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PERSPECTIVAS RETÓRICO-DISCURSIVAS PARA O ESTUDO DA PATEMIZAÇÃO

RESUMO

Tomando como ponto de partida as reflexões sobre a dimensão patêmica do discurso, este artigo focaliza a discussão sobre as três provas retóricas de persuasão – logos, pathos e ethos –, buscando argumentar em favor de sua integração, a partir de contribuições advindas tanto da Nova Retórica e da Sofística quanto da Teoria Semiolinguística do Discurso. Recusando a perspectiva dicotômica do paradigma cartesiano, nosso objetivo principal é realçar a necessidade de concebermos uma relação de interdependência entre o pathos e o logos. Para ilustrar nossa proposta, procedemos, após exposição teórica sobre o tema, ao exame de excertos de uma crônica jornalística, na expectativa de reforçar a legitimidade do assunto em apreço e de confirmar a necessidade de debates e demonstrações mais consistentes. Elegidas as categorias da intergenericidade e da metáfora como estruturas discursivas representativas do logos, a análise permite observar seu desdobramento em efeitos de patemização, concebidos aqui como efeitos de sentido.

Pathos; Logos; Nova Retórica; Sofística; Semiolinguística

ABSTRACT

Taking as a starting point some reflections on the pathetical dimension of discourse, this article focuses the discussion of the three rhetorical modes of persuasion – logos, pathos, and ethos – in an attempt to argue in defence of their integration, with contribution from the new rhetoric, sophistics and the semiolinguistic theory of discourse. Refusing the dichotomous perspective of the Cartesian paradigm, our main purpose is to draw attention to the need to reconfirm a relationship of interdependence between pathos and logos. To illustrate our proposal, after a theoretical exposition on the subject, we analyse excerpts from a journalistic chronicle in the hope of confirming the legitimacy of the subject under consideration and the need for more consistent debates and demonstrations. Once the categories of intergenericity and metaphor have been chosen as discursive structures representative of the logos, the analysis allows us to observe their deploymenting in the effects of patemization, considered here as meaning effects.

Pathos; Logos; New Rhetoric; Sophistics; Semiolinguistics

Introdução

Nas últimas décadas, vêm ganhando corpo as discussões acerca das emoções nos discursos, sobretudo a partir do postulado de que certas emoções podem ser intencionais e, portanto, racionais. Tal postura põe em xeque uma visão tradicional pela qual se compreende razão e emoção numa relação de oposição, concepção oriunda do clássico dualismo platônico corpo/mente, mas, de fato, consagrada por Descartes, no século XVII, que defendia a supressão das paixões, sob o argumento de que somente estando livre delas a mente se mantém saudável.

No rastro de Platão e do paradigma cartesiano, a partir dos quais paradoxos como corpo e mente, razão e emoção, acabaram sendo cristalizados, outras dicotomias foram sendo estabelecidas. Dentre tantas formulações, podemos citar algumas tão conhecidas quanto disseminadas: argumentação x retórica, objetividade x subjetividade, ciências exatas x ciências humanas e, uma que particularmente nos interessa, logos x pathos/ethos, dualismo que contempla os três meios de persuasão trabalhados por Aristóteles em sua Retórica (ARISTÓTELES, 2012ARISTÓTELES. Retórica. Tradução de Manuel A. Junior, Paulo F. Alberto e Abel N. Pena. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.).

A partir desta problemática e da constatação de que muito pouco tem sido produzido a fim de que a dicotomia seja rediscutida e revista, julgamos necessário trazer o debate à tona, apoiando-nos em autores em cujas obras já é possível vislumbrar algum avanço no que concerne à assunção de uma concepção menos rígida, segundo a qual cremos em um movimento mais harmônico entre as provas artísticas do triângulo aristotélico, tidas, assim, como perspectivas discursivas em interação ou, nas palavras de Galinari (2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.257) como “dimensões do mesmo discurso”. E uma vez que nosso posicionamento é o de evitar as fórmulas dicotômicas, entendendo que muitas delas fixam barreiras à construção do conhecimento e à integração de diferentes disciplinas, buscaremos estabelecer nossa discussão articulando noções provenientes de diferentes abordagens dos estudos da linguagem, aparentemente distintas, mas que, em nossa visão, se completam: a Análise do Discurso, em sua vertente Semiolinguística; a Nova Retórica, com seus mais proeminentes representantes; além de um debate com a Sofística, cujas contribuições são basilares para que efetivamente ultrapassemos os limites impostos pelo racionalismo cartesiano.

Embora nossa proposta de levantamento teórico e de análise tenha como alvo principal o pathos, meio de persuasão concernente às emoções despertadas pelo orador/enunciador no auditório/coenunciador, é valido antecipar, ainda nesta seção introdutória, a inevitabilidade de se recorrer ao conceito de logos. Diferentemente do modelo que considera o logos [racional/objetivo] como oposto ao pathos e ao ethos [menos racionais/mais subjetivos] – isso do ponto de vista de um racionalismo fragmentador –, compreendemos estes como desdobramentos daquele. Tendo em vista que o logos se relaciona ao próprio discurso – ou à construção argumentativa –, não podemos prescindir de assumir que a construção de uma representação de si (ethos) ou a expressão linguageira de certas emoções (pathos) deve ser resultado do discurso (logos).

Admitindo, pois, que o pathos (assim como o ethos) resulta sempre do logos, este materializado nos textos por meio de diferentes estratégias retórico-discursivas, e compreendendo o pathos como uma propriedade das “discursivizações que funcionam sobre efeitos emocionais com fins estratégicos” (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2014CHARAUDEAU, P.; MAINGUENEAU, D. Dicionário de análise do discurso. Coordenação da tradução: Fabiana Komesu. São Paulo: Contexto, 2014., p.372), este artigo, após uma exposição teórica, investiga alguns processos de gerenciamento das emoções em uma crônica jornalística. Para dar sequência a esse percurso teórico-analítico, assumimos os seguintes pressupostos:

  • é possível, num diálogo entre vertentes de estudos do discurso com a doutrina sofística, compreender o pathos como um desdobramento do logos e, assim, sistematizar de forma mais didática e inteligível um quadro de emoções (pathos) como efeito do discurso (logos);

  • nesse sentido, certos estereótipos ou representações sociais são ativados, no discurso, com fins estratégicos para se atingirem – e também para refletirem – efeitos patêmicos. Ora, se Charaudeau (2013)CHARAUDEAU, P. Discurso político. Tradução de Fabiana Komesu e Dilson F. da Cruz. São Paulo: Contexto, 2013. compreende as emoções como atreladas ao saberes de crença (uma das formas de construção/manutenção das representações), não há como desvinculá-las da maneira como as atividades discursivas condicionam o apelo às emoções a partir das representações sociais no discurso, particularmente no âmbito das mídias jornalísticas;

  • a crônica jornalística, por constituir um gênero textual midiático dos mais emblemáticos, no que concerne ao apelo a todo o tipo de subjetividade – incluindo-se aí as emoções no discurso – é um espaço discursivo privilegiado para o exame dos possíveis efeitos patêmicos refletidos e potencialmente produzidos no interlocutor, sobretudo pela abertura de que goza o enunciador para “apostar” em diversas estratégias, sejam aquelas garantidas pela própria língua, seja por meio de certas representações às quais o cronista recorre para atingir seus propósitos no discurso.

Assim, este artigo segue com: uma breve apresentação do estado da arte sobre o tema antes do reaparecimento da retórica, no século XX; a proposta de revisão sobre o objeto em foco, com as contribuições da Nova Retórica, da Sofística e da Semiolinguística; uma rápida análise, de natureza qualitativa e interpretativa, de excertos de uma crônica jornalística de Lya Luft, a fim de ilustrar a proposta em debate; e, enfim, algumas considerações finais a propósito da articulação entre o percurso teórico e a análise.

Patemização e linguagem: algumas problemáticas

Sabemos que a importância das emoções para os estudos do discurso não é nada recente. Foi, primeiramente, tratada pelos retóricos como fenômeno concernente às paixões, e constitui, de acordo com Aristóteles (2012ARISTÓTELES. Retórica. Tradução de Manuel A. Junior, Paulo F. Alberto e Abel N. Pena. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012., p.13) uma das três provas de persuasão presentes no discurso, sendo que: “umas residem no caráter moral do orador [ethos]; outras, no modo como se dispõe o ouvinte [pathos]; e outras, no próprio discurso, pelo que este demonstra ou parece demonstrar [logos]”.

Podemos dizer que, das três provas de persuasão, o pathos está ligado às paixões, aos afetos, às emoções despertadas por um orador em seus ouvintes. Lidar com um aspecto tão subjetivo, como o é a disposição afetiva de um ouvinte, pode dar a impressão de que o pathos é um fenômeno que foge ao controle do discurso, pois os efeitos de ordem emotiva produzidos no outro são sempre dependentes das condições de receptividade deste. Nem por isso podemos atribuir ao pathos um papel menos essencial. O próprio Aristóteles (2012ARISTÓTELES. Retórica. Tradução de Manuel A. Junior, Paulo F. Alberto e Abel N. Pena. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012., p.XXX) declara que ethos, pathos e logos são os “três elementos de prova que juntamente contribuem para o raciocínio entimemático”1 1 Grifo nosso. , isto é, o raciocínio que pressupõe conhecimentos partilhados entre orador e auditório, tratando certas afirmações e pressupostos como não problemáticos.

Embora o quadro desenhado por Aristóteles sugira a integração das três provas de persuasão, ainda no período clássico já havia aqueles que, como Platão, elaboravam seus postulados canônicos a partir de dicotomias, tais como corpo/mente, possivelmente a mais proeminente nos “anos de ouro” da retórica, tendo servido como paradigma para tantas outras oposições como convicção/persuasão e, no mesmo rastro, razão/emoção. Esta última, é importante destacar, foi sustentada ao longo dos séculos, ganhando ainda mais solidez no século XVII, sob a égide do pensamento cartesiano:

[...] Com Platão temos uma amostra da exclusão a que foi relegada a emoção ao longo da história, pensamento seguido por diversos filósofos de outras épocas, como Santo Agostinho, por exemplo. Todavia, é com alguns filósofos como Descartes e Kant que tal cisão mostrou-se ainda mais aguda. Se, como postulava Descartes, as paixões seriam signo de doença, somente se elas fossem alijadas, a mente estaria em perfeita saúde. Esse modo dicotômico de pensar a emoção e a razão contribuiu com séculos de atraso em termos de debates sobre o assunto. (LIMA, 2007LIMA, H. Patemização: emoções e linguagem. In: MACHADO, I. L.; MENEZES, W.; MENDES, E. (Orgs.). As emoções no discurso. v.1. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. p.140-149., p.140).

Essa concepção racional-mecanicista foi, nos séculos posteriores, o fundamento que resultou em uma quase aniquilação da tradição retórica dos gregos. O fato foi que, o mundo ocidental da era das luzes, dominado pelo cientificismo, não poderia admitir formas de pensamento ou demonstrações verossímeis, plausíveis, tal como previa a retórica de Aristóteles. Requeria-se o racional e o absoluto para se alcançarem afirmações verdadeiramente válidas e, para tanto, formas lógicas de raciocínios, com noções como as de valor de verdade, ocuparam o espaço das teorias argumentativas. E foi assim que ocorreram grandes cismas conceituais, já que a influência de filósofos como Descartes seria responsável, entre tantas formulações, pela definitiva separação entre argumentação e retórica, a qual carrega

[...] em seu “DNA”, a propriedade de se reproduzir em cascata, trazendo à luz outros dualismos, respectivamente análogos, tais como: “convencer x persuadir”, “razão x emoção”, “lógica x retórica”, “não falacioso x falacioso”, “argumento válido x não válido”, “boa retórica x má retórica”, “objetividade x subjetividade”, “logos x ethos/pathos” etc.. (GALINARI, 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.261, grifos do autor).

É pertinente, tendo em vista as finalidades específicas de nossa proposta neste artigo, observar que tal cisão acabou por afetar a harmonia do triângulo aristotélico, formado pelos três meios de persuasão, fruto do intenso domínio que o paradigma filosófico cartesiano exerceu e ainda exerce, até os dias de hoje, sobre modelos epistemológicos em vários setores do saber.

Assim, no que tange aos estudos que articulam emoção e discurso, é valido mencionar as reflexões de Galinari (2007GALINARI, M. M. As emoções no processo argumentativo. In: MACHADO, I. L.; MENEZES, W.; MENDES, E. (Orgs.). As emoções no discurso. v.1. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. p.221-239., 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014.), que aponta algumas barreiras para a reintegração das provas de persuasão, obra, segundo este autor, de um “fetiche cartesiano” (GALINARI, 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014.). Dito em outras palavras, trata-se de uma mania ou de uma cultura de dicotomização, pela qual o triângulo aristotélico é muitas vezes alvo de uma bipartição, em que se opõe o logos – ostentado como prova objetiva – ao ethos e ao pathos. Galinari (2014)GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014. registra que, em sua análise de alguns autores, verificou obstáculos que impedem a integração efetiva das provas retóricas (ainda que tais autores não tenham noção do empecilho que acarretam):

[...] Eggs (2008)2 2 Referência a: EGGS, E. Ethos aristotélico, convicção e pragmática moderna. In: AMOSSY, R. (Org.). Imagens de si no discurso: a construção do ethos. São Paulo: Contexto, 2008, p.29-56. , por exemplo, fundamentando-se na sua leitura de Aristóteles, separa os meios de persuasão em ‘dois blocos de convicção’: por um lado, encontramos o logos (classificado como inferencial, como raciocínio e como argumentação); noutro bloco da dicotomia, juntam-se o ethos (habitus, virtude, caráter) e o pathos (paixão, afeto). Por sua vez, Plantin (2005)3 3 Referência a: PLANTIN, C. L’argumentation: histoire, théories et perspectives. Paris: PUF, 2005. , ao mencionar os três caminhos para validar uma opinião, assim executa o seu divórcio diante do trio amoroso/retórico: para um lado vai, solitariamente, o logos (prova objetiva, proposicional); para outro, seguem, entrelaçados, o ethos e o pathos (‘provas’ subjetivas, não proposicionais). (GALINARI, 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.260).

No que diz respeito à postura de Eggs, notamos uma contradição, pois uma vez que sua proposta é baseada em sua leitura da retórica aristotélica, que parece não oferecer margem para uma visão dicotômica, a divisão em blocos constituiria um paradoxo quase declarado. A propósito da concepção de Plantin, a oposição logos x pathos/ethos é, provavelmente, oriunda de outra, de natureza mais abrangente, entre objetividade e subjetividade. Galinari ressalva que embora as reflexões destes e de outros autores ofereçam amplas contribuições para a análise do discurso, impera, ainda, a preferência pelas rigorosas separações.

Embora possamos compreender que os autores se orientem por um modelo epistemológico que lhes seja apropriado aos seus propósitos, as dicotomias, neste caso, podem ser verdadeiros obstáculos para que os estudos relativos às provas retóricas ultrapassem as barreiras da teoria para se tornarem mais operacionais, como, por exemplo, nas práticas de leitura e de análise discursiva.

É importante frisar que o nosso posicionamento coincide com o de Galinari (2007GALINARI, M. M. As emoções no processo argumentativo. In: MACHADO, I. L.; MENEZES, W.; MENDES, E. (Orgs.). As emoções no discurso. v.1. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. p.221-239., 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014.), no sentido de admitir a inter-relação das provas de persuasão. Assim, no lugar de considerar que o logos se opõe ao pathos e ao ethos, julgamos imperativa a necessidade de revisão dessa proposta, abandonando, portanto, antigas dicotomias. Na perspectiva integradora aqui adotada, o pathos – tanto como o ethos – consistiria em um desdobramento semântico-discursivo do logos (cf. GALINARI, 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014.), ou melhor, do discurso enquanto resultante de uma ação enunciativa, o que, naturalmente, envolve a ação do sujeito da enunciação.

Na próxima seção, veremos como as reformulações operadas pela Nova Retórica e como a doutrina sofística sobre o logos constituem-se como fontes produtivas para amparar a proposta aqui adotada.

Contribuições da Nova Retórica e da Sofística

Embora, como registramos na seção anterior, a retórica tenha sofrido, a partir do século XVII, um forte rebaixamento, enquanto disciplina ou arte do argumentar, ela ressurge com bastante energia no século XX. A obra Tratado da Argumentação: a nova retórica (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 1996PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado de argumentação: a nova retórica. Tradução de Maria Ermantina de Almeida P. Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1996.), com primeira edição datada de 1958, marca, sobremaneira, a (re)integração da retórica e da argumentação, o que irá oferecer aos estudos da linguagem, entre outras contribuições: a incorporação de todas as formas discursivas de persuasão, como a publicidade e as demais mídias, por exemplo; a consideração da matéria não-verbal, seja nos discursos puramente imagéticos, seja nas formas sincréticas; e a inserção do não racional, abrindo-se, assim, ao universo passional (pathos). Dessa forma, a Nova Retórica indica o caminho para a fuga de um racionalismo ultrapassado, dando lugar a uma lógica do razoável, do provável, do verossímil. (cf. FERREIRA, 2015FERREIRA, L. A. Leitura e persuasão: princípios de análise retórica. São Paulo: Contexto, 2015.).

Na esteira dessa postura integradora, os postulados neorretóricos apontam para o fato de que os três componentes de persuasão – logos, pathos e ethos – mais se complementam do que se retraem. São, antes de serem perspectivas isoladas, elementos em plena interação. Ora, não é complexo admitir que, em uma situação de comunicação, um orador/enunciador seja capaz de tocar a afetividade (pathos) de seu auditório/coenunciador, por meio de uma representação de si (ethos) como efeito do próprio discurso (logos).

Nesse sentido, as provas de persuasão podem ser consideradas mais como perspectivas integradas ou, no caso de uma aplicação didática, por exemplo, como diferentes ângulos de leitura, simultaneamente atuantes. Isso não significa que cada uma delas não possa ser examinada separadamente, mas isso deve, claramente e apenas, ser feito por uma questão de sistematização, a fim de que os três elementos sejam compreendidos dentro das particularidades que caracterizam cada um deles.

Ainda que toda a sofisticação proporcionada pela Nova retórica tenha constituído uma virada importantíssima, algumas heranças do paradigma cartesiano se mantêm fortes. Devo explicar, novamente com base nos estudos de Galinari (2011GALINARI, M. M. A polissemia do logos e a argumentação: contribuições sofísticas para a análise do discurso. EID&A – Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, Ilhéus, n.1, p.93-103, nov. 2011., 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014.), que um entendimento mais sólido da inter-relação das provas retóricas requer um aprofundamento na noção do logos. Na visão do autor, a vertente sofística da retórica comporta um arcabouço teórico-conceitual capaz de conceber o logos como mais do que um conjunto de operações mentais razoáveis – o que, como vimos, já teria sido uma grande inovação dos neorretóricos. A partir de um estudo sobre os sofistas, considerados grandes pensadores e educadores situados no século V a.C.4 4 Referimo-nos, pois, à Sofística tal como praticada em seu primeiro momento – Sofística Antiga ou Primeira Sofística –, na segunda metade do século V a.C., cujos representantes mais proeminentes foram figuras como Górgias, Protágoras e Hípias, entre outros. Difere de uma Segunda Sofística, desenvolvida no século II d.C. – embora tenham sido, de certa forma, marginalizados –, e de obras contemporâneas acerca do tema, Galinari compreende que o logos “não se restringe ao campo das operações mentais, dos raciocínios esboçados na materialidade do discurso, pois, assim pensando, excluir-se-ia, pode-se interpretar, o campo do dizer, da enunciação”, da qual “os sofistas foram grandes estudiosos, abarcando várias de suas dimensões, e sempre – o que é mais importante – sob uma perspectiva retórica e comunicativa” (GALINARI, 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.263, grifos do autor).

O estudo de Pinto (2000)PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000., intitulado “A Doutrina do Logos na Sofística”, investiga, com base em uma profunda fundamentação teórica, a maneira como o logos nasce e se desenvolve com o fomento da escola dos primeiros sofistas. Entre tantas explicações, a autora cita um trabalho de Emmanuele Riverso, sobre a influência destes pensadores:

Com a Sofística dá-se uma crise ao logos, tal como foi elaborado pelas filosofias precedentes. A sua validade para descobrir uma verdade absoluta, colocada na estrutura do real, foi demolida e com ela foi demolida a primitiva objectividade da verdade; por outro lado, foi aperfeiçoada a sua força persuasiva, isto é, a sua capacidade de modelar interpretações das coisas que, pela sua coerência interna e pela capacidade de suscitar a adesão dos outros, se constituíam como verdades, criadas pelo ser humano. (RIVERSO apud PINTO, 2000PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000., p.100).

Pinto (2000)PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000. salienta, ainda, que houve uma preocupação sofística com a linguagem; uma preocupação, sobretudo, centrada no uso das palavras, evidência de uma concepção menos rigorosa do logos, tendo em vista a dinamicidade da própria linguagem. Dessa forma, a autora cita, entre outros, os exemplos: de Protágoras, que “se debruçou sobre questões de gramática, ocupando-se dos géneros dos nomes e da classificação das partes do discurso”, além da “crítica das expressões desajustadas e da composição sintática do discurso” (PINTO, 2000PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000., p.173); de Pródico, uma vez que sua atividade “no campo das questões relativas logos falado é documentada por numerosas fontes que lhe atribuem (...) a maestria na arte da divisão dos nomes” (PINTO, 2000PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000., p.182); de Antifonte, cujos ensinamentos incluem o pressuposto de que “os conceitos que utilizamos no discurso (...) não têm um significado único, pois os constituintes últimos da natureza, discerníveis mediante o sentido ou o pensamento, são coisas singulares” (PINTO, 2000PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000., p.208), num possível vislumbre de consideração da dependência dos fatores contextuais para a interpretação dos discursos.

Com base nas atividades desenvolvidas por estes e por outros sofistas, que, como vemos, oferecem uma visão ampliada do logos, apreendendo-o – no caso do logos enquanto dizer – por meio de diferentes categorias da língua, Galinari (2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.264) sugere uma subdivisão do logos em diferentes dimensões, tais como: “logos-palavra”, considerando “todo o peso retórico da formação de vocábulos e da seleção lexical”; “logos-sintaxe”; “logos-prosódico”; “logos-raciocínio”; “logos-narração”; “logos-descrição”; “logos-enunciação” (em primeira, segunda e terceira pessoas) etc. O autor ainda explica:

Obviamente, todas essas e outras dimensões do logos, incluindo – por que não! – os raciocínios, reforçam ou constroem opiniões, “teses” ou visões de mundo, a partir de sua estrutura cognitiva e referencial, mas se desdobram, também – eis a questão –, no ethos e no pathos durante a interação. Em outros termos, isso equivale a dizer que o ethos e o pathos (as imagens de si e as emoções suscitáveis no auditório) só se tornam realidade a partir do discurso, ou seja do uso de sua estrutura, de seus raciocínios, em suma, de tudo o que se chamou acima de logos. (GALINARI, 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.264).

Tomando como parâmetro a citação acima, que registra, para os fins aqui pretendidos, pressupostos com os quais concordamos, a partir dos quais procederemos, mais adiante, à análise, reafirmamos, agora com maior clareza, nossa hipótese inicial – a de que o pathos, aspecto do discurso relacionado às emoções, deve ser definido e examinado a partir de seu imbricamento com o logos e com o ethos; e estabelecemos uma segunda hipótese, segundo a qual o orador/enunciador dispõe de um amplo espaço de estratégias, de natureza linguística e retórico-discursiva, para colocar em prática seu projeto de ação e de influência sobre o outro, nas mais variadas situações de troca (orais ou escritas).

Tendo chegado ao cabo das contribuições da Nova Retórica e da Sofística, passemos à seção seguinte, na qual procedemos a algumas considerações de Charaudeau (2007CHARAUDEAU, P. Pathos e discurso político. In: MACHADO, I. L.; MENEZES, W.; MENDES, E. (Orgs.). As emoções no discurso. v.1. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. p.240-251., 2010CHARAUDEAU, P. A patemização na televisão como estratégia de autenticidade. In: MENDES, E.; MACHADO, I. L. (Orgs.). As emoções no discurso. v.2. Campinas: Mercado de Letras, 2010. p.23-56.) sobre sua proposta discursiva de estudo das emoções.

A noção de patemização: contribuições de Charaudeau

Veremos, nesta seção, que o estudo das emoções deve ser complementado por uma teoria do discurso. Acreditamos que as contribuições apresentadas até este momento são essenciais, mas que carecem de explicações acerca da forma como o analista deve apreender as emoções.

Charaudeau (2010)CHARAUDEAU, P. A patemização na televisão como estratégia de autenticidade. In: MENDES, E.; MACHADO, I. L. (Orgs.). As emoções no discurso. v.2. Campinas: Mercado de Letras, 2010. p.23-56. adverte que o ponto de vista de uma análise do discurso deve se distinguir, por exemplo, dos pontos de vista de uma psicologia das emoções – cuja ótica recai sobre aquilo que os sujeitos efetivamente sentem – ou de uma sociologia das emoções – as relações sociais e os comportamentos dos grupos sociais. Sem desprezar essas realidades, o autor enfatiza que as emoções devem ser estudadas por uma perspectiva interdisciplinar, ou, melhor dizendo, por uma abordagem de análise do discurso integradora, que não se situe no campo estritamente das relações entre língua e discurso, mas que busque, em disciplinas como a filosofia, a psicologia e a sociologia, pontos de contato que permitam uma compreensão multidimensional – e, por isso mesmo, mais ampla – do fenômeno das emoções no discurso. Assim,

[...] mesmo se distinguindo da psicologia e da sociologia, a análise do discurso precisa delas, na medida em que suas análises evidenciam os mecanismos de intencionalidade do sujeito, os da interação social e a maneira como as representações sociais se constituem. Certas noções são mais propícias à interdisciplinaridade que outras justamente porque estão no centro de diferentes mecanismos. Este é o caso da “emoção”. (CHARAUDEAU, 2010CHARAUDEAU, P. A patemização na televisão como estratégia de autenticidade. In: MENDES, E.; MACHADO, I. L. (Orgs.). As emoções no discurso. v.2. Campinas: Mercado de Letras, 2010. p.23-56., p.26).

Por isso mesmo, Charaudeau situa sua proposta em uma dimensão psico-socio-discursiva. Apoiado, pois, nessas diferentes disciplinas, particularmente no que tange às emoções, o autor propõe algumas reflexões para tratar do que ele chama de “efeitos patêmicos do discurso”, detendo-se, para tanto, em dois pressupostos, os quais retomamos brevemente a seguir.

As emoções são de ordem intencional

O discurso se coloca sempre em função de um querer-dizer, de um fazer-pensar, de um fazer-fazer e/ou de um fazer-sentir. Se, como vimos na seção anterior, as emoções são passíveis de serem inscritas no discurso juntamente com a razão, devemos crer, juntamente com Charaudeau que “é pelo fato de as emoções se manifestarem em um sujeito ‘a propósito’ de algo que ele representa para si que elas podem ser nomeadas de intencionais” (CHRARAUDEAU, 2010, p.28).

Não podemos deixar de mencionar, seguindo o “mapa” semiolinguístico do autor, que o pathos será sempre um jogo, uma aposta, uma vez que, para ele, comunicar é aventurar-se na encenação – mis’en scène – de um ato de linguagem. Assim, para os semiolinguistas, os efeitos visados (as intenções) se sobrepõem aos efeitos efetivamente produzidos.

As emoções estão ligadas aos saberes de crença ao mesmo tempo em que se inscrevem em uma problemática das representações

Na definição de Charaudeau (2013CHARAUDEAU, P. Discurso político. Tradução de Fabiana Komesu e Dilson F. da Cruz. São Paulo: Contexto, 2013., p.198), os saberes de crença são aqueles que têm por finalidade a proposição de “um julgamento sobre o mundo”, conforme “valores que lhe atribuímos”, mediante “um movimento de avaliação”. Diferentemente dos saberes de conhecimento, os quais se impõem ao sujeito, sobretudo por força da razão científica, os saberes de crença são construídos a partir de escolhas operadas pelo sujeito falante, “segundo uma lógica do necessário e do verossímil, na qual pode intervir tanto a razão quanto a emoção”, traço que, naturalmente, aponta para a relatividade de um saber de crença, que encontra sua contrapartida no caráter incontestável de um saber de conhecimento.

Emoções e crenças se ligam na medida em que não basta ao sujeito a capacidade de percepção das intenções de outrem ou a captação de alguma informação, de um saber. É necessário que, por meio de valores socialmente compartilhados, o sujeito avalie esse saber, e, para isso, ele “mobiliza uma, ou várias, das redes inferenciais propostas pelos universos de crença disponíveis na situação em que ele se encontra, o que é susceptível de desencadear nele um estado emocional”, estado o qual “o coloca em contato com uma sanção social que culminará em julgamentos diversos de ordem psicológica ou moral” (CHARAUDEAU, 2010CHARAUDEAU, P. A patemização na televisão como estratégia de autenticidade. In: MENDES, E.; MACHADO, I. L. (Orgs.). As emoções no discurso. v.2. Campinas: Mercado de Letras, 2010. p.23-56., p.30).

Para esse aspecto das emoções, Charaudeau (2010CHARAUDEAU, P. A patemização na televisão como estratégia de autenticidade. In: MENDES, E.; MACHADO, I. L. (Orgs.). As emoções no discurso. v.2. Campinas: Mercado de Letras, 2010. p.23-56., p.28) exemplifica: “Qualquer indivíduo pode perceber um leão, reconhecer sua morfologia, conhecer seus hábitos [...], mas enquanto ele não avaliar o perigo que este pode representar [...], ele não vivenciará nenhuma emoção de medo”, e são as crenças, individuais ou coletivas, que permitem ao sujeito tal avaliação acerca do perigo.

A relação patêmica (afetiva) do sujeito com um fato, fenômeno, situação ou acontecimento o leva a uma reação, conforme as normas sociais às quais se submete, sejam elas previamente internalizadas, sejam provenientes de suas representações. Essas representações

[...] podem ser chamadas de ‘sociodiscursivas’, quando o processo de configuração simbolizante do mundo se faz por meio de [...] enunciados que significam [...] [e] testemunham [...] a maneira como o mundo é percebido por sujeitos que vivem em comunidade, os valores que eles atribuem aos fenômenos percebidos, e o que são os próprios sujeitos. Esses enunciados circulam na comunidade social, tornam-se objeto de partilha e contribuem para constituir um saber comum e, particularmente, um saber de crenças. (CHRARAUDEAU, 2010, p.31-32).

Podemos dizer, em outras palavras, que, se as representações sociais estão no plano (sócio)cognitivo, as representações sociodiscursivas são caracterizadas pela forma como crenças e conhecimentos coletivamente partilhados são construídos e discursivizados a partir de enunciações verossímeis, baseadas nas experiências comuns internalizadas pelos grupos sociais mais complexos.

As mídias, por exemplo, fazem uso dessas representações, em suas matérias jornalísticas e peças publicitárias, como componente incitador, a fim de tocar a afetividade de seu público-alvo. Em uma reportagem, por exemplo, a manchete que enuncia a morte de um bebê, a acusação de um padre por pedofilia, a absolvição ou condenação de um político corrupto ativam representações capazes de despertar, nos interlocutores, os mesmos sentimentos, obviamente, em diferentes graus, uma vez que devemos considerar a dependência do estatuto de cada interlocutor e das suas disposições patêmicas no momento da enunciação.

De qualquer forma, não podemos negar que, no caso ilustrado, as representações sociodiscursivas são sempre “encenadas” com o propósito de se atingir de forma semelhante o maior número possível de interlocutores.

Vale esclarecermos, ainda, que o vínculo entre emoções e representações é atestado pelas próprias escolhas terminológicas de Charaudeau, que, em lugar de “emoções”, opta por termos derivados da palavra “pathos” – “patêmico”, “patemia”, “patemização”. A patemização, conforme entendimento de Mendes, S. e Mendes, P. (2007MENDES, S. S.; MENDES, P. H. A. Uma análise discursiva das emoções em Laranja Mecânica: o estranhamento, a humilhação e a indignação. In: MACHADO, I. L.; MENEZES, W.; MENDES, E. (Orgs.). As emoções no discurso. v.1. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. p.272-289., p.274), é passível de ser concebida “como efeito de sentido e, portanto, deve ser tomada em um contexto específico de troca, de acordo com a capacidade de inferência do interlocutor e das representações sociais que subjazem essa troca”. As representações, enquanto determinantes dos efeitos de patemização, consistiriam em avaliações acerca de uma dada proposta sobre o mundo, cujo julgamento de valor é atribuído em uma situação particular de enunciação.

O que acabamos de apresentar são apenas algumas das ponderações de Charaudeau acerca das emoções, as quais parecem ser aplicáveis a quaisquer discursos. Não nos estenderemos sobre suas considerações, já que sua análise se concentra em um corpus de mídia televisiva, ao passo que a nossa focaliza a mídia jornalística escrita.

Efeitos patêmicos na crônica jornalística

Como o espaço deste artigo não permite uma investigação e um exame prolongados, nossa análise levará em conta duas estratégias retórico-discursivas que, claramente, saltam aos olhos nas crônicas em apreço: a metáfora e a intergenericidade. Poderemos, com isso, observar a atividade retórica dessas estratégias, considerando que ambas engendram o que chamaremos aqui de um logos-representação, com potencial para despertar certas emoções, tendo em vista que o pathos é sempre uma probabilidade, uma expectativa.

Alguns esclarecimentos são necessários antes de procedermos à análise proposta. Ocorre que em 2014, a cronista Lya Luft, que escreve quinzenalmente para a revista Veja, publicou, dentre suas colunas, quatro crônicas nas quais o vocábulo “nau” aparece no título, sempre em referência à nação brasileira. A ordem cronológica das publicações ocorreu conforme indica a tabela a seguir:

Data Título
12/02/2014 Não podemos ser uma nau sem rumo
05/11/2014 A nau de todos
19/11/2014 A nau avariada
03/12/2014 Oração da nau à deriva

Embora, como explicamos acima, não seja possível proceder à análise das quatro crônicas, é preciso ater-se aos três primeiros títulos, cujos textos a que fazem referência estão, pela natureza dialógica da linguagem, retomados na última crônica – Oração da nau à deriva –, foco de nossa análise. Em outras palavras, ignorar que se trata de uma série de crônicas, cujo elemento comum mais evidente é a repetição do vocábulo “nau” nos quatro títulos, seria o mesmo que desconsiderar a propriedade heterogênea do discurso.

Conforme nossa proposta, o logos-representação irá evidenciar efeitos patêmicos de indignação, de insatisfação, de esperança, de otimismo, dentre outros. Tal demonstração é elaborada por meio de diferentes estratégias discursivas linguisticamente marcadas5 5 Essa perspectiva orienta nosso método de análise, uma vez que consideramos a trajetória que vai da língua ao discurso, operada por meio de atos de enunciação produzidos a partir das escolhas feitas pelo sujeito cronista. . Tendo em vista, pois, que o pathos é sempre uma consequência dessas escolhas do enunciador, as quais, em seu discurso, regem os processos de produção, compreensão e persuasão do coenunciador, consideraremos, primeiramente, duas estratégias que são marcantes na crônica em análise: a metáfora, focalizando a sua função persuasiva; e a intergenericidade, com base nas concepções de Marcuschi (2008)MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.. Buscaremos, ao mesmo tempo, discutir de que forma tais estratégias engendram certas representações, refletindo, na cena enunciativa, efeitos de ordem patêmica.

Dessa forma, a primeira das estratégias que salta aos olhos é o emprego da metáfora “nau”. Quando, no decorrer do texto, há menção deste vocábulo, deve-se não somente considerar uma alusão direta à nação brasileira, mas, conforme o contexto temporal de produção da crônica, ponderar sobre as circunstâncias vivenciadas pelo Brasil e por seu povo à época. Afinal, foi um ano marcado pela deflagração da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que consistiu em uma série de investigações de um grande esquema de lavagem de dinheiro envolvendo a Petrobras e empreiteiras de renome, além de políticos brasileiros. Além deste escândalo, que envolveu rombos bilionários aos cofres públicos, o Brasil ainda se recuperava de uma derrota massacrante na final da Copa do Mundo de 2014.

Nos títulos das crônicas constantes da tabela acima, a nação brasileira – essa grande “nau”, já é qualificada como “a nau sem rumo”, “a nau avariada”, “uma nau a deriva”, e, no decorrer do texto em análise, é possível observar que uma série de expressões, vocábulos e enunciados reforçam a imagem negativa sugerida pelos títulos.

Esse realce, na crônica Oração da nau à deriva, é operado por meio de enunciados como “mar indeciso e muitas vezes encapelado” (1º parágrafo), “flutuo devagar, inclinada, num mar morto, à beira de um naufrágio” (5º parágrafo), “restos de naufrágio” (8º parágrafo). Nestes casos, a representação, facilmente assimilada pelos leitores da crônica, de um país inerte em meio a descobertas de escândalos sobre desvios de valores milionários, carente de uma administração coesa, incorruptível e com bom senso é capaz de suscitar, de forma mais ou menos semelhante, nesses leitores, as emoções da incerteza, da indignação, do pessimismo e mesmo de um otimismo restrito, já que a melhoria dependeria da superação à mediocridade e à resignação de tantos “passageiros” omissos dessa “nau incerta e ameaçada” (6º parágrafo).

Assim, não é forçoso considerar algumas associações entre o conteúdo da crônica e a realidade vivida pelo Brasil, especificamente no ano de 2014, momento caracterizado por uma sucessão de descobertas que justificaram o desequilíbrio econômico do país, em que, aliás, os rumores sobre uma provável recessão já ecoavam até na mídia internacional. Essa analogia entre a “nau” e a realidade concreta vai ao encontro de uma afirmação de Pinto (2000)PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000., que, citando um autor anônimo, retoma as definições sobre as funções retórica e estética da metáfora:

De um modo geral, no âmbito da primeira as finalidades dominantes são as da prova e da persuasão, enquanto a segunda, evocando mimeticamente universos possíveis, suscita nos auditores efeitos mais ou menos profundos que se desenrolam à margem de qualquer critério de verdadeiro e de falso. (PINTO, 2000PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística. Lisboa: edições Colibri, 2000., p.277).

Típico da crônica jornalística, gênero que se caracteriza pela integração da realidade e da atualidade a uma prosa descontraída e pela liberdade dada ao cronista para expressar seu ponto de vista por meio de variados mecanismos linguístico-discursivos, o emprego de figuras como as metáforas viabilizam tanto efeitos racionais (no sentido de serem razoáveis, verossímeis) quanto estéticos, e contribuem, talvez mais do que a linguagem seca, livre de ornamentos, para a produção de efeitos patêmicos. No caso da crônica em análise, comparar o Brasil com uma “nau” ou um “grande navio” pode produzir, no imaginário do leitor, uma representação mais próxima da realidade empírica, por se tratarem de objetos de fácil assimilação cognitiva, assim como também o são os especificadores empregados nos títulos – “nau a deriva”, “nau sem rumo”, “nau avariada” – e os termos correlatos identificados no decorrer do texto – expressões como “nuvens de tempestade”, “rochedos fatais” (2º parágrafo); “águas apodrecidas” (3º parágrafo); “redemoinhos fatais” (8º parágrafo).

Conforme nos lembra Charaudeau, ao propor que as emoções estão relacionadas aos saberes de crença, avaliar as situações vivenciadas pelo sujeito (neste caso, um cronista em relação de cumplicidade com o leitor) é algo essencial para que certas emoções e representações sejam ativadas. Vejamos, no trecho transcrito a seguir, alguns elementos ligados ao medo: “[...] no nevoeiro, e com tantas nuvens de tempestade ameaçando, talvez rochedo fatais debaixo da linha da água, tenho medo de soçobrar” (LUFT, 2014LUFT, L. Oração da nau à deriva. Veja. São Paulo, 03 dez. 2014, p.24., p.24. Oração da nau à deriva).

Os perigos que o país atravessa e o ambiente obscuro em que se encontra, devido à incapacidade de gestão e à corruptibilidade de alguns governantes, engendram o receio e o medo, novamente por meio de imagens de fácil identificação, como o “nevoeiro”, a “tempestade” e os “rochedos”. A crença de que o país corre perigo e a representação de uma nação que sofre (ou que deveria estar preocupada) com as incertezas quanto ao futuro são reativadas nesta crônica.

O título – Oração da nau à deriva – registra exatamente a forma como o texto se apresenta: uma prece. Esclarecendo: trata-se de uma crônica jornalística com a forma de uma oração, do começo ao fim. Marcuschi (2008)MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008., ao tratar desses casos de hibridização genérica, afirma que em algumas situações, para atender a finalidades comunicacionais específicas, “é comum burlarmos o cânon de um gênero fazendo uma mescla de formas e funções” (MARCUSCHI, 2008MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008., p.164). Tal procedimento caracteriza o que o autor chama de intergenericidade.

Vale esclarecer que no caso específico da crônica Oração da nau à deriva, a intergenericidade verificada na mescla deste gênero com uma oração é perfeitamente legítima, porque o espaço de estratégias de que o cronista dispõe permite essa transgressão, o que, então, não compromete o espaço de restrições do sujeito cronista.

Voltando-nos à crônica em questão, transcrevemos, a seguir, excertos que evidenciam uma forte dominância do apelo e do clamor a Deus:

“Dá-me, Senhor, uma tripulação competente, com alta perícia, que me tire destas dificuldades e aflições [...]”

“Dá-me, Senhor, um timoneiro experiente, sério, honrado, de pulso firme e ideias claras, coerente, decidido, que saiba o que faz e que deseje fazer o que é preciso para corrigir os rumos a fim de que esta viagem acabe bem [...]”

“Dá-me, Senhor, responsáveis que escolham sua tripulação segundo seus merecimentos e preparo, gente boa, corajosa, incansável, que consiga limpar as águas apodrecidas em que de momento estou mergulhada.”

““Dá-me, Senhor, águas limpas para navegar [...]”

“Dá-me, Senhor, gente que acredite que vale a pena mudar, que incômodos, aborrecimentos, até receios que quaisquer transformações impõem, são essenciais e benfazejos nesta hora [...]”

“Dá-me, Senhor, a dádiva da renovação para que eu seja uma nau respeitada e bela, e não restos de naufrágio em qualquer ilha esquecida.”

Pelo que podemos notar, trata-se de uma petição pessoal, em que o enunciador, ao se colocar como a própria nau, na primeira pessoa do singular, convoca o direcionamento e a intervenção divina. A intergenericidade transcende, neste caso, os limites da forma e da função dos gêneros e faz com que o texto seja produzido num interdiscurso cujo intercâmbio de esferas distintas – a midiática e a religiosa – evoca emoções como a sensação de fragilidade do homem mortal e a esperança de que o Ser Divino virá em resposta ao seu clamor.

A repetição da fórmula “Dá-me, Senhor” ao longo do texto pode indicar tanto a esperança – se considerarmos que sendo Deus onipotente, Ele haverá de atender ao insistente pedido – quanto o seu oposto, a angústia. Esta tópica angústia/esperança (CHARAUDEAU, 2010CHARAUDEAU, P. A patemização na televisão como estratégia de autenticidade. In: MENDES, E.; MACHADO, I. L. (Orgs.). As emoções no discurso. v.2. Campinas: Mercado de Letras, 2010. p.23-56.) parece ser, inclusive, a que domina o conteúdo da crônica. As representações oscilam entre positivas e negativas, a depender se o foco está nos perigos e nas dúvidas ou na confiança de que, por intervenção divina, o país pode se ver livre das tormentas.

A intergenericidade, assim como o emprego da metáfora, converge para o logos-representação, o qual por sua vez, coloca em jogo expectativas plausíveis de efeitos patêmicos. O próprio fato de se inscrever em um espaço interdiscursivo, possibilitando a mescla de diferentes esferas e gêneros, aponta para uma representação específica: a do leitor cristão, já que a oração a Deus pode sugerir uma visada de captação do maior número possível dos leitores de um país de maioria cristã, como é o Brasil, mesmo que (especulemos) uma parte do público de leitores não seja adepto ou simpatizante ao cristianismo.

Embora a análise venha focalizando o desdobramento do logos no pathos, ainda a propósito da inter-relação das provas retóricas, creio ser possível especular sobre a questão do ethos no pathos, proposta por Galinari (2007GALINARI, M. M. As emoções no processo argumentativo. In: MACHADO, I. L.; MENEZES, W.; MENDES, E. (Orgs.). As emoções no discurso. v.1. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. p.221-239., 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014.). O autor registra, em sua análise, o caso em que um colunista, ao projetar uma determinada imagem de si, acaba “contribuindo na instauração de sentimentos” (GALINARI, 2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.281).

Tendo isso em vista, poderíamos refletir sobre um ethos de natureza sacra, capaz de instaurar a esperança e o senso de fragilidade. A pesquisa de doutorado de Alves Jr. (2015), na qual foi examinado um corpus de 54 crônicas de Lya Luft, foram identificados indícios da construção de um ethos cristão, expresso por meio de diferentes configurações linguísticas – expressões nominais, porções de texto de extensões variadas, vocábulos isolados etc.

Assim, não seria novidade que a cronista faça uso, deliberado ou não, de uma imagem de si comprometida com o cristianismo. Mas o imbricamento das provas de persuasão verificado neste ponto de nossa análise demonstra, usando as palavras de Galinari (2014GALINARI, M. M. Logos, ethos e pathos: “três lados” da mesma moeda. Revista Alfa, São Paulo, v.58(2), p.257-285, 2014., p.261) a “capacidade do ethos de agir por empatia ou identificação, incorporando ético-emotivamente o interlocutor”. Desta forma, no caso da crônica “Oração da nau à deriva”, esse ethos cristão, projetado pela intergenericidade crônica/prece, seria o componente incitador de vários dos efeitos de patemização possivelmente visados pelo enunciador, com destaque para a esperança, sugerida, sobretudo, pelo tom de súplica registrado na oração.

A título de conclusão, registramos nosso anseio de que esta breve análise cumpra o propósito de ilustrar a articulação entre as provas retóricas, especialmente no que tange à conversão do logos em pathos, mas também com evidências do desdobramento do logos-representação em um ethos cristão, este com potencial para o engendramento de determinados efeitos patêmicos.

Considerações finais

O que apresentamos neste artigo é uma abordagem já proposta pela Nova Retórica de revisão das relações entre as provas retóricas, particularmente no que concerne à inter-relação do pathos com o logos. Trata-se, de um estudo sobre as emoções no discurso, as quais concebemos como resultado não necessariamente do desejo de um orador/enunciador tocar afetivamente seu público-alvo, mas de uma possibilidade vislumbrada pelo próprio fazer discursivo, a partir de atos de enunciação produzidos em situações efetivas de troca.

Assim como a Nova Retórica, a Sofística traz importantes contribuições, embora não sejam tão disseminadas. Isso ocorre, provavelmente, por conta da carência de registros escritos atribuídos aos sofistas. Daí a necessidade de buscarmos, nos trabalhos de outros pesquisadores, algumas contribuições deixadas pelos neoretóricos da antiguidade.

As considerações de Charaudeau mostram-se igualmente fundamentais para um estudo mais amplo e integrado do pathos e da patemização. Seu pressuposto segundo o qual as emoções estão atreladas a representações sociais – sociodiscursivas, nos casos em que se analisam atos de enunciação efetivamente produzidos – constitui, a nosso ver, uma perspectiva inovadora e essencial à compreensão do fenômeno patêmico.

O itinerário teórico percorrido, seguido do exame da crônica, intenta, entre outras expectativas, estimular maiores debates sobre as provas retóricas e sua estreitíssima relação, o que poderia, inclusive, servir como abertura a um modelo de análise menos fragmentado, considerando as diferentes dimensões que integram o discurso.

REFERÊNCIAS

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  • PINTO, M. J. V. A doutrina do logos na sofística Lisboa: edições Colibri, 2000.
  • 1
    Grifo nosso.
  • 2
    Referência a: EGGS, E. Ethos aristotélico, convicção e pragmática moderna. In: AMOSSY, R. (Org.). Imagens de si no discurso: a construção do ethos. São Paulo: Contexto, 2008, p.29-56.
  • 3
    Referência a: PLANTIN, C. L’argumentation: histoire, théories et perspectives. Paris: PUF, 2005.
  • 4
    Referimo-nos, pois, à Sofística tal como praticada em seu primeiro momento – Sofística Antiga ou Primeira Sofística –, na segunda metade do século V a.C., cujos representantes mais proeminentes foram figuras como Górgias, Protágoras e Hípias, entre outros. Difere de uma Segunda Sofística, desenvolvida no século II d.C.
  • 5
    Essa perspectiva orienta nosso método de análise, uma vez que consideramos a trajetória que vai da língua ao discurso, operada por meio de atos de enunciação produzidos a partir das escolhas feitas pelo sujeito cronista.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    29 Mar 2017
  • Aceito
    08 Nov 2017
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