança. Já o componente Físico não evidenciou diferença estatisticamente significativa, embora tenha apresentado diminuição na média após a terapia.

Na comparação de resultados antes e pós-terapia da GRBAS, não foi percebida diferença estatisticamente significativa para nenhum dos parâmetros da escala. De acordo com Behlau et al., os dados obtidos nos instrumentos de autopercepção diferem das avaliações objetivas e não apresentam correlação direta entre o autorrelato e a avaliação perceptivo auditiva(1313 Moreti F, Zambon F, Behlau M. Voice symptoms and vocal deviation self-assessment in different types of dysphonia. CoDAS. 2014 jul/ago;26(4):331-3. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/201420130036. PMid:25211694.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/2014...
,1616 Behlau M, Madazio G, Moreti F, Oliveira G, Santos LDMA, Paulinelli BR, et al. Efficiency and cutoff values of self-assessment instruments on the impact of a voice problem. J Voice. 2016 jul;30(4):506.e9-18. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2015.05.022. PMid:26168902.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2015....
,1818 Moreti F, Zambon F, Oliveira G, Behlau M. Equivalência cultural da versão brasileira da Voice Symptom Scale - VoiSS. J Soc Bras Fonoaudiol. 2011 dez;23(4):398-400. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912011000400018.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912011...
). De acordo com resultados de um estudo(1919 Oliveira IB, Fernandez EDS, Gargantini EP. Disfonias orgânicas por neoplasias: análise de diagramas de desvio fonatório. Rev CEFAC. 2015 mar/abr;17(2):364-73. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620152714.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620152...
), os participantes do grupo com disfonia orgânica obtiveram pontuação superior na escala GRBAS em relação ao grupo controle, indicando que esse tipo de disfonia gera maior impacto no ouvinte, fato que pode ter contribuído para manter escores altos dentre esse grupo, mesmo apresentando alguma possível melhora no período pré e pós-terapia, uma vez que os áudios dos participantes estavam organizados randomicamente e sem identificação, durante a análise dos juízes.

Foi possível perceber que, do ponto de vista dos participantes, houve diminuição no autorrelato de sintomas vocais, sendo percebidas mudanças nos escores de grau geral, Limitação e Emocional, demonstrando que o trabalho em grupo promoveu mudanças positivas na sua visão em relação à própria voz. Os dados sugerem que o grupo pode ser espaço para a discussão de práticas em saúde, com caráter complementar à clínica fonoaudiológica individual, podendo, também, reduzir os longos períodos em lista de espera.

Os resultados do presente estudo-piloto apontam que a realização de pesquisas adicionais com maior rigor metodológico e maior homogeneidade em relação ao tipo de disfonia podem trazer resultados mais robustos a respeito dos efeitos do programa terapêutico em grupo.

CONCLUSÃO

O programa de fonoterapia teve efeitos estatisticamente significativos em relação aos sintomas vocais autorrelatados no nível geral de alteração e nas subescalas de Limitação e Emocional, sinalizando, portanto, um caminho promissor de abordagem eclética para a terapia vocal em grupo.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ).

  • Trabalho realizado na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA - Porto Alegre (RS), Brasil, em parceria com a Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre - ISCMPA - Porto Alegre (RS), Brasil.
  • Financiamento: Nada a declarar.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    07 Jun 2022
  • Aceito
    15 Nov 2022
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