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A biblioteca de um estadista do Império: o inventário dos livros de José Lino Coutinho (1836)

Resumo

Esse estudo apresenta o inventário dos livros do médico e estadista brasileiro José Lino Coutinho (1786-1836), no qual foi possível identificar a maior parte dos impressos da sua coleção, organizada desde as últimas décadas do período colonial. O conjunto dos seus livros, divididos entre obras de natureza política/filosófica e livros de medicina, revela os hábitos de leitura da elite intelectual na transição da colônia portuguesa para o Império brasileiro. Na biblioteca de Lino Coutinho estão presentes obras e autores que ofereceram as bases intelectuais, políticas e jurídicas para a construção da emergente Ordem Imperial brasileira, da qual ele foi um dos protagonistas.

Palavras-Chave:
Livros na Província da Bahia; Ilustração; Maçonaria.

Abstract

This study presents an inventory of the books of the Brazilian statesman José Lino Coutinho (1786-1836), in which it was possible to identify most of his published collection, organized since the last decades of the colonial period. The set of his books, divided between works of political / philosophical nature and medical books reveals the reading habits of the intellectual elite in the transition from Portuguese colony to the Brazilian Empire. In Lino Coutinho library are present works and authors who provided the intellectual foundations, political and legal for the construction of the emerging Brazilian Imperial Order, of which he was one of the protagonists.

Keywords:
Books in the Province of Bahia; Enlightenment; Masonry.

José Lino Coutinho

Aos 24 de julho de 1836, às 18 horas, morria o médico, escritor e político baiano José Lino Coutinho.1 1 O Correio Official (RJ) transcreveu o necrológio publicado no Correio Mercantil (BA), de 27 de julho de 1836, segundo o qual Lino falecera após “longos sofrimentos”, sinalizando ainda que quando nomeado Ministro pela Regência, em 1831, estava ele “ja então acabrunhado por suas enfermidades” e que “seu estado morboso o forçou a hir ultimamente á França, onde não conseguindo melhoras algumas, regressou á sua Patria para nella terminar huma existência que lhe fora toda consagrada”. Sobre o funeral, informou que foi “sepultado no dia 25 de julho, pelas 7 horas da noite, na Matriz de S. Pedro desta Cidade da Bahia, onde tiverão lugar as honras fúnebres devidas á sua alta dignidade no Estado, e ás quaes assistio hum numeroso concurso das pessoas as mais gradas e respeitáveis desta Cidade”, Vol. VII, n. 40, 18 de ago. de 1836, p. 160. Disponível em: <http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=749443&PagFis=3685&Pesq=>. Acesso em 07 set. 2016. Evaristo da Veiga, em seu Aurora Fluminense (n. 328) de 23 de abril de 1830, noticiava ao público a chegada dos deputados à Capital para aquele ano legislativo, e destacou: “Ouvimos que o Sr. Lino Coutinho virá hum pouco mais tarde este anno, por se achar enfermo dos seus ataques de gotta” Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=706795&PagFis=1452>, acesso em 10 ago. 2016. Aos 15 dias de agosto do mesmo ano ocorreu a abertura do seu inventário que contemplava a jovem viúva Maria Adelaide Sodé Coutinho, a filha do casal, Maria, com dois anos de idade e a filha legitimada de Lino Coutinho, Cora Cesar Coutinho, fruto do seu relacionamento com a poetisa baiana Idelfonsa Laura Cesar.2 2 Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB). Seção Judiciária; Série Inventário; Núcleo Tribunal da Relação; 01/105/157/04, 178 fls. Além dos bens do inventário, a viúva receberia uma pensão anual; Jornal do Commercio, Segunda feira 29 de Agosto de 1836, n. 188, p. 3: Assembléa Geral legislativa resolve: Art. Unico Fica approvada a pensão anual de 800$ rs, concedida por decreto de 16 de Agosto de 1836, a D. Maria Adelaide Sudré Coutinho, em recompensa dos serviços prestados por seu fallecido marido, o Conselheiro José Lino Coutinho. Paço da Camara dos Deputados, 26 de Agosto de 1836.

Apesar da relevância política de José Lino Coutinho e sua reconhecida atuação como médico e diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, sua obra tem sido mais notada nos estudos acadêmicos que versam sobre a História da Educação no Brasil. Tradutor e autor de textos de medicina, seu livro mais reconhecido é, contudo, Cartas Para a Educação de Cora (1849), póstumo, que apresentava uma série de escritos de conteúdo pedagógico e moral que ele desenvolveu para melhor educar sua primeira filha.3 3 Para um estudo sobre a obra pedagógica de Lino Coutinho, ver REIS, Adriana Dantas. Cora: lições de comportamento feminino na Bahia do século XIX. Salvador: FCJA; Centro de Estudos Baianos da UFBA, 2000, pp. 135-198. A atenção de Lino Coutinho com a educação feminina pode ser vista também em seu projeto de lei apresentado à Câmara dos Deputados em 1826, que propunha “o estabelecimento de Escollas de Meninas nos Conventos de Religiosas, onde se ensine a ler, escrever e contar”, lançando-se mão das religiosas como professoras, dada a carência de lentes no país. Diario da Camara dos Deputados á Assemblea Geral Legislativa do Imperio do Brasil. 1826. Rio de Janeiro: Imprensa Imperial e Nacional, 1827, p. 1302 et seq. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=5rxOAAAAcAAJ>. Acesso em 30 jul. 2016. Seu pioneirismo na proposta da educação feminina o manteve presente na academia, mas os aspectos do estadista José Lino Coutinho também merecem ser assinalados. É um personagem que carece de uma biografia de fôlego, o que, decerto, ultrapassa os limites destas laudas.

O inventário de José Lino Coutinho confirma que ele era dono de um razoável patrimônio, cuja propriedade de maior valor financeiro era o engenho Trindade, situado no termo da Vila de Santo Amaro da Purificação, além de 113 escravos. Em grande medida essa fortuna foi adquirida por meio do casamento com Maria Adeláide Sodré Pereira. O inventariante legou, para suas herdeiras, escravos, terras e uma significativa coleção de livros, sendo este último item o propósito deste estudo. A lista dos livros que compunham a biblioteca de José Lino Coutinho se encontra entre as folhas 36 e 45 do referido inventário. Para compreender melhor o sentido da biblioteca do estadista baiano é necessário contextualizar aquela coleção de livros tanto no tempo histórico na qual ela foi organizada quanto apresentar a trajetória política do seu proprietário.

José Lino Coutinho nasceu em Salvador, capitania da Bahia, em 31 de março de 1786, filho do casal português José Lino dos Santos e Rosa Luísa Coutinho. Formou-se médico pela Universidade de Coimbra, vivendo por um curto período na Inglaterra e na França. É possível que tenha sido iniciado na maçonaria durante o período em que estudou na Europa. Concluído os anos universitários, Lino Coutinho retornou à terra natal. Sua ascenção política se deu no interior da nascente maçonaria brasílica, nos quadros do Grande Oriente Brasileiro estabelecido na Bahia a partir de 1813, filiando-se na Loja Humanidade.

O que foi possível apurar dos primeiros tempos da presença da maçonaria na Bahia deve-se ao historiador e pedreiro-livre português Rodrigo José de Lima Felner (1809-1877), que imprimiu, em 1846, Progressos da Maçonaria na Bahia, inserto no Almanak do Rit:. Esc:. Ant:. e Acc:. em Portugal para o Ano de 5846, entre as páginas 66-71.4 4 FELNER, Rodrigo José de Lima. Almanak do Rit:. Esc:. Ant:. e Acc:. em Portugal para o Ano de 5846 [Almanak do rito escocez antigo e aceite para Portugal, para o anno de 5846 (1846)} Offerecido ao Synhedrio de Beneficencia pelo Ir:. R. Felner. Lisboa: Typographia de O. R. Ferrer, 1846. As informações de Felner foram reeditadas no Astrea: Almanak Maçônico. Rio de Janeiro: Tipografia Laemmert, 1846, p. 79-81. Completamente desconhecida pelos pesquisadores brasileiros, Progressos da Maçonaria na Bahia é obra relevante, na medida em que apresenta informações precisas sobre a criação das três primeiras lojas maçônicas estabelecidas na Bahia entre 1802 e 1813, bem como do Grande Oriente Brasileiro. A loja Humanidade, segundo Rodrigo Felner, seguindo as informações do pedreio-livre baiano José Mendes Costa Coelho, encerrou suas atividades a “15 do 3.o mez de 5817” {4 de Junho de 1817}, após a Revolução Pernambucana de 6 de março de 1817. Contudo, a mesma loja seria reativada em 1820 e seus associados tiveram o protagonismo na guerra pela independência da Bahia:

Todavia os trabalhos da L:. Humanidade {...} recomeçarão em 27 do 12.o mez de 5820 {19 de março de 1820}, devendo-se ao zêlo de todos os seus obreiros a conservação do archivo, por elles subtrahidos aos furores dos inimigos da instituição. Ao Quadro d’esta Off:. pertenciam os II:. Manoel Pedro de Freitas Guimarães, tenente coronel, e depois brigadeiro, que, posto à frente do corpo d’artilheria, fez echoar na Bahia o brado patriotico de liberdade, levantado no Porto, repetido em Lisboa, e propagado sucessivamente por toda a extensão do reino de Portugal; - e os II:. doutor José Lino Coutinho, e Francisco Antonio Felgueiras, que por essa occasião passarão a formar parte do governo provisorio d’aquella opulentissima provincia.5 5 Ibidem, p. 68. Grifo nosso.

Não resta dúvida de que José Lino Coutinho era um dos mais influentes pedreiro-livres atuantes em Salvador. Além do que foi relatado no Almanak de Felner, o nome de José Lino Coutinho está arrolado numa lista anônima e sem data conservada no Arquivo Histórico do Itamaraty, no Rio de Janeiro, onde figura ao lado de outros notórios maçons, assinalando que esteve envolvido nas “cabalas” constitucionalistas na Bahia desde fins de 1820. Suas ligações dentro da maçonaria colonial, ao que parece, lhe rendera a secretaria da Junta Provincial da Bahia e subsequente eleição para as Cortes lisboetas, em 1821.6 6 Arquivo Histórico do Itamaraty - Lata 195, maço 6, pasta 13. Tendo em vista que Hermógenes Pantoja aparece listado, morto ele em 1821, a lista é, portanto, anterior a esta data. Deve estar relacionada às conspirações constitucionalistas na Bahia de então. Boa parte dos eleitos para as Cortes era composta por pedreiros-livres, posto que a fraternidade e a organização da maçonaria concorreram para a eleição de deputados “Irmãos”.

Foi um dos deputados brasileiros a abandonar as Cortes e não jurar a Constituição Política da Monarquia Portuguesa, embarcando para Falmouth ao lado dos deputados baianos Francisco Agostinho Gomes e Cipriano Barata de Almeida. Na Inglaterra, escreveu, com outros deputados brasileiros, o manifesto de 22 de outubro de 1822. Apesar de sua oposição à manutenção do sistema colonial português no Brasil, seu notável conhecimento médico lhe reputou sócio da Real Academia de Ciências de Lisboa.

Após a Independência do Brasil, foi eleito deputado geral pela Bahia para as duas primeiras legislaturas, 1826-1829 e 1830-1833. Tornou-se conselheiro do imperador D. Pedro I, médico honorário da Imperial Câmara e cavaleiro da Ordem de Cristo. Apesar disso, fez oposição ao mesmo imperador e, após sua abdicação, ocupou a Secretaria de Estado dos Negócios do Império, em 1831.

Foi designado lente de patologia externa da Escola Médico-Cirúrgica da Bahia (1825). Quando, em 3 de outubro de 1832, a Regência transformou a referida Escola em Faculdade de Medicina, foi Lino Coutinho nomeado seu primeiro Diretor. Na direção daquela instituição, seu gosto pelos livros se materializou na criação da Biblioteca da Faculdade de Medicina, que chegou a constituir um dos mais ricos acervos do Brasil Império.

Foi profícuo autor e tradutor. Parte da sua obra está catalogada no Diccionario Bibliographico Brazileiro, composto pelo médico baiano Augusto Victorino Alves Sacramento Blake. Ali estão indicadas sua primeira tradução impressa, as Observações sobre as afecções catarrais de Cabanis (1816)7 7 Observações sobre as affecções catarraes em geral, e particularmente as que são conhecidas com o nome de defluxos do cerebro e defluxos do peito; por P.J.G. Cabanis, Doutor em Medicina, Membro do Senado, do Instituto Nacional, da Escola, e Sociedade de Medicina de Paris, da Sociedade Americana, da de Medicina de Bruxellas, &c. Traduzidas, e Anotadas por J. Lino, Bacharel Formado em Medicina, pela Universidade de Coimbra, e Medico do Hospital Real Militar da Cidade da Bahia. Bahia: Tipografia de Manoel Antonio da Silva Serva, 1816. Viii, 94p. , seguida pela Topografia médica da Bahia (1832)8 8 “O Snr. José Lino Coutinho, Deputados em Cortes pela Provincia da Bahia, e agora correspondente da Academia, apresentou uma Memoria sobre a topographia medica daquelle tão interessante berço do Reino do Brazil”. Historia e Memorias da Academia Real das Sciencias de Lisboa. Lisboa: Typ. da Mesma Academia, 1823. Tomo VIII, Parte I. p. VII. É possível que o manuscrito dessa memória ainda exista na Academia de Ciências de Lisboa. , Coleção dos principais fatos na história da epidemia do cólera morbus (1833), Parecer da comissão da Câmara dos deputados (1822), Sustentação das acusações que na sua respectiva câmara fez o deputado José Lino Coutinho ao Marquês de Baependi (1827) e, por fim, as Cartas sobre a educação de Cora (1849). Sacramento Blake ainda indica outras duas obras desaparecidas de Lino Coutinho, sendo uma Memória sobre as águas naturaes da Bahia, assinalada como impressa na própria Bahia, e uma Memória sobre a doutrina de Broussais, registrando que “Este escripto, assim como o precedente, nunca pude ver”. Não foi possível localizar nenhuma das duas obras. Também não foi possível encontrar exemplar (se é que fora impresso) do Projeto reformando as Escolas de Medicina (1826), apresentado a D. Pedro I, mas na seção de Obras Raras na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro há um exemplar das observações feitas por Joaquim Cândido Soares Meireles sobre esse documento.9 9 MEIRELES, Joaquim Cândido Soares de. Observações sobre o projeto do senhor deputado Lino Coutinho, a cerca das escolas de medicina. Rio de Janeiro, Typ. do Diario, 1828. 28 p. III-186,5,3,n.16 Blake ainda registra que Lino Coutinho deixou poesias inéditas, “e que somente vira impressa A sensitiva - mimosa poesia lyrica, na Opinião Nacional. Pernambuco, de 21 de abril de 1868”.10 10 BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Diccionario Biblographico Brazileiro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1899, vol 5, p. 7-8.

A lista de Sacramento Blake está, contudo, incompleta. Na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro existe exemplar de um Relatorio do Senhor Ministro do Imperio, José Lino Coutinho. Rio de Janeiro: Typ. Nacional, 1832, 15 p. (Livros Raros - 153,002,028 n.007). O então ministro também teria publicado músicas de sua autoria. A 12 de setembro de 1831, o Diário do Rio de Janeiro informava que saía à luz “O Gerassol (sic), modinha brasileira à imitação de cavatina com acompanhamento de piano forte ou de viola francesa; quadras feitas pelo Illm.o e Exm.o Sr. José Lino Coutinho; posta em muzica, e dedicada ao lindo sexo Brasileiro, por Bartholomeu Bartolozzi”.11 11 Diário do Rio de Janeiro, n.09, Rio de Janeiro: Typographia do Diário, 12 de setembro de 1831. No ano seguinte, em 1832, o mesmo Diário do Rio de Janeiro anunciava “as três Modinhas Brasileiras (quadras do Illm.o e Exmo José Lino Coutinho) com acompanhamento de piano forte, ou Viola franceza”.12 12 Diário do Rio de Janeiro, n.11, Rio de Janeiro: Typographia do Diário, 16 de junho de 1832. Não há nenhum outro registro dessas obras e não foi possível identificar exemplares em nenhuma biblioteca pública ou coleção particular. A biografia de José Lino Coutinho ainda está por ser feita, sendo fundamental localizar seus manuscritos e exemplares dos seus impressos, até agora, perdidos.

Lino Coutinho, apesar da contínua produção intelectual e ação política, não estava bem de saúde. Morreu de “reumatismo gotoso” em sua casa na Rua da Quitanda Velha, freguesia de São Pedro, em Salvador, aos 52 anos. Como de praxe ocorre nas bibliotecas da Bahia, seus livros não sobreviveriam muito tempo à ausência do dono.

A biblioteca de Lino Coutinho: breves notas

A biblioteca particular de José Lino Coutinho possui 146 obras listadas, que totalizam 291 volumes, além de “cem volumes de diversas obras truncadas em muito mau estado, e por isso lhe não derão valor algum”. Com essa quantidade de obras truncadas é possível, então, que a sua biblioteca somasse cerca de 400 volumes. O inventário foi dividido em duas partes, a primeira composta por obras gerais e a segunda parte formada pela coleção dos livros de medicina. Os livros médicos não serão aqui analisados (na esperança de que outra pessoa mais abalizada nesse assunto o faça). O enfoque é dado à primeira parte do inventário que compreende obras de caráter político, filosófico, histórico, econômico e literário.

É importante e revelador fazer uma breve comparação entre as bibliotecas de José Lino Coutinho e Manoel Dendê Bus, visto que ambas foram inventariadas pelo livreiro-impressor João Paulo Franco Lima no mesmo ano, 1836, e estavam (pessimamente) conservadas na mesma cidade.13 13 IGLESIAS MAGALHÃES, Pablo Antonio. Deus e o diabo na biblioteca de um cônego da Bahia: o inventário dos livros do padre Manoel Dendê Bus em 1836. Revista de História, São Paulo, 2014, p. 245-286. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.11606/issn.2316-9141.rh.2014.89013>. Acesso em 10 jul. 2016. Pode-se perceber em ambas as bibliotecas um direcionamento para os interesses profissionais dos seus respectivos proprietários. Isso era raro nos tempos do Brasil colonial, onde a imprensa era proibida e as remessas de livros eram feitas sob a licença das autoridades. Difícil encontrar no período colonial coleções significativas de livros tratando de um mesmo assunto ou direcionada para um tema específico. Exemplo disso são as bibliotecas apreendidas (em 1798) de Cipriano Barata e do Tenente Hermógenes Aguilar, que, além de poucos volumes, são confusas miscelâneas onde se encontrava de tudo um pouco. Nelas, nenhum assunto ou área de conhecimento era contemplado exaustivamente. As bibliotecas daqueles dos dois conjurados baianos eram a “arte do possível” para a época, salvo exeções.14 14 Barata e Pantoja possuíam, respectivamente, 30 e 22 títulos apreendidos. Sobre o assunto, ver MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Presença francesa no movimento democrático baiano de 1798. Bahia: Itapuã, 1969, p. 18. Entre as exceções, incluem-se as bibliotecas de Manoel Ignacio da Silva Alvarenga (1749-1814) e Francisco Agostinho Gomes (1769-1842). Sobre bibliotecas coloniais ver, dentre outros, MORAES, Rubens Borba de. Livros e bibliotecas no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1979. Ao que se sabe, a biblioteca do padre Gomes, acrescida a partir de 1800 com caixas de livros trazidos de Lisboa, era a maior da capitania da Bahia. Tal coleção deu origem ao acervo da Biblioteca Pública da Bahia, em 1811. Era uma coleção de natureza enciclopédica, que contemplava tantas áreas do conhecimento quanto era possível à época, onde encontravam-se livros de mineralogia, química, botânica, arquitetura, zoologia, matemática, física, filosofia, política, geografia, história, direito, linguística, arte, religião e clássicos. Sobre Gomes, ver NEVES, Lúcia M. Bastos P.; PEREIRA, Neves Guilherme. A biblioteca de Francisco Agostinho Gomes: a permanência da ilustração luso-brasileira entre Portugal e o Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 165, n.425, 2004, p. 11-28.

Já nos casos das bibliotecas de José Lino Coutinho e Manoel Dendê Bus é possível afirmar que o primeiro possuía uma coleção de livros própria de um estadista e de um médico da sua época, enquanto o segundo possuía uma biblioteca de um sacerdote e professor de línguas. Não eram bibliotecas enciclopédicas que contemplavam todos os campos do conhecimento, mas coleções orientadas para dar suporte às suas profissões e carreiras. A semelhança comparativa entre as coleções de Lino Coutinho e Dendê Bus, no entanto, cessa nesse direcionamento para interesses profissionais. As duas bibliotecas possuem sentidos completamente diferentes, senão antagônicos.

A biblioteca de Manoel Dendê Bus era formada em sua maior parte por livros portugueses, de cunho pedagógico, e livros latinos, de caráter religioso. Era também rica em obras de literatura portuguesa. Por mais que Manoel José de Freitas Batista Mascarenhas tivesse adotado o sobrenome de Dendê Bus e se aliado aos brasileiros na luta contra os portugueses no Recôncavo baiano entre 1822 e 1823, ele era um portuense de nascimento. Sendo padre, os livros religiosos eram parte significativa da sua coleção. Sendo professor de línguas, possuía até mesmo dicionários em russo e holandês.

Já a biblioteca de Lino Coutinho materializou o espírito do antilusitanismo que teve lugar na Bahia, explicitamente, a partir de 1822 e que se estendeu até meados da década de 1840. É perceptível a ausência de autores portugueses. Ainda que Camões e Antonio Vieira estejam nela representados, ambos estão mais como autores universais, o que já eram desde o século anterior, do que como propriamente gênios portugueses. Aliás, até 1857, ainda persistia a controvérsia sobre onde ocorrera o nascimento de Antonio Vieira, se em Lisboa ou se na Bahia, questão que só foi resolvida a partir dos exames dos livros da Cúria pelo Arcebispo D. Romualdo Antônio de Seixas.15 15 SEIXAS, Romualdo Antônio de. Breve Memoria acerca da naturalidade do Padre Antonio Vieira da Companhia de Jesus de que foi encarregado pelo Instituto Histórico e Geographico do Brasil o Exmº Snr. Arcebispo da Bahia. Bahia: Typ. Camillo de Lellis Masson, 1857. A coleção de Lino materializou também o secularismo e o pensamento científico do seu tempo, visto que não se encontra nenhuma obra religiosa ou piedosa no inventário dos seus livros. A biblioteca de Lino Coutinho é, de facto, produto do século XIX. Tanto assim, que a imensa maioria dos livros registrados foi impresso entre 1810 e 1830.

Há outro aspecto a ser observado de Lino Coutinho. As bibliotecas setecentistas coloniais, arroladas em devassas que puniram as conspirações de Minas Gerais (1789) e Bahia (1798), eram caracterizadas pela presença de autores que questionavam e combatiam o Antigo Regime nos seus aspectos mercantil e absolutista. Nelas, também estavam assinalados os autores anticlericais e os livros “incendiários” ou iconoclastas de Voltaire, Rousseau, Volney, que davam o tom daqueles ajuntamentos de livros avulsos, que não se podiam denominar ainda de coleções. A biblioteca de Lino Coutinho, por outro lado, tem maior enfoque na construção de uma nova Ordem política e econômica, que tivera lugar após as turbulências napoleônicas que levaram ao fim do Absolutismo na Europa ocidental, aos eventos da Independência brasileira e a gradual implantação do liberalismo no continente americano. Ainda que Voltaire, Montesquieu e Raynal estejam presentes na sua biblioteca, os livros que divulgavam os “abomináveis princípios franceses” não são o foco da sua coleção. Por exemplo, o “Contracto Social” nela presente não era o de Rousseau, que não figura entre os autores catalogados,16 16 Com efeito, não foi possível identificar Rousseau como autor de qualquer item catalogado. Entretanto, seu nome aparece no conjunto da Collection des classiques français (item 102). É possível que outra obra, Principes du droit politique mis en opposition avec le Contrat Social de J. J. Rousseau (item 63), de Torombert e Lanjuinais, que contém o Contrato Social no anexo, fizesse parte do acervo de Lino. Trata-se, como indica o título, de um contraponto ao Contrato Social rousseauniano. mas sim o livro Du contrat social au XIXme siècle (item 6), do menos afamado advogado Jean Duplan.

Para a conformação do seu pensamento ilustrado político, econômico e social, bem como para atuar em sua vida de estadista no legislativo e no governo, Lino Coutinho estava bem servido de autores dedicados a temas variados, tais como filosofia, história, direito natural, administração pública, economia política, constitucionalismo, sistema carcerário e direito. Entre os autores ilustrados destacam-se, quanto ao número de volumes catalogados, as obras dos franceses Dominique de Pradt (1759-1837), ou Abade de Pradt - cuja obra teve destacada influência no contexto da Independência brasileira -, presente com oito títulos, totalizando 12 volumes (itens 89 a 96), Turgot (1727-1781), destacado estadista setecentista representado em uma coleção de nove volumes de sua obra (item 70),17 17 A coleção das suas obras, na biblioteca de Lino Coutinho, apresentava o volume primeiro as Mémoires sur la vie, l’administration et les ouvrages de M. Turgot, de autoria de Pierre-Samuel Dupont de Nemours, em sua segunda edição, que no volume segundo trazia os textos escritos entre 1749 e 1754; no volume terceiro traz os textos escritos entre 1754 e 1760, incluindo os artigos de Turgot que figuram na Encyclopédie; no quarto volume os escritos elaborados entre 1761 e 1774. O quinto volume compreende as obras escritas entre 1761 e 1774. Essa obra completa reproduz a linha de pensamento de um dos principais estadistas da França setecentista. e o Barão de Montesquieu (1689-1755), com obra em oito volumes (item 73). Entre os britânicos, sobressai a figura do jurista e filósofo reformista Jeremy Bentham (1748-1832), que possui quatro títulos listados no catálogo, totalizando sete volumes (itens 8 e 58 a 60).

É compreensível que o autor com o maior número de impressos no invetário de Lino Coutinho, conforme já observado, fosse o abade Dominique de Pradt. Segundo recente estudo feito pelo historiador Marco Morel:

Já na sua obra de 1801-1802, Pradt acenava claramente com a possibilidade de Independência do Brasil, baseado em dados econômicos (a riqueza e o comércio) quantificados, bem como geográficos, culturais e políticos. O barão e abade considerava o Brasil como “un très grand pays”, elogiava a perspectiva do marquês de Pombal em projetar a transferência da sede da Coroa portuguesa para o domínio americano {...} Ou seja, para este autor, o Brasil (nomeado como um Império, seis anos antes da vinda da Corte portuguesa com d. João VI) já reunia as condições, digamos, materiais para a separação de Portugal. 18 18 MOREL, Marco. O caminho incerto das Luzes francesas: o abade De Pradt e a Independência brasileira. Almanack, v. 13, 2016, p. 116 < www.scielo.br/pdf/alm/n13/2236-4633-alm-13-00112.pdf >. Em se tratando de obras da Ilustração, muitos dos títulos identificados contemplam temas diversificados, alguns, como Melanges de litterature, d’histoire, et de philosophie, de D’Alambert (item 57, em 5 vols.), ou Collection des classiques français (item 102, em 4 vols.), são mesmo coletâneas ou possuem caráter enciclopédico, comum à época. Assim sendo, e na impossibilidade de analisar cada uma das obras dentro dos limites deste estudo, é importante assinalar a presença de dezenas de títulos relacionados à política de Estado, e seu funcionamento, bem como ao direito natural e das gentes, moral, contratualismo, constitucionalismo e judiciário - incluindo os cinco códigos napoleônicos (item 38), outro sobre júri (item 40) e a obra Que he o codigo civil?, de Vicente José Ferreira Cardozo da Costa (item 18). Tema recorrente entre os estadistas de então, há dois tratados sobre sistema carcerário (itens 1 e 49) e um sobre sistema penal em geral (item 33) catalogados no inventário. Na seara da economia política, finanças e comércio, foi possível identificar ao menos 13 títulos entre os catalogados, incluindo os já citados Turgot e o código comercial napoleônico. Tal coleção, totalizando quase 30 volumes, demonstra a importância deste campo de estudos para os estadistas de então.

É interessante observar ainda a presença de títulos sobre as Américas, evidência do quanto os homens públicos do Império brasileiro estavam atentos às experiências políticas dos demais Estados do continente. Note-se que no catálogo de Lino Coutinho constam temas sensíveis àquele momento histórico: no campo das ideias políticas, um manual de direito parlamentar de Thomas Jefferson (item 14) e escritos de Benjamin Franklin (item 82) trazem algo sobre o sistema político dos Estados Unidos; quanto à mais delicada zona fronteiriça do Império do Brasil, o Rio da Prata, existia na biblioteca de Lino Coutinho um exemplar do Essai historique sur la Revolution du Paraguay, et le gouvernement dictatorial du Docteur Francia, de J. R. Rengger (item 7), e outro do Esquisses historiques, politiques et statistiques, de Buénos-Ayres, des autres Provinces Unies du Rio de la Plata, de Ignacio Núñes (item 41); quanto à política de Simón Bolívar e a tentativa de unificar a América hispânica, consta um exemplar do Congrès de Panama, do Abade Pradt (item 94). O invetário também indica uma obra sobre a Revolução Haitiana (1791-1804) - tema dos mais sensíveis entre escravagistas brasileiros, como Coutinho -, Précis historique de la révolution de Saint-Domingue, de Louis Jean Clausson (item 50), grande proprietário e magistrado em Porto-Príncipe.

Pelo exposto, pensado em conjunto, o inventário dos livros de José Lino Coutinho contempla aquilo que José Murilo de Carvalho denominou, corretamente, A Construção da Ordem, de que o estadista baiano foi um dos protagonistas nas primeiras décadas do Império.19 19 CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial. Brasília: UNB, 1981. Deve ser ressaltado que, além do seu papel relevante como estadista, por conta dos seus estudos e traduções na seara médica Lino Coutinho era tido como um dos grandes nomes da ciência brasileira. Seu nome figura entre os biografados na obra Du climat et des maladies du Brésil, do Dr. Sigaud (Paris: Chez Fortin, Masson et Cia., Libraires, 1844), sendo que o comentário no anúncio desta no Diário do Rio de Janeiro em novembro de 1844 listava Coutinho entre os “sábios do paiz que illustrão as sciencias naturaes e medicas”, ao lado de nomes como José Bonifácio, Manuel Arruda Camara e Alexandre Rodrigues Ferreira. (Diário do Rio de Janeiro. Anno XXIII, N. 6769, 15 de novembro de 1844. Disponível em <http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=094170_01&pagfis=28170>. Acesso em 20 jul. 2016). Não obstante, enquanto biblioteca orientada pelos ideais projetados pela Ilustração, o acervo de Lino Coutinho contempla temas para além da política ou da economia. Por exemplo, a liberdade de culto religioso, uma das questões que no Brasil estava em evidência desde a Independência, encontrava eco nos livros de Lino Coutinho, que possuía um exemplar da Mémoire en faveur de la liberté des cultes (item 31), do suísso Alexandre Vinet (1797-1847). Este teólogo protestante, contemporâneo de Lino Coutinho, defendia a absoluta liberdade de crença religiosa e a separação ente Igreja e Estado, expondo suas ideias igualmente nos livros Essai sur la conscience (1829) e Essai sur la manifestation des convictions religieuses (1842).

De natureza anticlerical havia a Mémoire à consulter sur un système religieux et politique tendant à renverser la religion, la société et le trone, de François-Dominique de Reynaud, conde de Montlosier, impresso em 1826 e que rapidamente teve oito edições. Montlosier continuaria divulgando seu discurso anticlerical em outros escritos, publicando em 1829 De l’origine, de la nature, et des Progrés de la puissance ecclésiastique en France, que atacava principalmente os jesuítas.

No tratado de educação escrito para sua filha Cora Coutinho, Lino observou o tema das leituras perigosas, desaconselhando que a jovem tivesse contato com “romances amatorios, versos, e musica de semelhante natureza”. Como alternativa, o progenitor de Cora indicou para sua leitura a Vida dos Homens Ilustres, de Plutarco, as máximas morais de La Bruyère e A Moral Universal, do Barão de Holbach, sendo que neste último “se encontra a doutrina acerca dos deveres do homem para com Deus e o próximo, e sobre aqueles dos Pais, dos filhos, e dos esposos”.20 20 Cartas Sobre a Educação de Cora, Seguidas de um Cathecismo Moral, Político e Religioso, pelo finado Conselheiro Dr. José Lino Coutinho e publicadas por João Gualberto dos Passos. Bahia:Typographia de Carlos Poggetti, 1849, carta XXIII, p. 84-85. Os três autores que recomendou para que a sua herdeira estudasse estavam presentes em sua biblioteca. José Lino Coutinho possuía um exemplar setecentista da obra de Paul Henri Dietrich, Barão de Holbach, intitulado La morale universelle, ou les devoirs de l’homme fondés sur sa nature. (item 75), bem como a coleção em 10 volumes de Les Vies Des Hommes Illustres, Traduites Du Grec De Plutarque, Avec Notes, Par D. Ricard (item 71). La Bruyère estava presente na Collection des classiques français. Seconde Partie Contenant Voltaire, La Rochefoucault, la Bruyère, Fénelon, Massillon, Fléchier, Bossuet, Pascal, Montesquieu et Le Sage, impresso em Paris em 1828 (item 102). Notável que sugerisse para sua filha a leitura de clássicos, livros de História e Filosofia, ao invés de romances.

Apesar de ser influente pedreiro-livre, não foi indicado no inventário dos livros de Lino Coutinho nenhum impresso de cunho maçônico, como instruções, catecismos, constituições e outros documentos da maçonaria luso-brasileira. Não quer dizer que não existissem. Livros dessa natureza não eram vendidos, o que era o objetivo final da elaboração do inventário. Livros de natureza maçônica eram recolhidos, por Irmãos iniciados, após a morte de seus proprietários. É possível que José Paulo Franco Lima fosse também iniciado na maçonaria, visto que manteve relações comerciais e intelectuais com parte significativa dos maçons da Bahia, incluindo a família de Silva Serva, bem como imprimira a Sentinela da Liberdade, do maçom Cipriano Barata.

A despeito disso, com as exceções de Camões, Vieira e Madureira, todos os autores luso-brasileiros presentes na biblioteca de Lino Coutinho são iniciados na maçonaria. Entre os autores pedreiros-livres lusófonos estão o baiano Vicente José Ferreira Cardozo da Costa, o fluminense Antonio de Moraes Silva, o magistrado e poeta Antonio José Osório de Pina Leitão e o seu colega na Faculdade de Medicina, o doutor Johnatas Abbott. O médico inglês Abbott, aliás, iniciado na maçonaria na Bahia em 1824, dedicou a Lino Coutinho sua gramática inglesa (item 12), publicada em 1827, cujo único exemplar existente está em posse dos herdeiros do diplomata Fernando Abbott Galvão (1922-2009). A preferência por autores ligados a franco-maçonaria também se faz presente junto aos europeus e norte-americanos, abrangendo iniciados como Montesquieu, Voltaire, Louis-Sébastien Mercier, Benjamin Franklin, Thomas Jefferson, Condorcet, Diderot, Jean D’Alembert, Goethe e Jeremy Bentham. É claro que essa preferência de Lino por esses autores poderia residir mais por deles comungar ideais da Ilustração do que pela fraternidade maçônica.

Alexandre de Laborde foi outro influente pedreiro-livre cujos escritos estavam presentes na biblioteca de Lino Coutinho. Consta no inventário um exemplar da primeira edição De l’esprit d’association dans tous les intérêts de la communauté, ou, Essai sur le complément du bien-être et de la richesse en France par le complément des institutions (item 81). Laborde foi o Grão-Mestre adjunto do Grand Orient de France, entre 1835 a 1842, e no referido livro já afirmava que “Le monde est une grande franc-maçonnerie.”21 21 LABORDE, Alexandre. De l’esprit d’association dans tous les intérêts de la communauté, ou, Essai sur le complément du bien-être et de la richesse en France par le complément des institutions. Paris: Gide, 1818, p. 460.

Lino Coutinho possuía exemplar de um dos livros precursores da ficção científica contemporânea, L’An 2440, de Louis-Sébastien Mercier, que também era notório pedreiro-livre na França pre-revolucionária.22 22 AMADOU, Robert, Un discours maçonnique de Louis Sébastien Mercier. Soyons maçons et point académiciens, Renaissance traditionnelle, n. 13, 1973, p. 20-27. Originalmente impressa em 1771, foi a primeira novela utópica apresentando um cenário futurista e tornou-se um dos livros mais bem-sucedidos no mercado clandestino do século XVIII, sendo imediatamente proibido na França, com as edições impressas naquele país trazendo, falsamente, Londres como local de impressão para despistar a censura. Foi colocado na lista de livros proibidos Index Librorum Prohibitorum em 1773 e condenado em Madrid em 1778 como uma obra blasfema cujos distribuidores, se descobertos, seriam multados em quinhentos ducados e condenados a seis anos de prisão. Segundo Robert Darnton, a obra “fascinou um público imenso em sua época: L’an 2440 é o supremo best seller na lista dos livros proibidos. Teve pelo menos 24 reedições entre 1771 e 1789.”23 23 DARNTON, Robert. Edição e sedição: o universo da literatura clandestina no século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, p. 172. Até 1799, além das diversas edições francesas, teve duas traduções em inglês e outras em holandês, italiano e alemão. Investigação da história da sua impressão levou Everett Wilkie a concluir que “houve 18.000 exemplares impressos em três idiomas até o final de 1772 e 30.000 cópias até o final de 1782, altura em que se espalhou por toda a Europa. 63.000 cópias tinham sido impressas até a altura da morte de Mercier em 1814”.24 24 WILKIE JR., Evertt C.. “Mercier’s L’An 2440: Its Publishing History During the Author’s Lifetime, Part I.” In: Harvard Library Bulletin n.32, (Inverno 1984), pp. 5-35. A divulgação da obra de Mercier foi bem menor deste lado do Atlântico, mas em 1795 foi publicada uma edição na Filadélfia, sendo a primeira novela utópica publicada na América do Norte. É notável, também, que tanto George Washington quanto Thomas Jefferson, o primeiro e terceiro presidentes dos Estados Unidos, possuissem exemplares de L’An 2440.25 25 ANKON, Paul K. Origins of Futuristic Fiction. Georgia: University of Georgia Press, 1987, p. 117.

José Honório Rodrigues afirma que o livro de Mercier era bem conhecido no Brasil, mas o fez baseado apenas no exemplar apreendido ao bacharel Mariano José Pereira da Fonseca, na conspiração fluminense de 1794. O exemplar de Lino Coutinho reforça a afirmação de que a obra circulava por outras paragens do Brasil.26 26 RODRIGUES, José Honório. Independência: Revolução e contra-revolução. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975, vol. 1, p. 5.

Lino Coutinho possuía os cinco volumes da Nouvelle Bibliothèque d’un homme de goût (item 66), editados entre 1808 e 1810 por Antoine-Alexandre Barbier e N.L.M. Dessessarts, membros de várias academias francesas. Sobre essa edição, um crítico no Mercure de France afirmou que o título de Bibliothèque d’un homme de goût “parecia tão feliz que três compilações do mesmo tipo foram sucessivamente publicadas”. Observava que “não sou capaz de comparar as três Bibliothèque d’un homme de goût {mas} é conhecido {...} que a última é mais completa do que as outras duas”. Por fim, assevera que os seus autores são “geralmente reconhecidos como espírito judicioso e sábio bibliógrafo, {que} corrigiram os erros de seus antecessores, endireitaram seus juízos falsos {e} completaram as suas omissões”.27 27 Auger. Mercure de France, Littéraire et Politique. Paris: Arthus-Bertrand, 1808, v. 32, p.535-540.

Quanto aos periódicos, foi possível identificar a presença de apenas dois títulos, um fascículo avulso de O Padre Amaro, impresso em Londres, e cinco volumes da Revue Française, cujo número incial fora impresso em Paris em janeiro de 1828, extendendo-se a publicação até julho de 1830. A Revue Française foi editada sob auspício de François Guizot e Charles de Rémusa, sendo que a coleção completa possui 16 números, normalmente encadernados em 8 volumes. Assim, é possível afimar que a coleção que pertencia a Lino Coutinho estava incompleta.

Foram utilizados alguns critérios para identificar os livros arrolados no inventário de livros de José Lino Coutinho. Obviamente, todas as obras e edições eram anteriores a 1836. O principal desafio para algumas obras foi identificar a edição, pois Franco Lima não teve o cuidado de registrar, em nenhum caso, o impressor ou o ano em que a obra foi ao prelo. Em poucos itens, Lima indica o corte do exemplar, normalmente in-folio, in-4 ou in-8. O número de volumes também ajudou a identificar a edição do livro, bem como a língua em que foi publicado. Ainda assim, em parte dos livros foi impossível identificar com precisão a edição inventariada. Nestes casos, foram indicadas mais de uma edição, sempre anteriores à data do inventário. No fim, é possível oferecer aos leitores e estudiosos do livro um mosaico de possibilidades.

Segundo os registros oferecidos por Franco Lima foi possível apurar da biblioteca de Lino Coutinho, quanto ao idioma, a predominância da língua francesa, com 122 livros (83,56%), apenas 16 livros em português (11%), dois em inglês, um em espanhol, um em italiano, dois dicionários bilíngues, totalizando 144 obras com idioma identificado. Não foi possível identificar dois itens do inventário, visto que só foi indicado o nome do autor, não havendo referência aos títulos dos livros. A quase ausência de livros espanhóis na Biblioteca Pública e nas bibliotecas privadas da Bahia oitocentista não é uma novidade, o que já havia sido constatado no inventário dos livros pertencentes à biblioteca do Cônego Manoel Dendê Bus. Aliás, o único livro em espanhol na biblioteca de Lino foi impresso em Paris (item 103), tratando da vida e obra do dominicano espanhol Bartolomé de Las Casas. Surpreendente não haver a ocorrência de nenhum livro em latim, não por ser a língua oficial da Igreja Católica, já que na coleção de Lino Coutinho não costa livros piedosos ou devocionais, mas por ser o latim muito usual entre os cientistas do século XIX.

Pela quantidade e proporção de livros na língua de Voltaire, é possível afirmar que Lino Coutinho possuia mesmo uma biblioteca francesa na Bahia. Essa presença massiva de livros franceses na biblioteca privada do primeiro diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, algo recorrente entre os ilustrados luso-brasileiros de então, se explica pelo fato de ser a França berço da maior parte dos filósofos da Ilustração, e outros tantos médicos renomados, bem como grande mercado editorial - na produção, distribuição e consumo de livros, o que fazia com que mesmo autores estrangeiros publicassem em francês. Eram poucas ainda as traduções para o português dos livros tanto dos philosophes quanto dos tratados médicos - motivo pelo qual o próprio Coutinho se lançava à tarefa de tradutor.

Essa francofilia (ou francofonia) dos professores da Faculdade de Medicina da Bahia perdurou até o avançar do século XX. A literatura de Jorge Amado bem captou esse fenômeno através do personagem Nilo d’Ávila Argolo de Araújo, professor da mesma Faculdade de Medicina, na novela Tenda dos Milagres (1963). Nilo Argolo é, certamente, uma alegoria do médico e professor Raimundo Nina Rodrigues (1862-1906). O romancista baiano observou que os lentes de medicina, com poucas exceções, gastavam mais seu tempo dedicando-se às pequenas vaidades da língua francesa do que com pesquisas médicas. Segundo Amado, na Faculdade de Medicina da Bahia, “falar francês sem erros e com boa pronúncia tornara-se motivo de vaidade, fator de prestígio {...} a quem quisesse merecer foros de intelectual, instrumento indispensável ao ensino superior”. Decerto, ainda que houvesse bons autores e valiosos livros de medicina portugueses dos séculos XVII e XVIII, o conhecimento sobre o assunto avançou muito no século XIX, fazendo com que as tipografias do Brasil e de Portugal não conseguissem traduzir e publicar com a rapidez necessária a maior parte dos progressos científicos na referida área.

Para a transcrição do invetário foi mantido o texto conforme o manuscrito, com todos os equívocos e barbarismos registrados por Franco Lima, indicando a numeração das folhas do documento entre colchetes. Em alguns itens, foram inseridas algumas poucas observações explicativas, logo abaixo dos dados bibliográficos identificados. Na transcrição do documento foi sinalizado o idioma de cada obra, indicado com as letras P (português), F (francês), IN (inglês), IT (italiano), E (espanhol), D (desconhecido). Há ainda dois dicionários bilíngues, sendo o primeiro um exemplar, possivelmente, do Dicionário Inglês de Antonio Vieira Transtagano.

Recuperar o catálogo da biblioteca de Lino Coutinho é importante como um retrato intelectual do seu tempo. É a imagem de uma época de transição. A ausência de livros portugueses revela uma possível influência do antilusitanismo, particularmente entre os baianos, nos anos de 1820-30. O certo é que não se trata de uma biblioteca colonial ou, mesmo, de uma biblioteca brasileira. Os livros de José Lino Coutinho se impõem como uma tentativa de constuir uma biblioteca da civilização ocidental contemporânea que, em 1836, se pretendia enquanto civilização universal.

O inventário dos livros

{fl.35v}

Termo de juramento e avaliação dos livros

Aos quatorze dias do mez de Janeiro de mil oitocentos e trinta e sette annos nesta Cidade da Bahia a casa da residencia do Doutor Juiz dos Orfãos, Amancio João Pereira de Andrade vim eu Escrivão, e os Avaliadores do auditorio Joaquim José de Moraes, e Joaquim José Tiburcio, e estando tãobem presente o Livreiro José Paulo Franco Lima, a este deferio o juiz o juramento dos Sanctos Evangelhos, recomendando lhe que com verdade, e saã consciencia juntamente com os Avaliadores visse, e examinasse os livros pertencentes ao finado Conselheiro José Lino Coitinho, e lhes desse o justo valor, que entendesse sem dolo, ou malicia sob pena da Ley; e recomendou aos dittos Avalia{fl.36} Avaliadores, que debaixo do juramento de seos officios tãobem dessem os justos valores, que suas consciencias lhes dictassem. De que fiz este termo, em que assignarão o Juiz, os Avaliadores, e o Livreiro. E eu José Olympio Gomes de Soiza Escrivão o escrevi.D.r Per.a de And.e

Joaquim J.e Tiburcio Joaq.m J.e de Moraes

José Paulo Franco Lima

Por esta forma houve o Doutor Juiz dos Órfãos por concluída a descripção dos livros do finado testador José Lino Coitinho em rasão de não haver mais do que para constar fiz este termo, em que assignaram o mesmo Juiz, os avaliadores, e Perito. Eu Jozé Olympio Gomes de Souza Escrivão dos Orfãos o escrevi.

Joaquim J.e Tiburcio Joaq.m J.e de Moraes

José Paulo Franco Lima

Bibliografia

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  • Diário Diário do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Typographia do Diário , n. 11, 16 de junho de 1832.
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  • 1
    O Correio Official (RJ) transcreveu o necrológio publicado no Correio Mercantil (BA), de 27 de julho de 1836, segundo o qual Lino falecera após “longos sofrimentos”, sinalizando ainda que quando nomeado Ministro pela Regência, em 1831, estava ele “ja então acabrunhado por suas enfermidades” e que “seu estado morboso o forçou a hir ultimamente á França, onde não conseguindo melhoras algumas, regressou á sua Patria para nella terminar huma existência que lhe fora toda consagrada”. Sobre o funeral, informou que foi “sepultado no dia 25 de julho, pelas 7 horas da noite, na Matriz de S. Pedro desta Cidade da Bahia, onde tiverão lugar as honras fúnebres devidas á sua alta dignidade no Estado, e ás quaes assistio hum numeroso concurso das pessoas as mais gradas e respeitáveis desta Cidade”, Vol. VII, n. 40, 18 de ago. de 1836, p. 160. Disponível em: <http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=749443&PagFis=3685&Pesq=>. Acesso em 07 set. 2016. Evaristo da Veiga, em seu Aurora Fluminense (n. 328) de 23 de abril de 1830, noticiava ao público a chegada dos deputados à Capital para aquele ano legislativo, e destacou: “Ouvimos que o Sr. Lino Coutinho virá hum pouco mais tarde este anno, por se achar enfermo dos seus ataques de gotta” Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=706795&PagFis=1452>, acesso em 10 ago. 2016.
  • 2
    Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB). Seção Judiciária; Série Inventário; Núcleo Tribunal da Relação; 01/105/157/04, 178 fls. Além dos bens do inventário, a viúva receberia uma pensão anual; Jornal do Commercio, Segunda feira 29 de Agosto de 1836, n. 188, p. 3: Assembléa Geral legislativa resolve: Art. Unico Fica approvada a pensão anual de 800$ rs, concedida por decreto de 16 de Agosto de 1836, a D. Maria Adelaide Sudré Coutinho, em recompensa dos serviços prestados por seu fallecido marido, o Conselheiro José Lino Coutinho. Paço da Camara dos Deputados, 26 de Agosto de 1836.
  • 3
    Para um estudo sobre a obra pedagógica de Lino Coutinho, ver REIS, Adriana Dantas. Cora: lições de comportamento feminino na Bahia do século XIX. Salvador: FCJA; Centro de Estudos Baianos da UFBA, 2000, pp. 135-198. A atenção de Lino Coutinho com a educação feminina pode ser vista também em seu projeto de lei apresentado à Câmara dos Deputados em 1826, que propunha “o estabelecimento de Escollas de Meninas nos Conventos de Religiosas, onde se ensine a ler, escrever e contar”, lançando-se mão das religiosas como professoras, dada a carência de lentes no país. Diario da Camara dos Deputados á Assemblea Geral Legislativa do Imperio do Brasil. 1826. Rio de Janeiro: Imprensa Imperial e Nacional, 1827, p. 1302 et seq. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=5rxOAAAAcAAJ>. Acesso em 30 jul. 2016.
  • 4
    FELNER, Rodrigo José de Lima. Almanak do Rit:. Esc:. Ant:. e Acc:. em Portugal para o Ano de 5846 [Almanak do rito escocez antigo e aceite para Portugal, para o anno de 5846 (1846)} Offerecido ao Synhedrio de Beneficencia pelo Ir:. R. Felner. Lisboa: Typographia de O. R. Ferrer, 1846. As informações de Felner foram reeditadas no Astrea: Almanak Maçônico. Rio de Janeiro: Tipografia Laemmert, 1846, p. 79-81.
  • 5
    Ibidem, p. 68. Grifo nosso.
  • 6
    Arquivo Histórico do Itamaraty - Lata 195, maço 6, pasta 13. Tendo em vista que Hermógenes Pantoja aparece listado, morto ele em 1821, a lista é, portanto, anterior a esta data. Deve estar relacionada às conspirações constitucionalistas na Bahia de então. Boa parte dos eleitos para as Cortes era composta por pedreiros-livres, posto que a fraternidade e a organização da maçonaria concorreram para a eleição de deputados “Irmãos”.
  • 7
    Observações sobre as affecções catarraes em geral, e particularmente as que são conhecidas com o nome de defluxos do cerebro e defluxos do peito; por P.J.G. Cabanis, Doutor em Medicina, Membro do Senado, do Instituto Nacional, da Escola, e Sociedade de Medicina de Paris, da Sociedade Americana, da de Medicina de Bruxellas, &c. Traduzidas, e Anotadas por J. Lino, Bacharel Formado em Medicina, pela Universidade de Coimbra, e Medico do Hospital Real Militar da Cidade da Bahia. Bahia: Tipografia de Manoel Antonio da Silva Serva, 1816. Viii, 94p.
  • 8
    “O Snr. José Lino Coutinho, Deputados em Cortes pela Provincia da Bahia, e agora correspondente da Academia, apresentou uma Memoria sobre a topographia medica daquelle tão interessante berço do Reino do Brazil”. Historia e Memorias da Academia Real das Sciencias de Lisboa. Lisboa: Typ. da Mesma Academia, 1823. Tomo VIII, Parte I. p. VII. É possível que o manuscrito dessa memória ainda exista na Academia de Ciências de Lisboa.
  • 9
    MEIRELES, Joaquim Cândido Soares de. Observações sobre o projeto do senhor deputado Lino Coutinho, a cerca das escolas de medicina. Rio de Janeiro, Typ. do Diario, 1828. 28 p. III-186,5,3,n.16
  • 10
    BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Diccionario Biblographico Brazileiro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1899, vol 5, p. 7-8.
  • 11
    Diário do Rio de Janeiro, n.09, Rio de Janeiro: Typographia do Diário, 12 de setembro de 1831.
  • 12
    Diário do Rio de Janeiro, n.11, Rio de Janeiro: Typographia do Diário, 16 de junho de 1832.
  • 13
    IGLESIAS MAGALHÃES, Pablo Antonio. Deus e o diabo na biblioteca de um cônego da Bahia: o inventário dos livros do padre Manoel Dendê Bus em 1836. Revista de História, São Paulo, 2014, p. 245-286. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.11606/issn.2316-9141.rh.2014.89013>. Acesso em 10 jul. 2016.
  • 14
    Barata e Pantoja possuíam, respectivamente, 30 e 22 títulos apreendidos. Sobre o assunto, ver MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Presença francesa no movimento democrático baiano de 1798. Bahia: Itapuã, 1969, p. 18. Entre as exceções, incluem-se as bibliotecas de Manoel Ignacio da Silva Alvarenga (1749-1814) e Francisco Agostinho Gomes (1769-1842). Sobre bibliotecas coloniais ver, dentre outros, MORAES, Rubens Borba de. Livros e bibliotecas no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1979. Ao que se sabe, a biblioteca do padre Gomes, acrescida a partir de 1800 com caixas de livros trazidos de Lisboa, era a maior da capitania da Bahia. Tal coleção deu origem ao acervo da Biblioteca Pública da Bahia, em 1811. Era uma coleção de natureza enciclopédica, que contemplava tantas áreas do conhecimento quanto era possível à época, onde encontravam-se livros de mineralogia, química, botânica, arquitetura, zoologia, matemática, física, filosofia, política, geografia, história, direito, linguística, arte, religião e clássicos. Sobre Gomes, ver NEVES, Lúcia M. Bastos P.; PEREIRA, Neves Guilherme. A biblioteca de Francisco Agostinho Gomes: a permanência da ilustração luso-brasileira entre Portugal e o Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 165, n.425, 2004, p. 11-28.
  • 15
    SEIXAS, Romualdo Antônio de. Breve Memoria acerca da naturalidade do Padre Antonio Vieira da Companhia de Jesus de que foi encarregado pelo Instituto Histórico e Geographico do Brasil o Exmº Snr. Arcebispo da Bahia. Bahia: Typ. Camillo de Lellis Masson, 1857.
  • 16
    Com efeito, não foi possível identificar Rousseau como autor de qualquer item catalogado. Entretanto, seu nome aparece no conjunto da Collection des classiques français (item 102). É possível que outra obra, Principes du droit politique mis en opposition avec le Contrat Social de J. J. Rousseau (item 63), de Torombert e Lanjuinais, que contém o Contrato Social no anexo, fizesse parte do acervo de Lino. Trata-se, como indica o título, de um contraponto ao Contrato Social rousseauniano.
  • 17
    A coleção das suas obras, na biblioteca de Lino Coutinho, apresentava o volume primeiro as Mémoires sur la vie, l’administration et les ouvrages de M. Turgot, de autoria de Pierre-Samuel Dupont de Nemours, em sua segunda edição, que no volume segundo trazia os textos escritos entre 1749 e 1754; no volume terceiro traz os textos escritos entre 1754 e 1760, incluindo os artigos de Turgot que figuram na Encyclopédie; no quarto volume os escritos elaborados entre 1761 e 1774. O quinto volume compreende as obras escritas entre 1761 e 1774. Essa obra completa reproduz a linha de pensamento de um dos principais estadistas da França setecentista.
  • 18
    MOREL, Marco. O caminho incerto das Luzes francesas: o abade De Pradt e a Independência brasileira. Almanack, v. 13, 2016, p. 116 < www.scielo.br/pdf/alm/n13/2236-4633-alm-13-00112.pdf >.
  • 19
    CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem: a elite política imperial. Brasília: UNB, 1981. Deve ser ressaltado que, além do seu papel relevante como estadista, por conta dos seus estudos e traduções na seara médica Lino Coutinho era tido como um dos grandes nomes da ciência brasileira. Seu nome figura entre os biografados na obra Du climat et des maladies du Brésil, do Dr. Sigaud (Paris: Chez Fortin, Masson et Cia., Libraires, 1844), sendo que o comentário no anúncio desta no Diário do Rio de Janeiro em novembro de 1844 listava Coutinho entre os “sábios do paiz que illustrão as sciencias naturaes e medicas”, ao lado de nomes como José Bonifácio, Manuel Arruda Camara e Alexandre Rodrigues Ferreira. (Diário do Rio de Janeiro. Anno XXIII, N. 6769, 15 de novembro de 1844. Disponível em <http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=094170_01&pagfis=28170>. Acesso em 20 jul. 2016).
  • 20
    Cartas Sobre a Educação de Cora, Seguidas de um Cathecismo Moral, Político e Religioso, pelo finado Conselheiro Dr. José Lino Coutinho e publicadas por João Gualberto dos Passos. Bahia:Typographia de Carlos Poggetti, 1849, carta XXIII, p. 84-85.
  • 21
    LABORDE, Alexandre. De l’esprit d’association dans tous les intérêts de la communauté, ou, Essai sur le complément du bien-être et de la richesse en France par le complément des institutions. Paris: Gide, 1818, p. 460.
  • 22
    AMADOU, Robert, Un discours maçonnique de Louis Sébastien Mercier. Soyons maçons et point académiciens, Renaissance traditionnelle, n. 13, 1973, p. 20-27.
  • 23
    DARNTON, Robert. Edição e sedição: o universo da literatura clandestina no século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, p. 172.
  • 24
    WILKIE JR., Evertt C.. “Mercier’s L’An 2440: Its Publishing History During the Author’s Lifetime, Part I.” In: Harvard Library Bulletin n.32, (Inverno 1984), pp. 5-35.
  • 25
    ANKON, Paul K. Origins of Futuristic Fiction. Georgia: University of Georgia Press, 1987, p. 117.
  • 26
    RODRIGUES, José Honório. Independência: Revolução e contra-revolução. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975, vol. 1, p. 5.
  • 27
    Auger. Mercure de France, Littéraire et Politique. Paris: Arthus-Bertrand, 1808, v. 32, p.535-540.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2017

Histórico

  • Recebido
    17 Out 2016
  • Aceito
    05 Jun 2017
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