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Repensar o futurismo

RESENHAS

Repensar o futurismo

Futurismo da ripensare [Para repensar o futurismo], um pequeno - quase um manifesto - e instigante livro, foi publicado há pouco em Milão, pela Electa, uma das mais importantes editoras de arte da Itália. Nesse livro, Giorgio de Marchis observa que embora se tenha falado muito sobre o futurismo, principalmente, dos anos cinqüenta do século passado até hoje, ainda falta um verdadeiro estudo sobre o que realmente foi este movimento, que é considerado por alguns historiadores e críticos literários como uma das principais correntes artísticas surgidas na Itália do século passado.

Nesse sentido, afirma De Marchis,

Sul futurismo, il diluvio di letteratura prodotto dagli anni cinquanta a oggi non risponde nella sua massima parte a tali caratteristiche, per cui la conoscenza del futurismo non ha fatto molti passi avanti, anzi, a furia di ripetere le stesse inesattezze e di aggiungervi nuove scioccaggini, la confusione è venuta aumentando fino a diventare un sucesso di massa.

Vale lembrar que o futurismo é uma corrente literária de grande ressonância internacional, especialmente na cultura européia, mas que também deixou marcas no Modernismo brasileiro e foi um movimento que colocou novamente a Itália no centro do debate cultural europeu no início do século XX, a ponto de Ezra Pound admitir, depois de anos de uma "leitura limitada" do futurismo, que "Marinetti e o futurismo deram um grande empurrão a toda a literatura européia" e que o movimento que ele (Pound), Eliot e Joyce iniciaram em Londres "não teria existido sem o futurismo".

Não por acaso, às vésperas do centenário do manifesto futurista de 20 de fevereiro de 1909 - muito embora os três artigos que compõem o livro já tenham sido escritos na década de setenta e oitenta do século passado -, Giorgio de Marchis propõe um estudo filológico para a compreensão deste tão importante movimento, que, no âmbito literário, tem como expoentes Marinetti, Palazzeschi, Govoni, Soffici e, no campo das artes plásticas, Boccioni, Carrà e Balla. Note-se que são lembrados aqui alguns dos nomes que impulsionaram as vanguardas européias, entre elas o cubismo, o dadaísmo e o surrealismo.

O estudo filológico a que se refere De Marchis tem como objetivo averiguar e analisar que coisa foi verdadeiramente produzida pelo futurismo; logo, o que foi verdadeiramente o futurismo a partir da "analisi ragionata e sistematica di tutta la documentazione internazionale a stampa sul futurismo italiano e straniero, in tutti i suoi aspetti, pubblicata dal 1909 al 1918, cioè contemporanea al futurismo stesso".

O crítico insiste, de maneira muitas vezes irônica, sobre o fato de que para se estudar o Futurismo como fenômeno histórico "e non come categoria dello spirito"

1. O primeiro futurismo, de 1909 a 1911, como fenômeno exclusivamente italiano, inicialmente literário, mas que rapidamente estende sua poética a outras artes;

2. O futurismo médio, de 1912 a 1915, caracterizado como a época de ouro do movimento, pois ganha contornos transnacionais;

3. O futurismo tardio, de 1916 a 1918, quando o movimento se desagrega.

De Marchis afirma que "I termini cronologici in cui è compreso il futurismo appaiono ancora più chiari se collegati con una periodizzazione del futurismo stesso".

Precisati i termini cronologici del fenomeno e la sua complessità, bisogna chiedersi quali siano i documenti e gli strumenti di metodo da usare per conoscerne le manifestazioni, tracciarne la storia e capire che cosa è stato. I documenti sono le fonti a stampa contemporanee internazionali, e gli strumenti quelli della loro analisi e del loro corretto ordinamento.

Como se percebe, o estudioso propõe ainda que estes três períodos sejam minuciosamente estudados através de documentos publicados na imprensa da época junto com os catálogos de exposições, cartazes de teatro, anúncios e convites de acontecimentos e manifestações variadas, notícias de jornal, fotos etc. Todo esse material, que foi mal e parcialmente usado até agora, é importante para a compreensão do movimento. Para De Marchis, são três os temas que no seu conjunto constituem o futurismo:

1. declarações programáticas futuristas;

2. obras futuristas;

3. comentários e críticas.

Somente com a precisão cronológica na sua complexidade, aliada aos documentos devidamente selecionados e analisados, é que se poderá saber melhor o que exatamente foi produzido pelos futuristas, onde, quando e em qual seqüência. De Marchis observa que:

Avendo come strumento guida le fonti a stampa, è possibile redigere un corpus internazionale di opere e testi futuristi completo, chiaro, ordinato, quale risulta dalle fonti stesse, da cui ricostruire e riscrivere la storia del futurismo che è, come próprio della storia dell'arte, innanzitutto storia di opere.

O autor prossegue no final da primeira parte do livro reafirmando que este trabalho é imenso, mas necessário, por isso:

Bisognerebbe raccogliere e analizzare i documenti relativi al futurismo pubblicati nel período 1909-1918 in tutto il campo internazionale, ordinandoli senza distinzione di nazionalità. In Rússia il lavoro da fare è sterminato, sia per la letteratura sai per lo spettacolo sia per le arti visive, ma c'è molto da cercare e da trovare nell'Europa centrale, e il materiale italiano va completamente riesaminato.

Esta abordagem filológica para compreender o complexo fenômeno do futurismo será também proposta, na segunda parte do livro, como metodologia para pesquisas sobre os originais de Giacomo Balla. A obra futurista deste importante pintor e escultor, que atualmente está sendo homenageado com uma importante mostra em Milão, foi uma das mais afetadas por aquilo que De Marchis chama de pesquisa "rabdomântica", ou seja, acervo de uma crítica de "hipocrisias inúteis":

L'opera futurista di Giacomo Balla è stata tra le più affette dalla ricerca rabdomantica. Infatti, per oltre cinquant'anni a tutt'oggi il numero di opere mai prima sentite nominare e poi scoperte, riconosciute, periziate e avallate sul mercato da critici rabdomanti è incomparabilmente superiore al numero di quelle documentate nelle fonti pur abbondanti ed esaurienti.

A contundente reivindicação de De Marchis em relação ao futurismo tende a ganhar contornos mais precisos, pois já neste ano estão ocorrendo inúmeras manifestações na Itália e fora dela, e no próximo ano, o do centenário de nascimento deste importante movimento, muitas outras manifestações estão sendo programadas, pois não podemos pensar no futurismo sem deixar de lembrar as inúmeras conferências e artigos publicados, o epistolário, os fragmentos de diário, os telegramas, que juntos compõem um vasto material que, ainda que por vezes fragmentário e esparso, merece ser explorado, pois nos fará ter uma idéia mais abrangente deste movimento que serviu de "motor das vanguardas européias".

Para finalizar, o livro apresenta um "Álbum", que é composto de importantes pinturas de Balla, espalhadas por vários acervos como o do Museu de Arte Moderna de Nova York, o da Pinacoteca Giovanni e Marella Agnelli al Lingotto e o da Galeria Nacional de Arte Moderna de Roma.

Andréia Guerini (UFSC)

  • *2 (ASOR ROSA, A. (org.). Literatura Italiana, 2007: 246-247, v. 14.)
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  • *2
    Como se sabe, o futurismo irradiou-se por outros campos, além da literatura, como a pintura, música, escultura, arquitetura, teatro e cinema. Diversos manifestos foram publicados em todos esses setores.
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  • *4
    é necessário limitar cronologicamente o início e fim do movimento. Na realidade, De Marchis sugere um estudo em termos cronológicos, assim dividido:
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    Depois disso, de maneira bastante clara e didática, ele diz:
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Fev 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008
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