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Apresentação do v. 24, n. 1 de Alea. Estudos Neolatinos

Presentation of volume 24, issue 1, of Alea. Estudos Neolatinos

Este número de Alea tem uma importância singular na história da revista. Ele marca nossa efetiva adesão à Ciência Aberta, um movimento que propõe mudanças estruturais na forma como o conhecimento científico é produzido, organizado, compartilhado e reutilizado. É um novo modo de fazer ciência, mais transparente, inclusivo e sustentável. Seu objetivo é privilegiar a natureza colaborativa da pesquisa e democratizar o acesso e uso do conhecimento científico.

Esse novo conceito na produção e divulgação científica modifica muitos aspectos do trabalho editorial. Por essa razão, Alea vem se organizando, desde 2020, para introduzir mudanças no processo de recepção, avaliação e divulgação dos textos, afins com a Ciência Aberta. Fazendo um balanço do trabalho da revista em seus 20 anos de existência e delineando suas perspectivas futuras, os editores já anunciavam no v. 22, n.3, de 2020, a necessária transformação dessas práticas editoriais como caminho imediato para implementar a Ciência Aberta (GONZÁLEZ; LABRIOLA, 2020PALMERO GONZÁLEZ, Elena; LABRIOLA, Rodrigo. Percursos de una revista brasileira no mundo dos estudos neolatinos. Alea, v. 22, n. 3, p. 309-333, set./dez. 2020. ). Hoje podemos dizer que a revista está em condições de aderir a esse movimento, desenvolvendo práticas de abertura, suscetíveis sempre de serem ampliadas e aperfeiçoadas nos próximos anos. Cabe destacar nesse processo o incentivo permanente da SciELO (Scientific Electronic Library Online), assim como todo seu apoio em termos de infraestrutura.

Entrar na dinâmica de Ciência Aberta requer mudanças na cultura científica da comunidade acadêmica, porque supõe transformar metodologias e, sobretudo, concepções sobre a divulgação dos resultados científicos. Para promover essas abordagens inovadoras de abertura da pesquisa científica em nível mundial, a UNESCO, reunida em sua 41ª sessão, em novembro de 2021, elaborou um documento com Recomendações sobre Ciência Aberta1 1 Refiro-me à Recomendação da UNESCO sobre Ciência Aberta, disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000379949_por , que refere entre suas ações:

(a) promover a Ciência Aberta desde o início do processo de investigação e alargar os princípios de abertura a todas as fases do processo científico incluindo o incentivo de pré-impressões, claramente distintas das publicações finais revisadas por pares, a fim de acelerar a disseminação e encorajar o rápido crescimento no conhecimento científico;

(b) promover, conforme apropriado, práticas de avaliação de revisão por pares, incluindo possível divulgação da identidade dos revisores publicamente disponíveis e das avaliações e possibilitando que uma comunidade mais ampla forneça comentários e participe do processo de avaliação;

(c) encorajar e valorizar a publicação e o compartilhamento de resultados e de dados científicos negativos;

(d) desenvolver novos métodos participativos e técnicas de validação para incorporar e valorizar contribuições de atores sociais, além da comunidade científica tradicional, inclusive por meio da ciência cidadã, projetos científicos baseados em crowdsource, envolvimento do cidadão em instituições arquivísticas pertencentes à comunidade e outras formas de ciência participativa;

(e) desenvolver estratégias participativas para identificar as necessidades das comunidades marginalizadas e destacar questões socialmente relevantes a serem incorporadas nas agendas de pesquisa de CTI;

(f) desenvolver estratégias que facilitem o depósito de dados em arquivos, a fim de promover sua curadoria e preservação, fazendo-os utilizáveis e reutilizáveis pelo período de tempo apropriado;

(g) promover o desenvolvimento de infraestruturas partilhadas de coleta, preservação e acesso convivial ao software livre e ao código-fonte;

(h) apoiar cientistas e outros atores sociais na acumulação e no uso de recursos de dados abertos em um modo transdisciplinar para maximizar os benefícios científicos, sociais, econômicos e culturais e estimular a criação de espaços disciplinares híbridos onde cientistas de diferentes disciplinas interajam com desenvolvedores de software, codificadores, criativos, inovadores, engenheiros, artistas, etc.;

(i) incentivar a partilha, promover a interoperabilidade e melhorar o acesso aberto a infraestruturas de investigação em grande escala, como infraestruturas internacionais em física, astronomia e ciências espaciais, bem como infraestruturas colaborativas em outros campos, como ciências da saúde e sociais, entre outros;

(j) promover práticas de inovação aberta que conectem as práticas da Ciência Aberta a uma tradução e a um desenvolvimento mais rápidos de suas descobertas. Como a Ciência, a inovação aberta pressupõe um envolvimento amplo e eficaz e participação no processo de inovação, bem como a descoberta e o desenvolvimento de um modelo de negócios para a comercialização efetiva de novos conhecimentos.

Essas ações, focadas neste caso em uma agenda internacional, dada a abrangência mundial da UNESCO, destacam um caminho já transitado no nível regional e nacional há mais de uma década. O Brasil tem um sólido compromisso com a Ciência Aberta dentro do Plano de Ação Nacional em Governo Aberto2 2 Ver o 4º Plano de Ação Nacional (2018-2019) que inclui como compromisso estabelecer mecanismos de governança para a divulgação de dados científicos no Brasil (https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/planos-de-acao/4o-plano-de-acao-brasileiro/4-plan-acao-nacional-atualizado2020.pdf) e o 5º Plano de Ação Nacional (2021) (https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/planos-de-acao/5o-plano-de-acao-brasileiro/5-plano-acao-nacional-30-03-2022.pdf), que já estabelece em seu Compromisso nº 8 a construção de um modelo de avaliação que fomente o avanço da Ciência Aberta no Brasil. e os órgãos de fomento à pesquisa participam desse plano de ação nacional. CAPES, CNPq, assim como diversas fundações estaduais de amparo à pesquisa, defendem a ideia de que os resultados científicos financiados por verbas públicas são um bem público e como tal devem ser disseminados em larga escala (resguardados, obviamente, os aspectos éticos, de privacidade, segurança e relativos à proteção de propriedade intelectual).

SciELO, por sua parte, vem orientando os periódicos de sua coleção desde 2014 para aderirem à Ciência Aberta, traçando em 2020, como meta, que todos os periódicos indexados nessa biblioteca eletrônica atualizem suas políticas editoriais para que estejam alinhadas às práticas da Ciência Aberta até 2023. Esse esforço visa fortalecer a colaboração e a partilha como essência da pesquisa científica; maximizar a transparência em todo o processo editorial e democratizar o conhecimento científico e os mecanismos de participação de atores sociais no empreendimento científico.

Nessa direção nosso periódico mostra sua adesão a Ciência Aberta através de um conjunto de ações que descrevemos a seguir.

Acesso aberto, dados abertos e fontes abertas

Alea é uma publicação de acesso aberto, isso já era um traço caracterizador da revista, porém, investimos agora na abertura de dados. Os autores podem disponibilizar seus trabalhos em repositórios ao mesmo tempo (antes, inclusive) em que submetem seus textos à avaliação por pares na revista. A divulgação do texto em preprint não invalida a originalidade do trabalho. Packer, Santos e Meneghini em “SciELO Preprints a caminho” (2017PACKER, Abel; SANTOS, Solange; MENEGHINI Rogerio. SciELO Preprints a caminho. In: SciELO em Perspectiva. [S. l.], 22 fev. 2017. Disponível em: Disponível em: https://blog.scielo.org/blog/2017/02/22/scielo-preprints-a-caminho/#.YjFbbrhv-qA . Acesso em: 14 mar. 2022.
https://blog.scielo.org/blog/2017/02/22/...
) traduzem ao português uma definição de preprint, tomada da página Preprint info center do website da ASAPbio:

Um preprint é um manuscrito científico completo que é depositado pelos autores em um servidor público. O preprint contém dados e metodologias completos; é frequentemente o mesmo manuscrito que está sendo submetido a um periódico (…). Depois de uma breve inspeção de controle de qualidade para garantir que o trabalho é de natureza científica, o manuscrito do autor é publicado na Web dentro de aproximadamente um dia sem passar por avaliação pelos pares e pode ser visualizado gratuitamente por qualquer pessoa no mundo. Com base no feedback e/ou novos dados, novas versões do seu preprint podem ser submetidas; no entanto, versões anteriores do preprint também são mantidas. Os servidores de preprint permitem que os cientistas controlem diretamente a disseminação de seu trabalho na comunidade científica mundial. Na maioria dos casos, o mesmo trabalho publicado como preprint também é submetido para avaliação por pares em um periódico. Assim, os preprints (rápidos, mas não validados através de peer review) e a publicação de periódicos (lentos, mas validados por meio de peer-review) funcionam em paralelo como um sistema de comunicação para a pesquisa científica” (2007, s/pPACKER, Abel; SANTOS, Solange; MENEGHINI Rogerio. SciELO Preprints a caminho. In: SciELO em Perspectiva. [S. l.], 22 fev. 2017. Disponível em: Disponível em: https://blog.scielo.org/blog/2017/02/22/scielo-preprints-a-caminho/#.YjFbbrhv-qA . Acesso em: 14 mar. 2022.
https://blog.scielo.org/blog/2017/02/22/...
).

Em sintonia com essa prática de Ciência Aberta, Alea receberá trabalhos depositados no servidor Preprint de SciELO. Na submissão do artigo o autor deverá informar se o texto está depositado nesse repositório, não sendo obrigatório que os artigos submetidos tenham necessariamente que estar disponíveis em preprint para serem avaliados e publicados em nossa revista.

Abertura do processo avaliativo

SciELO propõe três formas de abertura do processo avaliativo nas revistas de sua coleção: a publicação do nome dos editores responsáveis que emitiram o Parecer Final; a possibilidade dos pareceristas dialogarem diretamente com o autor correspondente, com abertura ou não das identidades; e a opção de publicar os pareceres de aprovação de artigos com ou sem a identificação dos pareceristas.

Alea decidiu optar pelas duas primeiras, sendo que mantemos o anonimato dos avaliadores (somente nos casos que os avaliadores o indiquem, disponibilizamos seus nomes, nesse sentido, no formulário do avaliador é solicitado que este declare se prefere manter o anonimato ou não). Já no presente número, como Editores, gerenciamos o diálogo entre autores e avaliadores no caso de textos que receberam recomendações de correção. O procedimento foi optativo, de ambas as partes, e não revelamos a identidade dos avaliadores, os Editores fizeram mediação sempre por meio de diálogo, sem necessidade de contato direto entre eles. No final desse processo, procedemos com um Parecer Final e publicamos os nomes dos Editores responsáveis por sua emissão.

Declaração de autoria e compromisso com a Ciência Aberta

A partir deste número, os autores passam a declarar o grau de participação que tiveram em todas as etapas do trabalho 1) Concepção, projeto, pesquisa bibliográfica, análise e interpretação dos dados; 2) Redação e revisão do manuscrito; 3) Aprovação da versão final do manuscrito para publicação. Da mesma maneira, devem declarar sua responsabilidade por todos os aspectos do trabalho, garantindo a originalidade e integridade de qualquer uma de suas partes. Solicitamos também, no momento da submissão, a assinatura do Compromisso com a Ciência Aberta. Nesse momento, o autor deve declarar se o artigo está como preprint no repositório de Scielo, sendo encorajado a abrir todos os dados de sua pesquisa. Nesse momento também se oferece a possibilidade de um diálogo, mediado pelos Editores, com os avaliadores.

Essas transformações geraram mudanças no site da revista e na plataforma de submissão. Na apresentação de Alea, no seu site, houve alterações no Escopo; no Corpo editorial e nas Diretrizes para os autores. Já na plataforma, fizemos mudanças no Formulário de submissão; no Formulário de avaliação; nas Instruções aos avaliadores e incluímos o Formulário de conformidade dos autores com a Ciência Aberta.

Houve também algumas intervenções no formato dos textos, com a inclusão de dois novos dados, a Declaração dos autores sobre o grau de participação na pesquisa, assim como sua responsabilidade pela integridade das informações veiculadas no texto e a Declaração dos editores que aprovaram o artigo para publicação.

Esperamos que esses sejam somente os primeiros passos de Alea com vistas à abertura total propugnada pela Ciência Aberta. O caminho para chegar a esse momento será longo, porque precisamos criar uma tradição de trabalho nesse espírito colaborativo e de partilha. Por enquanto, fica um conjunto de ações e toda nossa vontade de transformar nossa revista em um instigante espaço de debate e de criação coletiva.

Os artigos que compõem o sumário do número transitam por temas muito variados, atendendo à natureza da chamada, que foi de Tema Livre. Ainda assim, é possível propor uma linha de leitura que aproxime o leitor a certos sistemas literários: os cinco primeiros artigos estão focados no sistema da literatura francesa; os oito seguintes discutem temas da literatura brasileira; na sequência, um texto se aproxima ao universo da literatura portuguesa e outro ao da literatura cubana. Fechando a seção, podemos ler um estudo das traduções da micronarrativa Prometheus, de Franz Kafka, na versão francesa e nas traduções ao português, ao italiano e ao espanhol.

Na seção Tradução, contamos com um excelente trabalho de tradução de oito poemas do livro Poemas póstumos (1968), de Jaime Gil de Biedma, acompanhado de uma breve apresentação, como é de praxe na seção. Aproveitamos para agradecer à Agência Carmen Balcells S.A, que gerencia os direitos autorais de Jaime Gil de Biedma, pela autorização para traduzir e publicar os textos em Alea. Da mesma maneira, agradecemos a Saturnino Valladares, pela tramitação da autorização e por prestigiar nossa revista com a tradução do grande poeta espanhol.

A última seção do número reúne três resenhas. A primeira apresenta o livro organizado por Viviana Gelado e Rodrigo Labriola, Traducción, archivos, políticas (2019), publicado pela Editora 7Letras, do Rio de Janeiro. A segunda foca seu interesse no livro Sena & Sophia: centenários (2020), reunindo estudos da obra dos poetas portugueses Jorge de Sena e de Sophia de Mello Breyner Andresen. O volume foi organizado por Gilda Santos, Luci Ruas e Teresa Cristina Cerdeira e publicado pela editora do Rio de Janeiro Bazar do Tempo. A última resenha está dedicada a Les frères Goncourt: Hommes de lettres (2020), que reúne o trabalho de pesquisa biográfica desenvolvido por Jean-Louis Cabanès e Pierre-Jean Dufief durante anos, sob a chancela da editora parisiense Fayard.

Colaboraram nesse volume de Alea professores de diversas universidades brasileiras e estrangeiras. Do Brasil recebemos colaborações de professores e de pesquisadores das seguintes instituições: Universidade Federal de Goiás, Universidade do Estado de Rio de Janeiro, Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade de São Paulo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade do Sul de Santa Catarina, Universidade de Brasília, Universidade Federal da Integração Latino Americana, Universidade Católica Dom Bosco, Universidade Federal do Ceará, Universidade Estadual Paulista e Universidade Federal do Amazonas. Procedentes de intuições estrangeiras colaboraram professores e pesquisadores da Université Vasile Alecsandri (Romênia); Université de Haïfa (Israël), Universidade de Lorraine (França), Universidad Nacional de Córdoba (Argentina), Universidad de la República (Uruguay) e da Universidad de Buenos Aires (Argentina).

Agradecemos a participação de todos os colaboradores, e aos nossos leitores, como sempre, desejamos uma agradável leitura.

Referências

  • PACKER, Abel; SANTOS, Solange; MENEGHINI Rogerio. SciELO Preprints a caminho. In: SciELO em Perspectiva [S. l.], 22 fev. 2017. Disponível em: Disponível em: https://blog.scielo.org/blog/2017/02/22/scielo-preprints-a-caminho/#.YjFbbrhv-qA Acesso em: 14 mar. 2022.
    » https://blog.scielo.org/blog/2017/02/22/scielo-preprints-a-caminho/#.YjFbbrhv-qA
  • PALMERO GONZÁLEZ, Elena; LABRIOLA, Rodrigo. Percursos de una revista brasileira no mundo dos estudos neolatinos. Alea, v. 22, n. 3, p. 309-333, set./dez. 2020.
  • UNESCO. Recomendação da UNESCO sobre Ciência Aberta. UNESDOC Digital Library, 2022. Disponível: Disponível: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000379949_por Acesso em: 14 mar. 2022.
    » https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000379949_por
  • 1
    Refiro-me à Recomendação da UNESCOUNESCO. Recomendação da UNESCO sobre Ciência Aberta. UNESDOC Digital Library, 2022. Disponível: Disponível: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000379949_por . Acesso em: 14 mar. 2022.
    https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf...
    sobre Ciência Aberta, disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000379949_por
  • 2
    Ver o 4º Plano de Ação Nacional (2018-2019) que inclui como compromisso estabelecer mecanismos de governança para a divulgação de dados científicos no Brasil (https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/planos-de-acao/4o-plano-de-acao-brasileiro/4-plan-acao-nacional-atualizado2020.pdf) e o 5º Plano de Ação Nacional (2021) (https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/planos-de-acao/5o-plano-de-acao-brasileiro/5-plano-acao-nacional-30-03-2022.pdf), que já estabelece em seu Compromisso nº 8 a construção de um modelo de avaliação que fomente o avanço da Ciência Aberta no Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022
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