Resumo
O presente estudo analisa como narrativas de Eça de Queirós, produzidas em sua juventude, principalmente “Farsas” e “O réu Tadeu”, são “reutilizadas” em textos posteriores do escritor. Para isso, usam-se as ideais de motivo, tema, topoi e intertextualidade. A base teórica menciona C. Segre (1999), E. R. Curtius (2013), U. Eco (1976), J. Kristeva (2005), R. Barthes (2004) e outros autores. Dessa forma, chega-se ao conceito de um trabalho de patchwork nos textos queirosianos, pois novos tecidos textuais são feitos, cuja base são pedaços de trabalhos literários anteriores. Nesse contexto, os “pedaços” textuais antigos ganham diferentes usos e significados ao serem trabalhados nos outros textos de Eça.
Palavras-Chave:
Eça de Queirós; tema; motivo; topoi; intertextualidade
Abstract
The current study analyses how “Farsas” and “O réu Tadeu” by Eça de Queirós, narratives written in his youth, are “reused” in the writer’s later texts. In order to do so, we use the ideas of motif, theme, topoi, and intertextuality. The theoretical framework mentions C. Segre (1999), E. R. Curtius (2013), U. Eco (1976), J. Kristeva (2005), R. Barthes (2004), among other authors. In this sense, the concept of patchwork in queirosian texts becomes key, because new textual textures are achieved based on previous literary works. In that context, the older textual “pieces” gain different usages and new meanings when read in unison with other works by Queirós.
Keywords:
Eça de Queirós; Theme; Motif; Topoi; Intertextuality
Resumen
Este estudio analiza cómo las narrativas de Eça de Queirós, producidas principalmente en su juventud, como “Farsas” y “O réu Tadeu”, son “reutilizadas” en textos posteriores del escritor. Para ello, se emplean las ideas de motivo, tema, topoi e intertextualidad. La base teórica menciona a C. Segre (1999), E. R. Curtius (2013), U. Eco (1976), J. Kristeva (2005), R. Barthes (2004) y otros autores. De esta forma, se llega al concepto de un trabajo de patchwork en los textos queirosianos, ya que nuevos tejidos textuales se crean, teniendo como base fragmentos de trabajos literarios anteriores. En este contexto, los “fragmentos” textuales antiguos adquieren diferentes usos y significados al ser trabajados en otros textos de Eça.
Palabras-clave:
Eça de Queirós; tema; motivo; topoi; intertextualidad
No início de sua carreira literária, Eça de Queirós (1845-1900) publicou, principalmente, contos em periódicos de Portugal, como Gazeta de Portugal e o Distrito de Évora.1 Nesses textos chamam a atenção o tom sombrio, temas satânicos e, muitas vezes, a presença do sobrenatural. Ao analisar as ficções iniciais de Eça, Ernesto Guerra da Cal destaca o uso de “todo um elenco verbal de caráter sinistro, tétrico, espectral e misterioso” (Cal, 1969, p. 85), proveniente “de palavras tópicas do período baixo-romântico” (Cal, 1969, p. 85). Por outro lado, o pesquisador defende que a inclinação perdurará por toda a produção de Eça, sendo lapidada ao longo dos anos:
[...] é curioso observar que muitos dos elementos, que assinalamos como característicos das suas primeiras páginas, permanecerão ou reaparecerão com significativa tonicidade, através de toda sua obra, denunciando o muito de sinceramente temperamental que há nessas páginas “românticas”, tão líricas, tão livrescas. Certos elementos desse léxico não o abandonarão jamais, entremeando-se sutilmente na fábrica do seu estilo, ao longo de sua evolução. Outros, para permanecerem, mudarão de signo. E outros ainda desaparecerão temporariamente, para reaparecer, com uma valoração e um uso mais sagaz e experimentado, na etapa final de neo-romantização, quando Eça agora voluntária e corajosamente volta a “envolver-se totalmente no fantástico” (Cal, 1969, p.87)
O próprio Eça, em alguns escritos não ficcionais, comenta seu apreço pelo pensamento fantasioso. Numa carta de 1884, escrita originalmente em francês, que deveria ter sido o prefácio de O mandarim, ele reflete que essa obra “se caracteriza por ser totalmente fiel ao que [...]é a tendência mais natural e mais espontânea do espírito português”2 (Queirós, 2001, p. 15). Segundo o autor, mesmo que o Realismo-Naturalismo exercesse fascínio sobre a literatura da época, os portugueses se encantavam, na verdade, por “emoções excessivas traduzidas com um grande Fausto plástico de linguagem” (Queirós, 2001, p. 15) e pela “fantasia sob todas as formas” (Queirós, 2001, p. 15). Por isso, na perspectiva do autor, sempre “sufocados” pela objetividade do naturalismo ou nostálgicos pela imaginação fantasiosa, os escritores portugueses voltavam-se à produção desses textos.
No ensaio de 1893, “Positivismo e Idealismo”, ao pensar sobre as implicações do racionalismo no positivismo científico - uma das crenças basilares do Realismo-Naturalismo -, Eça argumenta que o homem, mesmo forçado a seguir esse rigor, não consegue de todo abandonar a imaginação fantasiosa:
O homem desde todos os tempos tem tido (se me permitem renovar esta alegoria neoplatónica) duas esposas, a razão e a imaginação, que são ambas ciumentas e exigentes, o arrastam cada uma, com lutas por vezes trágicas e por vezes cómicas, para o seu leito particular - mas entre as quais ele até agora viveu, ora cedendo a uma, ora cedendo a outra, sem as poder dispensar, e encontrando nesta coabitação bigâmica alguma felicidade e paz. [...] O positivismo científico, porém, considerou a imaginação como uma concubina comprometedora, de quem urgia separar o homem; - e, apenas se apossou dele, expulsou duramente a pobre e gentil imaginação, fechou o homem num laboratório a sós com a sua esposa clara e fria, a razão. O resultado foi que o homem recomeçou a aborrecer-se monumentalmente e a suspirar por aquela outra companheira tão alegre, tão inventiva, tão cheia de graça e de
Tendo em vista este apreço, parece justificável a duradoura presença do léxico sombrio e do fantasioso na prosa queirosiana. Porém, mais do que isso, nos textos iniciais do escritor, existe um reaproveitamento de temas, motivos e topoi que, por vezes, levam a um uso literal de excertos ou ainda, de forma mais sutil, à remodelação de ideias apresentadas num texto anterior em posteriores.
Segundo Massaud Moisés (2004), na prosa, tema é a ideia principal e/ou secundária que se pode retirar de um conto, novela ou romance. Para o autor, uma obra é capaz de mesclar vários temas. Por exemplo, Dom Casmurro (1899), de Machado de Assis (1839-1908), expõe de modo proeminente os temas do ciúme, da suspeita e da complexidade das relações humanas. De acordo com Cesare Segre (1999, p. 379), tema “é matéria a elaborar (ou elaborada) num discurso”. Ou seja, o assunto, o desenvolvimento ou a ideia inspiradora do escrito. Os motivos são mais amplos que os temas, “revelam-se então como imagens; as suas combinações são histórias e alegorias” (Segre, 1999, p. 383). Complementado a ideia, o autor discute que o motivo pode ser uma unidade significativa mínima que vem antes do tema, um elemento germinal ou, ainda, um elemento recorrente. Assim, “tema e motivo são, então, unidades de significado estereotipado, recorrentes num texto ou num grupo de textos e capazes de definir áreas semânticas determinadas” (Segre, 1999, p. 397).
Por fim, os topoi são um conceito da retórica, e Ernst Robert Curtius (2013, p. 109) compreende os topoi como “clichês de emprego universal na literatura”. Na antiguidade clássica, surgidos primeiramente na retórica, os topoi eram “argumentos aplicáveis aos mais diferentes casos. [...] temas ideológicos apropriados a quaisquer desenvolvimentos ou variações” (Curtius, 2013, p. 108). Com o passar do tempo, os topoi surgiram na poesia e foram incorporados pela retórica, configurando uma “permuta constante entre poesia e prosa” (Curtius, 2013, p. 123). Umberto Eco associa o conceito de tópos pós-Antiguidade clássica e Idade Média a um “módulo imaginativo” (Eco, 1976, p. 232), uma figura “evocada pela lembrança [que] substitui exatamente um ato compositivo da imaginação que, pescando no repertório do já feito, se exime de inventar aquela figura ou aquela situação que a intensidade daquela experiência postulava” (Eco, 1976) p. 232, grifo do autor). R. Barthes e J. Bouttes (1987) associam os topoi à locução, a uma frase, a uma proposição, a um tema ou um desenvolvimento, isto é, um tema pensado dentro de uma forma. Portanto “o que conta é a evidencia do já (mil vezes) ouvido; de modo que uma forma muito codificada, [...] pode parecer-me original se ainda não a conhecer” (Barthes; Bouttes, 1987, p. 273, grifos dos autores). Dessa forma, cabe ao receptor a identificação dos topoi, estabelecendo uma conexão entre diferentes textos. Fica implícito no conceito que, quando um tópos adentra um novo texto, existem algumas variações do pensamento, frase, locução etc. para que esse processo de derivação soe como novidade.
Mais recentes que os conceitos anteriores apresentados são os estudos intertextuais. O termo, criado por Julia Kristeva, a partir de suas leituras de Mikhail Bakhtin, postula que “todo texto se constrói como um mosaico de citações, todo texto é absorção e transformação de um outro texto” (Kristeva, 2005, p.68). Dessa forma, Kristeva entende a intertextualidade como uma transposição de sistemas de signo para outro, o que exige uma nova articulação das ideias previamente apresentadas e uma outra colocação enunciativa e denotativa.
Roland Barthes também contribui para o estudo da intertextualidade. Para o autor, o texto é um tecido no qual o estudioso deve “perceber o tecido em sua textura, na trama dos códigos, das fórmulas, dos significantes” (Barthes, 2004, p. 277); e, assim, no interior do texto, o sujeito “se situa e se desfaz, tal qual uma aranha se dissolve em sua teia” (Barthes, 2004, p. 277). Tendo em vista o conceito da tessitura do texto, Barthes conclui que:
[o] texto redistribui a língua (é o campo dessa redistribuição). Um dos caminhos dessa desconstrução-reconstrução é permutar textos, retalhos de textos que existiram ou existem em torno do texto considerado e finalmente nele: todo texto é um intertexto; outros textos estão presentes nele, em níveis variáveis, com formas mais ou menos reconhecíveis, os textos da cultura anterior e os da cultura ambiente, todo texto é um tecido de citações passadas. Passam para o texto, redistribuídos nele, fórmulas, modelos rítmicos, fragmentos de linguagens sociais, etc. [...]. A intertextualidade, condição de todo texto, seja ele qual for, não se reduz, evidentemente, a um problema de fontes ou influências; o intertexto é um campo geral de fórmulas anônimas cuja origem raramente é detectável, de citações inconscientes ou automáticas, dadas sem aspas (Barthes, 2004, p. 275, grifo do autor).
Comparando os conceitos de tema, motivo, topoi e intertextualidade, observa-se que os três primeiros são muito mais caros à retórica, à filologia e aos estudos de textos literários antigos (teatro grego, epopeias, sermões etc.), enquanto a intertextualidade é uma visão contemporânea aplicável a textos das mais diferentes épocas. Todavia, conforme Kristeva e Barthes postulam, o texto é composto por diferentes processos e diálogos; é como uma multiplicidade, “peças” discursivas, simbólicas e linguísticas vindas de diferentes espaços (outros textos, a fala popular, outras artes etc.), organizadas sob uma nova roupagem. Portanto observa-se que a constituição do “tecido” literário, retomando o termo barthesiano, não exclui a retomada de temas, motivos e topoi associados ao processo intertextual. Ao contrário, os fios dessa trama derivam das mais variadas composições discursivas e, ao mesmo tempo que se cria algo que soa novo para o leitor, também se estabelece uma relação com o que já foi feito no passado. O resultado não é um tecido “puro”, e sim um material cuja a composição é um entrelace de retomadas de fórmulas anteriores, variações de algo já dito, símbolos e imagens repaginadas, discursos proferidos e “citações passadas”, como no termo de Barthes. Cabe ainda ressaltar uma aproximação entre este pensador francês e o estudioso da retórica, Curtius. Embora se refiram a processos diferentes, ambos admitem que há uma permuta constante entre os textos e os gêneros textuais. Por meio dessa constatação, reforça-se a ideia de que ambos os processos podem ocorrer juntos.
Tendo em vista essas considerações teóricas, esta pesquisa examina algumas das narrativas produzidas por Eça em sua juventude, especialmente aquelas com elementos sombrios, buscando demonstrar a forma como o Eça retoma discussões realizadas em textos anteriores, aprimorando-as em textos posteriores. Nesse sentido, os textos “Farsas” e “O réu Tadeu” são interpretados como um ponto de partida dos quais se desdobram os “retalhos” que comporão produções posteriores.
Tecendo mortalhas
Antes de publicar seu primeiro romance, junto a Ramalho Ortigão (1836-1915), O mistério da estrada de Sintra (1870), Eça de Queirós publica alguns contos na década de 1860. Os primeiros foram “As Misérias. I - Entre a Neve”, de 1865, e “Farsas”, de 1866, ambos veiculados pela Gazeta de Portugal.3 O primeiro narra a história de um lenhador que falece em busca de madeira e alimento devido ao extremo frio. No segundo, onze pequenas histórias, com enredos independentes uns dos outros, comunicam a violência, a miséria e a degradação causada pela pobreza. Ambos os contos são marcados pelo mórbido e pelo tom gótico; mais do que isso, podem ser encarados como um laboratório de experimentação no qual o jovem escritor lançou características textuais, temas, motivos, simbolismos, imagens, entre outros, que serão retomados em diferentes produções de sua carreira.
Primeiramente, “As Misérias. I - Entre a Neve” e “Farsas” são conectadas por um tema em comum, o da pobreza econômica. As duas narrativas comunicam os resultados catastróficos que a condição causa na vida humana. Essa temática repetir-se-á, mesmo que de modo sutil, em “O Tesouro” (1894), publicado na Gazeta de Notícias (RJ-Brasil), no qual três irmãos são descritos como animalizados e decrépitos, conforme destaca a narrativa: “E a miséria tornara estes senhores mais bravios que lobos” (Queirós, 1969, p. 101).
Em “As Misérias. I - Entre a Neve”, o tópos da floresta como locus horribilis é lançado: “[...] por entre nevoeiros moles, ele ia pelos montes, pelas colinas, pelos pinheirais, rachar, cortar e desramar, aos ásperos ventos, na grande neve silenciosa” (Queirós, 2009, p. 35). A grandiosidade da neve e a escassez de alimentos revelam a natureza como monstruosa e amedrontadora, na qual o ser humano é quase impotente para se adaptar, conforme assinalado pelo narrador: “Porque toda aquela natureza tinha estranhas barbaridades” (Queirós, 2009, p. 36). Em “O Tesouro”, esse tópos será também reaproveitado: “Ambos se emboscaram por trás de um silvado que dominava o atalho, estreito e pedregoso como um leito de torrente. [...] Um vento leve arrepiou na encosta as folhas dos álamos - e sentiram o repique leve dos sinos de Retortilho. [...] Um bando de corvos passou sobre eles, grasnando” (Queirós, 1969, p. 101).
Por sua vez, em “Farsas” encontram-se a maioria de temas, motivos e topoi que serão reaproveitados, além de constituir, entre narrativas aqui estudadas, a que estabelece o maior número de relações intertextuais. Na primeira micronarrativa, “A ladra”, uma mulher rouba os pertences de seu parceiro amoroso. Certa noite, ela roubou “uma bolsa de dinheiro, um relógio, um anel e fugiu” (Queirós, 1965, p.15). O homem enlouqueceu após o ato, e ela, tempo depois, deitada na relva, assim como um dia dispendeu seu tempo com o amante, “pôs-se a morrer” (Queirós, 1965, p. 16). Sua morte foi “na enfermaria da cadeia, no apodrecimento da febre calva e com chagas” (Queirós, 1965, p. 16). Futuramente, em “Singularidades de uma rapariga loura” (1873), o tópos da mulher ladra retornará. No conto, Luísa rouba um anel do caixeiro enquanto ela e seu noivo, Macário, escolhem uma joia para presenteá-la. A mulher é descrita como “fina, fresca, loira” (Queirós, 2009, p. 172), de “caráter loiro, como o cabelo - [...] o loiro é uma cor fraca e desbotada: falava pouco, [...]; era simples, quase indiferente, cheia de transigências” (Queirós, 2009, p. 184). Cego de amor, Macário não enxerga a ganância da moça e da sua família e, quando ela furta o anel, num primeiro momento, fica incrédulo: “- Essa senhora tirou um anel dali. - Macário ficou imóvel, encarando-o. - Um anel com dois brilhantes. Vi perfeitamente” (Queirós, 2009, p. 191). Assim, ele desfaz o noivado, parte para outro lugar e “não soube mais daquela rapariga loira” (Queirós, 2009, p. 193). No conto, Luísa não é punida legalmente nem fisicamente por seu delito, tampouco Macário enlouquece por causa da desilusão. Em O primo Basílio (1876), há um reaproveitamento de nomes do conto “Singularidades de uma rapariga loura”, pois ambas as protagonistas se chamam Luísa. No romance, ela também é descrita como dona de “cabelos tons de um louro quente” (Queirós, 2015, p. 59), e, assim, como as duas ladras anteriormente apresentadas, comete um delito: o adultério. De modo semelhante à personagem de “A ladra”, Luísa tem um desfecho bastante parecido após trair o marido. Embora não seja presa, ela enlouquece e tem os cabelos raspados, algo sentido principalmente por Jorge: “O cabelo não! Não! Isso não, pelo amor de Deus! Ela não está em perigo. Para quê? Mas, aquela massa de cabelo era o diabo, impedia a ação da água” (Queirós, 2015, p. 444). Assim, a mulher loira, que, num primeiro momento, parece angelical, mas depois se revela transgressora, torna-se na prosa queirosiana um tipo de motivo recorrente, lapidado ao longo das obras4.
Por sua vez, a narrativa inacabada, “O réu Tadeu” 5 herda de “A filha do carcereiro”, micronarrativa de “Farsas”, a presença de uma moça, também filha de um carcereiro. Em “A filha do carcereiro”, a jovem possui uma criação de pombas e zela pelo pai e pelos irmãos. Porém ela foge com um preso, “um bêbado, um covarde, um assassino, que tinha espancado o pai” (Queirós, 1965, p. 18). Sem cuidados, a família morre: “Passados dias havia pela vizinhança um cheiro de podridão. As crianças tinham morrido, o pai tinha morrido” (Queirós, 1965, p. 18), enquanto “todas as pombas haviam fugido” (Queirós, 1965, p.18). Dessa forma, as aves assumem um paralelo com a personagem: ela era tão presa quanto as pombas, bem como sua liberdade vem com a fuga e com a morte de sua família.
Em “O réu Tadeu”, o protagonista homônimo é acusado de assassinar seu irmão, Simão. Reaproveita-se a personagem (a filha do carcereiro), que, aqui, serve de companhia para o homem. Há a menção das aves, porém a jovem que auxilia a cuidar do cárcere não foge com um preso como na outra narrativa. Ainda, na história de “Farsas”, o nome da moça é Cotovia, em “O réu Tadeu”, não há nome próprio para personagem feminina, apenas o designador “a filha do carcereiro”. Numa visita, a jovem mostra a Tadeu uma pomba morta e ele diz: “[...] morreu o corpo da pomba, nasceu-lhe uma alma, olha: baptiza-lhe de Luísa. Vai-te” (Queirós, 1965, p. 42). É interessante notar que o nome Luísa se repete, agora designando o animal, porém a mulher não tem um nome concedido na história. Aqui, a pomba dialoga com a condição de Tadeu, pois ele, em breve, será morto. Assim, em “O réu Tadeu” a intertextualidade com “A filha do carcereiro” se dá por meio da personagem que trará à narrativa posterior um reaproveitamento imagético - a pomba - para simbolizar a condição do protagonista.
“O réu Tadeu” também se relaciona com “A forma”, outra micronarrativa de “Farsas”. Em “A forma” uma pobre e bela jovem não se casa e é engolida pela solidão e pela decrepitude proveniente da passagem do tempo. Diz o narrador:
Mas era pobre. E ela era casta e religiosa. [...] aquela forma escultural e a brancura lilial da sua pele arrastavam a multidão filistina [quando passava]. Mas era pobre. Não casou e não se deu. Agora, velha, engelhada, lenta, com vestidos lúgubres [...] passa virginal, cheia de solitárias impurezas, arrefecida, oleosa, beata, e com um cão no colo (Queirós, 1965, p. 29-30).
Em “O réu Tadeu” (1867), o reaproveitamento surge no seguinte trecho:
Vê aquele seio robusto: dá a esperança de belas maternidades. Quem a levasse para o leito, teria fidelidade e filhos sãos e belos. Mas, é pobre. [...] daqui anos hão-de vê-la passar, amarrotada, velha, engelhada, desejosa, magra, com um chapéu desbotado, um grande chalé russo, uns sapatos ignóbeis e um cão felpudo ao colo! (Queirós, 1965, p. 48).
Do primeiro para o segundo texto são feitas algumas modificações, como a história central em que a mulher é personagem e o tempo verbal usado em sua descrição (em “A forma”, a descrição da mulher é majoritariamente no presente e, em “O réu Tadeu”, é no futuro). Ademais, poucos adjetivos da descrição são alterados de um texto para outro. Embora não configure uma citação,6 devido à ausência de aspas, ao manter o texto base com poucas alterações, permite-se uma identificação quase imediata da fonte, ou, ainda, uma copresença de “A forma” em “O réu Tadeu”.
Poder-se-ia associar tal retomada a um plágio, o qual “constitui uma retomada literal, mas não marcada”, e cuja “designação do heterogêneo aí é nula” (Samoyault, 2008, p. 51), porém a classificação esbarra em duas questões: a autoria e a gênese textual. No caso, ambos os textos dividem o mesmo autor, portanto, de forma criativa, Eça detém o uso das personagens que cria. Além disso, quando se cria um novo texto, embora se reaproveite uma personagem, mesmo que de maneira quase idêntica à primeira menção, no segundo texto, ela tende a desempenhar uma nova função, ter novas ações, pensamentos e, às vezes, outra personalidade. Assim, por mais que dividam o mesmo nome, já não é mais o mesmo ente ficcional de outrora. Este pensamento também é aplicável ao caso da filha do carcereiro, que, no primeiro texto, tem uma figuração e função - protagonista - e, no segundo, outra - a interlocutora de Tadeu na cadeia.
“O réu Tadeu”, por sua vez, lega características textuais a outros dois contos: “O tesouro” e “Memórias de uma forca” (1867), originalmente publicado no GP. Em “O réu Tadeu”, conforme supracitado, há um suposto fratricídio inflingido por Tadeu contra Simão. Em “O tesouro”, os irmãos Rui, Rostabal e Guanes matam uns aos outros pela cobiça pelas moedas de ouro. Dessa forma, o motivo do assassinato em família, especialmente o de irmãos, retorna na prosa queirosiana.
A relação de “O réu Tadeu” com “Memórias de uma forca” é mais complexa. Na parte II da primeira história, a narrativa heterodiegética é substituída pelas Memórias de Tadeu, organizadas em torno do narrador autodiegético. No segundo conto, o narrador incomum, a forca, comunica a sua história desde quando era uma árvore até seu fim, o apodrecimento. Mais do que a mesma escolha de procedimento narrativo, em “O réu Tadeu”, o protagonista é enforcado:
O ar estava sereno e tão doce que parecia que todo ele derramava a alma duma santa. [...] A forca estava erguida numa clareira, entre árvores. Eram oliveiras. [...] Subiu os degraus da forca, [...] [viu] ao longe os campos semeados, as grandes espessuras sonoras, todas as formas de vida, esplêndidas e verdes. [...] Depois quando o alçapão desceu, ficou hirto, convulsivo, suspenso, arroxeado. Estava morto.
O sol vinha nascendo; e seus vastos raios [...] deram-lhe aquela auréola, mais bela que a dos santos [...].
As pombas voavam.
A manhã estava religiosa e meiga; e o vento agitava brandamente as flores e o cadáver (Queirós, 1965, p. 45).
Apesar de comunicar a execução de uma pena capital, o excerto possui um tom poético acentuado, que se relaciona à perspectiva do narrador sobre o ocorrido. Com exceção da descrição do estado do corpo, o restante da narração apresenta uma visão bela sobre a morte, com caráter positivo, o que contradiz o senso comum. No caso, a morte de Tadeu é sua liberdade e a possível forma de expiar seu suposto crime; por isso, faz sentido que o tom adotado seja belo e positivo.
Em “Memórias de uma forca”, sobrenaturalmente, o instrumento conta sua própria história. A forca não se sente à vontade matando os condenados, conforme apresenta:
[...] eu não quero ser relíquia de tortura: eu alimentava, não quero aniquilar [...], não quero ser a aliada do coveiro! [...]. Ó meu Deus, liberta-me deste mal humano tão aguçado e tão grande, que se traspassa a si, atravessa de lado a lado a natureza, e ainda te vai ferir, a ti, no Céu! (Queirós, 2009, p. 113).
Porém, quando a forca apodrece e já não pode mais ser usada como instrumento de tortura e morte, o tom da narração muda:
O corpo esfria-me: eu tenho a consciência da minha transformação lenta de podridão em terra. Vou, vou. Oh terra adeus! Eu derramo-me já pelas raízes. Os átomos fogem para toda a vasta natureza, para a luz, para a verdura. Mal ouço o rumor humano. Ó antiga Cíbele, eu vou escorrer na circulação material do teu corpo. Vejo ainda indistintamente a aparência humana, como uma confusão de ideais, de desejos, de desalentos, entre os quais passam, diafanamente, bailando, cadáveres! Mal te vejo, ó mal humano! No meio da vasta felicidade difusa do azul, tu és, apenas, como um fio de sangue! As eflorescências, como vidas esfomeadas, começam a pastar-me! Não é verdade que ainda lá em baixo, no poente, os abutres fazem o inventário do corpo humano? Oh matéria, absorve-me! Adeus! para nunca mais, terra infame e augusta! Eu vejo já os astros correrem como lágrimas pela face do céu. Quem chora assim? Eu sinto-me desfeita na vida formidável da terra! Oh mundo escuro, de lama e de oiro, que és um astro no infinito - adeus! adeus! - deixo-te herdeiro da minha corda podre (Queirós, 2009, p. 115).
Ambos os contos têm a narração da morte pelo viés poético, que a representa como uma transmutação relacionada ao belo: no momento da finitude, Tadeu ganha ares sacros, enquanto a forca adquire sua liberdade longe da maldade humana. No caso da forca, torna-se plausível o tom positivo e belo sobre a morte, pois o fim transforma o objeto em átomo, livrando-o de sua macabra e odiada função. Em ambos os casos, a morte liberta e faz com que essa perspectiva se torne um tema recorrente nos contos de Eça.
Ambas as personagens também aludem a uma figura sacra em comum: Jesus. Num momento de sofrimento, a forca diz:
Oh! Meu Deus! Soluçava eu ainda, eu não quero ser relíquia de tortura: eu alimentava, não quero aniquilar; era a amiga do semeador, não quero ser a aliada do coveiro! [...] Oh meu Deus, liberta-me deste mal humano tão aguçado e tão grande, que se traspassa a si, atravessa de lado a lado a natureza, e ainda te vai ferir, a ti, no Céu! Oh! Deus, o céu azul, todas as manhãs, me dava os orvalhos, o calor fecundo, a beleza imaterial e fluida da brancura, a transfiguração pela luz, toda a bondade, toda a graça, toda a saúde, - não queiras que, em compensação, eu lhe mostre, amanhã, ao seu primeiro olhar, este cadáver esfarrapado! “Mas Deus dormia, entre os seus paraísos de luz. Vivi três anos nestas angústias”. (Queirós, 2009, p. 113-114)
Numa aparente tentativa de se assemelhar a Cristo em seu martírio, o objeto “indivíduo” se sente abandonado por Deus, mesmo que tenha pedido a ele sua libertação. Assim como no texto bíblico, a forca não recebe uma resposta do Criador, ficando abandonada. Essa imagem, mesmo que muito sutilmente evocada, ajuda o leitor a se compadecer com o sofrimento da narradora.7
Anos antes de “Memórias de uma forca”, em “O réu Tadeu”, Eça relaciona o protagonista a Cristo. Primeiramente, o espaço de morte é rodeado de oliveiras, e, enquanto Tadeu caminhava para a forca, é dito: “Ele caminhava, olhando fixamente os ramos e as folhagens, os ramos erguidos como dedos, para todos os pontos do ar, pareciam mostras àquela alma serena, que ia partir, todos os caminhos do céu” (Queirós, 1965, p. 45). Antes de ser crucifixado, Jesus conversa com Deus no Monte das Oliveiras e, no conto, de certa forma, o espaço remete ao apresentado na Bíblia, pois além desse tipo de árvore há uma menção aos céus. Depois de morto, conforme mencionado anteriormente, Tadeu ainda ganha uma espécie de auréola, como se a morte o santificasse, o que é reforçado pelo tom religioso e meigo que a descrição faz da manhã.
Longe de blasfemar o Messias, relacionando-o ao mundano, os contos usam dessa imagética para comunicar, de um lado, o sofrimento da forca e, do outro, a libertação e redenção de Tadeu diante de seu suposto crime. Além disso, é bastante plausível essa imagética sacra em comum, devido ao cenário extremamente católico que Portugal apresenta. O contexto português também influi na escolha do meio de execução, a forca: o país, por anos, usou o instrumento para cumprir a pena capital8. O motivo da forca e do enforcamento ressurgirá em “O defunto”, de 1895, publicado primeiramente na Gazeta de Notícias, no qual um enforcado, sobrenaturalmente, “retorna à vida” para ajudar D. Rui de escapar de um logro.
“O réu Tadeu” também carrega um tema que, futuramente, desdobrar-se-á em O primo Basílio: o adultério. No conto, fica entendido que Tadeu, Simão e sua cunhada dividem a mesma casa por algum tempo. Quando ela vai “para uma quinta para a companhia de sua mãe” (Queirós, 1965, p. 39), Simão fica “descorado” e “despenteado” (Queirós, 1965, p. 39), vagando pelas ruas, desnorteado, à noite. Já Tadeu, tempo antes do suposto crime, “saíra de casa do irmão, e fora habitar, para uma aldeia próxima” (Queirós, 1965, p. 39). No conto, se Simão estava sozinho, não teria como ser assassinado. Dessa forma, cabe questionar o motivo pelo qual Tadeu se considera culpado. Fica implícito que algo ocorreu entre Tadeu e sua cunhada, fato descoberto por Simão, causando nele o estado alterado, e em Tadeu a culpa que o conduz a assumir o crime. Além disso, a forma que o cadáver de Simão encontrada soa muito mais como um suicídio do que como um assassinato: estava enforcado dentro de um armário de louças. De forma muito mais explícita, o adultério em O primo Basílio também ocorre em família: Luísa revive seu amor da juventude pelo primo Basílio. Todavia, no romance, apenas a protagonista é punida pelo ato e, conforme supracitado, adoece, enlouquece e morre.
No que tange ao tópos do loci horribiles, há uma diferença de abordagem entre “O réu Tadeu” e “Memórias de uma forca”. No primeiro, o espaço do enforcamento não é caracterizado como horrendo. Ao contrário, é iluminado, calmo, florido e quase idílico. Ou seja, sua caracterização está muito próxima do locus amoenus, que, para Curtius (2013), é o da paisagem ideal, onde o ser humano pode descansar ou usa do espaço para encontros amorosos. No conto, o espaço de morte ganha sentido positivo justamente por que é onde Tadeu pode expiar sua possível culpa, livrando-se de seu erro, um suposto adultério.
Por sua vez, em “Memórias de uma forca”, o espaço dos enforcamentos é um legítimo locus horribilis.9 A forca caracteriza o espaço como “descampado sinistro” (Queirós, 2009, p. 112), onde, além da presença dos cadáveres,
[...] [v]oavam sombras por cima de mim. Eram os corvos. Poisaram. Eu sentia as penas imundas; afiavam os bicos; no meu corpo; penduravam-se, ruidosos, cravando-me as garras. [...] Solucei dentro de mim (Queirós, 2009, p.113).
No conto, a perspectiva da forca domina a apresentação do lugar e, por ela estar descontente de ser um instrumento de tortura, apresenta-o ao leitor como desagradável e sinistro. Diferentemente, em “O réu Tadeu”, a perspectiva da personagem, filtrada pela voz do narrador heterodiegético, é positiva sobre a morte, o que torna o espaço agradável e iluminado.
Ao longo das análises aqui apresentadas, percebeu-se que os “fios” em comum entre os contos iniciais queirosianos são relacionados ao imaginário sombrio, remetendo e se desdobrando em temas, motivos, topoi e intertextualidades de semelhante valor, como o enforcamento, os loci horribiles, o tema do amor maldito etc. A reutilização de “fios” de uma narrativa para outra - como personagens que reaparecem ou o aproveitamento de excertos quase de forma literal -,ou ainda, uma “reciclagem” que faz o material primário soar mais distante do secundário demonstram que o escritor teve um profundo interesse nos assuntos obscuros, assim como Cal (1969) havia apontado. A tendência se mostra ainda mais duradoura ao ser encontrada em romances com cariz realista-naturalista, como O primo Basílio, aqui mencionado.
Os deslocamentos de um texto para outro, seja por meio dos processos retóricos ou pela intertextualidade, podem fazer com que o leitor se questione se está lendo algo novo ou apenas um material modificado. Assim, em Eça, mesmo quando é possível rastrear tais deslocamentos no texto anterior com facilidade, o novo uso do discurso os diferem do primeiro, pois novas funções, valores, perspectivas e contextos são apresentados. Dessa forma, adaptando a metáfora barthesiana sobre a “tecelagem” literária, conclui-se que, nas obras do autor, a composição dos textos fica próxima ao processo do patchwork (trabalho com retalhos, em inglês), no qual o recorte de um tecido costurado com outros pedaços origina novos trabalhos. No patchwork, mesmo que se use os mesmos tecidos, cada resultado é diferente, pois podem ser aplicados diversos padrões de recorte e de organização dos retalhos, num processo semelhante ao que o escritor aplicou nos textos aqui estudados.
Ao ler as narrativas da forma aqui adotada, observou-se que foram nesses primeiros contos que Eça começou a desenvolver os traços estilísticos e conteudísticos que lhe cederam renome. A Luísa d’O primo Basílio possivelmente não teria existido se a personagem de “Singularidades duma rapariga loura” não tivesse sido criada, assim como o tema do adultério foi lapidado, pois, anteriormente, figurou o cerne de “O réu Tadeu”. Portanto, de forma semelhante com o que ocorre com os topoi, fica a impressão de que, após uma remodelação, o tecido textual soa como novidade.
Referências
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» https://books.google.com.br/books?id=nxqlCgAAQBAJ&printsec=frontcover&hl=pt- BR#v=onepage&q&f=false - QUEIRÓS, Eça de. Contos I Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda , 2009.
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» https://doi.org/10.7458/SPP20219518797
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1
Na Gazeta de Portugal, Eça teve a sua colaboração iniciada em 1886 e, no Distrito de Évora, em 1887.
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2
O prefácio foi escrito como uma carta ao editor Revue Universelle quatro anos após a primeira publicação, que é datada de 1880. No Brasil, o prefácio foi incorporado em algumas edições de O mandarim, como a publicada pela L&PM Pocket, aqui consultada e de tradução de Dannie Pauluzzi Mancio.
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3
Neste trabalho, o nome será abreviado para GP.
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4
Sobre o motivo das mulheres, que parecem oferecer um amor divino que se revela perigoso e destrutivo, recomenda-se a leitura de A recepção literária de H. Heine no romantismo português (1984), de M. M. G. Delille. No estudo, a autora, além de outras análises, investiga o tópos das estátuas de mármore, relacionada à literatura germânica, no qual está englobado os amores malditos e uma esfera vampírica.
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5
Narrativa publicada pela primeira vez em 1867 no Distrito de Évora.
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6
Para G. Genette (1982), em Palimpsestos, a citação é um tipo de co-presença de um texto A em um texto B facilmente identificável por causa das aspas ou outra marca tipográfica junto com a autoria.
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7
Destaca-se que, em “Entre a neve” - narrativa que também foi integrada à coletânea póstuma Prosas bárbaras (1903) -, o lenhador, personagem protagonista, também se sente abandonado por Deus, quando está sozinho, no escuro da noite e em meio à neve da floresta.
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8
De acordo com matéria do Arquivo Nacional Torre do Tombo, o Tribunal do Santo Ofício condenou à fogueira centenas de pessoas acusadas de crimes religiosos. Os registros mais antigos de pessoas “relaxadas em carne” (como se referiam aos executadas por heresias), em posse do arquivo, são os Autos de Fé 1732 e de 1733, ambos celebrados em Lisboa. Segundo Vaz e Estevens (2021), Portugal extinguiu a pena capital para crimes civis em 1867, tornando-se, na Europa, um dos primeiros países a aboli-la, bem como teve a sua última execução em 1846, a qual ocorreu por enforcamento.
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9
Em “O defunto”, o espaço dos enforcamentos também é caracterizado como um loci horribiles: “Sobre os pilares pousavam quatro grossas traves. Das traves pendiam quatro enforcados negros e rígidos, no ar parado e mudo. Tudo em torno parecia morto como eles. Gordas aves de rapina dormiam empoleiradas sobre os madeiros” (QUEIRÓS,1969, p. 194). É dali que o defunto que auxiliará D. Rui surgirá, contudo, nem a boa vontade do morto dissolve o aspecto do local, que ao fim do conto é apresentado como: “O silêncio era mais triste e fundo que os outros silêncios da terra. A água da lagoa enegrecera. A Lua descia e desfalecia” (QUEIRÓS, 1969, p. 204). Assim, o espaço parece mais triste, pois, agora, o defunto retorna à eternidade da morte e à decomposição total do corpo.
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Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
21 Nov 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
02 Mar 2025 -
Aceito
30 Jul 2025
