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MOOCS PARA O ENSINO DE LÍNGUAS: UM ESTUDO EM CALL DESDE UMA PERSPECTIVA CONECTIVISTA

RESUMO

Com o aumento da oferta na rede mundial de computadores dos chamados Cursos On-line Massivos e Abertos, mais conhecidos por seu acrônimo em inglês MOOCs (Massive Online Open Courses), cria-se a necessidade de que se pesquise de maneira mais aprofundada sua dinâmica, sua pedagogia e sua estrutura a fim de que se possa estabelecer um juízo sobre as possibilidades de uso efetivo desta nova ferramenta para o ensino de línguas estrangeiras. Neste trabalho, situado no âmbito das pesquisas em CALL (Computer Assisted Language Learning), partimos da perspectiva da Teoria Conectivista, estabelecida, sobretudo, a partir dos estudos de Siemens e Downes, para analisar dois cursos de línguas estrangeiras na modalidade MOOC, oferecidos em diferentes plataformas digitais: o curso de espanhol para estrangeiros oferecido pela UNED em plataforma própria e o curso de mandarim para hispanofalantes veiculado pela plataforma UNIMOOC. Em ambos os casos, evidencia-se que os cursos não cumprem o que prometem, apresentando falhas no processo de ensino, sobretudo no que tange à necessidade de criar espaços propícios à interação. Este trabalho inscreve-se em uma proposta de pesquisa mais ampla, cujo objetivo é estabelecer critérios adequados para a criação de MOOCs para o ensino de línguas estrangeiras.

Ensino de línguas estrangeiras; CALL; MOOCs; Conectivismo

ABSTRACT

The increasing offer of Massive Online Open Courses (MOOCs) in the World Wide Web generated the need to investigate their dynamics, pedagogy and structure in more depth to judge the possibilities of their effective use in the teaching of foreign languages. In this study, based on investigations in Computer Assisted Language Learning (CALL), we start from the perspective of the Connectivist Learning Theory, established, mainly, from the studies of Siemens and Downes to analyze two foreign language courses in the MOOC modality offered in two different digital platforms: one course in Spanish as a foreign language offered by UNED on its own platform and a Mandarin course for Spanish speakers from the UNIMOOC platform. In both cases, it is evident that the courses did not fulfill what they promised, especially regarding the need to create spaces conducive to interaction. This study is part of a broader research proposal, whose objective is to establish adequate criteria for the creation of MOOCs as tools for the teaching of foreign languages.

Second language teaching; CALL; MOOCs; Connectivism

Introdução

Em meados de 2013, os jornais de maior circulação do Brasil entraram em ebulição noticiando que a USP começara a disponibilizar seus primeiros cursos no formato MOOC, acrônimo de Massive Online Open Course ou Curso On-line Massivo e Aberto. Alguns veículos de comunicação, inclusive, como a Folha de São Paulo1, noticiavam que seriam os primeiros cursos da América Latina, muito embora a Universidade Nacional do México já tivesse fechado contrato para este fim com a plataforma Coursera desde fevereiro daquele ano, com os cursos Pensamento Científico, TIC na Educação e Como Ser mais Criativo. Aliás, no Brasil mesmo, outras experiências haviam sido desenvolvidas já em 2012. A Unesp lançara a plataforma Unesp Aberta, disponibilizando conteúdos de seus cursos em meio digital, enquanto a PUC-SP, em parceria com a Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED), lançara o curso MOOC EaD, coordenado pelo pesquisador João Mattar. A única ressalva dessas iniciativas é que não ofereciam certificados aos participantes, algo em que, efetivamente, a USP inovou.

Assim, ainda que não tenha sido a primeira a oferecer MOOCs, de fato a USP deu início a dois cursos certificados em 2013: Física Básica e Probabilidade e Estatística. Outro equívoco da mídia foi anunciá-los como os primeiros cursos de nível superior neste formato no Brasil. Embora oferecidos por uma instituição de ensino superior, os dois cursos tinham caráter extensionista.

A novidade festejada pelos meios de comunicação de massa, na verdade, já era de conhecimento de muitos brasileiros afeitos às tecnologias digitais e invariavelmente sedentos por inovações, que já participavam de cursos no formato MOOC oferecidos por universidades dos Estados Unidos e da Europa. Os MOOCs, como veremos em seguida, têm uma história que se inicia na aurora do século XXI, com os estudos conectivistas de Siemens e Downes, que já em 2003 teorizavam a respeito.

Em 2008, foi oferecido o primeiro curso neste formato. Em 2011, a partir de uma iniciativa da Universidade de Stanford, nascia a plataforma Coursera, totalmente voltada para este fim, logo seguida pela plataforma edX, filha de uma parceria entre o Massachusetts Institute of Technology (MIT) e a Universidade de Harvard. Desde então, universidades do mundo inteiro abraçaram a iniciativa. A plataforma Coursera, por exemplo, hoje em dia tem parcerias com universidades da África do Sul, Alemanha, Argentina, Austrália, Brasil, Bélgica, Canadá, Chile, China, Cingapura, Colômbia, Coreia do Sul, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, França, Holanda, Índia Israel, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Suécia, Suíça, Taiwan e Turquia.

Como se pode perceber, as plataformas MOOC têm avançado inexoravelmente em um intervalo de tempo relativamente curto, e a tendência para os próximos anos é que se amplie ainda mais a oferta. Sobram, contudo, dúvidas sobre o formato. Um exemplo emblemático é a entrevista concedida por Sebastian Thrun, professor da Universidade de Stanford e visionário criador da plataforma MOOC Udacity, ao jornalista Max Chafkin em 2013, apenas um ano depois de o New York Times ter publicado uma manchete em que afirmava ser 2012 o ano dos MOOCs (PAPPANO, 2012PAPPANO, L. The Year od the MOOC. In: New York Times. 2012. Disponível em: <http://www.nytimes.com/2012/11/04/education/edlife/massive-open-online-courses-are-multiplying-at-a-rapid-pace.html. Acesso em: 20 abr. 2017.
http://www.nytimes.com/2012/11/04/educat...
). Entre outras coisas, o professor afirmava: “Eu aspirava dar às pessoas uma educação profunda, ensinar-lhes algo substancial, mas os dados estavam em desacordo com essa ideia.” (CHAFKIN, 2013CHAFKIN, M. Udacity’s Sebastian Thrun, Godfather Of Free Online Education, Changes Course. 2013; Disponível em: <https://www.fastcompany.com/3021473/udacity-sebastian-thrun-uphill-climb. Acesso em: 20 abr. 2017.
https://www.fastcompany.com/3021473/udac...
).

Outra autoridade no assunto, o professor García Aretio, vinculado à UNED (Universidade Nacional de Educação a Distância da Espanha) e Diretor da Cátedra Unesco para Educação a Distância, em 2015 publicou um artigo em que elencava cerca de noventa dúvidas a respeito dos MOOCs, questionando desde seus mecanismos, passando por sua pedagogia e chegando até sua eficiência. O próprio pesquisador, contudo, tratou de responder a muitas dessas questões em novo artigo de 2017, intitulado Los MOOC están muy vivos, o que já dá uma ideia do teor do texto. Outros aspectos, entretanto, continuam em aberto. Especialmente, no que tange a este trabalho, o debate sobre os mecanismos de ensino e de aprendizagem de línguas estrangeiras nesta modalidade, uma vez que têm sido detectados problemas de interação e de feedback, elementos cruciais quando se trata de aprender um novo idioma.

O presente trabalho tem o objetivo de discutir algumas dessas lacunas. Trata-se de uma análise preliminar em torno de dois cursos de línguas oferecidos por diferentes instituições em diferentes plataformas, complementada por alguns dados considerados relevantes levantados em outros dez cursos que tangenciam o tema, seja porque tratam de aspectos culturais vinculados a alguma língua estrangeira, seja porque discutem o ensino mediado por computador.

Inscreve-se este trabalho em um projeto maior que vincula pesquisadores ligados à Universidade Federal de Santa Maria, à Universidade Federal da Fronteira Sul e à Universidade Católica de Pelotas em busca do estabelecimento dos melhores critérios para a elaboração de cursos deste tipo. O objetivo final do projeto é o de desenvolver um curso no formato MOOC que discuta justamente como deve ser um MOOC para ensino de línguas, definido como LMOOC (MARTÍN-MONJE; BÁRCENA, 2015MARTÍN-MONJE, E.; BÁRCENA, E. (Eds.). Language MOOCs: providing learning, transcending boundaries. Berlin, New York: Mouton de Gruyter, 2015.).

Nas próximas seções, discutimos a teoria que move os MOOCs, o conectivismo, apresentamos as principais características de alguns cursos analisados, comparando com os preceitos estabelecidos pela teoria, e concluímos apresentando algumas sugestões para a elaboração de um bom MOOC de ensino de línguas.

O conectivismo e os MOOCS

Em um artigo de 2003, intitulado Learning Ecology, Communities, and Networks: extending the classroom, George Siemens começou a esboçar os primeiros contornos do que viria a se tornar uma nova teoria de aprendizagem, segundo seu ponto de vista, o conectivismo. Mais tarde, em 2006, Siemens lançou a obra Knowing Knowledge, publicada em regime de creative commons, em que fundamenta de maneira mais aprofundada sua teoria, que ganharia reforços importantes sobretudo a partir das colaborações de Stephen Downes e alcançaria o mundo com o lançamento do primeiro MOOC de que se tem conhecimento, em 2008, em que mais de duas mil e duzentas pessoas se dedicaram a discutir o assunto num curso on-line.

Nas palavras dos criadores do conceito:

Um MOOC é um curso on-line com a opção de inscrição gratuita e aberta, um currículo compartilhado publicamente e resultados em aberto. MOOCs integram redes sociais, recursos on-line acessíveis e são facilitados pelos profissionais mais reconhecidos da cada área de estudo. Mais significativamente, MOOCs são construídos pelo envolvimento dos alunos que auto-organizam sua participação de acordo com as metas de aprendizagem, conhecimentos prévios e habilidades e interesses comuns. (SIEMENS et al., 2010SIEMENS, G.; MCAULEY, A.; STEWART, B.; CORMIER, D. The MOOC Model for Digital Practice. 2010. Disponível em <http://www.elearnspace.org/Articles/MOOC_Final.pdf. Acesso em: 10 out. 2012.
http://www.elearnspace.org/Articles/MOOC...
, p.10).

No que diz respeito à teoria conectivista, o primeiro e mais importante conceito de Siemens é o da Ecologia da Aprendizagem. Segundo o autor, as ecologias são meios compartilhados e colaborativos de construção de conhecimento em que um dos principais fatores de desenvolvimento é a existência de pessoas conectadas entre si, como nós que compõem uma espécie de teia, como a Teia da Vida conceituada por Capra (2006)CAPRA, F. A Teia da Vida. São Paulo: Cultrix, 2006., uma espécie de organismo vivo auto-organizado, dinâmico, adaptável e, por vezes, confuso e caótico, mas de onde é plenamente possível a emergência de conhecimento. Partindo deste ponto de vista, Siemens (2010) identifica uma série de elementos necessários para que a aprendizagem emerja:

  • A aprendizagem e o conhecimento repousam na diversidade de opiniões.

  • A aprendizagem é um processo de conectar nós especializados ou fontes de informação.

  • A promoção e a manutenção de conexões são movimentos fundamentais para facilitar a aprendizagem contínua.

  • A capacidade de ver conexões entre ideias, conceitos e áreas de saber é uma competência crucial.

  • A capacidade de ampliar conhecimentos continuamente é mais importante do que aquilo que sabemos num dado momento.

  • A tomada de decisões é, em si mesma, um processo de aprendizagem.

  • A aprendizagem pode residir em dispositivos não humanos.

Ainda que Siemens e seus colegas busquem dar ênfase ao fato de que o conectivismo atende à necessidade de uma teoria que lance um olhar à aprendizagem em meios digitais, é importante ter claro que há muitos críticos que insistem que, em termos de teorias de aprendizagem, as ideias que compõem o conectivismo não são novidade (KOP; HILL, 2008KOP, R.; HILL, A. Connectivism: learning theory of the future or vestige of the past? The International Review of Research in Open and Distributed Learning, v.9, n.3, p.1-13, 2008.). Respondendo a estes pesquisadores, Siemens (2010) procura colocar em destaque alguns aspectos que, sob sua ótica, seriam exclusividade de sua teoria:

  1. A contemplação a princípios que regem a aprendizagem em diferentes escopos: conceituais, biológicos, neurais, sociais etc.

  2. A atenção à abundância de informação e sua velocidade e como isso afeta a compreensão, a interpretação, a construção de conhecimento hoje.

  3. A importância dada ao conceito de formação de redes e como as conexões que se estabelecem com outros seres humanos e mesmo com bancos de dados interferem na aprendizagem.

  4. A ênfase nas tecnologias digitais como parte fundamental da distribuição de cognição e conhecimento.

Siemens e seus colegas, pensando em como tais princípios se aplicam ao ensino on-line, elencam algumas características que julgam indispensáveis em cursos desenvolvidos em plataformas digitais, como é o caso dos MOOCs, de maneira efetiva:

  • Altos níveis de controle dos estudantes sobre os modos e lugares de interação.

  • Sessões síncronas semanais com facilitadores e palestrantes convidados.

  • Um e-mail de newsletter diário como ponto de contato regular para os participantes do curso.

  • Uso de Really Simple Syndication (RSS, um sistema de atualização automática de informações) para acompanhar os blogs dos participantes do curso.

  • Ênfase na autonomia do aluno no que tange à seleção de recursos de aprendizagem e nível de participação em atividades.

  • Ênfase nos sistemas sociais como meios eficazes de auto-organização dos alunos.

Ainda que essas pareçam ser características exigíveis para que um curso on-line massivo seja efetivamente considerado um MOOC, pesquisadores como Tony Bates (2014)BATES, T. Comparing xMOOCs and cMOOCs: philosophy and practice. 2014. Disponível em: <http://www.tonybates.ca/2014/10/13/comparing-xmoocs-and-cmoocs-philosophy-and-practice/. Acesso em: 8 mai. 2016.
http://www.tonybates.ca/2014/10/13/compa...
sugerem que, atualmente, os MOOCs podem ser divididos em dois tipos: xMOOCs e cMOOCs. Os xMOOCs contariam com uma organização pouco ou nada flexível, centrada em conteúdos e na figura do professor. Neles, trabalhar-se-ia exclusivamente em uma plataforma especificamente desenhada para o fim do curso, com vídeo-leituras, atividades de resposta automática, avaliação por pares, algum espaço para compartilhar opiniões e discussões, pouca ou nenhuma moderação nos debates. Seriam do tipo mais usual, presentes nas plataformas mais populares como Coursera, edX, Miriada X. Aliás, o “x” de xMOOC remeteria justamente a este tipo de plataforma, que forçaria os cursos a um formato estanque.

Já os cMOOCs seriam mais condizentes com os critérios de Siemens e seus companheiros. A relação é transparente, uma vez que o “c” faz alusão justamente ao conectivismo. Neles haveria mais espaço para a autonomia do aprendiz, sendo priorizada a conexão entre alunos e aceitando-se o uso de uma diversidade de ferramentas e meios, a critério dos próprios alunos, incluindo as mídias sociais e ferramentas de criação colaborativa. Não haveria espaço para avaliações formais e o professor teria um papel auxiliar, orientando a aprendizagem, sem interferir diretamente.

O protagonismo dos alunos, nesse modelo, fica claro especialmente a partir do Princípio de Criticidade da Criação, segundo o qual

[...] os alunos compartilham a sua compreensão dos temas do curso através de blogs, mapas conceituais, vídeos, imagens e podcasts. A criação de artefatos digitais ajuda os alunos a conduzir as discussões do curso para uma base mais pessoal. (SIEMENS et al., 2010SIEMENS, G.; MCAULEY, A.; STEWART, B.; CORMIER, D. The MOOC Model for Digital Practice. 2010. Disponível em <http://www.elearnspace.org/Articles/MOOC_Final.pdf. Acesso em: 10 out. 2012.
http://www.elearnspace.org/Articles/MOOC...
, p.23).

Na próxima seção, trazemos a análise de dois cursos de línguas, apresentados como MOOCs, com base em critérios definidos a partir dos princípios conectivistas. Precisamos deixar claro que não temos dúvidas de que há outras teorias de aprendizagem que poderiam dar conta de um estudo sobre MOOCs. Nosso objetivo, contudo, é verificar se a teoria elaborada justamente sob a égide dos MOOCs é suficiente para o desenvolvimento de uma análise profunda e se, de fato, esse modelo de curso cumpre a promessa de inovação educativa que o tem acompanhado desde sua criação.

Entre o Espanhol e o Mandarim

A presente pesquisa foi desenvolvida ao longo do segundo semestre de 2016 e contou com o trabalho de dez pesquisadores que se envolveram como cursistas em diferentes MOOCs oferecidos em distintas plataformas, obedecendo às premissas da observação participante para coleta de dados (FLICK, 2009FLICK, U. Introdução à Pesquisa Qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009.). A intenção inicial era avaliar cursos de línguas neste formato. Em virtude dos prazos de pesquisa e respeitando o critério de gratuidade, contudo, à época em que o grupo estava envolvido com a coleta de dados apenas dois cursos de línguas estavam disponíveis, um de espanhol e outro de mandarim. Para não perder a janela de pesquisa e conseguir levantar dados sobre diferentes plataformas, o grupo decidiu abrir o escopo do trabalho, permitindo-se analisar cursos voltados para literatura e cultura de línguas estrangeiras ou às pedagogias de ensino on-line. Todos os cursos foram acompanhados por dois ou três pesquisadores, que fizeram suas observações e anotações individualmente. Logo, os dados coletados foram compartilhados e debatidos em reuniões do grupo de pesquisa à luz do conectivismo, a fim de se chegar às conclusões que mais adiante se publicam.

Nesta seção, apresentamos os resultados pertinentes à análise dos dois cursos de línguas que pudemos acompanhar. Na próxima, traremos algumas informações adicionais que puderam ser levantadas a partir dos demais cursos.

Os MOOCs de línguas a que conseguimos ter acesso no segundo semestre de 2016 foram: Aprende chino para negocios e Español en Línea ELE. O primeiro, disponibilizado na plataforma UNIMOOC, foi desenvolvido pela Escola de Chinês Lun Yu, sediada em Madri, na Espanha. Trata-se de uma escola especializada no ensino de mandarim para falantes de espanhol. A escola oferece o MOOC como uma espécie de introdução ao idioma, fazendo o convite para seus cursos presenciais. Em sua publicidade, afirma seguir os critérios do Instituto Confúcio para o ensino da língua. O Instituto é uma organização oficial voltada para a difusão do idioma, com inserção em várias universidades ocidentais, como a Unesp, por meio de convênios e estabelece determinados padrões de ensino e de aprendizagem, de maneira similar ao Marco Comum Europeu de Referência para o Ensino de Línguas.

O segundo curso foi desenvolvido pela UNED, Universidade Nacional de Educação a Distância da Espanha. Nascida no início dos anos 1970, a UNED é hoje a maior universidade espanhola, com mais de duzentos e cinquenta mil estudantes matriculados. Além de seus vinte e seis cursos de graduação e quarenta e três em nível de mestrado, a UNED tem investido fortemente nos MOOCs, tendo criado, inclusive, uma plataforma própria para o desenvolvimento de seus cursos massivos: a UNED-COMA (COMA é o acrônimo em espanhol para Cursos Online Masivos Abiertos).

A fim de levar adiante a análise dos cursos, o grupo de pesquisas elaborou um guia de observações baseado nos critérios estabelecidos pela teoria conectivista para a caracterização de um MOOC. O guia foi composto por questões capazes de conduzir os pesquisadores em suas observações e reflexões a respeito dos cursos dos quais estavam participando. Ao total, o guia foi composto por dezesseis questões:

  1. O que foi proposto ao princípio do curso e o resultado final foram condizentes?

  2. O curso está dividido em unidades?

  3. Caso tenhas respondido sim à anterior, as unidades têm objetivos claros, explícitos e bem delineados? Comenta.

  4. Ao iniciar uma unidade, fica claro o que se espera que o cursista desenvolva em termos de conhecimentos e habilidades?

  5. As unidades têm tempo sugerido ou obrigatório? Em caso positivo, quanto? Há flexibilidade para se terminar uma unidade? Caso não se termine dentro do tempo proposto, há alguma perda ou penalidade para o cursista?

  6. Ao passar para uma nova unidade, sentes que dominas o conteúdo da unidade anterior? Te sentes avaliado(a), autoavaliado(a) e apto(a) a seguir adiante?

  7. O curso apresenta um guia didático que ajude a situar o aluno no curso, indicando a unidade em que se encontra, o que já percorreu e o que lhe falta avançar? Em caso positivo, descreve como se apresenta o guia e os elementos que o compõem.

  8. Que tipos de avaliação são apresentadas ao longo do curso?

  9. O curso é ministrado por um único professor ou por um grupo de professores? No caso de um grupo, parece haver um professor responsável trabalhando com colaboradores ou todos os professores são protagonistas?

  10. O curso conta com fóruns de discussão? Em caso positivo, quais são seus objetivos? Como funcionam?

  11. O curso conta com materiais em PDF ou PPT? Em caso positivo, que tipo de conteúdo apresentam? Como são estruturados (textos, imagens etc.)?

  12. O curso conta com vídeos? Em caso positivo, quais seus objetivos? São falas de professores ou há outro tipo (animações, curtas etc.)? Qual a duração média? Houve alguma exceção (vídeos excepcionalmente muito longos ou mais curtos que o habitual)?

  13. Houve algum tipo de videoconferência com os professores ou entre os cursistas? Em caso positivo, como funcionou?

  14. Há outros materiais oferecidos pelo curso ao cursista?

  15. No geral, ficaste satisfeito(a) com o curso? O que mais gostaste e o que menos gostaste desta experiência?

  16. Há outras informações que gostarias de agregar?

Não seguiremos, em nossa análise, a sequência estrita das questões apresentadas. A fim de dar maior dinamicidade e tornar nossas reflexões mais objetivas, discutiremos em conjunto os principais aspectos avaliados nessas questões, categorizando-os da seguinte maneira: estrutura do curso, materiais disponíveis, interação, avaliações e percepção global de aprendizagem.

No que diz respeito à estrutura, começamos abordando a divisão em unidades. Seguindo os princípios conectivistas, é importante que o estudante tenha claro o processo pelo qual irá passar desde o princípio, que consiga visualizar o passo a passo do curso a fim de ter facilitadas suas escolhas no que diz respeito a suas estratégias de aprendizagem. O aluno precisa ter controle do seu processo de aprendizagem e, por conta disso, a estrutura do curso precisa ser transparente. Neste sentido, o curso de mandarim estava claramente dividido em seis lições, todas elas com tópicos definidos a priori. Já o curso de espanhol estava dividido em módulos: Apresentação, Módulos 0 a 4 e Fechamento. Neste, contudo, apenas na Apresentação há uma descrição da unidade 1. A descrição é feita em espanhol, francês, inglês e português. As demais unidades não têm os objetivos descritos. A única forma de saber o que se espera que o cursista aprenda é pelo título da unidade. Em nenhum dos dois cursos há exigência ou mesmo sugestão de tempo estipulado para estudar o conteúdo e cumprir as tarefas. Os cursistas têm plena liberdade para definir a velocidade de seu avanço. Além disso, em ambos os casos o estudante tem à disposição um indicador de progresso. Sempre que faz o login, é remetido ao ponto em que parou. No caso da plataforma UNIMOOC, no curso de mandarim, o sistema indica a lição atual com letras negras, em contraste com o azul das passadas e daquelas por vir. Já a plataforma COMA marca com azul os títulos já assistidos.

No quesito materiais disponíveis, o curso de mandarim é composto basicamente por vídeos. Cada lição é apresentada por meio de um único vídeo de aproximadamente quatro minutos, exceto pelos dois últimos, que têm cerca de sete e oito minutos, respectivamente, em que um dos professores que se revezam na apresentação dos temas dá explicações em espanhol e pronuncia as palavras e expressões na língua-meta. Adicionalmente, ao lado de cada vídeo há um botão “Mais conteúdo”. Ao clicar nele, o cursista é remetido a um link do Google Docs em que tem acesso à visualização de um arquivo de texto com vocabulário. Trata-se de uma tabela com quatro colunas: o ideograma chinês, a escrita correspondente em caracteres ocidentais, a categoria gramatical e o significado. Da mesma maneira, o curso de espanhol é apresentado fundamentalmente por vídeos. Alguns são a reprodução de apresentações em Power Point com explicações gramaticais com a voz do professor ao fundo. Em geral, os vídeos são de oito a nove minutos. O mais longo é um dos primeiros, que explica a estrutura da resenha cinematográfica, levando em torno de quinze minutos. Há imagens e textos usados de forma harmônica, sem excessos de nenhuma parte. Além dos vídeos, o curso de espanhol também conta com material em áudio em formato MP3.

Sobre interação, podemos afirmar que ela é praticamente nula em ambos os casos. Isso surpreende pelo fato de que a teoria que está na base de criação dos MOOCs dá ênfase na socialização e na auto-organização dos alunos. Para o conectivismo, os meios digitais devem servir de ponte entre os aprendizes. A aprendizagem se dá na criação de redes que, se bem podem ter como nós bancos de dados, aplicativos e outras ferramentas tecnológicas, não podem prescindir do toque humano, da interação humana. No caso do curso de mandarim, há apenas um fórum para sanar dúvidas, em que se pode perguntar algo à equipe organizadora. Se não se faz uma pergunta, porém, em nenhum momento há contato direto com os professores. Menos ainda com outros cursistas. Em nenhum momento essa interação é possibilitada. Quase o mesmo ocorre no curso de espanhol. Neste, porém, sequer há um fórum em que se possa solicitar ajuda dos professores. A única interação que ocorre está na entrega do trabalho final, que é remetido à equipe, que irá avaliar e dar um feedback.

No que se refere às avaliações, o curso de mandarim apresenta algumas questões de múltipla escolha ao final de cada uma das seis lições. Concluídas as lições, há uma prova com cinco questões, também de múltipla escolha. Ao responder pelo menos quatro corretamente (80%), o cursista obtém um certificado gratuito expedido pela Universidade de Alicante, parceira da Escola Lun Yu. Já no curso de espanhol, há exercícios de múltipla escolha intercalados por exercícios de escrita. Todos são remetidos, mas apenas a tarefa final recebe feedback da equipe responsável pelo curso. Trata-se de um feedback genérico, em que o avaliador parabeniza o cursista e agradece pela participação. O curso oferece certificado somente mediante pagamento.

Finalmente, chegamos ao último ponto, que diz respeito à percepção global de aprendizagem. As observações realizadas pelos pesquisadores, feitas individualmente e depois discutidas em reunião, como já mencionamos, levam à conclusão de que os cursos não responderam completamente ao que se haviam proposto. No caso do curso de mandarim, o objetivo do curso seria o de “propiciar noções básicas de mandarim, as quais permitirão estabelecer negócios na China”. Ao se considerar a complexidade do mandarim, uma língua distante em todos os níveis do espanhol ou do português, seria ingênuo criar-se a expectativa de que apenas dez horas de curso seriam suficientes para que este objetivo, ainda que relativamente modesto, pudesse ser contemplado. Mesmo com uma meta enxuta, contudo, o curso oferece menos do que se propõe, resumindo-se a explorar a estrutura tonal da pronúncia da língua, de maneira bastante superficial, aspectos relacionados à saudação e à cortesia, a forma correta de se entregar um cartão de visitas e os numerais. Dificilmente alguém conseguiria realizar um acordo de importação/exportação expressivo com tão poucos elementos. Obviamente, o curso ajudará aqueles que tenham o apoio de um intérprete, permitindo-lhe expressar pequenas cortesias na língua-meta, que certamente serão bem vistas pelos anfitriões, porém os conhecimentos linguísticos desenvolvidos não ultrapassam este limite modesto.

Os dados levantados com relação ao curso de espanhol apontaram resultados semelhantes. Apesar de apresentar-se como um curso embasado na exploração do gênero resenha cinematográfica, pouco se trabalhou dentro deste enfoque. Apenas os primeiros módulos exploram a ideia. Os demais voltam-se para a gramática, pura e simplesmente. Ainda assim, os pesquisadores concluíram que, desde uma perspectiva gramatical, o curso deu conta de apresentar, discutir e ensinar alguns rudimentos de espanhol. O que mais chamou a atenção, de maneira positiva, foi o fato de o MOOC ter sido declaradamente desenhado para cursistas que já tinham alguma noção de espanhol, sendo apresentado como adequado para estudantes de nível A2, segundo o Marco Comum Europeu. Neste sentido, na introdução do próprio curso disponibilizou-se um link para que o interessado pudesse fazer um teste de nível para saber previamente se teria condições de acompanhar. De todos os modos, com interação quase nula e uma proposta de trabalho não cumprida, o curso parece não alcançar os objetivos a que se propõe.

Até aqui, portanto, conseguimos ter uma visão mais ou menos clara de como deveriam funcionar e de como de fato funcionaram os dois cursos de línguas apresentados como MOOCs por seus idealizadores. Foram avaliados dois cursos de línguas diferentes, disponibilizados em plataformas diferentes e por instituições diferentes. Na próxima seção, apresentaremos outros dez cursos avaliados. Não nos aprofundaremos nestes. A intenção é apenas mostrar a variedade de cursos existentes, as plataformas e instituições que os disponibilizam e tecer alguns comentários gerais que possam nos ajudar a ter uma percepção de como esses MOOCs têm funcionado e do que ainda pode faltar para que eles sejam adequados dentro de uma perspectiva conectivista.

Do Quixote ao ensino híbrido: variações do mesmo tema

Conforme mencionamos desde o princípio, nossas opções de cursos para análise foram limitadas pela janela de tempo que tínhamos. Encontramos apenas dois cursos de línguas disponíveis no segundo semestre de 2016 e nenhum deles nas plataformas mais tradicionais, Coursera e edX. Exploramos, então, outros cursos, conforme critérios já mencionados. Foram escolhidos cursos em português ou em espanhol por se tratar da língua de formação inicial da maioria dos pesquisadores, como se pode ver no quadro.

Quadro 1 – Cursos, universidades e plataformas
CURSO UNIVERSIDADE PLATAFORMA
Educación de calidad para todos. Equidad, inclusión y atención a la diversidad Universidad Autónoma de Madrid. edX
El desafío de Innovar en la Educación Superior Universidad de Chile Coursera
Ensino Híbrido: Personalização e Tecnologia na Educação USP e UNESP Coursera
Explorando os recursos educacionais da Khan Academy Fundação Lemann, Instituto Península, Instituto Natura, Ismart Coursera
Fundamentos do Google para o Ensino Fundação Lemann, Foreducation & Google for Education Coursera
Hacia una práctica constructivista en el aula Pontificia Universidad Católica de Chile Coursera
Introducción al Aprendizaje Basado en Problemas Universidad Zaragoza Miriada X
La España de El Quijote Universidad Autónoma de Madrid edX
Técnicas Cuantitativas y Cualitativas para la Investigación Universitat Politècnica de València – UPV edX
Tecnologías para la educación Universitat Politècnica de València – UPV edX
  • Fonte: Elaboração própria.
  • Os cursos estão listados em ordem alfabética. Cinco deles foram disponibilizados na plataforma Coursera e quatro na edX. Um último curso foi encontrado na plataforma Miríada X, uma plataforma espanhola vinculada à Universia, a maior rede de universidades ibero-americanas, sediada na Espanha e ligada ao Banco Santander.

    De maneira geral, as críticas feitas a estes dez cursos foram as mesmas que aquelas feitas aos dois primeiros. A única ressalva cabe à organização dos cursos da plataforma edX, que apresentam parte dos elementos propostos pela teoria conectivista, como objetivos explícitos, prazos definidos, programação, enfim, alguns dos dados que o cursista necessita para organizar sua trajetória e preparar suas estratégias de estudo. Isso, contudo, parece não ser mérito das instituições, mas da plataforma, que submete os cursos a uma estrutura padronizada.

    As maiores críticas, mais uma vez, recaíram sobre a pouca interação e a falta de feedback. Em geral, os estudantes não são colocados em situações em que tenham que interagir. Nem mesmo os professores interagem, em boa parte das vezes. Há cursos, por exemplo, em que há uma lista de professores responsáveis e só um ou dois aparecem nos vídeos. Os alunos ficam sem jamais conhecê-los. Sequer no vídeo de apresentação do curso eles se mostram. Em algumas circunstâncias, contudo, a esperada presença dos professores acaba por não promover a motivação almejada: leituras monocórdicas em off durante apresentações em Power Point repletas de texto ou mesmo extensas leituras em frente das câmeras. Essa mera transposição do presencial para o virtual entedia os cursistas e pode ser um dos motivos que levam à alta evasão encontrada neste tipo de curso, sendo registrados, em pesquisa realizada em 2013, números que variam de 2 a 14% de concluintes apenas (PERNA et al., 2013PERNA, L.; RUBY, A.; BORUCH, R.; WANG, N.; SCULL, J.; EVANS, C.; AHMAD, S. The life cycle of a million MOOC users. In: MOOC Research Initiative Conference. 2013.).

    As frequentes avaliações de atividades com os concisos “Muito bom!” ou “Parabéns, siga assim!” – isso quando há um feedback – são outro obstáculo para a permanência dos cursistas. Não há um debate estimulante. Ora, os professores avaliam as tarefas e, em virtude de terem milhares de cursistas envolvidos, acabam restringindo-se ao mínimo, ora, são realizadas atividades peer-to-peer (p2p), ou seja, de aluno a aluno, e como não há uma boa orientação sobre critérios de avaliação, mais uma vez o feedback se mantém no nível motivacional, evitando aspectos de conteúdo ou técnica.

    Uma das pesquisadoras do grupo que colaborou nas observações participantes, em virtude da pouca interação, da falta de feedback e da contínua exigência do preenchimento de questionários de satisfação em um dos cursos, na última reunião do grupo de pesquisa para discutir os dados levantados, chegou a afirmar: “Como estudante, eu não me senti importante. Parece até que são eles que estão nos estudando”. É possível, uma vez que se percebe um viés mercadológico muito forte em alguns cursos, cujo objetivo é muito mais fazer a publicidade de suas pós-graduações on-line, pagas em euros ou dólares.

    Há, contudo, pontos positivos. Vídeos dialogados ou com dramatizações deram um tom mais lúdico aos conteúdos e conseguiram captar melhor a atenção. Professores que sabem dialogar com a câmera, sem ficar presos a apresentações ou textos também foram pontuados positivamente. Outro aspecto encontrado em alguns cursos foi a flexibilidade no que tange ao trabalho final. A possibilidade de explorar diferentes mídias e ferramentas para elaborar a avaliação final, com um tema gerador, mas com um formato livre de moldes estanques pareceu render trabalhos bastante interessantes, dando liberdade de criação aos cursistas.

    Na próxima seção, com base nos aspectos positivos e negativos encontrados, sempre partindo dos princípios do conectivismo, elaboramos nossas considerações finais, apontando, entre outras coisas, alguns elementos que nos parecem importantes para um curso de línguas no formato MOOC.

    Apontando caminhos

    Adotando a mesma sequência de nossa análise, começaremos esta seção discutindo nossas considerações a respeito da estrutura desejável de um MOOC a partir da teoria conectivista em contraste com o que foi encontrado em nossa pesquisa. Assim sendo, no que diz respeito à estrutura dos MOOCs, precisamos dar ênfase à necessidade de que sejam transparentes. Um curso precisa ter seu objetivo geral claramente definido desde o início, bem como os objetivos específicos de cada unidade precisam ser visíveis e compreensíveis por parte dos alunos. Um cursista não pode iniciar uma unidade sem ter uma visão plena de onde deverá chegar, pois só assim se pode cumprir o princípio da auto-organização, já que, segundo Siemens, os alunos só conseguem se auto-organizar, entre outros fatores, a partir do momento que têm claras as metas de aprendizagem. É importante lembrar que a auto-organização é elemento fundamental no conectivismo. Não aprendemos sozinhos. Aprendemos quando formamos redes com ferramentas de aprendizagem e com outras pessoas e essas conexões só se tornam significativas se sabemos com claridade meridiana onde estamos em dado momento e onde precisamos chegar.

    A respeito dos materiais disponíveis e da interação, talvez a maior lição desta pesquisa até o momento tenha sido a descoberta de que a maneira como o vídeo é apresentado, ou melhor, a maneira como os professores se apresentam nos vídeos é fundamental. De nada adianta o vídeo ter uma boa produção se ele não reflete, pelo menos em parte, a interação humana. O professor precisa saber interagir com a câmera, conversar com quem está do outro lado. Deve, também, abster-se de leituras longas e tediosas ou de esconder-se por trás de apresentações com textos abundantes. Pode lançar mão de diálogos com colegas, simulando – ou realizando de fato – breves entrevistas, sempre tentando dar o tom adequado, sem excessiva formalidade nem tampouco com informalidade extrema. Dramatizações criativas para demonstrar algum ponto ou conteúdo também costumam ser bem-vindas. Além disso, os vídeos nunca devem ser demasiado longos. Caso um tema seja muito extenso, é mais produtivo que se elaborem vários pequenos vídeos em lugar de um único vídeo longo. Salman Khan, por exemplo, fundador da Khan Academy, sugere que um vídeo expositivo não passe dos dez minutos (KHAN, 2013). Outra sugestão útil é que esses vídeos contem com uma transcrição em PDF, para que o cursista possa consultar algum ponto específico mais tarde, sempre que necessário, sem ter que procurar minuto a minuto do vídeo ou assisti-lo por completo novamente. Se for possível, ainda, oferecer legendas em diferentes línguas, considerando que os MOOCs têm a vocação de chegar ao mundo todo, o resultado será melhor.

    No que tange às avaliações, é importante respeitar o princípio da autonomia dos estudantes. Avaliações restritas a perguntas de múltipla escolha colaboram muito pouco com a aprendizagem. Poucas avaliações elaboradas de forma que os alunos possam se expressar e usar sua criatividade tendem a ser mais bem acolhidas e render melhores resultados. Em geral, dos cursos avaliados, os pesquisadores se sentiram mais à vontade naqueles em que podiam usar livremente quaisquer ferramentas para realizar algum tipo de produção que envolvesse sua percepção pessoal a respeito dos conteúdos estudados. Em um dos cursos, por exemplo, os estudantes tiveram liberdade para elaborar um artefato digital, para usar a terminologia de Siemens, que sintetizasse sua compreensão sobre um dos tópicos trabalhados. Os artefatos foram enviados para os pares num sistema p2p para avaliação. Foram feitos vídeos, animações e outros objetos usando diferente recursos à disposição dos alunos. Foi-lhes dada total liberdade. Ao produzir seu material e avaliar o material dos colegas, o processo de aprendizagem se aprofundou e se consolidou. Dar espaço para que o estudante faça suas próprias leituras e relacione com os conteúdos estudados também se mostrou um ponto positivo.

    Por fim, é importante destacar que em nenhum dos MOOCs analisados fizeram-se presentes os aspectos considerados básicos por Siemens na constituição deste tipo de curso, os quais já apresentamos aqui, como sessões síncronas semanais com facilitadores e palestrantes convidados, e-mail de newsletter diário, uso de RSS para acompanhar os blogs dos participantes do curso; ênfase nos sistemas sociais como meios eficazes de auto-organização dos alunos etc. Ao que parece, muitos avanços ainda são necessários para que a realidade dos MOOCs encontre a teoria.

    Apresentamos neste texto os resultados de nossa pesquisa e algumas sugestões sobre a elaboração de um MOOC para ensino de línguas que seja significativo e eficiente dentro dos conceitos que norteiam a teoria conectivista. Há ainda várias lacunas que precisam ser preenchidas, entre as quais incluímos: (1) mais sugestões para a criação de cursos desse tipo; (2) definição clara dos elementos que são imprescindíveis para o funcionamento adequado dos cursos, com resultados significativos para os cursistas; (3) elaboração de um metaMOOC, ou seja, um MOOC que discuta e apresente as sugestões necessárias para a criação de cursos on-line massivos e abertos para o ensino de línguas.

    REFERÊNCIAS

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    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      Jan-Mar 2018

    Histórico

    • Recebido
      22 Maio 2017
    • Aceito
      10 Nov 2017
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