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Percepção de fadiga em professores universitários de acordo com o nível de conhecimento sobre saúde e higiene vocal

RESUMO

Objetivo

Analisar a percepção de fadiga em professores universitários, de acordo com o nível de conhecimento sobre saúde e higiene vocal.

Métodos

Estudo observacional, transversal e analítico. Participaram 235 professores universitários, divididos em: Grupo 1 (G1) - 201 professores universitários, com maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal; Grupo 2 (G2) - 34 professores universitários, com menor conhecimento sobre saúde e higiene vocal. Os participantes responderam ao instrumento Índice de Fadiga Vocal (IFV). Os dados foram analisados utilizando-se o teste de Mann-Whitney (p<0,05).

Resultados

Professores universitários do G1 apresentaram percepção de fadiga significativamente maior que os professores universitários do G2, nos domínios fadiga e restrição vocal (p=0,010) e recuperação com repouso vocal (p=0,039).

Conclusão

Professores universitários com maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal apresentam maior percepção da fadiga vocal.

Palavras-chave:
Avaliação em saúde; Fadiga; Docentes; Saúde do trabalhador; Voz

ABSTRACT

Purpose

To analyze the perception of fatigue in university professors, according to their level of knowledge of vocal health and hygiene.

Methods

Observational and cross-sectional study. The study counted with 235 university professors, divided into two groups: Group 1 (G1) - 201 professors with more knowledge of vocal health and hygiene; Group 2 (G2) - 34 professors with less knowledge of vocal health and hygiene. The participants answered to the Vocal Fatigue Index (VFI). The data were analyzed using the Mann-Whitney test (p<0.05).

Results

The G1 presented significantly higher fatigue perception than G2 in the factor of tiredness of voice and avoidance of voice use (p = 0.010) and improvement of symptoms with rest (p = 0.039).

Conclusion

Professors with more knowledge of vocal health and hygiene have higher perception of vocal fatigue.

Keywords:
Health evaluation; Fatigue; Faculty; Occupational health; Voice

INTRODUÇÃO

Os professores universitários são profissionais da voz da classe dos docentes e possuem risco de agravos à voz, decorrentes de condições ambientais e organizacionais de trabalho(11 Anhaia TC, klahr PS, Cassol M. Associação entre o tempo de magistério e a autoavaliação vocal em professores universitários: estudo observacional transversal. Rev CEFAC. 2015;17(1):52-7. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153314.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153...
,22 Aparecida E, Servilha M, Manchado P, Cat U, Dunlop JB. Condições de trabalho, saúde e voz em professores universitários. Rev Ciênc Méd. 2008;17(1):21-31.). Estes profissionais têm sido pouco analisados nos estudos da área de voz(33 Korn GP, Pontes AAL, Abranches D, Pontes PAL. Hoarseness and risk factors in university teachers. J Voice. 2015;29(4):518-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2014.09.008. PMid:25795353.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2014....
) e, devido a isso, há pouca evidência sobre o nível de risco vocal da classe docente.

A escassa literatura disponível sobre voz de professores universitários tem mostrado que as variáveis relacionadas à organização do trabalho, ao local de trabalho, atendimento vocal, hábitos pessoais e estilo de vida são consideradas fatores de risco para o desenvolvimento de sintomas vocais, mesmo que em menor probabilidade que nas demais classes docentes(44 Korn GP, Pontes AAL, Abranches D, Pontes PAL. Vocal tract discomfort and risk factors in university teachers. J Voice. 2016;30(4):507-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2015.06.001. PMid:26279322.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2015....
). Um dos sintomas apresentados por professores universitários é a fadiga vocal(11 Anhaia TC, klahr PS, Cassol M. Associação entre o tempo de magistério e a autoavaliação vocal em professores universitários: estudo observacional transversal. Rev CEFAC. 2015;17(1):52-7. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153314.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153...
,22 Aparecida E, Servilha M, Manchado P, Cat U, Dunlop JB. Condições de trabalho, saúde e voz em professores universitários. Rev Ciênc Méd. 2008;17(1):21-31.,55 Servilha EAM, Arbach MDP. Queixas de saúde em professores universitários e sua relação com fatores de risco presentes na organização do trabalho. Distúrb Comun. 2011;23(2):181-91.,66 Servilha E, Costa A. Conhecimento vocal ea importância da voz como recurso pedagógico na perspectiva de professores universitários. Rev CEFAC. 2015;17(1):13-26. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201514813.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
).

Apesar da falta de consenso sobre a etiologia da fadiga vocal, acredita-se que ocorra devido ao suprimento insuficiente de oxigênio para a demanda energética necessária ao desempenho de determinada tarefa vocal, o que causaria um decréscimo neste desempenho, ao longo do tempo. Isso poderia ocorrer por ineficiência neuromuscular e/ou deficit de recuperação, após a tarefa(77 Nanjundeswaran C, VanSwearingen J, Abbott KV. Metabolic mechanisms of vocal fatigue. J Voice. 2017;31(3):378-11. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016.09.014. PMid:27777059.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016....
). Além dos fatores supracitados, relacionados à atividade profissional, na classe docente a percepção de fadiga vocal pode ser associada, principalmente, à carga vocal demandada pelas aulas expositivas(22 Aparecida E, Servilha M, Manchado P, Cat U, Dunlop JB. Condições de trabalho, saúde e voz em professores universitários. Rev Ciênc Méd. 2008;17(1):21-31.).

Por serem profissionais da voz e se utilizarem dela como principal ferramenta no processo de ensino-aprendizagem(88 Ilomäki I, Kankare E, Tyrmi J, Kleemola L, Geneid A. Vocal fatigue symptoms and laryngeal status in relation to vocal activity limitation and participation restriction. J Voice. 2017;31(2):248-10. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016.07.025. PMid:27544637.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016....
), é fundamental que os professores universitários apresentem um bom conhecimento sobre saúde e higiene vocal(99 Servilha E, Costa A. Knowledge about voice and the importance of voice as an educational resource in the perspective of university professors. Rev CEFAC. 2015;17(1):13-26. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201514813.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
). Neste sentido, estudo apontou que essa classe docente possui conhecimento sobre saúde e higiene vocal, assim como de recursos de aperfeiçoamento vocal e de estratégias para manutenção da atenção dos alunos em sala de aula(99 Servilha E, Costa A. Knowledge about voice and the importance of voice as an educational resource in the perspective of university professors. Rev CEFAC. 2015;17(1):13-26. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201514813.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
). Sabe-se que o conhecimento vocal é essencial para a manutenção de um comportamento vocal adequado e que a ausência deste conhecimento pode ser um fator de risco para o desenvolvimento de sintomas, como a fadiga vocal, além de uma das etiologias dos distúrbios vocais comportamentais(1010 Behlau M, Zambon F, Moreti F, Oliveira G, Barros Couto E Jr. Voice self-assessment protocols: Different trends among organic and behavioral dysphonias. J Voice. 2017;31(1):112-27. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016.03.014. PMid:27210475.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016....
).

Não foram encontrados estudos que tenham analisado se o conhecimento sobre saúde e higiene vocal pode influenciar na presença de fadiga em professores universitários. Porém, com base nas informações supracitadas, a hipótese inicial de pesquisa do presente estudo era de que professores com menor conhecimento sobre saúde e higiene vocal apresentassem maior percepção de fadiga vocal. Acredita-se que associar os dados sobre conhecimento vocal com a percepção de fadiga vocal em professores universitários possa auxiliar na compreensão dos impactos que o conhecimento sobre saúde e higiene vocal pode gerar no desenvolvimento deste tipo de sintoma, nessa população, a partir de evidências científicas.

O objetivo do presente estudo foi analisar a percepção de fadiga em professores universitários, de acordo com o nível de conhecimento sobre saúde e higiene vocal.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo observacional, transversal e analítico. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Centro-Oeste, sob o número 1.639.096.

O recrutamento da amostra foi por conveniência, realizado online, por rede social e por e-mail. Os contatos foram obtidos nas secretarias e sites de instituições de ensino superior. Os e-mails das secretarias de departamentos ou coordenadores dos cursos foram obtidos nos sites das instituições. Em seguida, os autores enviaram o e-mail de divulgação da pesquisa, com o link para preenchimento, tendo solicitado auxílio no envio do e-mail para os professores do departamento.

Foram considerados como critérios de inclusão: ser professor ou professora de ensino superior. Foram considerados critérios de exclusão: não assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE); estar afastado das atividades docentes por problemas de quaisquer naturezas; referir problemas neurológicos, cirurgia de cabeça e pescoço, com sequela laríngea/vocal e/ou histórico de disfonia orgânica; terapia e/ou treinamento/condicionamento vocal. Para a seleção da amostra, os voluntários responderam a um questionário amostral, por meio da plataforma Survey Monkey. O questionário foi elaborado pelos pesquisadores e buscou investigar alguns aspectos sociodemográficos, ocupacionais e de saúde geral e vocal, relacionados aos critérios de seleção. Nos participantes incluídos, alguns dados do questionário amostral foram utilizados para caracterizar a amostra.

Foram selecionados 235 professores universitários, 103 do sexo masculino e 132 do sexo feminino, com média de idade de 40 anos e 5 meses, de 39 instituições públicas e privadas do Brasil. Do total, 88 referiram presença de queixa vocal e 147, ausência desta ocorrência. Os professores universitários foram divididos em dois grupos, em função do conhecimento sobre saúde e higiene vocal. Para isso, responderam ao Questionário de Saúde e Higiene Vocal (QSHV)(1111 Moreti FTG. Questionário de Saúde e Higiene Vocal – QSHV: desenvolvimento, validação e valor de corte. [tese]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2016. 103 p.), instrumento que contempla 31 fatores, subdivididos em positivos, negativos e neutros para a saúde da voz. O cálculo foi feito por somatória simples e utilizou-se um valor de corte de 23 pontos(1111 Moreti FTG. Questionário de Saúde e Higiene Vocal – QSHV: desenvolvimento, validação e valor de corte. [tese]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2016. 103 p.). Desta forma, os participantes foram divididos em dois grupos: Grupo 1 (G1) - 201 professores universitários com maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal, 122 do sexo feminino e 79 do sexo masculino, com média de idade de 40,34±9,67 anos; Grupo 2 (G2) - 34 professores universitários com menor conhecimento sobre saúde e higiene vocal, dez do sexo feminino e 24 do sexo masculino, com média de idade de 41,35±9,82 anos.

Após a seleção todos os participantes responderam ao instrumento Índice de Fadiga Vocal (IFV)(1212 Zambon F, Moreti F, Nanjundeswaran C, Behlau M. Equivalência cultural da versão brasileira do Vocal Fatigue Index – VFI. CoDAS. 2017;29(2):1-6. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172015261. PMid:28300936.
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/2017...
). O IFV(1212 Zambon F, Moreti F, Nanjundeswaran C, Behlau M. Equivalência cultural da versão brasileira do Vocal Fatigue Index – VFI. CoDAS. 2017;29(2):1-6. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172015261. PMid:28300936.
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) é um instrumento de autoavaliação de uma série de sintomas que caracterizam a fadiga vocal. Contém 19 itens, subdivididos em três fatores: fadiga e restrição vocal, desconforto físico associado à voz e recuperação dos sintomas com repouso. Os participantes responderam individualmente às questões em uma escala de Likert de 5 graus, em que 0 (zero) indicava “nunca” e 4 indicava “sempre”. O cálculo de cada fator foi feito por somatória simples. Para os domínios fadiga e restrição vocal e desconforto físico associado à voz, quanto maior o escore, maior é a percepção de fadiga vocal. Já para o fator melhora com repouso, quanto maior o escore, maior é a percepção de recuperação da fadiga vocal com repouso.

Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva e inferencial. A distribuição dos dados quantitativos foi analisada com o teste Shapiro-Wilk e todos mostraram distribuição não normal. Desta forma, os escores obtidos no instrumento de autoavaliação foram comparados em função do grupo de participantes, utilizando-se o teste de Mann-Whitney. A associação entre a variável qualitativa nominal e os grupos foi realizada com o teste Exato de Fisher. Foi adotado um nível de significância de 5% (p<0,05) para as análises inferenciais. Utilizou-se o software Statistica 13.0 (Stat Soft Inc., Tulsa, Oklahoma, USA).

RESULTADOS

Os grupos estudados foram homogêneos quanto a carga horária semanal em sala de aula e ao tempo de profissão docente (Tabela 1). Porém, com relação à presença de queixa vocal (Tabela 2), ambos os grupos apresentaram maior frequência de participantes sem queixa vocal, com frequência significativamente maior no G2 (p=0,034).

Tabela 1
Análise das variáveis ocupacionais quantitativas, em função do grupo, em professores universitários
Tabela 2
Análise da variável ocupacional qualitativa, em função do grupo, em professores universitários

Os professores universitários do G1 apresentaram percepção de fadiga significativamente maior que os do G2 nos domínios fadiga e restrição vocal (p=0,010) e recuperação com repouso vocal (p=0,039) (Tabela 3).

Tabela 3
Análise dos domínios do Índice de Fadiga Vocal, em função do grupo, em professores universitários

DISCUSSÃO

Não foram encontrados estudos que tenham comparado a classe de professores universitários aos professores dos demais níveis de ensino. Apesar disso, estudos com essa população inferiram que professores universitários podem ser uma classe docente diferenciada, porque, muitas vezes, apresentam melhores condições ambientais e organizacionais de trabalho(11 Anhaia TC, klahr PS, Cassol M. Associação entre o tempo de magistério e a autoavaliação vocal em professores universitários: estudo observacional transversal. Rev CEFAC. 2015;17(1):52-7. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153314.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153...
,22 Aparecida E, Servilha M, Manchado P, Cat U, Dunlop JB. Condições de trabalho, saúde e voz em professores universitários. Rev Ciênc Méd. 2008;17(1):21-31.), além de maior conhecimento sobre saúde e higiene vocais(99 Servilha E, Costa A. Knowledge about voice and the importance of voice as an educational resource in the perspective of university professors. Rev CEFAC. 2015;17(1):13-26. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201514813.
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) que as demais classes docentes.

Sabe-se que a presença de conhecimentos sobre saúde e higiene vocais é um dos aspectos importantes para a execução de um comportamento vocal adequado, sendo que a ausência destes conhecimentos é um fator de risco para o desenvolvimento de sintomas como o de fadiga vocal. Os docentes universitários são considerados profissionais com acesso às informações sobre saúde e higiene vocais(99 Servilha E, Costa A. Knowledge about voice and the importance of voice as an educational resource in the perspective of university professors. Rev CEFAC. 2015;17(1):13-26. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201514813.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
), comumente possuem melhores condições de trabalho e menor carga horária de uso vocal em atividades didáticas que outras classes docentes(11 Anhaia TC, klahr PS, Cassol M. Associação entre o tempo de magistério e a autoavaliação vocal em professores universitários: estudo observacional transversal. Rev CEFAC. 2015;17(1):52-7. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153314.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153...
,22 Aparecida E, Servilha M, Manchado P, Cat U, Dunlop JB. Condições de trabalho, saúde e voz em professores universitários. Rev Ciênc Méd. 2008;17(1):21-31.), porém, a literatura apontou que essa população apresenta, frequentemente, percepção de fadiga vocal. Desta forma, torna-se importante investigar se o conhecimento vocal influencia na percepção da fadiga vocal em professores universitários.

A carga vocal é um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento de sintomas como o de fadiga vocal(1313 Hunter EJ, Titze IR. Quantifying vocal fatigue recovery: dynamic vocal recovery trajectories after a vocal loading exercise. Ann Otol Rhinol Laryngol. 2009;118(6):449-60. http://dx.doi.org/10.1177/000348940911800608. PMid:19663377.
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). Assim, para que os grupos fossem comparáveis, foram controlados alguns fatores que poderiam influenciar a carga vocal. Observou-se, então, que os grupos foram homogêneos quanto à carga horária semanal em sala de aula e o tempo de profissão docente (Tabela 1). Por outro lado, apesar de ambos os grupos apresentarem maior frequência absoluta de participantes sem queixas vocais, na comparação entre os grupos, o G2 apresentou frequência significativamente maior que o G1 (Tabela 2).

No presente estudo, a análise estatística mostrou que professores com maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal apresentaram, consideravelmente, maior percepção de fadiga nos domínios fadiga e restrição vocal e recuperação com repouso vocal, que os professores com menor conhecimento sobre saúde e higiene vocal (Tabela 3).

A falta de conhecimento sobre saúde e higiene vocal é considerada como uma das etiologias da disfonia comportamental(1010 Behlau M, Zambon F, Moreti F, Oliveira G, Barros Couto E Jr. Voice self-assessment protocols: Different trends among organic and behavioral dysphonias. J Voice. 2017;31(1):112-27. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016.03.014. PMid:27210475.
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). Porém, o contrário não é necessariamente verdadeiro, visto que ter conhecimento sobre saúde e higiene vocal não significa que os indivíduos desenvolvam essas práticas vocais saudáveis e que possuam um bom nível de autorregulação do comportamento vocal(1414 Almeida AA, Behlau M. Relations between self-regulation behavior and vocal symptoms. J Voice. 2017;31(4):455-61. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016.10.010. PMid:27838284.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016....
), principalmente ocupacional.

No presente estudo, os dados mostraram que professores com maior conhecimento sobre saúde vocal apresentaram maior percepção de fadiga vocal. A hipótese inicial do presente estudo era de que professores com menor conhecimento sobre saúde e higiene vocal, apresentassem maior percepção de fadiga vocal. Porém, esta hipótese foi rejeitada após a análise de dados. A partir dos resultados, foram levantadas duas hipóteses: professores com maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal têm melhor percepção de fadiga, ou, a presença de fadiga leva os professores a buscarem conhecimento sobre saúde e higiene vocal. O presente estudo não teve a finalidade de estabelecer causalidade, porém, torna-se necessário refletir sobre isso para compreender os resultados. Ademais, é importante ressaltar que professores com maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal também apresentaram maior frequência de percepção de queixas vocais.

A autopercepção é um parâmetro subjetivo que não pode ser predito com base nas características clínicas do paciente, porém, fornece informações importantes da percepção do paciente sobre a voz, bem como da dimensão dos quadros vocais em sua vida(1515 Behrman A, Sulica L, He T. Factors predicting patient perception of dysphonia caused by benign vocal fold lesions. Laryngoscope. 2004;114(10):1693-700. http://dx.doi.org/10.1097/00005537-200410000-00004. PMid:15454756.
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). A literatura apontou que indivíduos com distúrbios vocais comumente não têm boa autopercepção vocal(1515 Behrman A, Sulica L, He T. Factors predicting patient perception of dysphonia caused by benign vocal fold lesions. Laryngoscope. 2004;114(10):1693-700. http://dx.doi.org/10.1097/00005537-200410000-00004. PMid:15454756.
http://dx.doi.org/10.1097/00005537-20041...
), o que confirma a questão referente a maior percepção de queixas vocais. Porém, não foram encontrados estudos que tenham relacionado a influência do conhecimento sobre saúde e higiene vocal na autopercepção.

Apesar de não utilizarem instrumentos específicos para mensuração da percepção de fadiga vocal, estudos com professores universitários mostraram alta ocorrência de sintomas associados à fadiga vocal nessa população, principalmente relacionados à demanda vocal(11 Anhaia TC, klahr PS, Cassol M. Associação entre o tempo de magistério e a autoavaliação vocal em professores universitários: estudo observacional transversal. Rev CEFAC. 2015;17(1):52-7. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153314.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620153...
,22 Aparecida E, Servilha M, Manchado P, Cat U, Dunlop JB. Condições de trabalho, saúde e voz em professores universitários. Rev Ciênc Méd. 2008;17(1):21-31.,55 Servilha EAM, Arbach MDP. Queixas de saúde em professores universitários e sua relação com fatores de risco presentes na organização do trabalho. Distúrb Comun. 2011;23(2):181-91.,66 Servilha E, Costa A. Conhecimento vocal ea importância da voz como recurso pedagógico na perspectiva de professores universitários. Rev CEFAC. 2015;17(1):13-26. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201514813.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
). Infere-se que o fato de apresentarem maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal pode fazer com que esses professores tenham maior percepção sobre as situações que se relacionam à voz, como a presença de fadiga vocal e a restrição no uso vocal por ela gerada. Os professores também podem perceber melhor as diferenças no quadro vocal, resultantes de práticas como repouso vocal após o uso vocal. Considerando-se que a percepção de fadiga vocal está relacionada ao aumento do esforço e à diminuição progressiva da capacidade fonatória(1616 McCabe DJ, Titze IR. Chant therapy for treating vocal fatigue among public school teachers. Am J Speech Lang Pathol. 2002;11(4):356-69. http://dx.doi.org/10.1044/1058-0360(2002/040).
http://dx.doi.org/10.1044/1058-0360(2002...
), indivíduos que demandam do uso vocal ocupacional e com melhor autopercepção podem ficar mais atentos às restrições no uso vocal que ocorrem quando apresentam episódios de fadiga vocal, sejam restrições que acometam os âmbitos ocupacional, emocional ou psicossocial(1717 Paolillo NP, Pantaleo G. Development and validation of the Voice Fatigue Handicap Questionnaire (VFHQ): clinical, psychometric, and psychosocial facets. J Voice. 2015;29(1):91-100. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2014.05.010. PMid:25261955.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2014....
). Outro fator que confirma essa inferência é que esse grupo também percebeu maior melhora da fadiga com o repouso vocal, prática cujo efeito é comprovado pela literatura(1212 Zambon F, Moreti F, Nanjundeswaran C, Behlau M. Equivalência cultural da versão brasileira do Vocal Fatigue Index – VFI. CoDAS. 2017;29(2):1-6. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172015261. PMid:28300936.
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).

Os principais fatores que explicam a fadiga vocal, de acordo com a literatura, são a ineficiência neuromuscular, recrutamento de um número maior de músculos, ou um padrão muscular inadequado de fonação, que acarretam o aumento da demanda energética, e/ou o deficit de recuperação após a tarefa vocal, falta de treinamento cardiovascular, que acarreta o aumento do tempo de recuperação cardiovascular e da homeostase após o uso vocal(77 Nanjundeswaran C, VanSwearingen J, Abbott KV. Metabolic mechanisms of vocal fatigue. J Voice. 2017;31(3):378-11. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016.09.014. PMid:27777059.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016....
). Neste sentido, apesar do conhecimento sobre saúde e higiene vocal ser importante para a execução do comportamento vocal adequado, ao tratar-se de condicionamento muscular, o fato de apresentar conhecimento sobre o comportamento vocal adequado pode ser suficiente para a melhor percepção dos quadros de fadiga, bem como das suas consequências. Por outro lado, no presente estudo, os dados mostraram que ter conhecimento sobre saúde e higiene vocal parece não ser suficiente para evitar os episódios de percepção de fadiga vocal. Acredita-se que isso tenha ocorrido porque professores têm alta carga de uso vocal demandada pelas aulas expositivas e, nestes casos, orientações sobre saúde e higiene vocal são estratégias indiretas, que devem ser associadas às estratégias diretas, como o treinamento vocal e cardiovascular, para adequar o condicionamento para a demanda vocal, objetivando retardar a sensação de fadiga vocal. Infere-se que tais estratégias devam ser associadas para um melhor desempenho vocal e menor percepção de fadiga. Porém, são necessários outros estudos para investigar se a associação entre as duas estratégias seria mais favorável para adequar o comportamento e a eficiência neuromuscular durante a realização de tarefas vocais, bem como a recuperação após a execução das tarefas(77 Nanjundeswaran C, VanSwearingen J, Abbott KV. Metabolic mechanisms of vocal fatigue. J Voice. 2017;31(3):378-11. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvoice.2016.09.014. PMid:27777059.
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), em professores universitários.

Por outro lado, a busca de conhecimentos sobre saúde e higiene vocal pode ser compensatória à presença de queixas que os indivíduos têm em relação à voz. Embora o presente estudo não tenha tido o objetivo de estabelecer relação de causa e efeito, levanta-se a hipótese que haja a possibilidade de que os professores que percebem a fadiga vocal tenham buscado por informações sobre saúde e higiene, na tentativa de minimizar este sintoma. Porém, o conhecimento, por si só, parece não ter sido suficiente para minimizar a percepção da fadiga vocal.

Sendo assim, o presente estudo se propõe a iniciar uma discussão sobre o papel do conhecimento sobre saúde e higiene vocal na percepção da fadiga. Porém, são necessários estudos longitudinais, com delineamento adequado para estabelecimento de relação causal, a fim de compreender melhor a percepção da fadiga vocal entre professores universitários, em função do conhecimento sobre saúde e higiene vocal, do treinamento vocal e/ou cardiovascular e da carga vocal. Além disso, sugerem-se novas pesquisas com o controle de variáveis referentes às atividades extras que o professor exerça com o uso da voz, tanto profissionais quanto de hobby/lazer. Tais estudos poderão oferecer mais elementos para a compreensão do tema.

CONCLUSÃO

Professores universitários com maior conhecimento sobre saúde e higiene vocal apresentam maior percepção da fadiga vocal, nos domínios fadiga e restrição vocal e recuperação com repouso vocal.

  • Trabalho realizado na Universidade Estadual do Centro-Oeste – UNICENTRO – Irati (PR), Brasil.
  • Financiamento: Bolsa concedida pela Fundação Araucária de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Estado do Paraná (FA) - (24/2017).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Out 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    22 Mar 2019
  • Aceito
    07 Ago 2019
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