Resumo
O texto realiza um breve percurso historiográfico sobre o tema da Independência na província do Maranhão. Para tanto, demarca a década de 1860 como momento de formulação de uma narrativa fundadora da primeira matriz interpretativa sobre o tema; na sequência, explora as permanências que balizaram tal matriz entre duas efemérides da Independência do Brasil/Maranhão, situadas nos anos de 1922/1923 e 1972/1973; por fim, explora para as últimas duas décadas os elementos de renovação historiográfica da temática. Nesse percurso, estabelece aproximações com as premissas que balizaram (ou ainda balizam) os estudos sobre a Independência do Brasil, à procura de especificidades e similitudes da produção aqui explorada.
Palavras-chave:
Independências; comemorações; historiografia
Abstract
The text executes a brief historiographic journey on the subject of Independence in the province of Maranhão. To do so, it marks the 1860s as the moment of formulation of a founding narrative of the first interpretative headquarters on the subject; afterwards, it explores the permanencies that guided this headquarters between two ephemeris of the Independence of Brazil/Maranhão, located in the years 1922/1923 and 1972/1973; finally, it explores, for the last two decades, the elements of historiographic renewal of the theme. On this route, it establishes approximations with the premises that guided (or still guide) studies on the Independence of Brazil, in search of specificities and similarities of the production explored here.
Keywords:
Independences; commemorations; historiography
Em 25 de fevereiro de 1972, correspondência trocada entre funcionários da Superintendência de Desenvolvimento do Maranhão (SUDEMA) expressava o receio de que o Maranhão “ficasse para trás” nas comemorações do Sesquicentenário da Independência que se aproximava. Afligia-os o fato de não haver quase nada a ser publicado sobre a Independência do Maranhão, razão pela qual recorreram à reedição do livro História da Independência da Província do Maranhão (1822-1828), publicado por Luís Antonio Vieira da SilvaARARIPE, Tristão de Alencar. A independência do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. 48, v. 71, pt. 2, p. 159-174, 1885., em 18623 3 VIEIRA DA SILVA, Luís Antonio. História da independência da província do Maranhão (1822-1828). São Luís: Typografia do Progresso, 1862. Esse episódio foi explorado em GALVES, Marcelo Cheche. Nos bastidores do Sesquicentenário: a reedição do livro História da Independência da Província do Maranhão (1822-1828), de Luís Antônio Vieira da Silva. Acervo, Rio de Janeiro, v. 35, p. 1-21, 2022a. .
A preocupação fazia sentido. Afinal, em 150 anos de Independência - a rigor, 149 no Maranhão4 4 A província do Maranhão foi incorporada ao Império do Brasil, não sem resistência, em 28 de julho de 1823, data da câmara geral, realizada em São Luís, que formalizou os termos da “adesão”, como registrado em ata. -, o livro de Vieira da Silva permanecia como única obra de fôlego sobre temática tão revisitada pela historiografia brasileira, mas, ao que parece, desconfortável para a historiografia maranhense, ao menos enquanto persistiu uma tradição historiográfica ocupada com a “manifestação do nacional” em território colonial5 5 Cabe demarcar brevemente três dos princípios que orientaram, desde a década de 1990, a renovação da temática da Independência na historiografia brasileira, tão bem representados na coletânea organizada por István Jancsó: a) a recusa à pré-existência do Estado e da nação, com a abolição de expressões como “manutenção da unidade”, “restauração das províncias rebeldes”, “separatismo do Norte”; b) a recuperação da dinâmica política a partir das variáveis que afligiam os cidadãos que se movimentavam na nova cena pública, sem o peso de explicações estruturais, como aquelas pautadas na “truculência das Cortes”, na “falência ibérica” e nas “novas necessidades do capital”; c) a imersão no conjunto de documentos produzidos dentro e fora da esfera estatal, que abrangia agora jornais e folhetos, tomados como novos ingredientes de uma política cujo aprendizado se dava também em praça pública. JANCSÓ, István (org.). Independência: história e historiografia. São Paulo: Hucitec, 2005. .
Nesse sentido, aquilo que compreendemos atualmente como decorrência das assimetrias do território colonial e consequente choque entre diferentes projetos de futuro6 6 A respeito, ver o texto seminal de JANCSÓ, István; PIMENTA, João Paulo Garrido. Peças de um mosaico (ou apontamentos para o estudo da emergência da identidade nacional brasileira). In: MOTA, Carlos Guilherme (org.). Viagem incompleta - formação: histórias. São Paulo: Senac, 2000. p. 129-175. , era concebido como “atraso” - das províncias resistentes ao movimento iniciado no Rio de Janeiro7 7 Entre as mais resistentes estavam a Bahia, o Maranhão e o Grão-Pará, só incorporadas em julho/agosto de 1823, além da Cisplatina, incorporada precariamente no início de 1824. - em “querer ser Brasil”, questão que colidia com a percepção de nação pregressa, orientadora das narrativas desde, pelo menos, John Armitage8 8 ARMITAGE, John. História do Brasil. Desde a chegada da família de Bragança, em 1808, até a abdicação de D. Pedro I, em 1831, compilada à vista dos documentos públicos e outras fontes originais formando uma continuação da História do Brasil, de Southey. Tradução de Eugênio Egas. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1965. , e que ganharia corpo com a criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), em 1838.
No caso do Maranhão, o “atraso” fora agravado, quinze anos depois, com a eclosão da Balaiada (1838-1841), outra demonstração de “infidelidade”, conectada à anterior, noutros moldes, pela resistência às ordens do Rio de Janeiro.
Entre a Independência e a Balaiada, e nas décadas seguintes, a importância no Maranhão daqueles reconhecidos politicamente como “portugueses” também parece ter dificultado o enfrentamento do tema da Independência9 9 Reintegrados ao comércio, política e administração a partir de 1825, os “portugueses” do Maranhão permaneceriam por décadas na cena pública. Em 26 de julho de 1864, às vésperas do quadragésimo primeiro aniversário da incorporação do Maranhão ao Império, o jornal A Coalição pedia aos “estrangeiros” que fechassem as portas de seus estabelecimentos comerciais, evitando assim que “[…] espíritos exagerados possam interpretar em mal sentido o procedimento contrário”. PEDIDO innocente. A Coalição, São Luís, v. 3, n. 60, p. 2, 1864. Cabe lembrar que o livro de Vieira da Silva foi publicado pouco antes desse episódio. Sobre a reintegração dos “portugueses”, ver GALVES, Marcelo Cheche. “Aderir”, “jurar” e “aclamar”: O Império no Maranhão (1823-1826). Almanack, Guarulhos, n. 1, p. 105-118, 2011. , nacional por excelência.
De certo modo, o livro de Vieira da Silva expressa esse desconforto. Em síntese, trata-se de uma história da guerra pela Independência do Maranhão travada inicialmente na fronteira leste da província e imediações, a partir do avanço das tropas independentistas do Ceará e Piauí, que venceram batalhas e angariaram apoios até o cerco à ilha em que se localiza a cidade de São Luís. A capital se rendeu no final de julho de 1823, após a chegada do almirante Cochrane.
Com Vieira da Silva inaugura-se não apenas a historiografia sobre a Independência do Maranhão, mas também uma interpretação que predominaria por mais de um século e meio: a narrativa da “libertação do Maranhão”. Se a publicação do livro abriu ao autor as portas do IHGB10 10 No ano seguinte, tornou-se sócio correspondente do IHGB. Para um ensaio sobre o personagem, a obra e sua recepção, ver GALVES, Marcelo Cheche; MENDES, Felipe Ucijara Guimarães. Luís Antônio Vieira da Silva: O IHGB e a questão da Independência. In: BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche (org.). Historiografia maranhense: dez ensaios sobre historiadores e seus tempos. São Luís: Café & Lápis, 2014. p. 35-56. , os termos em que integrou o Maranhão à Independência parecem inibir um impulso de publicações sobre a temática - curiosamente, o próprio autor jamais voltaria ao tema.
Décadas depois, a efeméride do centenário da Independência, quase ignorada pela historiografia maranhense, não provocou significativas alterações nesse quadro11 11 Para a vizinha “província rebelde” do Pará, Aldrin Figueiredo observou que a ocasião do centenário da Independência possibilitou não apenas uma revitalização do tema, mas os termos de sua nacionalização, centrada nos episódios vividos pelos “brasileiros” daquela província. Tais comparações, que poderiam incluir a Bahia ou províncias “mais brasileiras”, como Ceará e Piauí, parecem ser um caminho promissor para um debate sobre as “peças de um mosaico” historiográfico sobre o tema. FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Memórias cartaginesas: modernismo, Antiguidade clássica e a historiografia da Independência do Brasil na Amazônia, 1823-1923. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 22, n. 43, p. 176-195, 2009. . Em 1922, Dunshee de Abranches reeditou parte da obra do avô, Garcia de Abranches, redator do jornal O Censor (1825-1830), reconhecido politicamente como “português”. O intuito, evidente desde as palavras de apresentação até a forma como concebeu a reedição, era reabilitar a figura do avô e inseri-lo no panteão da pátria12 12 A respeito, ver GALVES, Marcelo Cheche. A Revolução Liberal vista do Maranhão: O Espelho crítico-político, de Garcia de Abranches. Almanack, Guarulhos, v. 1, p. 1-32, 2022b. . Em 1923, durante sessão solene do IHGB, comemorativa do “centenário da proclamação e juramento da independência em São Luís do Maranhão”, o sócio (maranhense) Augusto Olympio Viveiros de Castro pediu a palavra para atacar o que denominou como “lenda de que tem sido vítima o Maranhão”, em uma referência à ideia de que não teria “aderido espontaneamente” à Independência13 13 VIVEIROS DE CASTRO, Augusto Olympio. Actas das Sessões de 1923. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 94, n. 148, p. 611-640, 1923. A perspectiva de Viveiros de Castro alinhava-se, não por acaso, à de historiadores oriundos das províncias “libertadoras”, que ressaltaram a luta dos “patriotas maranhenses” contra os “inimigos portugueses”. A respeito, ver o cearense ARARIPE, Tristão de Alencar. A independência do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. 48, v. 71, pt. 2, p. 159-174, 1885; e o piauiense NEVES, Abdias. A guerra do Fidié. 2. ed. Rio de Janeiro: Artenova, 1974. Sobre Abdias Neves, cabe registrar que fora acusado, pelo coetâneo Anísio Brito, de plagiar Vieira da Silva. Para o que nos interessa aqui, importa reter que as influências deste autor sobre aquele transparecem na tensão em torno da questão da “libertação do Maranhão”, ora presente em capítulos como o intitulado “O perigo maranhense”. Para as polêmicas envolvendo a acusação de plágio, ver QUEIROZ, Terezinha. A História da Independência no Piauí: das escritas instituintes aos revisionismos, das versões modernas às celebrações. Humana Res, Teresina, v. 1, n. 5, p. 59-81, 2022. .
Até 1972, esse quadro permaneceu inalterado. Nem mesmo a fundação, em 1925, do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM)14 14 A Revista do IHGM começou a ser publicada em 1949. , guardião regional de uma memória fundacional da nação, que tem a Independência como temática-chave, alterou o estatuto do tema no Maranhão.
No Sesquicentenário da Independência, a única novidade foi o livro escrito por Mário Meireles, largamente devedor à explicação formatada por Vieira da Silva. Meireles era o historiador mais influente no Maranhão daquele momento. Autor da História do Maranhão, em 1960, compêndio que gravaria seu nome como principal historiador daquela geração, também se destacara noutra efeméride: os 350 anos da “fundação francesa” do Maranhão, comemorados em 1962, época em que presidia a Academia Maranhense de Letras. Dez anos depois, chefiava a Casa Civil do governo de Pedro Neiva de Santana (1971-1975); nos preparativos do Sesquicentenário, integrou a Comissão Estadual de Programação, Incentivo e Coordenação das Comemorações do Sesquicentenário da Independência do Brasil, nome dado à Comissão Executiva Estadual no Maranhão15 15 Criada pelo decreto n. 4.667, de 2 de fevereiro de 1972. ARQUIVO NACIONAL. Fundo Comissão Executiva Central do Sesquicentenário da Independência do Brasil (Maranhão, pasta 13). 1972. . Lançado em janeiro de 1972, o livro foi a única iniciativa bibliográfica inédita (mas não original) sobre o tema da Independência, motivada pelo Sesquicentenário no Maranhão16 16 Ineditismo sem originalidade também caracterizou a única dissertação de mestrado sobre o tema até o final do século XX, defendida por PEREIRA, Maria Esterlina Mello. O processo de independência e integração do Maranhão. 1982. Dissertação (Mestrado em História). Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1982. Entre 1997 e 2001, a Revista do IHGM publicou quatro artigos dedicados a justificar o “atraso” do Maranhão em se incorporar ao Império do Brasil: a “causa patriótica” permanecia em evidência. Uma breve consideração sobre esses artigos pode ser consultada em GALVES, Marcelo Cheche. “Ao público sincero e imparcial”: imprensa e Independência na província do Maranhão (1821-1826). São Luís: Café & Lápis, 2015. p. 21-53. .
No início do século XX, longe das efemérides e ocupado com as resistências populares na Balaiada (1838-1841), Matthias Assunção estabeleceu um diálogo profícuo entre as discussões sobre a Independência no Maranhão - tempo para o qual recuou - e a renovação historiográfica em curso naquele momento. Não por acaso, seu texto Miguel Bruce e os “horrores da anarquia” no Maranhão (1822-1827) foi o único sobre o Maranhão a integrar a coletânea organizada por István Jancsó em 2005, cuja centralidade já foi aqui evidenciada17 17 ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Miguel Bruce e os “horrores da anarquia” no Maranhão (1822-1827). In: JANCSÓ, István (org.).. Op. cit. p. 345-378. Pouco antes, o autor dera outra importante contribuição para o debate: ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Cabanos contra bem-te-vis: a construção da ordem pós-colonial no Maranhão. In: DEL PRIORE, Mary; GOMES, Flávio (org.). Os senhores dos rios: Amazônia, margens e histórias. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 195-225. .
Desde a elaboração da tese de doutorado, defendida em 199018 18 Na Freie Universität Berlin, e publicada em 1993. A edição brasileira foi publicada somente em 2015: ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. De Caboclos a Bem-Te-Vis: formação do campesinato numa sociedade escravista: Maranhão 1800-1850. São Paulo: Annablume, 2015. , Assunção tem tratado daquilo que considera como excepcionalidades da ocupação do território maranhense, também diversa internamente do ponto de vista étnico, demográfico e econômico, premissa que o aproximou, por caminhos outros, da discussão na historiografia brasileira sobre as assimetrias dessa ocupação. Para o momento da Independência do Maranhão, as guerras que assolaram o território entre, pelo menos, 1823 e 1825, lhe ofereceram o cenário para pensar essa ocupação, sob o prisma das resistências populares e de projetos dissonantes19 19 Características, não exploradas aqui, que teriam produzido as condições objetivas para a eclosão da Balaiada. , distantes de noções estanques de “brasileiros” e “portugueses”, outro ponto de aproximação com a historiografia brasileira em curso.
Por fim, e ainda em torno das efemérides, é importante registrar que o Bicentenário da Independência vivenciou os efeitos de três ou quatro décadas de profissionalização da pós-graduação no Brasil e consequente ampliação exponencial da pesquisa acadêmica produzida no país.
No Maranhão, tais avanços atingiram o campo da História nas últimas duas décadas, com incentivos à formação stricto sensu em outros estados, a atração de mestres e doutores e, muito mais recentemente, a formação de mestres e doutores em história no próprio estado20 20 Para uma brevíssima reflexão sobre esse percurso, ver BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche. Sobre o passado de ontem. In: BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche (org.). Op. cit., p. 11-14. .
Nesse cenário, a Independência no Maranhão tem sido revisitada a partir de referências como as já aqui apresentadas - István Jancsó, João Paulo Pimenta e Matthias Assunção -, às quais cabe acrescentar autores como Lúcia Neves e Marco Morel21 21 Referenciados aqui apenas com os dois títulos que considero de maior influência: NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das. Corcundas e constitucionais: a cultura política da Independência (1820-1822). Rio de Janeiro: Revan, 2003; MOREL, Marco. As transformações dos espaços públicos: imprensa, atores políticos e sociabilidades imperiais (1820-1840). São Paulo: Hucitec, 2005. , centrais para as reflexões sobre: produção, circulação e recepção de impressos; e construção de espaços públicos de representação política na transição do mundo luso-brasileiro, chaves de leitura que balizaram a produção acadêmica sobre o tema na última década22 22 Nesse conjunto, ao lado da produção acadêmica de minha autoria, citada ao longo desse texto, registro mais duas, a título de exemplo: CUTRIM, Luisa Moraes Silva. A alma do negócio: a trajetória do negociante Antonio José Meirelles no Maranhão (c. 1820 - c. 1832). 2017. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2017; ARAÚJO, Roni César Andrade de. Entre a Província e a Corte: brasileiros e portugueses no Maranhão do Primeiro Reinado (1823-1829), 2018. Tese (Doutorado em História Política) -Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018. .
Ademais, a efeméride de 2022-2023 tem impulsionado publicações que inserem o Maranhão na diversidade daqueles “Brasis”23 23 Como exemplos: FURTADO, Júnia Ferreira; SLEMIAN, Andréa (org.). Uma cartografia dos Brasis: poderes, disputas e sociabilidades na Independência. Belo Horizonte: Fino Traço, 2022; PIMENTA, João Paulo (org.). E deixou de ser colônia: uma história da Independência do Brasil. São Paulo: Almedina, 2022. e/ou apontam para diálogos interprovinciais24 24 Refiro-me a publicações ainda no prelo, motivadas pelo “segundo Bicentenário” de algumas províncias do Norte, a ocorrer durante o ano de 2023. , ainda muito tímidos, talvez pela força de uma tradição historiográfica referenciada no binômio centro/periferia (capitania ou província), ainda que também renovada nas últimas duas décadas.
De todo modo, no Bicentenário da Independência, o receio de que o Maranhão “fique para trás” já não é uma preocupação cívico-patriótica, felizmente, tampouco historiográfico-acadêmica.
Bibliografia
- ARARIPE, Tristão de Alencar. A independência do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. 48, v. 71, pt. 2, p. 159-174, 1885.
- ARAÚJO, Roni César Andrade de. Entre a Província e a Corte: brasileiros e portugueses no Maranhão do Primeiro Reinado (1823-1829). 2018. Tese (Doutorado em História Política) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: https://bit.ly/41IYAho. Acesso em: 2 mar. 2023.
- ARMITAGE, John. História do Brasil Desde a chegada da família de Bragança, em 1808, até a abdicação de D. Pedro I, em 1831, compilada à vista dos documentos públicos e outras fontes originais formando uma continuação da História do Brasil, de Southey. Tradução de Eugênio Egas. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1965.
- ARQUIVO NACIONAL. Fundo Comissão Executiva Central do Sesquicentenário da Independência do Brasil (Maranhão, pasta 13). 1972.
- ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Cabanos contra bem-te-vis: a construção da ordem pós-colonial no Maranhão. In: DEL PRIORE, Mary; GOMES, Flávio (org.). Os senhores dos rios: Amazônia, margens e histórias. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 195-225.
- ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Miguel Bruce e os “horrores da anarquia” no Maranhão (1822-1827). In: JANCSÓ, István (org.). Independência: história e historiografia. São Paulo: Hucitec, 2005. p. 345-378.
- ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. De Caboclos a Bem-Te-Vis: formação do campesinato numa sociedade escravista: Maranhão 1800-1850. São Paulo: Annablume, 2015.
- BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche. Sobre o passado de ontem. In: BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche (org.). Historiografia maranhense: dez ensaios sobre historiadores e seus tempos. São Luís: Café & Lápis, 2014. p. 11-14.
- CUTRIM, Luisa Moraes Silva. A alma do negócio: a trajetória do negociante Antonio José Meirelles no Maranhão (c. 1820 - c. 1832). 2017. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2017. Disponível em: https://bit.ly/35Ax8d5. Acesso em: 2 mar. 2023.
- FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Memórias cartaginesas: modernismo, Antiguidade clássica e a historiografia da Independência do Brasil na Amazônia, 1823-1923. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 22, n. 43, p. 176-195, 2009. Disponível em: https://bit.ly/3ZGQxje. Acesso em: 2 mar. 2023.
- FURTADO, Júnia Ferreira; SLEMIAN, Andréa (org.). Uma cartografia dos Brasis: poderes, disputas e sociabilidades na Independência. Belo Horizonte: Fino Traço, 2022.
- GALVES, Marcelo Cheche. “Aderir”, “jurar” e “aclamar”: O Império no Maranhão (1823-1826). Almanack, Guarulhos, n. 1, p. 105-118, 2011. Disponível em: https://bit.ly/3mrrGSl. Acesso em: 2 mar. 2023.
- GALVES, Marcelo Cheche. “Ao público sincero e imparcial”: imprensa e Independência na província do Maranhão (1821-1826). São Luís: Café & Lápis, 2015.
- GALVES, Marcelo Cheche. Nos bastidores do Sesquicentenário: a reedição do livro História da Independência da Província do Maranhão (1822-1828), de Luís Antônio Vieira da Silva. Acervo, Rio de Janeiro, v. 35, p. 1-21, 2022a. Disponível em: https://bit.ly/3L3uCz0. Acesso em: 2 mar. 2023.
- GALVES, Marcelo Cheche. A Revolução Liberal vista do Maranhão: O Espelho crítico-político, de Garcia de Abranches. Almanack, Guarulhos, v. 1, p. 1-32, 2022b. Disponível em: https://bit.ly/3Jjylqx. Acesso em: 2 mar. 2023.
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- MOREL, Marco. As transformações dos espaços públicos: imprensa, atores políticos e sociabilidades imperiais (1820-1840). São Paulo: Hucitec, 2005.
- NEVES, Abdias. A guerra do Fidié 2. ed. Rio de Janeiro: Artenova, 1974.
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- VIEIRA DA SILVA, Luís Antonio. História da independência da província do Maranhão (1822-1828) São Luís: Typografia do Progresso, 1862.
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VIEIRAVIEIRA DA SILVA, Luís Antonio. História da independência da província do Maranhão (1822-1828). São Luís: Typografia do Progresso, 1862. DA SILVA, Luís Antonio. História da independência da província do Maranhão (1822-1828). São Luís: Typografia do Progresso, 1862. Esse episódio foi explorado em GALVES, Marcelo Cheche. Nos bastidores do Sesquicentenário: a reedição do livro História da Independência da Província do Maranhão (1822-1828), de Luís Antônio Vieira da Silva. Acervo, Rio de Janeiro, v. 35, p. 1-21, 2022a.
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A província do Maranhão foi incorporada ao Império do Brasil, não sem resistência, em 28 de julho de 1823, data da câmara geral, realizada em São Luís, que formalizou os termos da “adesão”, como registrado em ata.
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Cabe demarcar brevemente três dos princípios que orientaram, desde a década de 1990, a renovação da temática da Independência na historiografia brasileira, tão bem representados na coletânea organizada por István Jancsó: a) a recusa à pré-existência do Estado e da nação, com a abolição de expressões como “manutenção da unidade”, “restauração das províncias rebeldes”, “separatismo do Norte”; b) a recuperação da dinâmica política a partir das variáveis que afligiam os cidadãos que se movimentavam na nova cena pública, sem o peso de explicações estruturais, como aquelas pautadas na “truculência das Cortes”, na “falência ibérica” e nas “novas necessidades do capital”; c) a imersão no conjunto de documentos produzidos dentro e fora da esfera estatal, que abrangia agora jornais e folhetos, tomados como novos ingredientes de uma política cujo aprendizado se dava também em praça pública. JANCSÓ, István (org.). Independência: história e historiografia. São Paulo: Hucitec, 2005.
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A respeito, ver o texto seminal de JANCSÓ, István; PIMENTA, João Paulo Garrido. Peças de um mosaico (ou apontamentos para o estudo da emergência da identidade nacional brasileira). In: MOTA, Carlos Guilherme (org.). Viagem incompleta - formação: histórias. São Paulo: Senac, 2000. p. 129-175.
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Entre as mais resistentes estavam a Bahia, o Maranhão e o Grão-Pará, só incorporadas em julho/agosto de 1823, além da Cisplatina, incorporada precariamente no início de 1824.
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ARMITAGE, John. História do Brasil. Desde a chegada da família de Bragança, em 1808, até a abdicação de D. Pedro I, em 1831, compilada à vista dos documentos públicos e outras fontes originais formando uma continuação da História do Brasil, de Southey. Tradução de Eugênio Egas. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1965.
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Reintegrados ao comércio, política e administração a partir de 1825, os “portugueses” do Maranhão permaneceriam por décadas na cena pública. Em 26 de julho de 1864, às vésperas do quadragésimo primeiro aniversário da incorporação do Maranhão ao Império, o jornal A Coalição pedia aos “estrangeiros” que fechassem as portas de seus estabelecimentos comerciais, evitando assim que “[…] espíritos exagerados possam interpretar em mal sentido o procedimento contrário”. PEDIDO innocente. A Coalição, São Luís, v. 3, n. 60, p. 2, 1864. Cabe lembrar que o livro de Vieira da Silva foi publicado pouco antes desse episódio. Sobre a reintegração dos “portugueses”, ver GALVES, Marcelo Cheche. “Aderir”, “jurar” e “aclamar”: O Império no Maranhão (1823-1826). Almanack, Guarulhos, n. 1, p. 105-118, 2011.
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No ano seguinte, tornou-se sócio correspondente do IHGB. Para um ensaio sobre o personagem, a obra e sua recepção, ver GALVES, Marcelo Cheche; MENDES, Felipe Ucijara Guimarães. Luís Antônio Vieira da Silva: O IHGB e a questão da Independência. In: BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche (org.). Historiografia maranhense: dez ensaios sobre historiadores e seus tempos. São Luís: Café & Lápis, 2014. p. 35-56.
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Para a vizinha “província rebelde” do Pará, Aldrin Figueiredo observou que a ocasião do centenário da Independência possibilitou não apenas uma revitalização do tema, mas os termos de sua nacionalização, centrada nos episódios vividos pelos “brasileiros” daquela província. Tais comparações, que poderiam incluir a Bahia ou províncias “mais brasileiras”, como Ceará e Piauí, parecem ser um caminho promissor para um debate sobre as “peças de um mosaico” historiográfico sobre o tema. FIGUEIREDO, Aldrin Moura de. Memórias cartaginesas: modernismo, Antiguidade clássica e a historiografia da Independência do Brasil na Amazônia, 1823-1923. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 22, n. 43, p. 176-195, 2009.
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A respeito, ver GALVES, Marcelo Cheche. A Revolução Liberal vista do Maranhão: O Espelho crítico-político, de Garcia de Abranches. Almanack, Guarulhos, v. 1, p. 1-32, 2022b.
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VIVEIROS DE CASTRO, Augusto Olympio. Actas das Sessões de 1923. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 94, n. 148, p. 611-640, 1923. A perspectiva de Viveiros de Castro alinhava-se, não por acaso, à de historiadores oriundos das províncias “libertadoras”, que ressaltaram a luta dos “patriotas maranhenses” contra os “inimigos portugueses”. A respeito, ver o cearense ARARIPE, Tristão de Alencar. A independência do Maranhão. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. 48, v. 71, pt. 2, p. 159-174, 1885; e o piauiense NEVES, Abdias. A guerra do Fidié. 2. ed. Rio de Janeiro: Artenova, 1974. Sobre Abdias Neves, cabe registrar que fora acusado, pelo coetâneo Anísio Brito, de plagiar Vieira da Silva. Para o que nos interessa aqui, importa reter que as influências deste autor sobre aquele transparecem na tensão em torno da questão da “libertação do Maranhão”, ora presente em capítulos como o intitulado “O perigo maranhense”. Para as polêmicas envolvendo a acusação de plágio, ver QUEIROZ, Terezinha. A História da Independência no Piauí: das escritas instituintes aos revisionismos, das versões modernas às celebrações. Humana Res, Teresina, v. 1, n. 5, p. 59-81, 2022.
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A Revista do IHGM começou a ser publicada em 1949.
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Criada pelo decreto n. 4.667, de 2 de fevereiro de 1972. ARQUIVO NACIONAL. Fundo Comissão Executiva Central do Sesquicentenário da Independência do Brasil (Maranhão, pasta 13). 1972.
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Ineditismo sem originalidade também caracterizou a única dissertação de mestrado sobre o tema até o final do século XX, defendida por PEREIRA, Maria Esterlina Mello. O processo de independência e integração do Maranhão. 1982. Dissertação (Mestrado em História). Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1982. Entre 1997 e 2001, a Revista do IHGM publicou quatro artigos dedicados a justificar o “atraso” do Maranhão em se incorporar ao Império do Brasil: a “causa patriótica” permanecia em evidência. Uma breve consideração sobre esses artigos pode ser consultada em GALVES, Marcelo Cheche. “Ao público sincero e imparcial”: imprensa e Independência na província do Maranhão (1821-1826). São Luís: Café & Lápis, 2015. p. 21-53.
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ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Miguel Bruce e os “horrores da anarquia” no Maranhão (1822-1827). In: JANCSÓ, István (org.).. Op. cit. p. 345-378. Pouco antes, o autor dera outra importante contribuição para o debate: ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Cabanos contra bem-te-vis: a construção da ordem pós-colonial no Maranhão. In: DEL PRIORE, Mary; GOMES, Flávio (org.). Os senhores dos rios: Amazônia, margens e histórias. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 195-225.
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Na Freie Universität Berlin, e publicada em 1993. A edição brasileira foi publicada somente em 2015: ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. De Caboclos a Bem-Te-Vis: formação do campesinato numa sociedade escravista: Maranhão 1800-1850. São Paulo: Annablume, 2015.
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Características, não exploradas aqui, que teriam produzido as condições objetivas para a eclosão da Balaiada.
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Para uma brevíssima reflexão sobre esse percurso, ver BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche. Sobre o passado de ontem. In: BITENCOURT, João Batista; GALVES, Marcelo Cheche (org.). Op. cit., p. 11-14.
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Referenciados aqui apenas com os dois títulos que considero de maior influência: NEVES, Lúcia Maria Bastos Pereira das. Corcundas e constitucionais: a cultura política da Independência (1820-1822). Rio de Janeiro: Revan, 2003; MOREL, Marco. As transformações dos espaços públicos: imprensa, atores políticos e sociabilidades imperiais (1820-1840). São Paulo: Hucitec, 2005.
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Nesse conjunto, ao lado da produção acadêmica de minha autoria, citada ao longo desse texto, registro mais duas, a título de exemplo: CUTRIM, Luisa Moraes Silva. A alma do negócio: a trajetória do negociante Antonio José Meirelles no Maranhão (c. 1820 - c. 1832). 2017. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2017; ARAÚJO, Roni César Andrade de. Entre a Província e a Corte: brasileiros e portugueses no Maranhão do Primeiro Reinado (1823-1829), 2018. Tese (Doutorado em História Política) -Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2018.
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Como exemplos: FURTADO, Júnia Ferreira; SLEMIAN, Andréa (org.). Uma cartografia dos Brasis: poderes, disputas e sociabilidades na Independência. Belo Horizonte: Fino Traço, 2022; PIMENTA, João Paulo (org.). E deixou de ser colônia: uma história da Independência do Brasil. São Paulo: Almedina, 2022.
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Refiro-me a publicações ainda no prelo, motivadas pelo “segundo Bicentenário” de algumas províncias do Norte, a ocorrer durante o ano de 2023.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
15 Maio 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
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Recebido
04 Mar 2023 -
Aceito
20 Mar 2023