Resumo
O artigo examina a documentação sobre uma beata, irmã Germana Maria da Purificação (1782-1853), que apresentava manifestações extáticas na Capela de Nossa Senhora da Piedade da Serra, em Caeté. Um diagnóstico sobre o caso, organizado por dois cirurgiões, Antônio Pedro de Sousa e Manuel Quintão da Silva, defendia que a beata era vítima de fenômenos sobrenaturais. Tal interpretação foi recusada por um médico mineiro diplomado na Europa, Antônio Gonçalves Gomide (1770-1835), em obra intitulada Impugnação Analítica (...), publicada pela Imprensa Régia no ano de 1814. Esse documento permite examinar o universo da medicina no início do século XIX no Brasil, evidenciando a rivalidade entre médicos e cirurgiões. O médico, guiando-se pelos princípios da ciência ilustrada e com base nos estudos da medicina douta, se apoiou nos trabalhos de Philippe Pinel (1745-1826) e de outros alienistas. Analisando as manifestações patológicas da beata como uma doença nervosa, Gomide produziu o que pode ser considerado uma das primeiras documentações sobre o alienismo no Brasil. O médico abriu caminho para o debate sobre essa especialidade médica moderna no país. Tal percepção propõe uma releitura da historiografia acerca dos estudos sobre as doenças nervosas, demonstrando que o conhecimento científico acerca da alienação já circulava no país pelo menos desde a década de 1810.
PALAVRAS-CHAVE:
Médicos e cirurgiões; alienismo; século XIX; Minas Gerais; Brasil; Antônio Gomide (1770-1835)