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A abolição do tráfico de escravos no Atlântico Sul: Portugal, o Brasil e a questão do contrabando de africanos

The Abolition of the Slave Trade in the South Atlantic: Portugal, Brazil and the Issue of the Smuggling of Africans

Resumo

Este artigo aborda a temática da abolição do tráfico de escravos realizado no Atlântico Sul. Cumpre destacar que o estudo que aqui se apresenta não traz uma discussão a partir do enquadramento das relações diplomáticas anglo-brasileiras com a questão do tráfico de escravos, mas sim com base no condicionamento do relacionamento luso-brasileiro com esta questão em meados do século XIX.

Palavras-chave:
tráfico escravo; diplomacia do tráfico; Portugal; Brasil

Abstract

This article deals with the issue of the abolition of the slave trade in the South Atlantic. It is important to say that this study does not deal with this discussion from the exclusive framework of the diplomatic relations between Great Britain and Brazil regarding the question of slave trade, it is also based on the traditional relations developed between Portugal and Brazil in respect to that same question in the mid-nineteenth century.

Keywords:
slave trade; slave trade diplomacy; Portugal; Brazil

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  • 1
    O termo "Mundo Atlântico" aqui utilizado, compreende uma modalidade de escrita da História centrada na historicização dos fatos, fenômenos e personagens pertencentes, atuantes e circunscritos ao universo do oceano Atlântico. Nesta perspectiva analítica, a temática do comércio escravista intercontinental - ou, a temática da diáspora, como alguns preferem denominar - tem sido a grande privilegiada dos esforços investigativos com o fito de localizar, debruçar e trazer à luz experiências e interconexões de gentes, episódios e fenômenos até então pouco valorizados ou, mesmo, pouco conhecidos, encerrados e compartilhados entre as diversas sociedades margeadas pelo Atlântico. Para uma leitura mais teórica do termo ver: THORTON, John Kelly. A África e os africanos na formação do mundo atlântico, 1400-1800. Rio de Janeiro: Elsevier/Editora Campus, 2004. p.41-43. Já para uma leitura especificamente voltada para o desenvolvimento desta perspectiva de estudo no cenário historiográfico brasileiro dos últimos anos ver: MAMIGONIAN, Beatriz Gallotti. A África no Brasil: mapa de uma área em expansão. Topoi, Rio de Janeiro, v.5, n.9, p.33-53, 2004.
  • 2
    Para um estudo amplo e pormenorizado das redes sociais, políticas e mercantis forjadas no seio das sociedades portuguesa e brasileira pelo tráfico atlântico de escravos ver: FRAGOSO, João (Org.). O antigo regime nos trópicos: A dinâmica imperial portuguesa (Séculos XVI-XVIII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. FRAGOSO, João; FLORENTINO, Manolo; SAMPAIO, Antonio Carlos Juca; CAMPOS, Adriana Pereira. Nas rotas do império: Eixos mercantis, tráfico e relações sociais no mundo português. Vitória/Lisboa: EdUFES/IICT, 2006.
  • 3
    Segundo assinalado por Leslie Bethell, embora o número de embarcações utilizadas pela GrãBretanha na vigília da costa atlântica africana, ao longo da primeira metade do Oitocentos, seja consideravelmente alto, a atuação desta esquadra nunca fora, de fato, eficiente. Isso por três razões: 1º O estado obsoleto dos navios; 2º A enorme extensão marítima a ser patrulhada; e 3º O acúmulo de deveres a serem cumpridos pela esquadra. Ver: BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil. A Grã-Bretanha, o Brasil e a questão do tráfico de escravos, 1807-1869. Rio de Janeiro/São Paulo: Expressão e Cultura/ EDUSP, 1976. p.125-127.
  • 4
    Roquinaldo Ferreira do Amaral apresenta uma rica análise em números, estatísticas, volumes e percentuais da reorientação do mercado escravista de Luanda (Angola) com destino a Cuba, ainda mais entre as décadas de 1840 e 1860, quando o tráfico para o Brasil começou a enfrentar novas e redobradas dificuldades que vão levar a sua extinção futura. AMARAL, Roquinaldo do. Dos sertões ao Atlântico: tráfico ilegal de escravos e comércio lícito em Angola. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, 1996. Ver em especial o capítulo 8, "O porto de Luanda e as relações com o Atlântico", p.200-215.
  • 5
    RODRIGUES, Jaime. O infame comércio: propostas e experiências no final do tráfico de africanos para o Brasil (1800-1850). 2ª ed. Campinas/São Paulo: Editora da Unicamp/CECULT, 2000. p.171-184.
  • 6
    Tratar dos navios negreiros exige um trabalho à parte, posto que a historicidade por trás destas embarcações é enorme e multifacetada. Na historiografia brasileira dois estudos pioneiros neste sentido são o de RODRIGUES, Jaime. Navios negreiros: imagens e descrições. In: De costa a costa: escravos, marinheiros e intermediários do tráfico negreiro de Angola ao Rio de Janeiro (1780-1860). São Paulo: Cia. das Letras, 2005. p.146-186; RAMBELLI, Gilson. Tráfico e navios negreiros: contribuição da arqueologia náutica e subaquática. In: Navigator: subsídios para a história marítima do Brasil. Rio de Janeiro: SDGM, v.2, n.4, p.59-72, 2006. Na historiografia estadunidense - que, assim como a brasileira, possui importantes obras a respeito do tráfico e da escravidão - merece destaque neste sentido o trabalho de CONRAD, Robert Edgar. Tumbeiros: o tráfico escravista para o Brasil. São Paulo: Brasiliense,1985; e, o estudo mais recente de REDIKER, Marcus. O navio negreiro: uma história humana. São Paulo: Cia. das Letras, 2011.
  • 7
    Segundo Bethell, a diplomacia das canhoneiras sempre fez parte da política externa britânica Oitocentista. Todavia, até meados daquele século esta ocorria por conta do modo de agir imperialista e arrogante de uma série de diplomatas que sentindo-se isolados (muitos estavam há mais de três ou seis meses de distância do Foreign Office) utilizavam de medidas coercitivas, sobretudo de demonstrações de força no que se refere ao poder naval, para preservar os interesses políticos e econômicos das comunidades britânicas espalhadas pela América Latina. Todavia, teria sido apenas a partir da segunda metade do século XIX, após a ascensão de lord Palmerston ao cargo de Primeiro Ministro e, consequentemente, a confirmação do domínio dos palmerstonianos sobre o Foreign Office, que a diplomacia das canhoneiras passaria de fato à qualidade de princípio norteador dos diplomatas da Grã-Bretanha. A este respeito ver: BETHELL, Leslie. O imperialismo britânico e a Guerra do Paraguai. In: Estudos Avançados, São Paulo, v.9, n.24, p.269-285, 1995.
  • 8
    BETHEL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.27.
  • 9
    Assim compartilham: CONRAD, Robert Edgar. Op. Cit., p.150; BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.36-37; e, WRIGHT, Antônia Fernanda Pacca de Almeida. Desafio americano à preponderância britânica no Brasil: 1808-1850. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense/ Instituto Nacional do Livro, 1978. p.228.
  • 10
    Compartilhamos aqui do ponto de vista de Waddell, que entende o sistema atlântico - ou, caso se prefira, americano - como um subsistema, isto no curso da transição do Setecentos para o Oitocentos, de um sistema político maior: o europeu. Ver: WADDELL, D. A. G. A política internacional e a independência da América Latina. In: BETHELL, Leslie (Org.). História da América Latina. Vol. III: Da independência até 1870. São Paulo: EdUSP/Imprensa Oficial do Estado/Fundação Alexandre de Gusmão, 2004. p.231-265.
  • 11
    Ao adotarmos o termo política da escravidão utilizamos a significação semântica fornecida por Tâmis Parron, que a entende como sendo uma rede de alianças políticas e sociais costuradas em favor da estabilidade institucional da ordem escravista. Este conceito, tal qual nos lembra o autor, é costumeiramente empregado por historiadores dos Estados Unidos para designar o conjunto de valores e práticas que direcionavam os eleitores sulistas na escolha de seus candidatos ao Congresso Nacional, com vista a salvaguardar não só a continuidade, mas também a própria expansão - para os novos territórios do sudoeste - do sistema escravista. Ver: PARRON, Tâmis. A política da escravidão no Império do Brasil, 1826-1865. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. p.17-19.
  • 12
    Para o leitor interessado na realidade do sistema escravista desenvolvido em Cuba e no sul dos Estados Unidos, um texto referencial para a formulação de ideias neste sentido é o de MARQUESE, Rafael de Bivar. Feitores do corpo, missionários da mente. Senhores, letrados e o controle dos escravos nas Américas, 1660-1860. São Paulo: Cia das Letras, 2004.
  • 13
    ALMEIDA, Paulo Roberto de. Formação da diplomacia econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império. Vol. I. São Paulo/Brasília: SENAC/FUNAC, 2001. p.315.
  • 14
    Ibidem, p.317.
  • 15
    Clara referência, obviamente, ao trabalho conjunto de FRAGOSO, João; FLORENTINO, Manolo. O arcaísmo como projeto: mercado atlântico, sociedade agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia - Rio de Janeiro, c. 1790 - c. 1840. 4ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
  • 16
    Para uma leitura dos pormenores da ideia de edificação do Império luso-brasileiro ver LYRA, Maria de Lourdes Viana. A utopia do poderoso império. Portugal e Brasil: bastidores da política, 1798-1822. São Paulo: Sette Letras, 1994. Um segundo trabalho referencial para a compreensão deste grande empreendimento que foi a criação de um Império extracontinental, porém com uma visão acadêmica portuguesa do tema, é a coletânea de NIZZA DA SILVA, Maria Beatriz (Org.). Nova história da expansão portuguesa. O Império luso-brasileiro (1750-1822). Lisboa: Estampa, 1986.
  • 17
    MAGNOLI, Demétrio. O corpo da pátria: imaginação geográfica e política externa no Brasil (1808-1912). São Paulo: Editora UNESP/ Moderna, 1997. p.86.
  • 18
    O termo partidário, aqui utilizado, difere da conotação contemporânea que o identifica como sendo uma pessoa ligada a um partido político, a um sistema ou a um regime de governo. Ele restringe, tão somente, à rivalidade dos círculos políticos do Império luso-brasileiro, verificada nos primeiros anos da década de 1820, entre os estadistas identificados com os interesses políticos e econômicos do Brasil e aqueles identificados às aspirações políticas e econômicas de Portugal. Para uma visão mais plena deste contexto ver RIBEIRO, Gladys Sabina. A liberdade em construção. Identidade nacional e conflitos antilusitanos no Primeiro Reinado. Rio de Janeiro: FAPERJ/Relume Dumará, 2002.
  • 19
    Compartilhamos aqui da visão dos professores Cervo e Bueno. Segundo eles, o Estado brasileiro [que] se apresenta à comunidade internacional, em 1822, reivindicando o papel de novo membro e ator (...) pouco tinha [na realidade] de brasileiro, na medida em que representava o transplante direto do Estado português. Ver: CERVO, Amado; BUENO, Clodoaldo. História da política exterior do Brasil. São Paulo: Ática, 1992. p.20-25.
  • 20
    Preâmbulo do Tratado de Paz e Aliança entre Brasil e Portugal, de 1825. Apud. CERVO, Amado; MAGALHÃES, José Calvet de. Depois das caravelas. As relações entre Portugal e Brasil: 1808-2000. Brasília: Editora da UnB, 2000. p.377-381.
  • 21
    ACCIOLY, Hildebrando. O reconhecimento da Independência do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1927. p.120.
  • 22
    Para uma leitura mais específica e consubstancial das negociações anglo-brasileiras durante a década de 1820, além da obra de Leslie Bethell, A abolição do tráfico de escravos para o Brasil, aqui já referida, indica-se também outros importantes trabalhos como: CALÓGERAS, João Pandiá. A política exterior do Império. Vol. II: o Primeiro Reinado. Brasília: Senado Federal, 1998; RODRIGUES, José Honório. Independência: revolução e contra-revolução. Vol. 5: a política internacional. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975; PANTALEÃO, Olga. A presença inglesa no Brasil/O reconhecimento do Império. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de (Org.). História geral da civilização brasileira. Tomo II: O Brasil monárquico. Vol.I - O processo de emancipação. 5ª ed. São Paulo: Difel, 1982. p.64-99 e p.331378.
  • 23
    BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos para o Brasil... Op. Cit., p.39-40.
  • 24
    Ibidem, p.41.
  • 25
    25Cabe aqui uma explicação pontual. Por muito tempo a historiografia tomou o Tratado anglo-brasileiro de 1826 como uma derrota à diplomacia do tráfico do Primeiro Reinado. Tal visão, em grande parte, se justifica em face da cláusula nele firmada de abolição do tráfico de escravos para o Brasil passados três anos de sua ratificação pelos respectivos governos contratantes. Todavia, para além desta determinação, a historiografia que se debruçou sobre o Tratado de 1826 foi também muito influenciada pela impressão negativa que o sistema de tratados tinha despertado no Poder Legislativo nacional que, àquela altura, já iniciava a sua campanha pelo fortalecimento das instituições parlamentares. Desta forma, a historiografia mais tradicional deixou-se, em certa medida, contaminar-se pela visão "do insucesso", criada pelos parlamentares a partir de 1826, o que impediu que se apreendessem os sucessivos esforços travados pelos diplomatas brasileiros desde 1822 para salvaguardar o tráfico de escravos.
  • 26
    A importância da embarcação dos escravos, bem como das demais atividades do negócio negreiro para os cofres públicos de Portugal ao longo do século XIX pode ser verificada no trabalho de LAINS, Pedro. Causas do colonialismo português em África, 1822-1975. In: Análise Social, Lisboa, Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, v.XXXIII, n.146-147, p.463-496, 1998. (Ver em especial as páginas 467 a 476).
  • 27
    ALEXANDRE, Valentim. O império português (1825-1890): Ideologia e economia. In: Análise Social, Lisboa, Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, v.XXXVIII, n.169, p.959979, 2004. (citação literal da página 960).
  • 28
    Seguimos aqui a noção de comunidade de traficantes fornecida por Florentino, de forma que a entendemos como uma rede de relações que extrapolava o âmbito econômico, estendendo-se ao campo pessoal e afetivo. Ver: FLORENTINO, Manolo. Em costas negras: uma história do tráfico atlântico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro (Séculos XVIII e XIX). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1995. p.219-222.
  • 29
    Eusébio de Queirós Coutinho era pai de Eusébio de Queirós Coutinho Matoso Câmara, justamente um dos líderes da Trindade Saquarema e Ministro da Justiça responsável, em 1850, pela repressão ao tráfico atlântico de escravos. A relação da família dos Queirós com a política brasileira se dá, por conseguinte, a partir da passagem do Eusébio pai pelo Rio de Janeiro, em 1822, quando este seguia para Lisboa a fim de tomar seu assento nas Cortes Constitucionais como um dos representantes eleitos por Angola. Ver: RODRIGUES, José Honório. Brasil e África: outros horizontes. Vol.I - Relações e contribuições mútuas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964. p.133-137.
  • 30
    COSTA E SILVA, Alberto da. Um rio chamado Atlântico: a África no Brasil e o Brasil na África. Rio de Janeiro: Nova Fronteira/Ed. UFRJ, 2003. p.32.
  • 31
    Artigo 3 do Tratado de Paz e Aliança entre Brasil e Portugal, de 1825. Apud. CERVO, Amado; MAGALHÃES, José Calvet de. Depois das caravelas... Op. Cit., p.379.
  • 32
    ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos (1834-1851). Análise Social, Lisboa, Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, v.XXVI, n.111, p.293-333, 1991 (citação literal da página 301).
  • 33
    As relações bilaterais de Brasil e Portugal eram, na realidade, mais complexas, envolvendo interesses divergentes de ambos os lados. Do lado brasileiro, demonstrava-se ainda o interesse pelos seguintes temas: fabricação e contrabando de moeda falsa e a liquidação dos prejuízos reclamados por Portugal quando da Guerra de Independência. Já do lado português constavam como principal ponto de pauta a coibição da emigração clandestina de portugueses para o Brasil e a proteção dos bens e dos súditos portugueses que se encontravam e que residiam no Brasil. Apesar desta agenda variada, naqueles anos de 1830, foi a coibição do tráfico atlântico feito debaixo da bandeira portuguesa que servira como ponto catalisador das relações entre ambos os países. CERVO, Amado Luiz; MAGALHÃES, José Calvet de. Depois das caravelas... Op. Cit., p.129-168.
  • 34
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1834, p.4.
  • 35
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1835, p.4-5.
  • 36
    A lei de 1831 foi por muito tempo considerada uma lei ineficiente por parte da comunidade acadêmica que, aliás, fazia questão de reforçar o estigma negativo por trás da denominação "lei para inglês ver". Contudo, já faz algum tempo que uma vertente da historiografia nacional tem chamado a atenção para outro caráter da lei de 1831 que não o jurídico: o seu caráter político. Nesse sentido, são instigantes os trabalhos de Beiguelman e de Mamigonian. Ambas as autoras reconhecem o trabalho legislativo acerca da regulamentação da extinção e da proibição do comércio negreiro para o Brasil impetrado durante a Regência (1831-1840) como uma tentativa do próprio legislativo de (re)afirmar a sua soberania sobre o Estado brasileiro e, por conseguinte, sobre as comissões mistas anglo-brasileiras. Estas foram criadas, com base nas estipulações acertadas no Tratado de 1826, para julgar as presas realizadas a partir de 13 de março de 1830, quando o tráfico entre a África e o Brasil deveria, pelo referido convênio internacional, cessar de vez. Este artigo compartilha dessa visão história. Ver: BIGUELMAN, Paula. Formação política do Brasil. Vol. I: Teoria e ação no pensamento abolicionista. São Paulo: Pioneira, 1976. MAMIGONIAM, Beatriz Gallotti. O direito de ser africano livre: os escravos e as interpretações da Lei de 1831. In: LARA, Silvia Hunold; MENDONÇA, Joseli Maria Nunes (Orgs.). Direito e justiça no Brasil: ensaios de história social. Campinas: Editora da Unicamp, 2006. p.129-169.
  • 37
    AMARAL, Roquinaldo do. Op. Cit., p.136. ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.297.
  • 38
    Da mesma forma com que grande parte das autoridades brasileiras eram suscetíveis ao tráfico e aos traficantes, era também conhecida a conivência com que autoridades portuguesas, no Brasil e/ou nos portos da África, tinham para com a dita prática e os ditos indivíduos. AMARAL, Roquinaldo do. Op. Cit., p.117-148 e p.216-233.
  • 39
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1838, p.14-15.
  • 40
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1835, p.5.
  • 41
    COSTA e SILVA, Alberto. Op. Cit., p.31. Três foram as tentativas do governo brasileiro, ao longo da primeira metade do século XIX em estabelecer um consulado em Luanda. A primeira se deu entre os fins de outubro de 1826 e os idos de novembro de 1827, quando Rui Germak Possolo chegou a assentar serviço em Luanda até ser expulso pelo governador de Angola, Nicolau de Abreu Castelo Branco. A segunda, em 1835, quando Manuel Alves Branco, Ministro dos Negócios Estrangeiros, buscou junto ao Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Sá da Bandeira, autorização para o mesmo fim. Seu pedido, no entanto, foi obstaculizado. A terceira, ocorreu em 1850, às vésperas da promulgação de uma nova lei antitráfico pelo governo brasileiro. Na ocasião, Paulino José Soares de Souza, então chanceler brasileiro, mais uma vez enviava requerimento às autoridades competentes da administração do ultramar português solicitando a admissão de agentes consulares brasileiros nos portos da África com base no princípio da reciprocidade entre as nações amigas. A este último pedido, respondeu o governo de Lisboa positivamente, ainda que tardiamente, autorizando, em 17 de março de 1854, o estabelecimento de consulados brasileiros em todos os seus portos ultramarinos abertos ao comércio estrangeiro com as nações amigas de Portugal. O que se deu, efetivamente, a 23 de agosto daquele mesmo ano, quando o recém elevado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, José Maria da Silva Paranhos, nomeara Hermenegildo Frederico Niterói para o cargo. Relatórios da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1835, p.5; de 1850, p.4; e de 1856, p.7.
  • 42
    COSTA e SILVA, Alberto. Op. Cit., p.32.
  • 43
    Com a dissolução do Império luso-brasileiro, em 1822, tornada irrevogável em 1825, os estadistas portugueses voltam sua atenção para os domínios ultramarinos na África. Objetivando estreitar as relações daquelas possessões com a metrópole, logo se entende que o refreamento do tráfico atlântico de escravos entre aquelas e o Brasil é uma das suas principais necessidades. Todavia, pelo menos até a segunda metade do Oitocentos, esses planos de regeneração do Império ultramarino português ainda não se encontravam amadurecidos, o que, por sua vez, contribuiu para a prorrogação das relações mercantis entre os portos da África portuguesa e os do Brasil. ALEXANDRE, Valentim. O império português (1825-1890)... Op. Cit., p.959-979.
  • 44
    CERVO, Amado & MAGALHÃES, José Calvet de. Depois das caravelas... Op. Cit., p.140.
  • 45
    BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.103. A década de 1820 pode ser apreendida como um momento de relativa calmaria das relações anglo-lusitanas no que tange a questão do tráfico atlântico de escravos. Isso porque, até 1825, a diplomacia britânica esteve direcionada na tarefa de mediar a reconciliação entre Portugal e Brasil após a cisão ocorrida em finais de 1822. Na segunda metade dos anos 20, por conseguinte, esteve a diplomacia da Grã-Bretanha extremamente ocupada em tirar do Brasil uma cláusula proibitiva mais efetiva com relação ao comércio negreiro realizado sob a sua bandeira. Destas circunstâncias resultam a relativa calmaria das relações anglo-lusitanas até o princípio da década de 1830.
  • 46
    BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.105-106.
  • 47
    ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.301.
  • 48
    ALEXANDRE, Valentim. O império português (1825-1890)... Op. Cit., p.962. A preeminência de Sá da Bandeira à frente da política colonial portuguesa do século XIX parece ser realmente um consenso da historiografia portuguesa, tanto da ala mais contemporânea como da ala mais tradicional. Da ala mais contemporânea, além de Alexandre, pode se destacar o trabalho de SARDICA, José Miguel. A Regeneração sob o signo do consenso. A política e os partidos entre 1851 e 1861. Lisboa: ICS-UL, 2001. Já da ala mais tradicional, lista-se, por exemplo, o estudo de CAYOLLA, Lourenço. Sá da Bandeira. Coleção figuras e feitos do além-mar. Lisboa: Agência Geral do Ultramar, 1969.
  • 49
    Para maiores informações acerca das minúcias do projeto e do pensamento político de Sá da Bandeira em relação ao tráfico atlântico de escravos ver: ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.304-317.
  • 50
    LAINS, Pedro. Op. Cit., p.468.
  • 51
    Estas medidas restritivas e punitivas não tiveram, contudo, efeito algum, pois, nos dizeres de Alexandre, "se o governo de Lisboa não tinha mãos nem nos seus cônsules, menos ainda se conseguiria fazer obedecer pelas autoridades coloniais das possessões de África [onde] o peso e a influência política dos interesses locais, já muito fortes no Antigo Regime [...] cresceram ainda [mais] depois da guerra civil e da vitória dos liberais na metrópole, que, pondo em causa o sistema de administração centrado nos capitães-generais, abria um período de indefinição e por vezes mesmo vazio de poder, preenchido geralmente pela criação de juntas de governo formadas por membros das oligarquias da colônia". ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.309.
  • 52
    BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.109.
  • 53
    Ibidem.
  • 54
    Ibidem, p.156.
  • 55
    55Apresentado a 10 de julho de 1839 à Câmara dos Comuns, o Bill foi ali rapidamente acolhido e aprovado. Talvez, pela proximidade dos interesses dos parlamentares daquela Casa com os interesses coloniais dos cultivadores do Caribe. Na Câmara dos Lordes, entretanto, o Bill encontrou forte oposição do Duque de Wellington, mais afeito à defesa dos direitos internacionais garantidos em tempos de paz, e, também à tradicional aliança entre Grã-Bretanha e Portugal. BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.159-163.
  • 56
    O Tempo, n.437, 29/07/1839. Apud. ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.319.
  • 57
    O Nacional, n.1368, 31/07/1839. Apud. ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.319.
  • 58
    O Atleta, n.173, 05/08/1839. Apud. ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.320.
  • 59
    ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.321.
  • 60
    BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.163.
  • 61
    Intervenção de Palmela de 14/07/1840 na Câmara dos Senadores de Portugal. Apud. ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.325.
  • 62
    Ibidem.
  • 63
    BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.183.
  • 64
    Com a revogação do Bill Palmerston os navios sob a bandeira portuguesa deixaram de ser apresados pela Royal Navy em águas territoriais portuguesas. Da mesma forma que deixaram de ser julgados pelos Tribunais do Vice-Almirantado britânico e voltaram a ser apresentados diante das comissões mistas na África. ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.326.
  • 65
    BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.181-183.
  • 66
    Ibidem, p.115. LAINS, Pedro. Op. Cit., p.475. ALEXANDRE, Valentim. Portugal e a abolição do tráfico de escravos... Op. Cit., p.299
  • 67
    BETHELL, Leslie; CARVALHO, José Murilo de. O Brasil da independência a meados do século XIX. In: BETHEL, Leslie (Org.). História da América Latina. Op. Cit., Vol.III, p.695-769 (citação literal da página 746).
  • 68
    É certo que as acusações de favorecimento à causa britânica contribuíram no desgaste da imagem pública de Oliveira Coutinho. Todavia, deve-se destacar o fato de que boa parte destas acusações eram, na realidade, fomentadas pelos traficantes, que "manipulavam habilmente os sentimentos nacionalistas da população para conduzir a opinião pública em apoio de seus interesses ameaçados". Ademais, outra parte do desgaste pessoal de Aureliano, deve-se às intrigas e manobras golpistas do próprio ambiente palaciano de princípio dos anos quarenta, movidas pelo Clube da Joana do Mordomo-Mor do imperador Paulo Barbosa da Silva e pelo Partido da Imperatriz de Honório Hermeto. Para uma leitura mais completa do cenário político da primeira década do Segundo Reinado ver CASTRO, Paulo Pereira de. Política e administração de 1840 a 1848. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de (Org.). Op. Cit. Vol.II - Dispersão e unidade. p.509-540.
  • 69
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1843, p.5.
  • 70
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1842, p.12.
  • 71
    Até o final da década de 1830, a esquadra imensamente superior da costa africana e a proeminência dos comissários britânicos na Comissão Mista anglo-brasileira de Serra Leoa faziam com que a Condenação das embarcações ali apresadas fosse quase tão certa quanto em qualquer tribunal do Vice-Almirantado. No que toca a esquadra britânica estacionada na costa brasileira, entretanto, o número reduzido de suas forças e a proeminência dos comissários brasileiros na Comissão Mista anglo-brasileira do Rio de Janeiro, fazia da absolvição dos navios ali capturados quase uma certeza. BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.176-206.
  • 72
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1840, p.7-8.
  • 73
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1841, p.5-7.
  • 74
    BETHELL, Leslie & CARVALHO, José Murilo de. O Brasil da independência a meados do século XIX... Op. Cit., p.746.
  • 75
    Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1844, p.14-15.
  • 76
    Ibidem, p.15.
  • 77
    Segundo as estimativas em posse do Foreign Office, de 1837 a 1844, 211.626 escravos haviam sido introduzidos no Brasil, contra apenas 7.947 introduzidos no período de 1831 a 1836. BETHELL, Leslie. Apêndice: estimativa da importação de escravos para o Brasil, 1831-1855. In: A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.368.
  • 78
    Uma cópia desta notificação foi anexada ao Relatório de 1846, do Ministro Bento da Silva Lisboa, Barão de Cairu. Relatório da Repartição dos Negócios Estrangeiros, 1846. Notas em nome do governo brasileiro, Anexo Nº1.
  • 79
    BETHELL, Leslie & CARVALHO, José Murilo de. O Brasil da independência a meados do século XIX... Op. Cit., p.756.
  • 80
    Publicado originalmente na língua inglesa, em 1970, pela Cambridge University Press, o livro de Bethell veio a ter sua primeira publicação em português já em 1976, pela Expressão Cultural em parceria com a Editora da Universidade de São Paulo. O curto período entre a edição inglesa e a edição brasileira atesta o interesse despertado entre os historiadores do lado de cá pelo estudo do historiador inglês.
  • 81
    Ao lado do trabalho do historiador norteamericano Alan k. Manchester, Preeminência inglesa no Brasil (1933), editado em português pela Editora Brasiliense, em 1973, e do trabalho do brasileiro José Honório Rodrigues, Brasil e África... Op. Cit., publicado pela primeira vez em 1961, pela Civilização Brasileira, e editado em inglês, já em 1965, pela University of California Press em parceria com Cambridge University Press.
  • 82
    Cf. BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.9.
  • 83
    A expressão surgiu entre as décadas de 1960 e de 1970 para identificar o grupo de pesquisadores estrangeiros que então fazia da história do Brasil o seu campo de estudo. Para maiores informações ver o dossiê História e Ciências Sociais da revista Estudos Históricos (v.3, n.5, de 1990).
  • 84
    Cf. BETHELL, Leslie. A abolição do tráfico de escravos no Brasil... Op. Cit., p.9.
  • 85
    Ibidem.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2013

Histórico

  • Recebido
    Ago 2012
  • Aceito
    Mar 2013
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