Acessibilidade / Reportar erro

Últimos poemas na terra

Last Poems on Earth

Resumo:

Com foco em diferentes modos de pensar o porvir e o fim, este trabalho analisa a mudança de escala em despedidas que ganharam forma em certa produção cultural recente. Partindo de poemas de Roberto Bolaño e do filme Melancholia de Lars von Trier, o artigo sugere que a atenção renovada à finitude e à mortalidade teve efeitos variados sobre a experiência temporal, levando a reações que vão da apreciação da lentidão à vontade de aceleração, incluindo a incitação à destruição. Há ainda, ao longo do trabalho, uma consideração da persistência de antagonismos de diferentes tipos no interior da experiência de antecipação da catástrofe, por mais que muitas representações culturais prefiram imaginar a ameaça como generalizada. Ao final, antes de terminar, revisita-se o problema do fim do poema.

Palavras-chave:
Roberto Bolaño, Melancholia, fim do mundo, aceleração; despedida.

Abstract:

Focusing on different ways of thinking about the future and the end, this paper examines changes in the scale of the farewells taking shape in recent cultural productions. In readings of poems by Roberto Bolaño and the film Melancholia by Lars von Trier, this article suggests that renewed attention to finitude and mortality has had varied effects on temporal experience, with reactions ranging from the pursuit of slowness to the desire for the acceleration of time, including the instigation of destruction. The paper also reflects on the persistence of antagonisms of different sorts within the experience of the anticipation of catastrophe, even as cultural representations tend to stress the generality of the threat. Finally, the paper revisits the question about the problem of the end of the poem.

Keywords:
Roberto Bolaño; Melancholia; end of the world; acceleration; farewell.

Resumen:

Centrándose en las diferentes maneras de pensar el futuro y el fin, este trabajo se centra en el cambio de escala en las despedidas que ganaron forma en la producción cultural reciente. A partir de poemas de Roberto Bolaño y de la película Melancolía de Lars von Trier, el texto sugiere que la atención renovada a la finitud y la mortalidad tiene efectos variados sobre la experiencia temporal, llevando a reacciones que van de la búsqueda de un aprendizaje de la lentitud hasta el deseo de aceleración del tiempo, incluyendo la incitación a la destrucción. A lo largo del trabajo, también se aprecia la persistencia de antagonismos de diferentes tipos dentro de la experiencia de anticipación de la catástrofe, aunque representaciones culturales prefieran destacar las generalidades de esa amenaza. Al final, antes de terminar, se regresa a la pregunta sobre el fin del poema.

Palabras clave:
Roberto Bolaño; Melancolía; fin del mundo; aceleración; despedida.

Aprendió a soportarLa lentitudDe los atardeceres humanosSu insoportable hedor Roberto Bolaño [Aprendeu a aguentar A lentidão Dos entardeceres humanos Seu insuportável fedor]1 1 A não ser quando um tradutor é identificado, as citações em outro idioma foram traduzidas pelo autor.

A esperança é que a epígrafe, solta ali no início da primeira página, seja capaz de diminuir o escândalo que é, sempre, começar. É como se aquelas linhas, destacadas do corpo do texto, pudessem abrandar o risco presente no ato de interromper o silêncio para, enfim, começar. Com a epígrafe, em vez de tomar a palavra, é você quem é tomado por elas, que chegam de um lugar impreciso, além ou aquém do começo. Recorda-se, assim, que

uma voz sem nome me precedia há muito tempo: bastaria, então, que eu encadeasse, prosseguisse a frase, me alojasse, sem ser percebido, em seus interstícios, como se ela me houvesse dado um sinal, mantendo-se, por um instante, suspensa. Não haveria, portanto, começo; e em vez de ser aquele de quem parte o discurso, eu seria, antes, ao acaso de seu desenrolar, uma estreita lacuna, o ponto de seu desaparecimento possível. (FOUCAULT, 1999FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. Trad. Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, 1999., p. 5-6).

É assim que Michel Foucault começa sua aula inaugural no Collège de France no dia 2 de dezembro de 1970, propondo uma definição delicada do que seria a leitura, do que seria a escrita: o ato de alojar-se discretamente nos interstícios da voz de outro. “Gostaria”, continua ele,

de ter atrás de mim (tendo tomado a palavra há muito tempo, duplicando de antemão tudo o que vou dizer) uma voz que dissesse: “É preciso continuar, eu não posso continuar, é preciso continuar, é preciso pronunciar palavras enquanto as há, é preciso dizê-las até que elas me encontrem, até que me digam - estranho castigo, estranha falta, é preciso continuar, talvez já tenha acontecido, talvez já me tenham dito, talvez me tenham levado ao limiar de minha história.”2 2 Há uma leitura desses trechos do livro de Foucault em Maria Carolina da Silva Rosa (2017, p. 19). (FOUCAULT, 1999FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. Trad. Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, 1999., p. 6).

Foucault cita e coloca entre aspas uma outra voz, essa que ele diz desejar que já existisse, para então nela se alojar. Não há, portanto, que começar, pois o que se encontra no início é um discurso que já estava em movimento, uma frase cujo desenrolar algo acidental será preciso simplesmente acompanhar.

Muitas vezes, ao começar, Roberto Bolaño insistia que aquilo que estava prestes a fazer não seria o que parecia - “parece mala literatura para enamorados, pero [...]” (“parece má literatura para apaixonados, mas [...]”) (BOLAÑO, 2002BOLAÑO, Roberto. Amberes. Barcelona: Anagrama , 2002., p. 49) - a conjunção adversativa abrindo uma brecha na página. Em prosa e verso, trechos semelhantes de Bolaño trarão desde o início advertências desse tipo, sugerindo que haverá, na continuação, um aspecto enganoso, que o texto poderá ter a aparência de uma história de terror, um melodrama ou um texto sentimental. O andamento discursivo é desse modo diferente da negação ou da repressão; sem que seja anulado o aspecto destacado, lhe é acrescentado, após a conjunção adversativa, mais um elemento, que a partir de então terá que conviver com o primeiro, num processo de acumulação. Também não se trata de um desvelamento, propriamente, com o tempo revelando uma verdade além da aparência. Assim, no final do conto “Uma aventura literária”, por exemplo, o narrador observa que pessoas num parque “à primeira vista dão a impressão de movimento”. Parece tudo montado para o posterior desvendamento da verdade por trás da fachada ilusória, a construção sintática sugerindo que em seguida se descobrirá o que de fato acontecia no parque, algo que se tornara visível apenas após a superação da falsa impressão inicial e a apreciação mais cuidadosa da cena. Mas esse será apenas o primeiro de uma série de movimentos no trecho, com uma sequência de adiamentos da revelação do sentido: “quando acorda, o parque está cheio de mendigos e drogados que, à primeira vista, dão a impressão de movimento, mas que, na realidade, não se mexem, embora também não se possa afirmar com propriedade que estão imóveis” (BOLAÑO, 2012BOLAÑO, Roberto. Chamadas telefônicas. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. , p. 64). Nem isso, nem aquilo, portanto. Como o relato que precisa primeiro reconhecer a própria proximidade com o melodrama para então prosseguir por um percurso que não lhe é equivalente, o que se aponta é uma limitação na língua, que parece exigir a escolha: afinal, é isto ou aquilo?

* * *

A citação de versos em meio à prosa costuma gerar frases explicativas, esclarecimentos do que estaria oculto nas construções enigmáticas. É menos comum que o procedimento seja esse - o da explicação - quando se trata de uma epígrafe. Permite-se a ela com maior frequência permanecer ali, enigmática, dispensando a elucidação, às vezes sem menção no corpo do texto, como se flutuasse acima das considerações desenvolvidas ao longo da escrita crítica ou filosófica. De uma maneira ou de outra, com ou sem o comentário posterior, a aparição de versos sempre aponta para a existência de outra forma de estar no mundo, num gesto com o potencial de balançar a autoridade do regime discursivo da explicação. Ocasionalmente, serve também como estímulo para que o próprio texto crítico se permita falar de outra maneira, inventando uma forma que, ainda que não prescinda da explicação (não se trata de imaginar um texto purificado da explicação, algo difícil até de imaginar), não se limite a ela e a suas demandas monolíngues. Pode, por exemplo, servir para autorizar que, como resposta aos versos que mencionam um aprendizado, uma lição da lentidão diante dos entardeceres, apareçam outros versos (no centro do poema há outro poema), versos como esses, de La Universidad Desconocida:

Buenas noches córnea buenas nochesuñas negras buenas noches muñecasbuenas noches cuello mordido buenasnoches ano buenas noches nariz rojade frío buenas noches estómago peludobuenas noches líneas de la manobuenas noches rodillas buenas nochesmandalas ocultos buenas noches vergabuenas noches hombros huesudos buenasnoches ombligo perfecto buenas nochesdientes buenas noches lóbulosbuenas noches fuego oblicuo de lacintura buenas noches nu(n)ca. (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 143)

[Boa noite córnea boa noite unhas pretas boa noite pulsos boa noite pescoço mordido boa noite ânus boa noite nariz vermelho de frio boa noite estômago peludo boa noite linhas da mão boa noite joelhos boa noite mandalas ocultas boa noite pau boa noite ombros ossudos boa noite umbigo perfeito boa noite dentes boa noite lóbulos boa noite fogo oblíquo da cintura boa noite nu(n)ca.]

Difícil saber se há nesses versos alguma lição, se o que se manifesta no poema é o resultado de algum aprendizado. O que parece certo, no entanto, é que estamos no gênero da despedida, ainda que seja uma despedida difícil de situar: a quem se dirige, a outro, a si mesmo? Se for o segundo, que sentido haveria numa despedida de si? Quem poderia ser o sujeito desse adeus? O que se sabe é que, ao anoitecer, uma voz se despede de um corpo, ou de partes dele, que não está claro se estaria certo chamar de “seu”, chegando, no final, simultaneamente à nuca e ao nunca, no que é também o fim do poema. No caso deste texto, também se trata de tentar chegar ao fim do poema, pensando a relação entre a epígrafe e o epílogo; e de buscar no poema auxílio para pensar o fim - o seu, mas também o do mundo.

* * *

Compostos, em sua maioria, nos anos 1970 e 1980, os poemas de Bolaño são atravessados pela questão do adeus: o adeus ao Chile, aos amigos, ao México, à esperança nos processos pós-ditatoriais de redemocratização, à vida.3 3 Sobre a poesia de Bolaño, ver PINHEIRO, 2016, p. 100-120 e DAMASCENO, 2019. O adeus que receberia maior atenção, no entanto, reproduzido em textos críticos e servindo muitas vezes como chave de leitura de toda a obra do autor, é o que aparece no texto conhecido como “Discurso de Caracas”, redigido para ser lido na ocasião da entrega do prêmio Rómulo Gallegos em 1999:

todo lo que he escrito es una carta de amor o de despedida a mi propia generación, los que nacimos en la década del cincuenta y los que escogimos en un momento dado el ejercicio de la milicia, en este caso sería más correcto decir la militancia, y entregamos lo poco que teníamos, lo mucho que teníamos, que era nuestra juventud, a una causa que creímos la más generosa de las causas del mundo y que en cierta forma lo era, pero que en la realidad no lo era. […] luchamos por partidos que de haber vencido nos habrían enviado de inmediato a un campo de trabajos forzados, luchamos y pusimos toda nuestra generosidad en un ideal que hacía más de cincuenta años que estaba muerto, y algunos lo sabíamos […] (BOLAÑO, 2005BOLAÑO, Roberto. Discurso de Caracas. In: Entre paréntesis. Barcelona: Anagrama, 2005., p. 37)4 4 Tudo o que escrevi é uma carta de amor ou de despedida à minha própria geração, aos que nascemos na década de 50 e aos que preferimos em algum momento o exercício da milícia, neste caso seria mais correto dizer a militância, e entregamos o pouco que tínhamos, o muito que tínhamos, que era nossa juventude, a uma causa que acreditamos ser a causa mais generosa do mundo e que de certa forma era mesmo, mas que na verdade não era. [...] lutamos por partidos que caso vencessem nos teriam mandado imediatamente a um campo de trabalhos forçados, lutamos e depositamos toda a nossa generosidade num ideal que fazia mais de 50 anos que estava morto, e alguns de nós já sabíamos [...].

Lendo o discurso 20 anos depois de sua redação, impressiona a mudança na escala das despedidas que parecem estar em questão agora. Num cenário em que os destinatários são a espécie, a existência humana e inumana ou o planeta, talvez até a ideia de escala se mostre insuficiente, pois a noção de extinção inclui não apenas a morte massiva, mas o esgotamento da própria possibilidade de continuar a morrer. É com essas preocupações que volto a ler Bolaño, estranhando-o a partir de um presente caracterizado pelo declínio da confiança na imortalidade da humanidade e do planeta que ela ocupa. Interessa menos, aqui, encontrar em Bolaño uma profecia ou antecipação do estado atual, incluindo sua acelerada temporalidade catastrófica, e mais tentar justapor os marcos temporais desses períodos históricos.5 5 Não que os elementos proféticos não tenham também seu interesse. Considere-se, por exemplo, a insistência de Bolaño, ao longo desses anos, que são também os da redemocratização de alguns países do continente, na persistência do fascismo. No poema “Reencuentro”, enquanto dois jovens poetas, nus e deitados na cama de um quarto, entrelaçam seus corpos, do outro lado da porta uma voz sussurra: “el fascismo, el fascismo...” (“o fascismo, o fascismo...”), para depois insistir: “el fascismo, un fascismo extraño, ciertamente, un fascismo casi translúcido” (“o fascismo, um fascismo estranho, certamente um fascismo quase translúcido”), mas ainda assim um fascismo (BOLAÑO, 2007, p. 403-404).

Seja como for, o adeus, como gênero, é a instauração de uma temporalidade complexa que depende, em primeiro lugar, do reconhecimento de que se está diante de um outro cuja presença é caracterizada pela fragilidade, precariedade e finitude; uma presença, nesse sentido, cujo fundamento é justamente a possibilidade de vir a estar ausente, o que significa também que se trata de uma presença de certo modo já ausente, já espectral (o espectro sendo aquele que não acaba de se despedir.) Dada essa percepção de finitude, toda fala, toda conversa, é potencialmente uma despedida, a vivência intensa de uma experiência que precisa ser entendida como, possivelmente, a última do seu tipo.

O instante em que eu me despeço é também aquele em que o outro se despede de mim. É como se o verbo só pudesse ser conjugado no plural: despedimo-nos, sendo necessário que a despedida seja de algum modo acordada. O Molloy de Beckett começa dizendo: “eu gostaria agora de falar das coisas que me restam, me despedir, terminar de morrer. Eles não querem” (BECKETT, 2014BECKETT, Samuel. Molloy. Trad. Ana Helena Souza. 2a. ed. São Paulo: Editora Globo, 2014., p. 17). É preciso que o outro também queira, que aceite que estamos nos despedindo, que reconheça o aspecto comum da experiência, que não é outra coisa senão a experiência do fim do mais que um, o fim de um nós.

Derrida contava que sua amizade com Emmanuel Lévinas estava baseada no reconhecimento mútuo de que, um dia, um dos dois estaria falando no velório do outro. Com um detalhe decisivo, lembrado por Derrida em seu Adeus a Lévinas, texto escrito quando lhe coube falar na ocasião da morte do amigo. Para Lévinas, “A saudação do a-Deus não significa o fim”, escreve Derrida, para então recuperar os restos das palavras do outro: “‘O a-Deus não é uma finalidade’, diz ele ao recusar essa ‘alternativa do ser e do nada’ que ‘não é a última’. O a-Deus saúda o outro para além do ser, naquilo ‘que significa, para além do ser, a palavra glória’” (DERRIDA, 2004DERRIDA, Jacques. Adeus a Emmanuel Lévinas. Trad. Fábio Landa. São Paulo, Perspectiva, 2004., p. 30).

No livro Dying for Time, do filósofo Martin Hägglund, e em texto da crítica Audrey Wasser em diálogo com Hägglund, propõe-se que o reconhecimento da precariedade da vida, da vulnerabilidade da existência, da vida como finita, seria responsável pela geração do desejo pela vida - isto é, por tudo aquilo que Sócrates, na República de Platão, denuncia em Homero, instaurando a distinção fundadora entre poesia e filosofia. Enquanto a poesia estimularia o desejo por uma vida que sempre pode se perder, a tarefa da filosofia, para Sócrates, deveria ser converter o desejo pelo mortal em desejo pelo imortal, isto é, por aquilo que não poderia se perder (HÄGGLUND, 2012HÄGGLUND, Martin. Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov. Cambridge: Harvard University Press, 2012., p. 1-2). Hägglund observa ainda que, embora a censura à poesia feita por Platão tenha sido submetida a séculos de críticas, defesas tradicionais da poesia não costumam destacar a relação, intuída por Platão, entre o poder da experiência estética e o apego à mortalidade. Ao contrário, elogios convencionais à literatura tendem a apontar sinais de eternidade nas epifanias da experiência artística (HÄGGLUND, 2012HÄGGLUND, Martin. Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov. Cambridge: Harvard University Press, 2012., p. 19; WASSER, 2014WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014., p. E464-E467).

Dying for Time irá argumentar que uma experiência temporal em que o mais característico é a passagem do tempo - isto é, o fato de que um momento é seguido de outro - seria condição para a constituição do desejo, em vez de uma falta ontológica ou a crença num ideal platônico. Nós não desejamos apesar da ameaça do tempo, acrescenta Wasser, mas por causa dele: desejar é temer a perda de alguma coisa, junto à esperança de adiar a sua desaparição (WASSER, 2014WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014., p. E465). Hägglund propõe que é esse aspecto, que ele denominará “cronolibido”, que torna possível o desejo. É porque o objeto (assim como o sujeito) tem, desde o início, uma existência temporal, e vive enquanto possibilidade de deixar de viver, que há desejo. É porque todo momento, não sendo indivisível, e não sendo, portanto, igual a si mesmo, dá lugar a outro que é possível chegar a desejar o que quer que seja. Assim, viver como se já não se vivesse mais faz sentido, porque em alguma medida é verdade que a morte já ocorreu. Não seria, em última instância, possível que ela chegasse se um momento particular qualquer estivesse plenamente e inteiramente vivo, se ele não estivesse já habitado pela morte. Mesmo num momento de plenitude, o instante já começa a deixar de ser, abrindo-se, portanto, à experiência da perda. A “cronolibido atribui essa característica à estrutura diferencial do tempo, e não a uma lacuna no ser. Além disso, a cronolibido descreve não apenas a estrutura do desejo, mas o vínculo afetivo com a vida temporal, argumentando que estamos constitutivamente investidos em nossa própria sobrevivência” (WASSER, 2014WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014., p. E465).

O máximo a que podemos aspirar é então que a despedida ainda não seja a última, e que possamos voltar a nos despedir, nesta “vida frágil e perecível” na qual sobrevive nosso apego aos objetos perecíveis que preenchem a existência (WASSER, 2014WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014., p. E464). Uma pluralização do fim, então: entardeceres, como aparece em versos de Bolaño e no título de um conto, os “Últimos entardeceres na terra”, nos quais a esperança parece ser a de que ocorra ainda outra despedida, depois desta; que esta tenha sido apenas a penúltima e que este seja apenas o instante antes da extinção, que seria, aí sim, o fim do fim. Para saber o momento de dizer adeus é preciso conseguir enxergar ao mesmo tempo a presença e a ausência, enxergar a forma do tempo, com o contraste entre o que sobrevive e o que se extingue no momento em que os dois movimentos estão acontecendo (WASSER, 2014WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014., p. E466).

Em “Encontro com Enrique Lihn”, um narrador chamado Roberto Bolaño conhece, finalmente, o escritor Enrique Lihn, tão admirado por ele, mas sabendo que o outro já está morto. “O coração não funciona mais [...]. Meu coração não existe mais”, diz Lihn (BOLAÑO, 2008BOLAÑO, Roberto. Putas Assassinas. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo, Companhia das Letras, 2008. , p. 215-216), para então observar que:

foi bonito enquanto durou, e: embora você não acredite, Bolaño, preste atenção, neste bairro só os mortos saem para passear. A essa altura nós dois já tínhamos atravessado o bar e estávamos numa janela, olhando as ruas e as fachadas desse bairro tão peculiar onde só os mortos passeavam. Olhávamos, olhávamos, e as fachadas eram sem sombra de dúvida fachadas de outros tempos, e também as calçadas, onde havia carros estacionados que pertenciam a outro tempo, um tempo silencioso mas móvel (Lihn o via mover-se), um tempo atroz que seguia vivendo sem nenhuma razão, só por inércia (BOLAÑO, 2008BOLAÑO, Roberto. Putas Assassinas. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo, Companhia das Letras, 2008. , p. 219).

* * *

Que as coisas acabam, que também isto vai chegar ao fim (este texto, esta vida), não é propriamente uma novidade. Isso nós já sabíamos, a mortalidade e a finitude não sendo uma descoberta recente. Até “a finitude empírica da espécie”, como escreveram Eduardo Viveiros de Castro e Déborah Danowski, “é algo que a grande maioria das pessoas letradas aprendeu a admitir desde, pelo menos, Darwin”, citando ainda a conhecida frase de Levi-Strauss que observa que “o mundo começou sem o homem”; sabemos também que “terminará sem ele” (VIVEIROS DE CASTRO; DANOWSKI, 2014VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo, e DANOWSKI, Déborah. Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins. Desterro: Cultura e Barbárie, 2014., p. 29).

Se até a ideia do fim do mundo é antiga, desdobrando-se por diversas genealogias e tradições, ela parece ter adquirido um peso maior em alguns territórios da produção intelectual e cultural contemporânea, na contracorrente do otimismo humanista dos últimos séculos. Nesse quadro, salta à vista a profusão de sinais - na cultura popular, na indústria cultural, no pensamento contemporâneo, no imaginário político, no léxico de diferentes campos do conhecimento - de certo desconcerto diante da constatação de que haverá um fim, uma angústia que parece vir do espanto, às vezes de algo próximo da indignação, com a verificação de que a existência não será infinita.

Essa angústia não é algo que faríamos bem em desprezar - inclusive porque o fato de que ela não é nova e que a morte iminente já tenha sido anunciada outras vezes não significa que, desta vez, não será diferente. “É sempre assim que se morre, aliás”, escreveu Derrida, “e a morte daquilo que às vezes ainda é chamado de humanidade talvez não escape à regra” (DERRIDA, 1984DERRIDA, Jacques. No apocalypse, not now. In: Diacritics, v. 14, n. 2, 1984, p. 20-31., p. 21).6 6 Para uma leitura desse texto de Derrida, ver RUGGIERI, 2017. Morre-se, afinal, após uma série de alarmes falsos, após uma sequência de avisos que não se realizaram, após alguma quantidade de situações em que a preocupação se mostrou infundada. É possível que se morra mesmo quando, como bom historiador, se reconhece a falta de ineditismo e originalidade na preocupação com o risco de morte, como escreveu Derrida (1984DERRIDA, Jacques. No apocalypse, not now. In: Diacritics, v. 14, n. 2, 1984, p. 20-31., p. 21).

De todo modo, o fenômeno coloca alguns desafios para o pensamento, que se vê impelido a entender o que há, efetivamente, de novo nessa configuração, e que tenha sido capaz de levar a mudanças no lugar e no peso da finitude. Aqui também, diante da ideia da possibilidade do fim, há mais de uma resposta, mais de um afeto. Por um lado, uma pulsão de morte ansiosa que busca acelerar a chegada do desenlace, apelando a artifícios suicidas e genocidas, incluindo a expansão do armamento, o estímulo ao desmatamento, a corrosão de órgãos fiscalizadores e instituições de controle e o assalto a noções tradicionais de conhecimento, ciência e educação. Para esses aceleracionistas, como observado por Danowski e Viveiros de Castro, o mundo deve acabar de acabar, o que ajuda a entender a preferência por representações explosivas e totalizantes do desfecho, a catástrofe tratada com entusiasmo macabro e a ausência de futuro ativando ainda uma possibilidade de desrecalque. A aparição também aqui da figura do detetive que tanto intrigou a Bolaño - “La mirada desesperada de un detective / frente a un crepúsculo extraordinario” (“O olhar desesperado de um detetive / diante de um crepúsculo extraordinário”) (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007.) - assinala que o confronto é também entre diferentes éticas, dado o interesse inevitável do detetive pela vida do outro, até sua responsabilidade pelo outro (como na série The Last Policeman, de Ben Winters, onde o detetive deve decidir se continua a investigar um crime enquanto um asteroide se aproxima da Terra).

Por outro lado, mesmo quando há concordância quanto à aproximação de alguma espécie de fim, surge o desejo de adiá-lo, enquanto for possível. Diante do temor, a tarefa passa a ser suportar a lentidão do encerramento, aguentar até mesmo seu “insuportável fedor”, resistindo à tentação de acabar com a incerteza da espera. Apesar da tendência, no imaginário aceleracionista e na indústria cultural, de retratar a catástrofe como um acontecimento repentino de proporções planetárias - uma colisão espacial, um supervírus, etc. -, o mais provável é mesmo que vejamos um processo gradual de degradação, outro sinal de que a reflexão sobre a crise climática está vinculada ao estudo da exacerbação de nossos antagonismos sociais. Como escreveu Dipesh Chakrabarty, “o fato de que a crise da mudança climática será apreendida através de todas as nossas diferenças antropológicas só pode significar que, por mais que o aquecimento global seja antropogênico em suas origens, não haverá uma ‘humanidade’ correspondente para agir como agente político unitário. A questão da justiça intra-humana - interespécie - continuará, com a distribuição desigual dos impactos da crise” (CHAKRABARTY, 2012CHAKRABARTY, Dipesh. Postcolonial Studies and the Challenge of Climate Change. New Literary History, v. 43, n. 1, p. 1-18, 2012., p. 14).

Mesmo fechados os olhos, continua lá, “aquel espectáculo extraño, lento y extraño, / aunque empotrado en una realidad velocísima” [“aquele espetáculo estranho, lento e estranho, / embora embutido numa realidade velocíssima”], milhares de rapazes (mas por que só homens?) latino-americanos (e por que apenas esses?), “miles de muchachos como yo, lampiños / o barbudos, pero latinoamericanos todos, / juntando sus mejillas con la muerte” [milhares de meninos como eu, imberbes / ou barbudos, mas latino-americanos todos, / juntando suas faces à morte] (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 346). Esse espetáculo lento, incrustado na velocidade extrema, essa paradoxal temporalidade do entardecer, com a estranha demora no desaparecimento da luz, até o ponto em que se nota que a claridade não está mais, situa o poema num lugar antes do amanhã, antes da partida, o único em que o adeus ainda poderia ser dito:

Y recordé entonces que el día Anterior a nuestra partida Habíamos estado En el Parque Forestal De visita en el monumento A Rubén Darío. Adiós, Rubén, dijimos borrachos Y drogados. (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 410)

[E me lembrei então que no dia Anterior à nossa partida Tínhamos estado No Parque Florestal Visitando o monumento A Rubén Darío. Adeus, Rubén, dissemos bêbados E drogados.]

Um fim, portanto, cuja antecipação já gera nostalgia por tudo aquilo que se imagina que será perdido; a recordação que se tem é de uma despedida anterior.

* * *

Melancholia, filme de Lars von Trier de 2011MELANCHOLIA. Direção e roteiro Lars von Trier. Magnolia Pictures, 2011., elabora outro inventário de diferentes modalidades do adeus, diante da iminência de um fim que, para Danowski e Viveiros de Castro, não é um intervalo ou uma parábola, mas o evento que acaba com todos os eventos (incluindo o filme). Como também expõe, em meio a isso, os antagonismos no interior da antecipação da catástrofe, incluindo a sugestão de que poderia haver na melancolia e na experiência da vulnerabilidade uma vantagem epistemológica na preparação para o desastre, coloca em questão a existência de um agente político unitário que corresponda à humanidade. Entre as personagens principais do filme, são duas mulheres, junto a uma criança, as que são capazes de aguentar a lentidão do entardecer, reunindo-se diante do fim que se aproxima, enquanto o chefe da família, como se diz, precisa acelerar a morte, assim que se percebe incapaz de dominá-la. De sua perspectiva, a perda de poder é vista como o desabamento de um paradigma civilizatório, aquele que situava em seus devidos lugares homem, esposa, cunhada, filho, trabalhador e animais. No topo, o patriarca, aquele que afirma saber e se apresenta como merecedor da gratidão alheia. Abaixo, a esposa, aliada provisória do marido, e sua irmã, uma espécie de agregada que volta derrotada à casa após um colapso psíquico e após o fracasso de seu casamento. Há ainda o trabalho, na figura do mordomo, que decide deixar a casa alheia e voltar à sua, no vilarejo, com a aproximação do planeta que vai se chocar com a Terra, numa espécie de greve derradeira. Os cavalos, embora vistos como propriedade ou servos, de quem Justine, a irmã, dizia ser “senhora” (“mistress”), também têm um momento de manifestação de vontade, na recusa a cruzar uma ponte (no mesmo local, mais tarde, também a máquina deixará de obedecer, impedindo o avanço). Eles serão soltos, perto do fim, mas, ainda que inicialmente saiam galopando, parece já ser tarde demais para eles, e pelo menos um voltará ao terreno da família e poderá ser visto pastando no gramado em frente à mansão.

Se não há dúvida de que a preocupação fundamental do filme é com a família privilegiada que é seu núcleo narrativo, mesmo aí o que se explicita é a distribuição desigual das consequências da iminência da catástrofe, com o privilégio se apropriando de recursos e intervindo na forma da morte dos outros. Há uma quantidade limitada de pílulas no frasco adquirido por Claire como parte de sua preparação para a catástrofe, levada adiante contrariando as falsificações divulgadas pelo marido, que dizia se apoiar em cientistas, não nos “profetas do apocalipse” (“prophets of doom”); “ele não vai chocar com a Terra”, assegurava, instruindo-a a não procurar fontes alternativas de informação. “Não há qualquer chance”. “Você promete?”, ela pergunta. “Claro”, responde ele. E, no entanto, apesar disso, o marido vai saquear a gaveta em que estava escondido o recipiente com as cápsulas, consumindo sozinho todo o conteúdo e provocando a própria morte. Dentro e fora do filme, é como se houvesse, nas representações do fim, uma disputa derradeira pelo modo do encerramento da vida, uma vez que ele passa a ser visto como inevitável.

Fundem-se assim diferentes fins: o fim do porvir, o da existência e o de um paradigma civilizatório. Com o enfraquecimento da fantasia da progressão infinita, termina a possibilidade de reivindicar a dominação (da natureza, dos animais, dos outros, da terra) como uma ética, que no longo prazo se mostraria benéfica, apesar da destruição inicial. A ameaça de escassez, junto à afirmação da ausência de alternativas, alimenta, contra propostas de desaceleração ou redução de danos, esse novo aceleracionismo, uma forma de nostalgia pelo progresso infinito e uma tentativa de dar sobrevida a uma noção de desenvolvimento que se vê tensionada pelo reconhecimento inevitável de que não haverá terra, água e ar para todos.

O recrudescimento da violência estatal e paraestatal acrescenta material a essa leitura, exigindo que se pense em conjunto e em relação a movimentos na cultura e na política contemporâneas como o reconhecimento crescente da crise ambiental e a ascensão da extrema direita, com a explicitação da violência dirigida a grupos vulneráveis da sociedade. Em outras palavras, seria necessário um esforço por pensar a pandemia, a violência policial racista e a crise climática como parte de um mesmo assunto: o esgotamento de territórios, recursos e privilégios. É crucial nesse quadro que a perda de privilégios seja representada como a perda de direitos, a manobra que permite que o reacionarismo, como sugere Marcos Nobre, se apresente como defensor da democracia, contra a ditadura (NOBRE, 2020NOBRE, Marcos. Ponto-final: a Guerra de Bolsonaro contra a Democracia. Todavia, 2020.), contra uma série de ditaduras representadas pela “ditadura gay”, as “feminazis”, o politicamente correto, a censura imposta pela esquerda, etc. Na mesma linha, a exaustão do infinito também é vivida como perda, parte do conjunto de prejuízos à fantasia de supremacia e domínio. É essa conjunção - a morte entendida como fracasso, a não ser quando decidida pelo sujeito - que parece não deixar alternativa para o imaginário supremacista patriarcal que é o delírio do extermínio. Vemos então “enormes liberações de raiva, ressentimento e fantasias de extermínio, com a organização de uma nova economia da fúria [...] numa cadeia de catástrofes”, numa multiplicação de desastres (SLOTERDIJK, 2010SLOTERDIJK, Peter. Rage and Time: A Psychopolitical Investigation. Trad. Mario Wenning. New York: Columbia University, 2010., p. 12; ver também APTER, 2013APTER, Emily. Planetary Dysphoria. Third Text, v. 27, n. 1, p. 131-140, 2013., p. 139). Isabelle Stengers caracteriza essas fantasias como uma “forma clandestina de transcendência” responsável pela geração de um “estranho direito”: “o direito [a] não ter cuidado” (STENGERS, 2015STENGERS, Isabelle. Tempo das catástrofes. Trad. Eloisa Araújo Ribeiro. São Paulo: Cosac Naify, 2015., p. 54). Entende-se, enfim, a torção que fez com que a situação fosse vista como uma imposição e uma ameaça a certa noção de masculinidade, entendida como a identidade que não é obrigada a incluir o cuidado.

Em MelancholiaMELANCHOLIA. Direção e roteiro Lars von Trier. Magnolia Pictures, 2011., cunhado, marido e chefe se recusam a pensar o adeus e o fim e insistem em continuar a acreditar no futuro. Michael, noivo de Justine, lhe entrega como presente uma foto de um terreno, sonhando com as macieiras que um dia crescerão lá. Depois, no momento da separação, dirá que “Isto poderia ter sido muito diferente”, a que Justine responde que “sim, mas o que você esperava?” É como se perguntasse: você esperava que não houvesse um fim? Já o chefe da agência publicitária quer monetizar o futuro catastrófico, vendendo-o através de uma campanha publicitária. Incapaz de aceitar que qualquer coisa interrompa a produção, busca um slogan para uma foto que lembra a pintura “O triunfo da morte” de Pieter Bruegel. Todos - noivo, cunhado, irmã e pai - pressionam-na para que seja feliz, com esse semblante deprimente da positividade compulsória. A exceção é a mãe, que, no entanto, parece comparecer à história apenas para mostrar que a negação da felicidade também não é uma saída.

Por sua vez, o que Justine sente, na primeira metade do filme, é medo. Não um medo dirigido à catástrofe iminente e à chegada do planeta. (Justine dirá à irmã que “Se você pensa que eu tenho medo de um planeta, você é uma idiota”.) O planeta Melancolia, antes escondido atrás do sol, é o que vem ao encontro da Terra e desperta Justine de seu torpor. À diferença do obsessivo, que tem a fantasia do domínio e responde à indeterminação do real com a vontade de controle, Justine já vinha fazendo seu luto, mesmo antes da morte, e já vivia com a ansiedade provocada ao ter que encarar a destruição e a ausência.

Apesar das comparações recorrentes, estimuladas até pelo próprio filme, Justine não é Ofélia. Na história de Ofélia, como na de tantas outras heroínas femininas, o sofrimento (e também um saber triste) é o resultado de um acontecimento, normalmente uma tragédia associada a uma perda, em geral de um homem (o pai, um amante, um filho). Não há um evento que provoque a crise ou o colapso de Justine. Não há explicação, como quase não há história prévia das personagens. Nessas circunstâncias, afirmar que o mundo é cruel, como ela faz, parece um resquício da expectativa de que ele fosse bondoso, possíveis restos de antropocentrismo, pois não parece haver no enredo sinais da crueldade da Terra. O que há é indiferença, interpretada pela humanidade como crueldade quando há dificuldade de conceber uma existência que não conceda centralidade à vida humana.

A novidade parece ser a transformação da noção de porvir, que já não estaria garantido para a espécie humana, como se imaginou durante os séculos de triunfalismo humanista. Com seu declínio, reaparecem versões antigas de temores e ansiedades, mas também certa reverência, na experiência de estar face a face com a terra. Nesses entardeceres, há quem perceba um momento em que vemos e somos vistos pela Terra, como se fosse também a tarde que nos vê, como se o entardecer fosse um acontecimento também para a Terra. O poema passa a ser espaço não apenas para o adeus, mas também para a solidariedade e a gratidão: “Escribo esto para / darte las gracias” (“Escrevo isto / para te agradecer”) (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 149). Se, em busca de uma resposta, alguns se voltam para o escritor como oráculo ou profeta- “o que será de toda essa gente?”, pergunta o poema - a reposta terá pouco de consolo: “nada é permanente”.

* * *

Um poema mais longo de Bolaño, intitulado “La gran fosa”, se ocupa do “misterio de un poeta surrealista / un poeta menor” (“mistério de um poeta surrealista / um poeta menor”), o escritor Gui Rosey, citado na antologia de surrealistas organizada por Aldo Pellegrini (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 373-375). Rosey aparecerá também no conto “Últimos entardeceres na terra”, onde de novo há menção à sua presença nos encontros dos surrealistas em Marselha em 1941, enquanto todos esperavam vistos para os Estados Unidos. Também no conto haverá uma foto, “a foto de um poeta menor [...]. É feio, bem-arrumado, parece um obscuro funcionário de ministério ou um bancário”.

O grupo de surrealistas se reúne todas as tardes num café próximo do porto. Fazem planos, conversam, Rosey não falta a nenhum encontro. Um dia, porém (um entardecer, intui [o narrador]), Rosey desaparece. De início, ninguém sente a sua falta. É um poeta menor e os poetas menores passam despercebidos (BOLAÑO, 2008BOLAÑO, Roberto. Putas Assassinas. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo, Companhia das Letras, 2008. , p. 41).

O poeta menor, figura cuja importância para a teoria e a história literária é raramente reconhecida, abunda em Bolaño, que se ocupa dele por seu aspecto frágil, por sua efemeridade, por tudo aquilo que em seu caso não pode ser justificado a partir da garantia de um porvir. Ao não tomar a permanência como critério para definir o interesse e não se restringir àquilo que foi capaz de se inscrever no arquivo, é o desejo, não a obra, o que comove o escritor.

À diferença de Breton, cuja preocupação é com o fim da literatura, Pellegrini, o antologista, se interessa por Rosey, incluindo em seu volume sobre poesia surrealista em língua francesa uma nota sobre o desaparecimento do escritor: “Foi visto pela última vez em Marselha em 1941, entre os surrealistas refugiados que esperavam partir da França. Desde então não se teve mais notícias dele” (PELLEGRINI, s/dPELLEGRINI, Aldo. Antología de la poesía surrealista de lengua francesa. Buenos Aires: Compañía General Fabril Editora, s/d., p. 228). Assim como não pôde haver despedida, pois o desaparecimento não era esperado, não há luto, dada a ausência de um corpo que constate a morte. Permanecemos, assim, à espera de notícias:

Y ésa es la historia, la misteriosa desaparición de un poeta menor (¿se llamaba Gui?, ¿Gui Rosey?) del parnaso surrealista Um poeta arrastrado por las corrientes desconocidas del mar hacia la Gran Fosa (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 375)

[Essa é a história, o misterioso desaparecimento de um poeta menor (o nome dele era Gui?, Gui Rosey?) do parnaso surrealista Um poeta arrastado pelas correntes desconhecidas do mar para a Grande Cova]

Antes (ou depois?) do fim do poema, há ainda uma pós-data, trazendo uma “revelação” que teria chegado num amanhecer: o barco e a fossa estavam unidos e jamais se separariam (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 376).

* * *

Nessas cenas - da poesia de Bolaño, do filme de von Trier - talvez a pior saída fosse dizer que, pelo menos, nos resta a arte. O problema estaria não só na atribuição de imunidade à poesia, afirmando sua exterioridade em relação à catástrofe, mas também no modo como a propensão a afirmar o poder da arte para transcender o tempo impediria que se percebesse como esses textos tornam palpáveis os efeitos do tempo, começando pela experiência da finitude (WASSER, 2014WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014., p. E465). O que muitas vezes encontramos, em reflexões sobre a arte e a literatura, é uma atualização da teodiceia, a doutrina que justificava o sofrimento humano através do apelo à existência de um plano divino. Nessa teodiceia secularizada ou estética, a sugestão, nem sempre explicitada, é que o mundo poderia ser redimido através da obra de arte. A tese do poder redentor da arte parece estar em jogo em MelancholiaMELANCHOLIA. Direção e roteiro Lars von Trier. Magnolia Pictures, 2011. de uma maneira que não é simples - e inclui citações diversas a obras de arte variadas, como o prelúdio da ópera Tristão e Isolda de Wagner e “O triunfo da morte” de Bruegel.

Uma consciência dramática da fragilidade do presente, no lugar da tentativa de tornar eterno o efêmero, veria na arte “el soporte perdido / de algo que ya no veremos” (“o suporte perdido / de algo que já não veremos”) (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 119). Seria essa uma poética que “sublinha o caráter traumático de todo evento” e o modo como o aspecto temporal de toda experiência faz com que aquilo que acontece esteja exposto ao risco de um futuro desconhecido (WASSER, 2014WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014., p. E466). São muitas as situações em que Bolaño se recusou a acompanhar essa transcendentalização, inclusive contrariando entrevistadores que, apreensivos diante dos elementos agônicos de sua obra, solicitavam que ele reafirmasse a função da literatura como refúgio e possibilidade de redenção. “Bolaño”, pergunta um jornalista na Feira do Livro de Santiago em 1999, “você também diria, como Enrique Lihn, que porque escreveu está vivo?” De forma alguma, responde ele: “Porque escrevi quase morri” (BOLAÑO, 1999BOLAÑO, Roberto. La belleza de pensar. Entrevista a Cristián Warnken. Feria Internacioal del Libro de Santiago, 1999. Disponível em <https://garciamadero.blogspot.com/2010/06/roberto-bolano-en-la-belleza-de-pensar.html>.
https://garciamadero.blogspot.com/2010/0...
).

Se Fredric Jameson escreveu que parece mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo (JAMESON, 1994JAMESON, Fredric. The Seeds of Time. New York: Columbia University Press, 1994., p. xii; 2003JAMESON, Fredric. Future City. New Left Review, n. 21, 2003., p. 76), seria possível dar ainda mais um giro à frase, para apontar como em alguns espaços parece mais fácil imaginar o fim dos dois, tanto do capitalismo quanto do mundo, do que o da literatura. Quanto a MelancholiaMELANCHOLIA. Direção e roteiro Lars von Trier. Magnolia Pictures, 2011., por mais que a beleza e as tomadas deslumbrantes dificultem a percepção da transitoriedade, levando a fortuna crítica por vezes a enxergar na obra o triunfo da arte, a sobrevivência do filme após o fim do mundo retratado por ele relativiza qualquer suposto poder redentor da arte, que precisará ser pensada agora como incerta, precária, frágil e acima de tudo como incapaz de subverter ou reverter a finitude. A arte então passa a ser também ela negociação com a mortalidade, reconhecendo não lhe ser superior. A utilidade do filme não seria sua transcendência, a superação ou triunfo sobre a morte, mas, ao contrário, a construção de um espaço cujos contornos são resguardados apenas minimamente, por alguns poucos galhos que se equilibram de modo inseguro. Mesmo assim, é alguma coisa, um espaço à espera da morte, um lugar para viver o antes do fim, sabendo que ele se aproxima. Ainda que seja chamado de “mágico” (é como Justine descreve a cabana ao sobrinho), o espaço é precário, incapaz, como a beleza, de impedir a destruição.

A cabana é sobretudo um lugar para se darem as mãos. Não é um espaço profético, no qual seria antevisto o porvir ou onde se teria acesso a um conhecimento avançado. Justine pede ao sobrinho que feche os olhos, e ela mesma estará de costas para o planeta Melancolia que se aproxima. Coloca-se de frente para a irmã e o sobrinho, e não para o céu e aquilo que vem (Figura 1).

Figura 1
Las Von Trier, Melancholia (2011MELANCHOLIA. Direção e roteiro Lars von Trier. Magnolia Pictures, 2011.), Magnolia Pictures.

Que possamos nos lembrar de outros prenúncios do apocalipse, que tenhamos lembrança deles é, evidentemente, evidência de que não chegaram a ocorrer, e talvez o próprio da literatura, sua verdade e sua beleza, sua força e sua tragédia, seja a capacidade de viver com essa consciência da catástrofe. “Arte” e “literatura” seriam aqui nomes para um conjunto de textos, um arquivo, sempre sob risco de destruição; um nome para a “precariedade radical e para a forma radical de sua historicidade”, como propôs Derrida (1984DERRIDA, Jacques. No apocalypse, not now. In: Diacritics, v. 14, n. 2, 1984, p. 20-31., p. 27).

Ao mesmo tempo, também seria duvidoso, a partir disso, indicar que se trata apenas de arte, só retórica, mera ficção - e de ficção que nem original seria, pois repetida tantas vezes ao longo da história (DERRIDA, 1984DERRIDA, Jacques. No apocalypse, not now. In: Diacritics, v. 14, n. 2, 1984, p. 20-31., p. 28). No entanto, como com a guerra nuclear para Derrida nos anos 1980, o apocalipse (palavra que também significa revelação) não tem como não ser um acontecimento textual, o relato ou fábula de algo que não houve. Quando tiver ocorrido será impossível narrá-lo, não havendo narração do apocalipse a não ser justamente como fábula, profecia ou “literatura”. A singularidade da catástrofe seria não deixar qualquer resto, seria a destruição sem rastros, uma destruição que abarcaria até o arquivo literário e historiográfico (DERRIDA, 1984DERRIDA, Jacques. No apocalypse, not now. In: Diacritics, v. 14, n. 2, 1984, p. 20-31., p. 26).

Entretanto, como estratégia de dissuasão, continua Derrida, a única chance de adiar a chegada do apocalipse é narrá-lo como se já tivesse acontecido, relatá-lo como concretude, apesar de todas as vezes em que ele foi anunciado e não chegou a se realizar. O apocalipse também “é uma especulação, no sentido de uma fábula ou uma invenção a ser inventada a fim de dar lugar a algo ou impedir que algo aconteça (é preciso invenção tanto para um quanto para o outro)”. Suspensa em sua épochè fabulosa, dá nome a uma destruição irreversível, sem arquivamento, sem qualquer trabalho possível com o resquício, podendo ser apenas antecipada fantasmaticamente,

A literatura e a crítica literária não podem falar de outra coisa [a não ser, isto é, da destruição sem restos da literatura], não podem ter outro referente último, só podem multiplicar suas manobras estratégicas para assimilar esse inteiramente outro inassimilável. Elas nada mais são do que essas manobras e essa estratégia diplomática. (DERRIDA, 1984DERRIDA, Jacques. No apocalypse, not now. In: Diacritics, v. 14, n. 2, 1984, p. 20-31., p. 28)

* * *

Estou terminando, estou chegando ao fim - como dizemos quando o que vamos fazer é, na verdade, continuar, e não terminar. Como procedimento retórico, numa conferência ou uma aula, é, além de uma promessa, um apelo à atenção. Como nas teorias do conto, espera-se que o encurtamento do tempo e a brevidade estimulem o foco, fixando o olhar que não consegue se desprender da bolha de sabão que sobe, pois sabe que a qualquer momento algo pode suceder.

No ensaio “O fim do poema”, Giorgio Agamben caracteriza a poesia como o discurso que vive na tensão e no contraste - em primeiro lugar, tensão (e, portanto, possível interferência) entre o som e o sentido (2002AGAMBEN, Giorgio. O fim do poema. Trad. Sérgio Alcides. In: Cacto. São Paulo, n.1, p. 142-148, 2002., p. 142). Além disso, tensão entre a unidade métrica (ou semiótica) e a unidade semântica, ou seja, na diferença entre o verso e a frase. Se o que caracteriza o poema é esse conflito, e se o verso se define precisamente através da possibilidade do enjambement, conclui-se que o último verso não seria um verso (AGAMBEN, 2002AGAMBEN, Giorgio. O fim do poema. Trad. Sérgio Alcides. In: Cacto. São Paulo, n.1, p. 142-148, 2002., p. 145). “Catástrofe” será a palavra usada por Agamben para denominar o fim do poema (lembrando que a unidade poética da “estrofe” se associa, etimologicamente, à “catástrofe”). Ao unir som e sentido, verso e frase (o fim do último verso é também necessariamente o fim da última frase), abole-se a tensão. Se na sucessão de versos de um poema temos o retorno cíclico à esquerda da folha, voltando a começar, no último verso já não poderá haver retorno. O que há, como aponta o crítico David Ben-Merre, é uma “reviravolta”, no sentido em que algo pode se voltar contra a volta, ou, ainda, o pronunciamento apocalíptico ainda mais aterrorizante que é o anúncio do fim de todo retorno, não havendo, “em última análise, no fim do poema, nada em que se tornar a não ser o vazio” (BEN-MERRE, 2021BEN-MERRE, David. Falling into Silence: Giorgio Agamben at the End of the Poem. Mosaic, v. 45, n. 1, p. 89-104, 2012., p. 98).

A antecipação desse trauma levou a tradição poética a elaborar diferentes avisos do fim (o commiato, a tornada), procedimentos poéticos que alertam o leitor para a aproximação do desfecho, como se o fim implicasse para o poema uma perda de identidade tão irreparável a ponto de requerer o uso de meios métricos e semânticos particulares. Ao mesmo tempo, esses recursos, nas palavras de Agamben, “são o que freia e retarda o advento do Messias, portanto daquele que, cumprindo o tempo da poesia e unificando os dois éones, destruiria a máquina poética precipitando-a no silêncio” (AGAMBEN, 2002AGAMBEN, Giorgio. O fim do poema. Trad. Sérgio Alcides. In: Cacto. São Paulo, n.1, p. 142-148, 2002., p. 147).

Como seria de se esperar, o fim do ensaio de Agamben se depara necessariamente com o problema do seu próprio final: “Como concluir um ensaio que fala da impossibilidade de concluir?”, pergunta Ben-Merre. E o que irrompe então são hesitações da escrita mesma: cesuras, digressões e a transformação da identidade do texto (que chega a mudar de tom no final), até chegar a um suplemento, após o ponto final, onde há mais um parágrafo, um acréscimo ou prótese entre parênteses, depois daquilo que parecia ser o fim, ajudando Agamben a chegar ao final de “O fim do poema” (BEN-MERRE, 2021BEN-MERRE, David. Falling into Silence: Giorgio Agamben at the End of the Poem. Mosaic, v. 45, n. 1, p. 89-104, 2012., p. 101).

Não se trata, aqui, de forçar uma conclusão, inventar um movimento que amarre os fios soltos, sintetizar o que aconteceu, ter a última palavra sobre o assunto, na orgulhosa estratégia que deseja “que a língua consiga no fim comunicar ela própria, sem restar não dita naquilo que diz” (AGAMBEN, 2002AGAMBEN, Giorgio. O fim do poema. Trad. Sérgio Alcides. In: Cacto. São Paulo, n.1, p. 142-148, 2002., p. 148). Ao contrário, o desafio seria buscar uma forma que sinalizasse que, mesmo tão perto daquilo que parece ser o fim, algo ainda falta, na aposta de que ainda é possível uma nova chegada. O que ela seria- vinda do futuro ou da origem, do além ou do centro - não há como saber, até porque “El centro / de un poema / es otro poema” (“o centro / de um poema / é outro poema”), como escreve Alejandra Pizarnik (2011PIZARNIK, Alejandra. Poesía completa. Barcelona: Lumen, 2011. , p. 381). Ou, no que talvez seja a mesma coisa: “En el centro del texto / está la lepra” (“No centro do texto / está a lepra”) (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 164).

Referências

  • AGAMBEN, Giorgio. O fim do poema. Trad. Sérgio Alcides. In: Cacto São Paulo, n.1, p. 142-148, 2002.
  • APTER, Emily. Planetary Dysphoria. Third Text, v. 27, n. 1, p. 131-140, 2013.
  • BECKETT, Samuel. Molloy Trad. Ana Helena Souza. 2a. ed. São Paulo: Editora Globo, 2014.
  • BEN-MERRE, David. Falling into Silence: Giorgio Agamben at the End of the Poem. Mosaic, v. 45, n. 1, p. 89-104, 2012.
  • BOLAÑO, Roberto. Chamadas telefônicas Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
  • BOLAÑO, Roberto. Putas Assassinas Trad. Eduardo Brandão. São Paulo, Companhia das Letras, 2008.
  • BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida Barcelona, Anagrama, 2007.
  • BOLAÑO, Roberto. Discurso de Caracas. In: Entre paréntesis Barcelona: Anagrama, 2005.
  • BOLAÑO, Roberto. Amberes Barcelona: Anagrama , 2002.
  • BOLAÑO, Roberto. La belleza de pensar. Entrevista a Cristián Warnken. Feria Internacioal del Libro de Santiago, 1999. Disponível em <https://garciamadero.blogspot.com/2010/06/roberto-bolano-en-la-belleza-de-pensar.html>.
    » https://garciamadero.blogspot.com/2010/06/roberto-bolano-en-la-belleza-de-pensar.html
  • CHAKRABARTY, Dipesh. Postcolonial Studies and the Challenge of Climate Change. New Literary History, v. 43, n. 1, p. 1-18, 2012.
  • DAMASCENO, Rodrigo Lobo. Contra a poesia ou voltas de um cavalo em volta da tese Tese (Doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2019.
  • DERRIDA, Jacques. Adeus a Emmanuel Lévinas Trad. Fábio Landa. São Paulo, Perspectiva, 2004.
  • DERRIDA, Jacques. No apocalypse, not now. In: Diacritics, v. 14, n. 2, 1984, p. 20-31.
  • FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso Trad. Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo: Loyola, 1999.
  • HÄGGLUND, Martin. Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov Cambridge: Harvard University Press, 2012.
  • JAMESON, Fredric. The Seeds of Time New York: Columbia University Press, 1994.
  • JAMESON, Fredric. Future City. New Left Review, n. 21, 2003.
  • MELANCHOLIA. Direção e roteiro Lars von Trier. Magnolia Pictures, 2011.
  • NOBRE, Marcos. Ponto-final: a Guerra de Bolsonaro contra a Democracia Todavia, 2020.
  • PELLEGRINI, Aldo. Antología de la poesía surrealista de lengua francesa Buenos Aires: Compañía General Fabril Editora, s/d.
  • PINHEIRO, Tiago Guilherme. Três quadros em um quarto: a poesia lança um olhar para a cena do crime. In: PEREIRA, A. M.; RIBEIRO, G. S. (Org.). Toda a orfandade do mundo: escritos sobre Roberto Bolaño Belo Horizonte: Relicário Edições, 2016, p. 100-120.
  • PIZARNIK, Alejandra. Poesía completa Barcelona: Lumen, 2011.
  • ROSA, Maria Carolina da Silva. Estamos sempre indo para casa: uma leitura de Lavoura arcaica Dissertação (Mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2017.
  • RUGGIERI, Mariana. Variações da Literatura Tese (Doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2017.
  • SLOTERDIJK, Peter. Rage and Time: A Psychopolitical Investigation Trad. Mario Wenning. New York: Columbia University, 2010.
  • STENGERS, Isabelle. Tempo das catástrofes Trad. Eloisa Araújo Ribeiro. São Paulo: Cosac Naify, 2015.
  • VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo, e DANOWSKI, Déborah. Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins Desterro: Cultura e Barbárie, 2014.
  • WASSER, Audrey. Martin Hägglund, Dying for time: Proust, Woolf, Nabokov . Modern Philology, v. 111, n. 4, p. E464-E467, 2014.
  • 1
    A não ser quando um tradutor é identificado, as citações em outro idioma foram traduzidas pelo autor.
  • 2
    Há uma leitura desses trechos do livro de Foucault em Maria Carolina da Silva Rosa (2017ROSA, Maria Carolina da Silva. Estamos sempre indo para casa: uma leitura de Lavoura arcaica. Dissertação (Mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2017., p. 19).
  • 3
    Sobre a poesia de Bolaño, ver PINHEIRO, 2016PINHEIRO, Tiago Guilherme. Três quadros em um quarto: a poesia lança um olhar para a cena do crime. In: PEREIRA, A. M.; RIBEIRO, G. S. (Org.). Toda a orfandade do mundo: escritos sobre Roberto Bolaño. Belo Horizonte: Relicário Edições, 2016, p. 100-120., p. 100-120 e DAMASCENO, 2019DAMASCENO, Rodrigo Lobo. Contra a poesia ou voltas de um cavalo em volta da tese. Tese (Doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2019..
  • 4
    Tudo o que escrevi é uma carta de amor ou de despedida à minha própria geração, aos que nascemos na década de 50 e aos que preferimos em algum momento o exercício da milícia, neste caso seria mais correto dizer a militância, e entregamos o pouco que tínhamos, o muito que tínhamos, que era nossa juventude, a uma causa que acreditamos ser a causa mais generosa do mundo e que de certa forma era mesmo, mas que na verdade não era. [...] lutamos por partidos que caso vencessem nos teriam mandado imediatamente a um campo de trabalhos forçados, lutamos e depositamos toda a nossa generosidade num ideal que fazia mais de 50 anos que estava morto, e alguns de nós já sabíamos [...].
  • 5
    Não que os elementos proféticos não tenham também seu interesse. Considere-se, por exemplo, a insistência de Bolaño, ao longo desses anos, que são também os da redemocratização de alguns países do continente, na persistência do fascismo. No poema “Reencuentro”, enquanto dois jovens poetas, nus e deitados na cama de um quarto, entrelaçam seus corpos, do outro lado da porta uma voz sussurra: “el fascismo, el fascismo...” (“o fascismo, o fascismo...”), para depois insistir: “el fascismo, un fascismo extraño, ciertamente, un fascismo casi translúcido” (“o fascismo, um fascismo estranho, certamente um fascismo quase translúcido”), mas ainda assim um fascismo (BOLAÑO, 2007BOLAÑO, Roberto. La Universidad Desconocida. Barcelona, Anagrama, 2007., p. 403-404).
  • 6
    Para uma leitura desse texto de Derrida, ver RUGGIERI, 2017RUGGIERI, Mariana. Variações da Literatura. Tese (Doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2017..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2021

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2020
  • Aceito
    10 Dez 2020
Programa de Pos-Graduação em Letras Neolatinas, Faculdade de Letras -UFRJ Av. Horácio Macedo, 2151, Cidade Universitária, CEP 21941-97 - Rio de Janeiro RJ Brasil , - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: alea.ufrj@gmail.com