RESUMO
A Eletroestimulação tem mostrado potencial na melhora do fluxo salivar em pacientes com câncer de cabeça e pescoço, mas seu impacto na voz pós-radioterapia ainda não é totalmente compreendido. Esta é uma série de casos, com três homens e uma mulher com média de idade de 58 anos e 2.5 meses, submetidos à quimioterapia e radioterapia para tumor de orofaringe, com queixa vocal e de hipossalivação. Todos os sujeitos foram submetidos à nasofibrolaringoscopia, registro das vozes e medida do fluxo salivar no início e no final do tratamento. Foram realizadas análises vocais perceptivo-auditiva e acústica. O objetivo foi comparar os resultados do volume de saliva e de medidas vocais antes e após a eletroestimulação. Após a intervenção, houve aumento variável no fluxo salivar em todos os pacientes, com média de 0.66 ml/min, porém, não foram observadas diferenças marcantes na avaliação perceptivo-auditiva da voz, por serem muito sutis. No entanto, foram registradas mudanças na análise vocal acústica de fonte glótica (mudanças na frequência fundamental, com aumento mais evidente, e redução em alguns parâmetros) e espectrográfica na Espectrografia de Banda Larga. Observou-se melhora, com redução da antirressonância, em baixas e altas frequências. Na Espectrografia de Banda Estreita, houve piora, com redução da definição e regularidade dos harmônicos nas frequências baixas e médias e em todo o espectrograma, e com redução do número de harmônicos nas frequências médias e em todo o espectrograma. Registrou-se melhora com redução de ruído (geral) e de sub-harmônicos em altas frequências. A eletroestimulação demonstrou induzir aumento variável no fluxo salivar com algumas melhoras vocais acústicas, enquanto a avaliação vocal perceptivo-auditiva não revelou diferenças entre os momentos pré e pós-intervenção. Apesar dos resultados promissores, estudos com amostras maiores e maior controle de variáveis intervenientes são cruciais para estabelecer uma relação causal entre a saliva induzida por eletroestimulação e a melhora da qualidade vocal em pacientes submetidos à radioterapia.
Descritores:
Estimulação elétrica nervosa transcutânea; Neoplasias de cabeça e pescoço; Xerostomia; Radioterapia; Voz
ABSTRACT
Electrical stimulation has shown potential in improving salivary flow in patients with head and neck cancer, but its impact on post-radiotherapy voice is not yet fully understood. This is a case series involving three men and one woman with an average age of 58 years and 2.5 months, who underwent chemotherapy and radiotherapy for oropharyngeal tumors, presenting with vocal complaints and hyposalivation. All subjects underwent nasofibrolaryngoscopy, voice recording, and salivary flow measurement at the beginning and end of treatment. Perceptual-auditory and acoustic voice analyses were performed. The aim was to compare the results of salivary volume and vocal measures before and after electrical stimulation. After the intervention, there was a variable increase in salivary flow in all patients, with an average of 0.66 ml/min; however, no marked differences were observed in the perceptual-auditory voice evaluation, as they were very subtle. Nevertheless, changes were recorded in the acoustic analysis of glottal source (changes in fundamental frequency, with a more evident increase, and reduction in some parameters) and in the spectrographic analysis using Wide Band Spectrography. Improvement was observed, with a reduction in antiresonance at low and high frequencies. In Narrow Band Spectrography, there was a worsening, with a reduction in the definition and regularity of harmonics at low and mid frequencies and across the entire spectrogram, as well as a reduction in the number of harmonics at mid frequencies and across the entire spectrogram. Improvement was recorded with a reduction in noise (general) and sub-harmonics at high frequencies. Electrical stimulation demonstrated the ability to induce a variable increase in salivary flow with some acoustic vocal improvements, while the perceptual-auditory voice evaluation did not reveal differences between pre- and post-intervention moments. Despite the promising results, studies with larger samples and greater control of intervening variables are crucial to establish a causal relationship between saliva induced by electrical stimulation and the improvement of vocal quality in patients undergoing radiotherapy.
Keyword:
Transcutaneous electric nerve stimulation; Head and neck neoplasms; Xerostomia; Radiotherapy; Voice
INTRODUÇÃO
O câncer de cabeça e pescoço (CaCP) afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Diante do diagnóstico, os pacientes podem submeter-se a tratamentos exclusivos ou combinados, incluindo cirurgia, quimioterapia (QT) e/ou radioterapia (RT)(1). Devido às funções desempenhadas nessa região, os pacientes com CaCP podem apresentar desvios na deglutição, mastigação, respiração, fala e voz(2). A severidade desses desvios depende da localização e do tratamento do CaCP, impactando a qualidade de vida do indivíduo em graus variados(2).
A comunicação, por meio da sinergia entre a fala e a voz, é uma das mais poderosas ferramentas de interação social e desempenha um papel importante no cotidiano do paciente e na manutenção de suas atividades de vida diárias(3). Os tumores da cavidade oral e orofaringe, quando envolvem cirurgia ou irradiação da musculatura supra-hióidea, podem comprometer o movimento superior da laringe, ocasionando rotação externa da articulação cricotireóidea. Esses movimentos distorcem os vetores de força, tensionando a musculatura intrínseca da laringe e aumentando, assim, a frequência fundamental (fo)(3).
Além disso, a radiação altera a morfologia da musculatura esquelética, limitando sua capacidade de contratilidade e interferindo diretamente na mobilidade muscular devido à fibrose e à rigidez(4). Na voz, isso significa aumento do pitch, redução da loudness, aumento significativo da tensão, rugosidade e aspereza(5). Como fator exacerbador para essas características, tem-se a hipossalivação, presente em grande parte dos casos tratados por meio da radiação. Essa condição ocorre a partir de 26-39 Gy (Gray), quando as glândulas salivares (maiores e menores) se encontram no campo de radiação(4).
A saliva é essencial para a lubrificação da cavidade oral, do trato digestivo e da laringe(4). Existem evidências de que pequenas glândulas salivares estão dispersas por toda a mucosa oral, do trato digestivo e ádito laríngeo(4). O fluxo salivar reduzido pode causar desequilíbrio oral, manifestado pela percepção alterada do paladar, aumento da incidência de cáries e dificuldades de mastigação, deglutição e produção vocal, devido à lubrificação insuficiente do trato fonatório(5,6). A hipossalivação contribui para o ressecamento das pregas vocais, eritema e edema laríngeo(7). Além disso, são identificadas mudanças em parâmetros vocais, sugerindo diferença de massa, tamanho e tensão entre as pregas vocais(7).
A xerostomia diminui a umidade da mucosa do trato vocal, causando a desidratação e a secura das estruturas fonatórias, que comprometem o mecanismo de vibração das pregas vocais, resultando na deterioração de sua qualidade e periodicidade. Isso se manifesta através de características vocais, como rouquidão, soprosidade, crepitação, instabilidade de fo e fadiga vocal(5). A vibração da mucosa das pregas vocais está intimamente relacionada à viscosidade da saliva secretada pelas glândulas do ventrículo laríngeo, o que pode implicar maior ou menor esforço necessário para a produção da voz(5,6). Essa alteração na viscosidade impacta diretamente o movimento das pregas vocais, reduzindo sua amplitude e aumentando o tempo de contato durante a fonação. Além disso, as propriedades biomecânicas das pregas vocais e as características de ressonância das vias aéreas superiores também são modificadas, resultando em alterações na qualidade e na produção da voz(8).
Os tratamentos da xerostomia, geralmente paliativos, incluem agentes tópicos, como lascas de gelo e substitutos de saliva, aumento da ingestão de água, aplicação de protetor labial, goma de mascar sem açúcar, parafina e ácido cítrico contendo pastilhas e enxaguantes bucais. Sialogogos sistêmicos, como pilocarpina e cevimelina, podem ser prescritos para estimular a produção de saliva, embora possam causar efeitos colaterais. Além disso, terapias complementares, como a acupuntura, têm mostrado potencial para melhorar a condição(9,10).
Além dos medicamentos, por meio da Transcutaneous Electric Nerve Stimulation (TENS), é possível aumentar a circulação sanguínea da região glandular, estimular o nervo auriculotemporal que é secretomotor e promover a dilatação dos ácinos funcionais, culminando em aumento do fluxo salivar. Tal recurso demonstrou potencial em pacientes com CaCP que apresentaram hipossalivação induzida pela RT(8), com efeitos duradouros.
Não foram encontradas na literatura pesquisas relacionadas com efeitos da TENS na saliva e na voz. Entretanto, estudo realizado com indivíduos saudáveis constatou que o uso de bochecho de pilocarpina com o objetivo de estimular o fluxo salivar possibilitou aumento do fluxo salivar de forma significativa. Como resultado, foram observadas diferenças notáveis na f o, bem como no aumento do Shimmer absoluto e relativo e no coeficiente de variação da amplitude, particularmente entre os participantes do gênero masculino(6).
A TENS tem demonstrado potencial para aumentar o fluxo salivar. Acredita-se que seu mecanismo de ação envolva a estimulação direta do nervo auriculotemporal, que inerva as glândulas salivares. Essa estimulação neural pode desencadear um reflexo, levando ao aumento da produção salivar. Além disso, a TENS pode promover a vasodilatação local, melhorando a irrigação sanguínea das glândulas salivares e potencializando seus efeitos(6,9,11-13).
A TENS vem sendo estudada por seus efeitos na hipossalivação induzida por radioterapia há alguns anos. Em um estudo, a TENS demonstrou melhorar significativamente o fluxo salivar estimulado em pacientes com hipossalivação após radioterapia. O estudo envolveu 68 pacientes, com aqueles no grupo TENS recebendo oito sessões ao longo de quatro semanas. Os resultados indicaram aumento progressivo no fluxo salivar estimulado (FSE) a partir da terceira sessão, com melhorias significativas no fluxo salivar autopercebido e na qualidade de vida observada até seis meses após o tratamento(8). Esse é um exemplo que compõe as publicações relativas ao tema e que ampliou o uso da TENS como recurso para a hipossalivação.
As diretrizes da International Society of Oral Oncology-Multinational Association for Supportive Care in Cancer (ISOO-MASCC) e da American Society of Clinical Oncology (ASCO) também sugerem que a TENS pode ser oferecida para melhorar a hipofunção da glândula salivar e a xerostomia em pacientes pós-radioterapia, embora a qualidade da evidência seja considerada baixa e a força da recomendação seja fraca(14). Outro estudo demonstrou que a TENS pode aumentar o fluxo salivar durante a estimulação em pacientes pós-irradiados, indicando seu potencial como uma modalidade de tratamento de suporte(15).
Apesar de existirem técnicas voltadas para o aumento do fluxo salivar, ainda são escassos os estudos que avaliam a relação do volume de saliva com a qualidade vocal após a RT em CaCP. O objetivo deste trabalho foi apresentar uma série de casos de CaCP com hipossalivação pós-RT e comparar resultados de volume da saliva e de medidas vocais objetivas e subjetivas, antes e após a TENS.
APRESENTAÇÃO DO CASO CLÍNICO
Esta é uma série de casos realizada em banco de dados de uma pesquisa maior, previamente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da instituição de origem (n° 68866023.2.0000.5335). Todos os participantes receberam esclarecimentos sobre a participação na pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE).
Para a seleção dos sujeitos, cujos registros faziam parte do banco de dados utilizado na presente pesquisa, considerou-se o histórico de RT para CaCP (exceto laringe); tempo mínimo de 60 dias após a RT; indivíduos adultos a partir de 18 anos, ambos os gêneros; ausência de lesão cancerígena em glândulas salivares (sublingual, submandibular e parótida) e queixa de xerostomia confirmada por avaliação do fluxo salivar (hipossalivação).
Foram excluídos os registros dos casos com doença laríngea ativa confirmada por laudo médico; tumores que comprometesse o fechamento velofaríngeo; respiradores orais (orgânicos e funcionais); uso de substâncias protetoras glandulares ou estimulantes salivares durante ou após a RT e no período de coleta de dados; volume de fluxo salivar estimulado maior que 1 ml/minuto; alterações cutâneas na região de aplicação da eletroterapia ou quaisquer outras alterações que contraindicassem a TENS; uso de marca-passo ou quaisquer outros dispositivos que impossibilitassem a TENS; indisponibilidade de tempo para participar do estudo (2 vezes/semana durante um mês) e excesso de faltas ao longo do tratamento (mais que 30% do total de sessões).
Anamnese e avaliação médica
Foram coletados os dados de identidade, do histórico de saúde e os referentes às condições clínicas dos voluntários, como a dose total de radiação utilizada e o tempo de término da RT. Os sujeitos também foram submetidos à avaliação médica e exame de nasofibrolaringoscopia realizado por um cirurgião de cabeça e pescoço para descartar qualquer possível recidiva da doença. A narina do paciente foi anestesiada com xylestesin 2% para minimizar o desconforto durante a introdução da fibra óptica. Em seguida, um aparelho da marca Olympus Medical System Corp foi inserido por uma das narinas. Uma telecâmera Karl Storz (modelo DX II) e uma fonte de luz Olympus (modelo CLV-S20) permitiram a inspeção detalhada do trato aerodigestivo superior, incluindo a cavidade nasal, rinofaringe, orofaringe, hipofaringe e laringe.
Para complementar o exame, quando necessário, foi realizada oroscopia direta e palpação da cavidade oral. Tais dados foram registrados no prontuário de cada paciente.
Mensuração do fluxo salivar
O fluxo salivar foi mensurado antes e após a TENS e determinado por meio da técnica de sialometria, através do kit Halitus®. Os participantes foram instruídos a não ingerir alimentos e bebidas e não fumar ou realizar higiene oral por um período de uma hora antes da avaliação. Os voluntários deveriam mastigar um sialogogo de silicone padronizado por cinco minutos, sem engolir saliva, e colocá-la em um tubo milimetrado. A escolha dos sialogogos mecânicos de silicone se justifica por suas características ideais: são atóxicos, inertes a saliva, paladar e odor, não causam efeitos colaterais, possuem formato e dureza adequados à estimulação salivar, mantêm suas dimensões ao longo do tempo e podem ser esterilizados(16,17). Para precipitar a espuma e converter em saliva, foi utilizado o medicamento dimeticona (três gotas para 4 ml; quatro gotas para 8 ml; cinco gotas acima de 8 ml de espuma); cada gota de dimeticona correspondeu a 0,02 ml e este valor foi subtraído do resultado final. A dimeticona, agente antiespumante, permite induzir rápida precipitação da espuma salivar. O uso da dimeticona possibilita que toda a espuma seja contabilizada no resultado do teste propiciando um efeito fiel à real produção de saliva. O volume de dimeticona adicionado foi cuidadosamente controlado e subtraído do volume total da amostra, minimizando o impacto da substância sobre os resultados(16).
A quantidade de saliva e espuma foi quantificada em mililitros (ml) e esse valor foi dividido em 5 para determinar o fluxo em ml/minuto. Foram adotados os seguintes valores de referência: menor que 0,7 ml/min (muito baixo); 0,7-1 ml/min (baixo); maior que 1 ml/min (normal) para a saliva estimulada (submandibular, sublingual e parótida)(16,18,19).
Amostras de voz
A obtenção das amostras de voz foi realizada em sala silenciosa, com ruído ambiental inferior a 48 dBNPS (medidor de pressão sonora RadioShack), sendo coletada a emissão prolongada da vogal /a/ com o indivíduo em posição ortostática antes e após a intervenção(20).
Para a captação das vozes, foi utilizado um gravador digital (Zoom H4n Pro digital Handy Recorder 4 canais), configurado em 96 kHz e 16 bits, com o nível de entrada ajustado para 50% de sua capacidade máxima, com microfone Behringer ECM8000 Omnidirecional profissional acoplado e colocado em ângulo de 90º em relação à boca e distante 4 cm para a vogal sustentada e a 10 cm para as amostras de fala encadeada(21). A emissão da vogal /a/ sustentada foi realizada em pitch e loudness habitual do paciente, seguida de uma inspiração profunda e mantendo o tempo máximo de fonação. A fala espontânea se deu com a resposta à pergunta "O que acha de sua voz?" e a emissão dos meses do ano.
Intervenção
Até o limite do conhecimento dos autores deste estudo, não existem pesquisas que relacionem a saliva produzida por meio da TENS e características da voz em paciente com xerostomia por radiação. Entretanto, estudos demonstram o efeito da produção de saliva por meio da TENS nesses pacientes(8,15,22,23). Uma revisão sistemática confirma a segurança e a viabilidade da TENS no tratamento da xerostomia induzida por radioterapia, sugerindo iniciar a terapia diária com TENS simultaneamente à radioterapia, para maior eficácia(24).
Neste estudo, para a realização da eletroestimulação, foram utilizados eletrodos de silicone aderidos à pele com micropore e colocados na região das glândulas parótidas e submandibulares, bilateralmente. O aparelho utilizado foi o Neurodyn II, com a corrente TENS, frequência de 50 Hz e largura de pulso de 250 µs, durante 20 minutos(8,23,25). Foram realizadas duas sessões por semana, durante quatro semanas, totalizando oito sessões. A intensidade foi graduada conforme o nível máximo de tolerância, sendo aumentada até o final dos vinte minutos e ajustada gradualmente a cada cinco segundos, até que o paciente indicasse o nível de conforto máximo, sinalizando com a mão(8). Todos os dados descritos constavam do banco de dados. Com as amostras de voz armazenadas, foram realizadas as análises vocais acústicas descritas a seguir.
Avaliação vocal acústica de fonte glótica
A análise das características vocais de fonte glótica foi realizada a partir da emissão sustentada da vogal /a/ antes e após a intervenção, armazenada no banco de dados. A vogal /a/ foi editada, eliminando-se os segmentos inicial e final da emissão, devido à presença de instabilidades naturais. Uma janela de análise de 3,6 s foi padronizada, tomando como base o menor tempo de sustentação da vogal observado entre todos os participantes.
As medidas vocais acústicas foram obtidas automaticamente, utilizando o Multi-Dimensional Voice Program Advanced (MDVPA) (Kay-PENTAX®, New Jersey, EUA), configurado com taxa de amostragem de 44 kHz e conversão analógico-digital de 16 bits.
As medidas utilizadas neste estudo foram: medidas de frequência: f o, Highest f o (fhi), Lowest f o (flo), Standart Deviation of f o (STD); medidas de perturbação da f o: Absolute Jitter (Jita), Jitter Percent (Jitt), Relative Average Perturbation (RAP), Pitch Perturbation Quotient (PPQ), Smoothed Pitch Perturbation Quotient (sPPQ), f o Variation (vf o); medidas de perturbação de amplitude: Shimmer in dB (ShdB), Shimmer Percent (Shim), Amplitude Perturbation Quotient (APQ), Smoothed Ampl.Perturbation Quotient (sAPQ), Peak-to-Peak Amplitude Variation (vAm); medidas de ruído: Noise to Harmonic Ratio (NHR), Voice Turbulence Index (VTI), Soft Phonation Index (SPI); medidas de quebra de voz: Degree of Voice Breaks (DVB), Number of Voice Breaks (NVB); medidas de segmentos surdos ou não sonorizados: Number of Unvoiced Segments (NUV), Degree of Voiceless (DUV); medidas de segmentos sub-harmônicos: Degree of Sub-harmonics (DSH), Number of Sub-harmonic Segments (NSH)(21,24).
Avaliação acústica espectrográfica da voz
A vogal /a/, editada e utilizada na avaliação vocal acústica de fonte glótica, foi empregada para a análise acústica espectrográfica, por meio do programa Real-Time Spectrogram (RTS) (Kay-PENTAX®, New Jersey, EUA), configurado com taxa de captação de 11 kHz e conversão analógico-digital de 16 bits. A análise foi realizada com Espectrografia de Banda Larga (100 points, 646 Hz) (EBL) e de Banda Estreita (1024 points, 63,09 Hz) (EBE). A janela de análise foi configurada com a duração padrão de 3,6 s(20,21).
As representações gráficas das EBL e EBE capturadas antes e após a intervenção foram submetidas a um processo de codificação e posterior aleatorização. Essas imagens aleatorizadas foram disponibilizadas para análise individual de três fonoaudiólogas doutoras, cada uma com experiência profissional de, pelo menos, uma década e expertise na área de análise acústica espectrográfica.
A fim de garantir a objetividade das análises, as fonoaudiólogas que atuaram como juízas foram mantidas cegadas no anonimato em relação aos objetivos da pesquisa, às informações relativas ao gênero, idade e ao período (pré ou pós-TENS). Elas receberam os arquivos por email, contendo exclusivamente as imagens de EBE e EBL, não incluindo as gravações sonoras das vozes dos participantes.
As juízas não receberam um treinamento direcionado e específico para a condução dessa análise, no entanto, foram providas de espectrografias-modelo que representavam padrões de normalidade, com a finalidade de orientar suas avaliações. As juízas utilizaram o Protocolo de Avaliação Vocal Espectrográfica - PAVE (Spectrographic Vocal Assessment Protocol - SVAP) para registrar suas conclusões(21). Esse protocolo avaliou diversos aspectos da EBE e EBL, conforme descrição a seguir.
No que tange à avaliação da intensidade do traçado, seja dos formantes (F m), das baixas, médias e altas frequências, ou do espectrograma completo, o SVAP apresentava uma escala variando de 0, representando a total ausência de cor no traçado espectrográfico, até 10, máxima intensidade de cor no traçado. A presença de ruído foi identificada pelas áreas sombreadas ou pontilhadas no espectrograma, em que 0 denotava a ausência completa de ruído e 10 representava a presença máxima de ruído (na forma de áreas sombreadas) no traçado espectrográfico(26,27).
No que diz respeito à definição dos F m e dos harmônicos (nf o), sua avaliação baseou-se na visibilidade, demarcação e simetria do traçado. Nesse contexto, a escala de avaliação variou de 0, indicando total indefinição, a 10, representando máxima definição dos F m e nfo. A regularidade do traçado foi relacionada à sua continuidade e estabilidade, sendo pontuada de 0, correspondendo à total irregularidade, a 10, que refletia a máxima regularidade no traçado. A presença de sub-harmônicos foi caracterizada pela manifestação de traçados entre dois nf o consecutivos, resultando em uma duplicação completa ou parcial dos nf o. A escala utilizada para avaliar a presença de sub-harmônicos variou de 0, indicando ausência total de sub-harmônicos a 10, sinalizando a presença de sub-harmônicos em todo o espectrograma. A largura de banda dos F m (BFm) foi avaliada como 0, correspondendo à totalmente reduzida/ausente e 10, à totalmente aumentada(26).
As avaliações realizadas pelas juízas por meio do protocolo validado SVAP foram quantificadas numericamente em uma escala que variava de 0 a 100 mm. Após, foi realizada a média das respostas das três juízas em cada aspecto avaliado, para cada sujeito. As médias de cada grupo pré e pós-intervenção foram calculadas. Os resultados médios de cada grupo foram comparados e discutidos em relação às demais variáveis do estudo.
Três juízas realizaram a avaliação vocal perceptivo-auditiva por meio de escala GRBASI26. O parâmetro Grade (G) avalia o grau geral da alteração vocal; Roughness (R), a rugosidade da voz; Breathiness (B) a soprosidade; Asteny (A) a astenia; Strain (S) a tensão e Instability (I), a instabilidade. Os parâmetros são quantificados em um sistema de escore de intensidade de 0 a 3 (0 - normal, 1 - discreto, 2 - moderado e 3 severo).
As juízas receberam por e-mail os arquivos de voz e um protocolo com a definição dos parâmetros e pontuação para registrar suas respostas. Da mesma forma que no PAVE, foram cegadas quanto ao obejtivo da pesquisa, a idade, gênero e momento de intervenção (pré ou pós). A concordância de pelo menos duas das juízas foi o critério utilizado para cada parâmetro. Quando não houve consenso entre as juízas, fez-se necessário um quarto avaliador especialista para definir o grau de alguns parâmetros, que recebeu as vozes e o protocolo da mesma forma que os primeiros avaliadores.
Os resultados estão apresentados de forma descritiva.
O coeficiente de correlação intraclasse (ICC) foi calculado para avaliar a concordância entre as três juízas para as variáveis da avaliação vocal perceptivo-auditiva e espectrográfica no pré e no pós-intervenção, utilizando o modelo de efeito fixo para estimação de medida de concordância e a unidade de média entre avaliadores. O coeficiente varia entre 0 e 1, sendo que, quanto mais próximo de 1, indica concordância e quanto mais próximo de 0 indica não concordância. Na GRBASI, apenas a A pré e pós-intervenção não mostrou concordância entre as juízas. Na avaliação espectrográfica, algumas das inúmeras variáveis avaliadas pelo SVAP(21) não mostraram concordância entre as juízas: regularidade do traçado nas altas frequências e no espectrograma como um todo; BFm de F 1 e F 2; antirressonância imediatamente acima de F 1 e nas baixas frequências; intensidade da cor do traçado das baixas frequências; presença de ruído nas baixas frequências e no espectrograma como um todo; substituição de nf o por ruído; definição, regularidade e número de nf o nas baixas e médias frequências e presença de sub- nf o nas altas frequências.
Quanto às características dos participantes (Tabela 1), o estudo contou com três homens e uma mulher, submetidos à QT e RT para tumor de orofaringe, com dose entre 44-70Gy e tempo de término de 2-12 meses. Quanto aos resultados da estimulação do fluxo salivar (Figura 1) no início e ao final do tratamento, observou-se que todos os pacientes apresentaram aumento no volume de saliva. Foi identificado um aumento variável do fluxo salivar, que passou, em média, de 0.1 ml/min a 1.8 ml/min.
Na análise da escala GRBASI (Tabela 2), não foi possível identificar, por meio da avaliação das juízas, melhora ou piora após a intervenção para aumento do fluxo salivar.
Na Tabela 3, são observados os resultados da análise acústica de fonte glótica por meio do programa MDVPA. Houve mudança na f o de todos os sujeitos pós-intervenção. Dois sujeitos (S1, masculino e S4, feminino) aumentaram a f o, em média, 22,372 Hz e 2 sujeitos (S2 e S3, ambos masculinos) diminuíram a f o, em média, 9,093 Hz.
Nos 4 sujeitos, houve aumento das medidas RAP e PPQ. Em 3 dos 4 sujeitos, houve diminuição da flo e aumento de fhi, jita, jitt e SPI. No entanto, se observou diminuição de sPPQ, Shim, ShdB, APQ, NHR e VTI.
Na EBL (Tabela 4), em 3 dos 4 sujeitos, houve piora caracterizada pela redução da definição e regularidade de F 1, redução da regularidade do traçado em todo o espectro e aumento da largura de banda de F 4. Houve melhora caracterizada pela redução da antirressonância imediatamente acima de F 1, nas baixas e nas altas frequências.
Na EBE (Tabela 5), em 3 dos 4 sujeitos, houve piora caracterizada pela redução da definição e regularidade dos nf o nas frequências baixas e médias e em todo o espectrograma e da redução do número de nf o nas frequências médias e em todo o espectrograma. E houve melhora caracterizada pela redução da presença de ruído em todos os aspectos avaliados e redução da presença de sub-harmônicos nas altas frequências.
DISCUSSÃO
Neste estudo, observou-se aumento do fluxo salivar em todos os participantes que foram submetidos à intervenção com TENS. Esse aumento se manifestou como uma sutil melhora em alguns dos parâmetros vocais, embora ainda dentro dos limites da normalidade (Tabela 1, Figura 1).
Após a TENS, o volume de saliva aumentou, mas os valores ainda ficaram abaixo do normal (1 a 3 ml/min), com um máximo de 2,2 ml/min(8). Observou-se o aumento variável no fluxo salivar em todos os pacientes, com aumento médio de 0.66 ml/min. Vale destacar que, quando as glândulas salivares são incluídas no campo de radiação da RT, é comum se observar o desenvolvimento de hipossalivação e/ou xerostomia. A duração dessa alteração é variável de paciente para paciente e está sujeita à dose de radiação recebida, ao campo de radiação empregado e às variações biológicas individuais(6).
Essa condição ocorre devido à sensibilidade das glândulas salivares à RT, o que provoca alterações morfológicas e/ou funcionais em sua estrutura(5). Uma possível influência nos resultados observados pode estar relacionada à dosagem da RT administrada aos pacientes. A xerostomia tende a se manifestar a partir da terceira ou quarta semana, quando os pacientes acumulam cerca de 39Gy de radiação(5).
Em relação ao tempo de término de RT, estudos mostram que alguns pacientes melhoraram o grau da xerostomia, tornando-se mais leve com o passar do tempo. Uma coorte acompanhou 80 pacientes pós-RT durante 37 meses, em que 18,8% dos pacientes melhoraram a xerostomia após 18 meses, aproximadamente(28). No presente estudo, os sujeitos com menores índices salivares pós-TENS apresentavam menor tempo pós-radioterapia, com seis e dois meses, e receberam 70Gy de RT.
Dessa forma, os danos às glândulas salivares podem ter sido muito grandes, tornando mais difícil a recuperação. Estudos indicam que danos mais importantes às glândulas salivares ocorrem entre 60 e 70Gy(28), dados que confirmam os resultados deste estudo.
No entanto, apesar de ter sido observado um aumento relativamente modesto no fluxo salivar, os achados estão em concordância com os resultados de outros estudos(7,21) nos quais os participantes demonstraram incremento no fluxo salivar após a aplicação da TENS, relatando melhorias notáveis na qualidade de vida, especialmente nas áreas de fala, voz, mastigação e sono.
No que diz respeito à análise vocal perceptivo-auditiva (Tabela 2), os resultados se apresentaram de forma inconsistente e heterogênea, aparentemente divergindo dos achados de uma revisão sistemática (RS) que abrangeu 20 estudos(29). Na RS, a escala GRBASI revelou significância estatística no grupo de intervenção, sugerindo que as condições de hidratação reduzida levaram à queda na qualidade vocal perceptivo-auditiva.
Os resultados da análise vocal acústica de fonte glótica revelaram modificações na f o de todos os participantes após a intervenção. Neste estudo, observou-se que dois participantes, S1 (masculino) e S4 (feminino), aumentaram a f o em média de 22,372 Hz, enquanto dois outros participantes, S2 e S3 (ambos do gênero masculino) diminuíram a f o em média de 9,093 Hz (Tabela 3). É relevante notar que, apesar dessa variação, todos os valores da f o permaneceram dentro da faixa considerada normal para falantes brasileiros, que abrange de 80 a 150 Hz para homens e de 150 a 250 Hz para mulheres(30).
Esses achados estão em parcial concordância com estudo conduzido anteriormente7, que avaliou a f o no início e após seis semanas de tratamento com quimiorradioterapia e observou diminuição da f o em dez pacientes após RT para câncer não laríngeo (cinco homens e cinco mulheres), juntamente com aumento da f o em quatro pacientes (dois homens e duas mulheres).
No atual estudo, os participantes não apresentaram afecções no momento do exame laríngeo realizado no início da intervenção fonoaudiológica para estimulação do fluxo salivar. No entanto, de acordo com outros autores(7) a redução da f o foi associada ao aumento da massa efetiva das pregas vocais devido ao edema na região laríngea, enquanto o aumento da f o foi atribuído à presença de pseudomembrana induzida por mucosite, causando alterações na vibração das pregas vocais.
O aumento da f o observado nos sujeitos 1 e 4, apesar do acréscimo no volume de saliva, contrasta com os resultados de um ensaio clínico randomizado, controlado por placebo. Tal estudo envolveu a estimulação do fluxo salivar por meio do bochecho de pilocarpina e avaliou a interferência da saliva sobre a hidratação/lubrificação laríngea e a qualidade da voz em indivíduos saudáveis. No referido estudo, os sujeitos também experimentaram aumento na produção salivar, mas houve redução da f o. Os autores sugerem que, com o aumento da lubrificação, mesmo que mínima, houve penetração laríngea que influenciou a velocidade dos ciclos de abertura e fechamento das pregas vocais(6).
Os sujeitos do presente estudo apresentavam hipossalivação e aumento da viscosidade da saliva residual, o que dificultava a lubrificação do trato vocal. Embora a análise da saliva produzida após a intervenção não tenha sido objeto do estudo, pode-se inferir que a possível redução da viscosidade salivar contribuiu para o considerável aumento da f o nos indivíduos 1 e 4. Essa hipótese se baseia na premissa de que uma saliva menos viscosa facilitaria o movimento vibratório das pregas vocais, permitindo que elas vibrem com maior frequência.
No que se refere aos participantes 2 e 3, observou-se redução na f o, apesar do leve aumento do fluxo salivar. A possível influência da qualidade do muco produzido e maior aderência às pregas vocais pode reduzir o número de ciclos vibratórios, justificando essa redução da f o. No entanto, é importante ressaltar que a análise da viscosidade e das propriedades adesivas do muco não foi realizada neste estudo.
Além disso, em relação à f o, notou-se um aumento da fhi em três participantes e diminuição da flo também em três dos quatro participantes (Tabela 3). Essas alterações sugerem aumento da flutuação da f o durante a sustentação da emissão, indicando instabilidade. Tal variação pode ser explicada pela falta de treinamento vocal dos participantes(21), mas, também, pode ser um reflexo do discreto aumento de salivação/lubrificação obtido no experimento.
No que se refere às medidas de perturbação de f o, os quatro participantes apresentaram aumento nos parâmetros RAP e PPQ; três dos quatro sujeitos apresentaram aumento de jita e jitt e diminuição de sPPQ ao final da intervenção (Tabela 3). É relevante notar que valores elevados de Jitter têm sido correlacionados à presença de ruído na voz ou à rouquidão, conforme observado por outros autores(5). O resultado obtido sugere que, juntamente com a instabilidade vocal, houve aumento da perturbação de f o nas emissões vocais. Isso poderia estar relacionado ao aumento de lubrificação pós-intervenção que pode ter originado maior perturbação no movimento das pregas vocais.
Adicionalmente, os indivíduos 1, 2 e 4 apresentaram diminuição nas medidas de perturbação da amplitude, incluindo ShdB, Shim e APQ. O Shimmer está frequentemente associado a ruídos e à periodicidade na produção vocal e tende a ser mais elevado em casos de soprosidade vocal(24).
Da mesma forma, esses mesmos indivíduos exibiram redução nas medidas de ruído, incluindo NHR e VTI. Essas medidas de ruído avaliam a presença de ruído em várias faixas do espectro vocal ou em todo o espectro, e são frequentemente associadas a vozes desviadas(24). Tais melhoras nas medidas de perturbação de amplitude e de ruído podem sinalizar maior qualidade do fechamento das pregas vocais à fonação, diminuindo o escape aéreo e o ruído. Esse resultado pode estar relacionado ao discreto aumento de salivação/lubrificação obtido com a intervenção.
Na EBL (Tabela 4), em três dos quatro sujeitos, houve piora caracterizada pela redução da definição e regularidade de F 1, redução da regularidade do traçado em todo o espectro e aumento da largura de banda de F 4. Houve melhora caracterizada pela redução da antirressonância imediatamente acima de F 1, nas baixas e nas altas frequências.
Na EBE (Tabela 5), em três dos quatro sujeitos, houve piora caracterizada pela redução da definição e regularidade dos nf o nas frequências baixas e médias e em todo o espectrograma, e da redução do número de nf o nas frequências médias e em todo o espectrograma. Houve melhora caracterizada pela redução da presença de ruído em todos os aspectos avaliados e redução da presença de sub-harmônicos nas altas frequências. Tais resultados confirmam aqueles obtidos por meio da análise vocal acústica de fonte glótica na qual se observou aumento das medidas de perturbação de frequência e instabilidade e redução de ruído e de escape aéreo.
Curiosamente, apesar dessas modificações observadas objetivamente nas medidas vocais acústicas, não foram percebidas mudanças expressivas na análise perceptivo-auditiva, sugerindo que modificações vocais discretas podem não ser suficientemente percebidas pelo ouvido humano e que a análise acústica parece ser mais sensível.
A discrepância entre os resultados da avaliação vocal perceptivo-auditiva e da avaliação vocal acústica, em concordância com estudo anterior(29), pode ter se originado em razão das mudanças vocais extremamente sutis, quase imperceptíveis ao ouvido humano. Ainda, os resultados discrepantes entre as avaliações vocais perceptivo-auditiva e acústica, bem como as melhoras e pioras simultâneas encontradas na avaliação acústica, podem ser atribuídos ao reduzido número de sujeitos, à variabilidade na resposta ao tratamento entre os pacientes e ao variado tempo de pós-RT entre os sujeitos, que poderia ter favorecido maior recuperação vocal naqueles com maior tempo pós-RT.
Apesar dessas possíveis variáveis intervenientes e limitadoras, infere-se que o aumento da quantidade de saliva produzida pode ter contribuído para a umidificação do trato vocal e interferido nos ciclos vibratórios das pregas vocais e nas características do sinal glótico, embora de forma não conclusiva. Essa observação encontra respaldo em um estudo anterior4 que, ao utilizar um contraste radioativo, demonstrou a presença de saliva não apenas na cavidade oral e na orofaringe, mas também na valécula e laringofaringe, projetando-se até o vestíbulo laríngeo. Isso ocorreu mesmo na ausência de queixas de desconforto, tosse ou reações adversas à saliva radioativa na laringe, o que reforça a ideia de que a hipossalivação impacta o funcionamento da laringe.
COMENTÁRIOS FINAIS
A TENS demonstrou induzir aumento variável no fluxo salivar com algumas melhoras vocais acústicas, enquanto a avaliação vocal perceptivo-auditiva não revelou diferenças entre os momentos pré e pós-intervenção. Na análise acústica da fonte glótica, observou-se aumento da f o, sugerindo agudização da voz, diminuição da flo e aumento de medidas de perturbação de f o e SPI, sinalizando maior aperiodicidade e perda de energia em f o agudas do espectro. Houve, ainda, diminuição de medidas de perturbação de amplitude, NHR e VTI, indicando menor escape aéreo transglótico e menor ruído à emissão.
Na avaliação acústica espectrográfica da voz, registrou-se piora com redução da definição e regularidade de F e nf o e da regularidade do traçado, sugerindo presença de instabilidade. Houve melhora caracterizada pela redução da antirressonância, da presença de ruído e de sub-harmônicos.
A série de casos apresentada indica que a TENS pode apresentar potencial de aumentar o fluxo salivar em pacientes com hipossalivação induzida pela RT. No entanto, para compreender plenamente os efeitos tardios e as modificações nos parâmetros vocais resultantes desse aumento, é necessário um acompanhamento mais extenso e a análise de uma amostra maior. Vale ressaltar que os resultados se refletiram em alterações dignas de investigação mais aprofundada no que diz respeito ao papel da saliva na qualidade vocal. É importante mencionar que algumas das limitações deste estudo foram: adição de dimeticona à amostra, que poderia interferir na composição da saliva ou nos resultados vocais, mesmo com a subtração do volume correspondente às gotas de dimeticona para controlar essa interferência; variação no tempo pós-radioterapia entre os pacientes e número reduzido de participantes. Recomenda-se a continuidade das investigações em uma amostra mais robusta, com maior padronização das variáveis intervenientes e em longo prazo.
AGRADECIMENTOS
C A Cielo agradece o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (processo 305151/2022-3)
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Trabalho realizado na Santa Casa de Porto Alegre – Porto Alegre (RS), Brasil.
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Financiamento:
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), n° 305151/2022-3.
REFERÊNCIAS
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Maio 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
17 Set 2024 -
Aceito
09 Fev 2025


Legenda: ml/min – milímetros por minuto