RESUMO
A mirmecofauna urbana do Município de Maringá, PR, foi avaliada neste estudo, através da coleta de formigas, ao longo de 5 meses, durante as atividades de atendimento a reclamações da população, do Serviço de Controle de Zoonoses e Pragas Urbanas da Secretaria Municipal de Saúde de Maringá, PR. As formigas foram coletadas em condições naturais sem auxilio de iscas em 165 pontos, totalizando 803 amostras. Foram identificadas 54 espécies de formigas pertencentes a 24 gêneros e 6 subfamílias, na área urbana do município de Maringá. As espécies que incomodam, gerando reclamações, são: Atta sexdens rubropilosa, Atta capiguara, Camponotus sericeiventris, Camponotus atriceps, Camponotus renguerii, Monomorium pharaonis, Tapinoma melanocephalum. Pode-se caracterizar como pragas urbanas no município de Maringá as espécies T. melanocephalum, Paratrechina longicornis, C. atriceps, M. pharaonis, Solenopsis saevissima, C. renguerii, C. sericeiventris, Atta spp., Pheidole aberrans e Pogonomyrmex spp., tendo em vista a freqüência e o nível de infestação constatados nas áreas interna e externa dos domicílios. T. melanocephalum foi a espécie de maior incidência no Município de Maringá e a mais freqüente qualitativa e quantitativamente, na área interna dos domicílios. As espécies consideradas de difícil controle pela população são: C. atriceps, T. melanocephalum e P. longicornis.
PALAVRAS-CHAVE Formigas urbanas; pragas; domicílios; mirmecofauna
ABSTRACT
The urban mirmecofauna of the city of Maringá, Paraná, was evaluated in this study, through the collection of ants, during a period of five months while working on complaints of the population to the Service of Pest Control of the city Secretary of Health in Maringá-PR. The ants were collected in natural conditions without the help of bait in 165 places in the city, totaling 803 samples. Fifty-four different species of ants were identified belonging to 24 genre and 6 subfamilies. The species that caused problems generating complaints were: Atta sexdens rubropilosa, Atta capiguara, Camponotus sericeiventris, Camponotus atriceps, Camponotus renguerii, Monomorium pharaonis and Tapinoma melanocephalum. We can characterize as urban pests in the city of Maringá the species T. melanocephalum, Paratrechina longicornis, C. atriceps, M. pharaonis, Solenopsis saevíssima, C. renguerii, C. sericeiventris, Atta spp., Pheidole aberrans and Pogonomyrmex spp., taking into account the frequency and the level of constant infestation in the internal and external parts of the households. T. melanocephalum was the species with the greatest incidence in the city of Maringá and the most frequent in quality and in quantity in the interior of households. The most difficult species to control for the population was C. atriceps, T. melanocephalum and P. longicornis.
KEY WORDS Urban ants; pests; households; mirmecofauna
INTRODUÇÃO
O êxodo rural que caracterizou as últimas décadas do Brasil fez com que a população rural deixasse o campo e viesse para as cidades, formando grandes conglomerados humanos e com eles emergiram grandes problemas sanitários. Segundo o Ministério da Saúde, 75% da população brasileira vivem nas áreas urbanas e a ocupação desordenada de espaços pelo homem aliada a falta de políticas de controle ambiental urbano, fez com que a questão das pragas urbanas se constituísse em um problema crescente de saúde pública nas grandes cidades. A grande disponibilidade de abrigo e alimentos propicia ambiente adequado para proliferação de diversas espécies de animais sinantrópicos.
O Município de Maringá conta atualmente com uma população de 300.000 habitantes, sendo que 97,48% vivem na área urbana. O clima é predominantemente sub-tropical, com temperatura média anual superior a 20º C e verões chuvosos e invernos secos. É conhecido pelo alto padrão de qualidade de vida, possuindo 25,47 m2 de área verde por habitante, além de preservar 17 bosques de mata nativa com total de 217,8 ha e um sistema viário de amplas ruas e avenidas fartamente arborizadas – 160.000 árvores. Tal situação propicia a instalação de uma fauna urbana diversificada, como aves, insetos, morcegos e aracnídeos ocasionando incômodos e agravos à saúde, conseqüência de superpopulações resultantes de agressões ambientais.
Nos últimos 3 anos houve um aumento significativo no volume de reclamações registradas no Serviço de Controle de Zoonoses e Pragas da Secretaria Municipal de Saúde de Maringá, referentes a diversos tipos de pragas urbanas, tanto quantitativa como qualitativamente (Figs.1 e 2), sendo que algumas delas têm se destacado, como a questão da crescente invasão dos domicílios por formigas, que gera incômodos e ansiedade por parte da população. No ano 2000 apenas uma reclamação foi registrada sobre esta praga, mas em 2003 o número elevou para 25 reclamações.
Número de reclamações registradas na Secretaria de Saúde- Ano 2000-Maringá. PR. Fonte: SESA/Maringá
Entre os insetos sociais as formigas foram os que mais se adaptaram às cidades, sendo que no Brasil estima-se que das 2000 espécies de formigas identificadas, cerca de 50 espécies são pragas urbanas causando prejuízos no campo, nas cidades e danos à saúde pública (BUENO & CAMPOS-FARINHA, 1999; CAMPOS-FARINHA et al., 2002).
Na agricultura os prejuízos econômicos podem ser grandes, tanto na produção como no armazenamento. Na área urbana podem causar inúmeros danos em gramados, campos de futebol e parques alimentando-se de sementes e desfolhando plantas (CAMPOS–FARINHA et al., 1997). Também causam problemas em locais onde se manipulam alimentos, instituições de pesquisa, biotérios, zoológicos, museus, cabines de eletricidades e centrais telefônicas. Algumas espécies apresentam ferrão podendo picar dolorosamente como as formigas dos gêneros Wasmannia, Labidus, Eciton, Crematogaster e da subfamíla Ponerinae (MALASPINA, 2002). As picadas de formigas lava-pés (Solenopsis) podem ocasionar desde leve coceira até choques anafiláticos em pessoas alérgicas. Algumas representam perigo à saúde pública quando invadem hospitais transportando microrganismos patogênicos (ALEKSEEV et al., 1972; BEATSON, 1972; EDUARDS & BACKER, 1981; IPINZA-REGLA et al., 1981; CHADEE & MAITRE, 1990; EICHLER, 1990; FOWLER & BUENO, 1993; PEÇANHA, 2000; ZARZUELA et al., 2002).
Nos Estados Unidos as formigas foram classificadas como sendo o maior problema residencial, ultrapassando até mesmo as baratas num levantamento sobre o uso de pesticidas residenciais e rurais (WHITMORE et al., 1992). Em um levantamento realizado no Brasil, com empresas controladoras de pragas, a formiga é a praga mais difícil de ser controlada e a campeã em reclamações, principalmente quando presentes em hospitais (CORRÊA, 2000).
Entretanto, a mirmecofauna presente em cidades no Brasil ainda é pouco conhecida, principalmente, quando se trata de cidades fora da região sudeste. Desta forma, neste trabalho foram registradas as espécies de formigas que ocorrem na área urbana do Município de Maringá, Estado do Paraná o nível de conhecimento da população sobre as diferentes espécies, os danos causados por elas, os fatores que dificultam seu controle e os agravos à saúde decorrentes destes insetos e seu controle indiscriminado, através de coletas realizadas durante as atividades de rotina do Serviço de Controle de Zoonoses e Pragas da Secretaria Municipal de Saúde de Maringá, visando o direcionamento das ações de promoção e proteção à saúde pública.
MATERIAL E MÉTODOS
No período de novembro de 2002 a março de 2003 foram coletadas amostras de formigas em domicílios, indústrias de alimentos e prédios públicos, durante as atividades de atendimento à reclamações da população do Município de Maringá, Estado do Paraná, referentes a infestações de pragas urbanas, perfazendo um total de 165 pontos de coleta, com 803 amostras coletadas (Fig. 3). Das reclamações atendidas em domicílios, formigas foram a causa em 12,7% das inspeções.
As amostras foram coletadas, através de inspeções nos locais visitados, tanto interna como externamente não tendo sido usado iscas atrativas, uma vez que se pretendia identificar as espécies que circulam pelo ambiente em condições naturais, ou seja, sem serem atraídas por qualquer componente atrativo no momento da coleta dos dados.
Os exemplares de tamanho pequeno e médio foram coletados com auxílio de pincel umedecido em álcool 70% e os maiores com auxilio de uma pinça. Posteriormente, foram colocados em frascos de plástico contendo álcool 70% e identificados por números e letras, sendo que a cada número correspondia a uma ficha com dados do local. Os espécimes estão depositados na Coleção Entomológica "Adolph Hempel" do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Vegetal do Instituto Biológico.
Em 50 dos 165 pontos de coleta foi aplicado um questionário, possibilitando uma avaliação da interferência da presença de formigas na qualidade de vida das pessoas. Foram abordados aspectos como: áreas das residências (cômodos) onde as formigas são encontradas; agravos à saúde ocasionados por formigas; danos materiais ocasionados, métodos de controle utilizados e o nível de conhecimento dos residentes sobre a biologia de formigas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O Município de Maringá possui uma mirmecofauna diversificada tendo sido identificadas 53 espécies de formigas pertencentes a 24 gêneros e 6 subfamílas (Tabela 1). As espécies variaram de 1 a 12 por local de amostragem, com média de 4,8 espécies, sendo que nenhum dos pontos registrou ausência de formigas. Os dados aqui coletados diferem significativamente daqueles encontrados por DELABIE et al. (1995) em Ilhéus, BA, e SILVA & LOECK (1999) em Pelotas, RS, que coletaram 31 e 24 espécies, respectivamente. Estes autores utilizaram em suas coletas iscas o que pode ter permitido a coleta de espécies diferentes das coletadas neste trabalho. Assim como DELABIE et al. (1995) não foi encontrada Linepithema humile em Maringá. Segundo SCHULTZ & MCGLYNN (2000) áreas com essas formigas apresentam mirmecofauna reduzida.
A subfamília Formicinae representou 41,9% dos gêneros amostrados, Myrmicinae 36,1%, Dolichoderinae 14,8%, Pseudomyrmecinae 3,1%, Ponerinae 1,9% e Ecitoninae 1.0% .
Dos 24 gêneros encontrados os que apresentaram maior diversidade de espécies foram Camponotus (6), Pheidole (6), Crematogaster (5) e Acromyrmex (4).
Das 53 espécies identificadas, 17 foram encontradas infestando a área interna das residências Tapinoma melanocephalum, Paratrechina longicornis, Camponotus atriceps, C. rengueri, C. sericeiventris, Pheidole aberrans, Pheidole sp. 1 , Brachymyrmex spp., Solenopsis saevissima, Dorymyrmex pyramicus, Pogonomyrmex naegelli, Pogonomyrmex sp.1 , Monomorium pharaonis, M. floricola, Cardiocondyla sp. 1, Paratrechina fulva e Wasmannia auropunctata. Estudos realizados em outros Estados do Brasil (DELABIE et al., 1995; CAMPOS-FARINHA et al., 1995; BUENO & CAMPOS-FARINHA, 1998; SILVA & LOECK, 1999) e em outros países (KNIGT & RUST, 1990; HANSEN et al., 1993; KLOTZ et al., 1995), demonstram resultados semelhantes com relação aos gêneros mais comumentemente identificados em áreas internas de domicílios, com exceção de Pogonomyrmex spp., Cardiocondyla sp. e Camponotus sericeiventris. A espécie de maior incidência no Município de Maringá foi Tapinoma melanocephalum sendo a mais freqüente qualitativa e quantitativamente na área interna dos domicílios a exemplo da situação verificada por BUENO & CAMPOS-FARINHA (1999) na região sudeste do Brasil.
As espécies encontradas nas áreas internas visitavam mais freqüentemente locais de manipulação de alimentos, porém não deixavam de freqüentar quartos, salas, banheiros, escritórios, corredores de circulação, lavanderias e forros.
Do total de amostras verificadas (803), 19,2% corresponderam ao gênero Camponotus, e destas, 24% corresponderam à espécie Camponotus atriceps, de hábitos noturnos, tendo sido encontrados pequenos ninhos satélites em forros de casas, dentro de guardaroupas, computadores, videocassetes, televisores, aparelhos de ar condicionado, equipamentos odontológicos, armários de consultórios em Postos de Saúde, esquadrias de metal de portas e janelas, frestas de alvenaria, além de grandes ninhos em árvores. Esta espécie é citada entre as formigas de importância econômica no Brasil por CAMPOS-FARINHA et al. (1995) e no exterior por (AKRE & JANSEN 1990; HANSEN et al., 1993; KLOTZ et al., 1995). A espécie de Camponotus encontrada com maior freqüência (30,5%) foi C. arboreus, onde na maioria das vezes circulava na área externa em varandas, jardins quintais, muros e paredes externas das casas.
As formigas do gênero Brachymyrmex foram encontradas raramente dentro de residências, apesar de terem sido observadas em altas densidades nas áreas externas, em jardins, varandas, paredes externas das casas e vasos. São citadas por SILVA & LOECK (1999), como uma das espécies mais freqüentes no interior de residências em Pelotas, RS, sendo considerada praga. Outros autores as citam apenas entre as formigas domiciliares sem o status de praga (CAMPOS-FARINHA et al., 1995; BUENO & CAMPOS-FARINHA, 1998). Não houve qualquer reclamação por parte dos munícipes de Maringá com relação a este gênero, uma vez que seus hábitos de associarem-se a plantas e seus insetos sugadores as mantenham fora dos domicílios.
Foram verificadas durante as inspeções grandes infestações de formigas envolvendo as espécies Camponotus sericeiventris, Monomorium pharaonis, Atta sexdens rubropilosa e Atta capiguara. Em um dos dois casos envolvendo M. pharaonis, a infestação ocorreu em um hospital público com dominância desta espécie sobre as outras, corroborando as informações contidas em CAMPOS-FARINHA et al. (1997). A presença desta formiga em hospitais representa um sério risco à saúde pública pelo fato de ter a capacidade de transportar microrganismos patogênicos, conforme verificado por BEATSON (1972), ALEKSEEV et al. (1972), EICHLER (1978) e PEÇANHA (2000).
A espécie C. sericeiventris foi identificada em 4 grandes infestações gerando pânico devido a grande quantidade de operárias, organizadas em trilhas que iam dos forros das casas até as árvores nas calçadas, passando pelos muros, quintais e calçadas sendo observadas também dentro das casas, porém em menores densidades.
As formigas cortadeiras do gênero Atta conhecidas como saúvas, foram responsáveis por danos em jardins, hortas caseiras, viveiros de mudas, campos de futebol, praças públicas e arborização de ruas, sendo encontradas em grandes quantidades. A maioria dos ninhos não era de grandes proporções e o maior encontrado foi estimado ter em torno de 4 anos de idade. O ninho, com a terra solta aparente localizava-se geralmente em algum terreno vazio próximo e em alguns locais os olheiros se localizavam em frestas de piso de alvenaria. Não existem muitas informações disponíveis sobre prejuízos causados por formigas cortadeiras em áreas urbanas e segundo MARICONI (1970), causam danos às construções (prédios, represas, pontes, pontilhões, mausoléus e túmulos) e estradas (rodoviárias e ferroviárias). JUSTI JUNIOR et al. (1996) citam que os ninhos na área urbana geralmente são pequenos com idade em torno de 2 anos. A abundante vegetação, a existência de muitos terrenos sem edificações em área centrais e na periferia da cidade e a falta de um serviço permanente e efetivo de controle de pragas no município de Maringá, são fatores que propiciam a sobrevivência dessas formigas na área urbana ocasionando danos e incômodos.
As espécies caracterizadas como pragas urbanas neste estudo foram T. melanocephalum, P. longicornis, C. atriceps, M. pharaonis, S. saevissima, C. rengueri, C. sericeiventris, Pheidole spp. e Pogonomyrmex spp., tendo em vista a freqüência, o nível de infestação constatada na área interna e externa dos domicílios e o número de reclamações registradas, no Município de Maringá.
De acordo com o questionário realizado nos 50 pontos de coletas, as espécies que mais incomodam a população gerando reclamações são A. sexdens rubropilosa, A. capiguara, C. sericeiventris, C. atriceps, C. rengueri, T. melanocephalum e M. pharaonis, principalmente, devido aos danos materiais causados em jardins, praças públicas e hortas caseiras pelas formigas cortadeiras (gênero Atta), eletrodomésticos e principalmente em alimentos deixados sobre mesas pelas demais espécies de hábito urbano. Também são motivo de reclamações os agravos à saúde como alergias e mordidas envolvendo C. rengueri e C. sericeiventris e picadas por Pseudomyrmexe Solenopsis. Das 50 pessoas entrevistadas 60% declararam ter algum caso na família ou conhecer alguém com problemas de alergia a picadas de formigas. Acidentes de fundo alérgico com formigas do gênero Solenopsis, envolvendo crianças que precisaram de atendimento médico foram mencionados, alguns inclusive com internamento hospitalar. Os ninhos geralmente estavam localizados nos gramados em quintais onde os acidentes ocorreram. A espécie C. atriceps foi citada como invasora de pavilhão auricular de uma pessoa idosa enquanto dormia ocasionando pânico e labirintite até a retirada da formiga. FIGUEIREDO et al. (2002), relatam que não são incomuns os casos de invasão de dutos auditivos por insetos, entre eles as formigas e outros organismos e que fatores como imobilidade e decúbito, além da proximidade a áreas verdes são relevantes para a invasão.
Levantamentos ou estudos clínicos sobre alergias são escassos na literatura e no Brasil existem poucas clínicas ou profissionais especializados no assunto. Segundo o Centro de Controle de Intoxicações do Hospital Universitário de Maringá é provavelmente o acidente mais sub-notificado, sendo tratado rotineiramente como alergias de origem desconhecida.ESHER et al. (2001) analisaram 138 pacientes com reação alérgica a picadas de himenópteros e citam que em 26,8% dos casos as formigas estavam envolvidas.
Não foram detectados casos de fobias a formigas e de maneira geral elas são bem vistas não despertando sentimentos de aversão ou medo como baratas e aranhas. A população entrevistada mostrou-se pouco informada a respeito dos malefícios causados pelas pragas urbanas, principalmente com relação as formigas que podem ser vetores mecânicos de microrganismos em ambientes residenciais (ZARZUELA et al., 2005), podendo estar implicadas nas epidemiologia das DVAS – Doenças Veiculadas por Alimentos. O perfil epidemiológico das doenças transmitidas por alimentos no Brasil é pouco conhecido e poucos estados e municípios dispõem de estatísticas a este respeito. Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde do Paraná – Instituto de Saúde do Paraná, durante o período de 1978 a 2000, dos surtos alimentares registrados, 50,5% ocorreram nos domicílios.
Pessoas entrevistadas relataram suas frustrações frente ao contínuo fracasso nas tentativas de controle de formigas informando já terem usado diversos tipos de iscas e inseticidas disponíveis no mercado sem sucesso. Relataram que em algumas situações as formigas ignoravam completamente as iscas, principalmente as noturnas como C. atriceps. Tal situação nos leva a suspeitar da eficiência dessas iscas, como constatado por FERNANDES (2000), e também confirma a importância de se identificar a espécie de formiga e se investir em estudos que contemplem a biologia, o comportamento, os hábitos alimentares de cada espécie, pois cada uma tem suas características e requer uma estratégia de controle e iscas específicas (BUENO & CAMPOS-FARINHA, 1999).
Os dados obtidos através do questionário informam que as espécies mais difíceis de se controlar são C. atriceps , T. melanocephalum e P. longicornis.
Foram encontrados produtos para controle de formigas, no comércio local, na forma de aerossóis, pós, iscas granuladas, gel, iscas em blocos, líquidos pronto para uso, líquidos para diluição e gases para fumigação. Todas as formulações líquidas prontas para uso não apresentavam registro no Ministério da Saúde e apresentavam irregularidades de rotulagem sendo que geralmente a comercialização era feita através de telefone celular o que dificulta a fiscalização dos órgãos competentes. Alguns produtos utilizados apresentavam registro no Ministério da Agricultura e uso exclusivamente agrícola.
O método de controle mais utilizado pela população é a aplicação de inseticidas aerossóis, adquiridos facilmente em supermercados, sobre as operárias que circulam no meio externo o que acentua o processo de fragmentação das colônias, levando ao aumento da população de formigas a médio prazo, uma vez que apenas em torno de 10 a 15% da colônia costumam sair para forragear (CAMPOS–FARINHA et al., 1995; BUENO & CAMPOS-FARINHA, 1999).
Segundo CAMPOS-FARINHA et al., (2002), as iscas tóxicas são as mais adequadas para controle químico, uma vez que entra no ciclo alimentar da colônia e tem lenta absorção, porém são muito pouco utilizadas e praticamente desconhecidas pela população. Verificamos que este tipo de isca é muito bem aceito por várias espécies como T. melanocephalum, P. longicornis, P. fulva e quando usados adequadamente são efetivas eliminando rapidamente toda a colônia. O uso inadequado de iscas foi observado como a utilização de iscas para formigas cortadeiras no controle de formigas doceiras ou uso de produtos como óleo diesel, cal em olheiros e trilhas de formigas cortadeiras.
Outro fator que tende a dificultar o controle de formigas são práticas inadequadas de empresas controladoras de pragas, que ignoram a importância do MIP (Manejo Integrado de Pragas), optando pela pulverização de inseticidas indiscriminadamente pelo ambiente, muitas vezes de uso exclusivamente agrícola, não realizando nenhum tipo de monitoramento para identificação de pragas e não orientando quanto ao manejo ambiental adequado. A fiscalização precária dos órgãos competentes, no que tange as práticas dessas empresas controladoras de pragas e dos produtos clandestinos encontrados no comércio, principalmente, por falta de legislações adequadas e recursos humanos capacitados, aliado a falta de programas públicos de Educação em Saúde, na área de controle de pragas urbanas, são fatores que facilitam a dispersão e proliferação de pragas urbanas, entre elas, as formigas.
Hábitos culturais da população em geral e de síndicos de condomínios, que por desconhecimento e preços mais acessíveis utilizam-se serviços de controladores de pragas clandestinos oferecidos de porta em porta, são comuns, resultando muitas vezes em intoxicações e alergias que na maioria das vezes não são denunciadas e constituindo um sério risco a saúde pública e ao meio ambiente.
O padrão de urbanização do Município de Maringá, considerada uma das cidades mais arborizadas do país, favorece a instalação de uma mirmecofauna diversificada, principalmente, de formigas do gênero Camponotus, que tem nessa vegetação um local privilegiado para fixação de seus ninhos principais e a proximidade de ambientes modificados pelo homem propiciando abrigo para ninhos secundários e alimentos. O desconhecimento da importância do manejo ambiental com relação a oferta de abrigo e alimentos associados ao desconhecimento de aspectos importantes como a diversidade de espécies, a biologia, os hábitos, o comportamento, a reprodução e a alimentação das formigas, pela população, propiciam a instalação e proliferação de formigas.
Desta forma a questão da invasão de domicílios por formigas urbanas e outras pragas tende a aumentar em curto prazo, principalmente em função da postura imediatista da população que prefere soluções terceirizadas, milagrosas e rápidas, porém temporárias, que resolvam a questão num passe de mágica, sem participação contínua e esforço das mesmas.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
01 Abr 2021 -
Data do Fascículo
Jan-Mar 2005
Histórico
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Recebido
28 Fev 2005 -
Aceito
29 Mar 2005