Acessibilidade / Reportar erro

Entre o alinhamento e a dissonância: a fotografia na revista Realidade Amazônia (1971) e a defesa da colonização da floresta 1 1 O artigo é uma versão atualizada de um capítulo da tese de doutorado A construção coletiva de "Amazônia": fotografia e política no livro de Claudia Andujar e George Love, de Vitor Marcelino da Silva, sob orientação da Prof.ª Dra. Helouise Costa, realizada no Programa Interunidades em Estética e História da Arte da Universidade de São Paulo (USP) e defendida no ano de 2022. Foi realizada uma investigação complementar, que resultou nesta nova versão em formato de artigo.

Between alignment and dissonance: photography in Realidade Amazônia magazine (1971) and the endorsement of forest colonization

RESUMO

O artigo tem como objetivo examinar a abordagem do fotojornalismo em relação às pautas indígenas e ambientais durante o período de colonização da floresta amazônica, conduzido pelo governo militar de maneira sistemática e predatória nos anos 1970. A análise centraliza-se na edição especial da revista Realidade sobre a Amazônia, lançada em outubro de 1971, a qual endossou ações governamentais. No entanto, algumas fotografias veiculadas na edição não se alinharam completamente a essa perspectiva, evidenciando elementos dissonantes em relação ao discurso oficial. O estudo examina diversas imagens presentes na revista, com ênfase nas fotografias de Claudia Andujar e George Love, figuras proeminentes do fotojornalismo brasileiro dos anos 1970.

PALAVRAS-CHAVE:
Fotojornalismo; Revista Realidade; Colonização da Amazônia; Claudia Andujar; George Love

ABSTRACT

The article aims to examine the approach of photojournalism regarding indigenous and environmental issues during the period of colonization of the Amazon rainforest, conducted by the military government systematically and predatorily in the 1970s. The analysis focuses on the special edition of the Realidade magazine about the Amazon, released in October 1971, which, overall, endorsed governmental actions. However, some photographs featured in the edition did not fully align with this perspective, highlighting moments in which they shaped up as dissonant elements in relation to the official discourse. The study examines various images present in the magazine, with an emphasis on the photographs by Claudia Andujar and George Love, prominent figures in Brazilian photojournalism of the 1970s.

KEYWORDS:
Photojournalism; Realidade magazine; Colonization of the Amazon; Claudia Andujar; George Love

INTRODUÇÃO

Nos primeiros dias do ano de 2023, fomos impactados com as inúmeras reportagens sobre a calamitosa crise sanitária vivida pelos Yanomami. Tal situação veio à tona e expôs as ações do governo Bolsonaro contra o povo indígena. De acordo com investigações jornalísticas, no período de quatro anos do governo (2019-2022), pelo menos 570 crianças com menos de cinco anos de idade morreram de causas evitáveis no território.3 3 Bedinelli, Brum e Machado (2023). Essa trágica situação é decorrente da exploração garimpeira ilegal na Terra Indígena Yanomami, demarcada em 1992, que tem crescido de modo exponencial e que não foi devidamente investigada nos últimos anos.4 4 De acordo com documentos divulgados pela imprensa, o governo Bolsonaro recebeu um aviso formal sobre a invasão de garimpeiros em território indígena, porém optou por não tomar nenhuma medida. Em agosto de 2022, a Funai elaborou um relatório que identificou mais de oitenta pontos relacionados ao garimpo dentro da Terra Indígena Yanomami. Contudo, o relatório foi arquivado dois dias depois de chegar ao Ministério da Justiça, que na época era comandado por Anderson Torres (MELLO, 2023). Desde outubro de 2018, início do monitoramento promovido pela Hutukara Associação Yanomami e ano da eleição do ex-presidente, até o final de 2021, o garimpo destruiu mais de 4 mil hectares do território. Apenas entre os anos de 2020 e 2021, o garimpo ilegal avançou 46%, atingindo cerca de 16 mil pessoas, moradoras de 273 comunidades yanomami.5 5 Hutukara Associação Yanomami e Associação Wanasseduume Ye’kwana (2022).

Tal situação levou o atual governo Lula a decretar estado de emergência de saúde pública no território no dia 20 de janeiro de 2023. No mês seguinte, Flávio Dino, ministro da Justiça e Segurança Pública, solicitou que a Polícia Federal abrisse investigações sobre a morte das crianças yanomami. Para Dino, há indícios de crimes de genocídio, omissão de socorro, peculato e desvio de verba pública contra o meio ambiente.6 6 Cf. Nunes (2023).

Essa trágica situação foi amplamente divulgada pela imprensa e expôs não apenas o descaso para com os Yanomami e a Amazônia, mas também demonstrou como tais ações podem estar inseridas em uma ampla estratégia de exploração predatória da floresta. Entretanto, infelizmente, essa não seria a primeira vez que um plano desse tipo foi comandado pelo governo federal, remetendo à ditadura militar, período constantemente exaltado por Bolsonaro e seus seguidores.

Considerando, portanto, o destaque que as questões ambientais e indígenas vêm ganhando nos últimos anos, o objetivo deste artigo é investigar como o fotojornalismo tratou essas mesmas pautas durante a ditadura civil-militar. Nesse período, especialmente no início dos anos 1970, o governo federal realizou significativos investimentos financeiros e políticos com o objetivo de colonizar e explorar a floresta amazônica, negligenciando a preservação ambiental e a proteção dos povos indígenas. Para persuadir a população brasileira sobre a viabilidade dessa empreitada, que assumiu grandes proporções, a imprensa desempenhou um papel crucial.

Para efetuar essa análise, tomaremos como estudo de caso a edição especial sobre a Amazônia da revista ilustrada Realidade,7 7 A partir desse ponto, tal edição será referida como Realidade Amazônia. Uma versão digitalizada da revista na íntegra pode ser consultada em https://bit.ly/3sqD83M. (Acesso em: 16 mai. 2023.) lançada em outubro de 1971. Essa edição foi um grande sucesso de vendas e é reconhecida como um marco importante para o jornalismo brasileiro.8 8 Cf. Pinto (2011). Além das análises dos textos das reportagens de Realidade Amazônia, também examinaremos como as fotografias podem tanto reforçar o discurso de incentivo da colonização da floresta como apresentar-se como elementos dissonantes. Será dada maior ênfase às fotografias produzidas por Claudia Andujar9 9 Claudia Andujar é uma fotógrafa, artista e ativista naturalizada brasileira. Ela nasceu no ano de 1931, na cidade de Neuchatêl, Suíça, e mudou-se para a cidade de São Paulo no ano de 1955, onde passou a atuar como fotógrafa em diversas revistas brasileiras. Organizou algumas exposições no Museu de Arte de São Paulo (MASP). Desenvolveu uma série de trabalhos em parceria com George Love, com quem foi casada entre os anos de 1968 e 1974. Desde os primeiros anos de sua vinda para o Brasil, procurou fotografar grupos indígenas, mas foi seu contato com os Yanomami, estabelecido no início dos anos 1970, que foi responsável por uma mudança significativa em sua trajetória. Nesse período, abandona sua profissão de fotógrafa e passa atuar como pesquisadora e ativista da causa indígena, criando e coordenando a Comissão para a Criação do Parque Yanomami (CCPY), no ano de 1978. Atualmente, Andujar tem exposto sua extensa produção fotográfica sobre os Yanomami em diversos museus de arte pelo mundo, estabelecendo-se como uma artista de projeção internacional (NOGUEIRA, 2018, p. 274-280). e George Love,10 10 George Love foi um fotógrafo estadunidense. Ele nasceu na cidade de Charlotte, Estados Unidos, no ano de 1931. Mudou-se para São Paulo em 1966, onde passou a atuar em diversas revistas brasileiras. Também atuou no MASP, em parceria com Claudia Andujar, e ainda desenvolveu uma série de trabalhos para empresas privadas, como agendas, calendários e apresentações audiovisuais. Love foi um dos poucos fotógrafos negros atuantes no Brasil durante as décadas de 1960 e 1970. Durante anos, visitou com frequência a floresta amazônica. Morreu no ano de 1995, na cidade de São Paulo. figuras proeminentes do fotojornalismo na década de 1970, sem deixar de considerar as imagens de outros fotógrafos. Por fim, também será brevemente discutido como algumas imagens de Andujar foram utilizadas em outro meio impresso que atuava na luta em defesa dos povos indígenas, ainda no período militar.

Nesse sentido, é importante considerar o contexto histórico que envolve o período do lançamento da revista, marcado por um ambíguo clima de repressão e otimismo. Segundo o historiador Carlos Fico, a promulgação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em dezembro de 1968, consolidou o estabelecimento de um sofisticado aparato de repressão política, que se manteve altamente violento até o ano de 1973, com inúmeras prisões, torturas e “desaparecimentos”11 11 Fico (2015, p. 62). . Esses anos também foram caracterizados pelo crescimento econômico significativo do país, conhecido como “milagre econômico”, com o PIB crescendo em média 11,2% ao ano.12 12 No entanto, essa situação econômica não perdurou por muito tempo. Em 1973, tanto a inflação quanto a dívida externa passaram a crescer consideravelmente. O salário-mínimo estagnou, resultando na diminuição do poder aquisitivo, e ocorreu uma intensa concentração de renda. Cf. Fico, op. cit. Esse desenvolvimento garantiu altos índices de popularidade ao então presidente, o general Médici, mesmo em meio à intensa repressão.

Para Fico, essa aparente contradição pode ser explicada pelas ações da propaganda política, que enfatizava amplamente o crescimento econômico, os sucessos da seleção brasileira no futebol e as grandes obras em andamento, como a construção da rodovia Transamazônica13 13 A rodovia, construída entre 1969 e 1974, foi projetada para conectar as regiões Norte e Nordeste do Brasil com Peru e Equador. Inicialmente foi projetada para ter 8 mil km de extensão, entretanto, apenas 4.223 km foram construídos, e de maneira precária, sem pavimentação. Durante a maior parte do ano, a estrada é intransitável, devido às chuvas recorrentes da floresta tropical. A construção dessa e de outras estradas na região Norte do país faz parte do ambicioso Plano de Integração Nacional (PIN). (abordada diversas vezes nos textos de Realidade Amazônia). Por outro lado, os mecanismos de censura escondiam da população qualquer indício de violência e repressão praticadas pelos militares.14 14 Fico, op. cit., p. 80-81.

Referentes a esse contexto, os conceitos de ideologia e verdeamarelismo, elaborados pela filósofa brasileira Marilena Chuí, são elucidadores, e se tornam instrumentos teóricos consistentes que nos auxiliam na análise da revista. Segundo ela, em uma sociedade em que determinadas classes exploram e dominam as outras, as ideias são geradas e difundidas pela classe dominante para assegurar seu poder econômico, social e político, de tal maneira que seja ocultado o modo real como as relações sociais se originaram e foram produzidas.

Esse ocultamento da realidade social chama-se ideologia. Por seu intermédio os dominantes legitimam as condições sociais de exploração e de dominação, fazendo com que pareçam verdadeiras e justas. Enfim, também é um aspecto fundamental da existência histórica dos homens a ação pela qual podem ou reproduzir as relações sociais existentes, ou transformá-las, seja de maneira radical (quando fazem uma revolução), seja de maneira parcial (quando fazem reformas). Em outras palavras, uma ideologia não possui um poder absoluto que não possa ser quebrado e destruído. Quando uma classe social compreende sua própria realidade, pode organizar-se para quebrar uma ideologia e transformar a sociedade.15 15 Chauí (2008, p. 24).

Ou seja, a ideologia não é um conjunto qualquer de ideias, mas um ideário que oculta suas raízes históricas e sociais a fim de manter a exploração econômica, a desigualdade social e a dominação política. Tais reflexões são fundamentais para que possamos identificar os aspectos ideológicos que atravessam a edição Realidade Amazônia, especialmente a defesa da colonização da floresta promovida pelo governo militar. Nesse período, foram fortalecidas as bases ideológicas do capitalismo através da relação estabelecida entre o desenvolvimento industrial, conduzido por empresas nacionais e estrangeiras, e a noção de identidade nacional.

Tais mecanismos são mais bem compreendidos através do conceito de verdeamarelismo, formulado por Chauí em Brasil: mito fundador e sociedade autoritária. Para elucidá-lo, a filósofa parte da noção de que uma representação homogênea do Brasil sempre foi historicamente útil, por permitir “crer na unidade, na identidade e na indivisibilidade da nação e do povo brasileiros”16 16 Id., 2000, p. 4. . Desse modo, foi possível dividir socialmente e politicamente a nação em “amigos” e “inimigos a combater”17 17 Ibid., p. 4. .

A filósofa vê o verdeamarelismo como uma estratégia da classe dominante brasileira, elaborada ao longo dos anos, para celebrar a imagem do Brasil como um país essencialmente agrário, com o objetivo de legitimar o que restou do sistema colonial e da hegemonia dos proprietários de terra. O Brasil “era, na verdade, o país historicamente articulado ao sistema colonial do capitalismo mercantil e determinado pelo modo de produção capitalista a ser uma colônia de exploração e não uma colônia de povoamento”18 18 Ibid., p. 33. .

Nos primeiros anos da ditadura civil-militar, a classe dominante brasileira ainda acreditava que apenas as atividades agrárias e extrativistas levariam o país ao progresso, evitando a competição direta com os países mais desenvolvidos. Entretanto, o excedente que vinha das nações centrais para o Brasil não foi investido em atividades produtivas, mas no consumo de luxo, que se tornou instrumento de demarcação social.19 19 Ibid., p. 34. Nesse processo, Chaui vê a fabricação no país da ideologia nacional-desenvolvimentista, que se dá na transição de uma dependência consentida para uma dependência tolerada, pois a classe dominante acreditava que a sujeição brasileira aos países centrais industrializados seria provisória, durando até o momento em que o país se tornasse industrialmente autônomo. Assim, até se poderia crer que o verdeamarelismo seria desmontado; mas não foi o que aconteceu, pois a industrialização brasileira nunca chegou a esses níveis de autonomia.

Na divisão internacional do trabalho, a industrialização se deu por transferência de setores industriais internacionais para o Brasil, em decorrência do baixo custo da mão-de-obra, e o setor agrário-exportador jamais perdeu força social e política. Se antes o verdeamarelismo correspondia à auto-imagem celebrativa dos dominantes, agora ele opera como compensação imaginária para a condição periférica e subordinada do país. Além disso, justamente porque aquele era o período da “questão nacional”20 20 Em referência à classificação de Eric Hobsbawm, em Nações e nacionalismo desde 1780, de que a partir de 1918 até os anos 1950-60 pode-se falar em “questão nacional”, que “enfatiza a consciência nacional, definida por um conjunto de lealdades políticas” em um discurso de nacionalidade que emana principalmente dos partidos políticos e do Estado (Ibid., p. 14). , houve a ação deliberada do Estado na promoção da imagem verde-amarela.21 21 Ibid., p. 36.

Com o golpe de 1964, e sobretudo após o AI-5, a escalada autoritária revitaliza e fortalece o verdeamarelismo sedimentado na “ideologia do ‘Brasil Grande’, isto é, da chamada ‘integração nacional’, com rodovias nacionais e cidades monumentais, uma vez mais destinadas a atrair o grande capital internacional”22 22 Ibid., p. 32. .Nessa conjuntura, o governo militar tinha como objetivo primordial chamar a atenção do empresariado multinacional, construindo a imagem de um país rico em recursos naturais, com um povo pacífico, empreendedor e ordeiro que vivia em meio a uma natureza exuberante.

Em sua análise, Chauí aponta que a ditadura militar assumiu para si três tarefas: a integração, a segurança e o desenvolvimento nacional. A primeira buscou superar a fragmentação e dispersão da nação; a segunda teve como objetivo lutar contra os inimigos internos e externos por meio da ação repressiva do Estado; e a terceira, por fim, tentou se pautar nos moldes das nações capitalistas, fundadas em regimes democráticos ocidentais cristãos.

As ligações, de origem colonial, entre indústria, desenvolvimentismo e identidade nacional fortaleceram o governo militar e nos ajudam a compreender os discursos presentes na Realidade Amazônia.

A REVISTA REALIDADE

Para Helouise Costa, o surgimento da revista ilustrada “esteve intimamente relacionado ao avanço tecnológico que permitiu a inclusão da fotografia nas páginas dos periódicos, à industrialização da imprensa, à comercialização da notícia e à expansão da publicidade”23 23 Costa (2012, p. 302). . A fotografia passou a ser moldável, adaptando-se facilmente aos sistemas de circulação e consumo do século XX. Desse modo, o componente ideológico da revista ilustrada - e especialmente da fotografia utilizada nesse tipo de publicação - responde a demandas de diferentes naturezas. A autora nos lembra que, nessa conjuntura, a imagem fotográfica torna-se mercadoria, tendo como função reforçar o discurso de autenticidade e veracidade da revista. Vista como prova ou testemunho do real, e manipulável em sua essência, ela cria um modo peculiar de ver o mundo moderno.24 24 Ibid., p. 315.

Segundo Maria Celeste Mira, a partir dos anos 1960, as revistas ilustradas passaram a integrar um competitivo cenário devido ao recrudescimento da indústria cultural que ocasionou no início da segmentação do setor e no aumento na produção de publicações, em contraposição aos anos anteriores quando a revista O Cruzeiro dominava o mercado. As revistas da Editora Abril tornam-se protagonistas e pioneiras nesse novo contexto. Para a autora, tais publicações tinham em comum uma certa obstinação em “descobrir e mostrar o Brasil ao leitor brasileiro”25 25 Mira (1998, p. 5). , sem abandonar as referências às revistas estrangeiras. Assim, “Claudia queria mostrar à mulher a moda e a cozinha brasileiras, enquanto Quatro Rodas pretendia traçar um mapa físico do Brasil. O projeto de Realidade era desvendar um país que o noticiário comum não mostrava”26 26 Ibid. . Em grande medida, essas revistas alinharam-se ao espírito da época do regime militar, ao definir como principal tema a identidade nacional, usado tanto como ideologia quanto estratégia de mercado.

Especialmente durante os anos 1960, a revista Realidade foi um dos principais carros-chefes da Editora Abril. O primeiro número foi lançado em abril de 1966 e procurava atingir um tipo de leitor mais intelectualizado através de reportagens político-ideológicas.27 27 Ibid. O período de atuação da revista foi dividido em três fases: a primeira corresponde ao período delimitado entre 1966 e 1968; a segunda fase compreende os anos de 1969 a 1973, e, por fim, a terceira e última fase abarcou os anos de 1973 a 1976. Nesta fase, a revista teve uma considerável alteração de sua linha editorial e abandonou as grandes reportagens que a tornaram conhecida.28 28 Migotto Filho (2021). Vejamos, de modo sucinto, as principais características das duas primeiras fases, que se mostram mais relevantes para compreender o contexto de produção do nosso estudo de caso.

A primeira fase é a mais comentada e analisada na bibliografia sobre a revista devido à ousadia das reportagens, que abordaram temas como prostituição, homossexualidade, pílulas anticoncepcionais e, ainda, perfis de algumas personalidades expoentes da esquerda. Tais reportagens agradavam a seu público progressista e garantiam significativa repercussão pública, que se revertia em números de vendas.

Entretanto, houve momentos em que a revista buscou legitimar discursos conservadores e figuras centrais do governo federal. O pesquisador Jonas Migotto Filho identifica que essas legitimações estão presentes, sobretudo, nos perfis dos ditadores escritos pelo repórter Luiz Fernando Mercadante, que tinha maior trânsito em setores mais tradicionais e com os militares que estavam no poder, como os presidentes Humberto de Alencar Castelo Branco, Artur da Costa e Silva e Emílio Garrastazu Médici.29 29 Ibid., p. 4. No entanto, os depoimentos de jornalistas da revista afirmam que era importante publicar reportagens que bajulassem os líderes do governo ou apresentassem visões positivas do momento vivido pelo país para garantir a continuidade do periódico.30 30 Faro (1999, p. 85)

A situação começou a mudar com a censura direta de determinadas reportagens,31 31 “A juventude diante do sexo”, de Pacheco Duarte, publicada no n. 5 da revista (agosto de 1966) e a “A mulher brasileira, hoje”, publicada no n. 10 da revista (janeiro de 1967). acusadas de serem obscenas pelo Juizado de Menores.32 32 Migotto Filho, op. cit., p. 2. Em um contexto político cada vez mais repressivo, os temas polêmicos chamaram a atenção dos generais, que pressionaram para que houvesse autocensura da revista, com o aval de importantes diretores33 33 São eles: Victor Civita (proprietário da editora), seus filhos Robert Civita (diretor da Realidade) e Richard Civita, Luis Carta (diretor editorial), Domingo Alzugaray (diretor da divisão de revistas) e possivelmente o advogado Edgard de Sílvio Faria, diretor-responsável da Abril, que após a saída da equipe assumiu a função de censor (SEVERIANO, 2013, p. 296-297). da Abril.34 34 Severiano (op. cit., p. 286). Tal prática já acontecia nos bastidores, antes de 1968, mas se intensificou após o ultimato dos dirigentes da editora.35 35 Marão (2010, p. 17). Esse fato acabou ocasionando perseguições e uma série de pedidos de demissão dos principais jornalistas e editores da revista, encerrando o que ficou conhecido como sua primeira fase.36 36 Severiano (op. cit., p. 15).

A segunda fase da Realidade compreende os anos de 1969 a 1973. Durante esse período, a revista teve que lidar com a censura imposta pelo AI-5, o que a obrigou a diminuir o tom polêmico, mas não a abandonar as grandes reportagens que a tornaram reconhecida. Não foram encontrados estudos mais aprofundados sobre essa fase, o que nos levou a realizar um levantamento preliminar na imprensa da época. Embora essas informações sejam escassas, elas são relevantes para entender o contexto em que a revista Realidade se encontrava, especialmente em relação à censura e ao controle dos militares.

A primeira informação refere-se ao posicionamento de Milton Coelho, então diretor da Realidade. No dia 22 de novembro de 1971, mês subsequente ao lançamento da edição especial sobre a Amazônia, Coelho participou de um debate sobre censura na imprensa, na cidade de São Paulo. Ao comentar sobre a publicação de documentos confidenciais do governo estadunidense em jornais, o diretor afirmou que era necessário “procurar uma forma de censura adequada”, que deveria ser “exercida pela coletividade”37 37 “Imprensa…” (1971, p. 25). , indicando que a censura deveria ser objetivo de outros setores da sociedade e não apenas dos censores do governo. A controversa afirmação nos leva a crer que o diretor da revista manteve alinhamento com os militares ao explicitar sua defesa da prática de autocensura.

Entretanto, essa abordagem não foi suficiente para os militares. Em abril de 1973, foi decretada uma portaria que obrigava o registro prévio de todas as revistas nacionais ou estrangeiras que circulassem em território nacional na Divisão de Censura e Diversões Públicas (DCDP) do Departamento da Polícia Federal. Caso a Polícia Federal julgasse que as publicações fossem “contrárias à moral e aos bons costumes”38 38 “Buzaid…” (1973, p. 5). , seus exemplares deveriam ser incinerados. Um dos estopins para a publicação da portaria foram os supostos “efeitos morais negativos causados à população brasileira”39 39 “Censura…” (1973, p. 2). por uma reportagem sobre impotência masculina publicada na Realidade de abril de 1973.

No que se refere à presença da fotografia40 40 Os principais fotógrafos que passaram pela Realidade foram os brasileiros Walter Firmo, Geraldo Mori, Jorge Butsuem e Amancio Chiodi, os estadunidenses George Love, David Drew Zingg e Lew Parrella, os ingleses Maureen Bisilliat e Roger Bester, o italiano Luigi Mamprim, o francês Jean Solari e a suíça Claudia Andujar, que se naturalizou brasileira em 1976. na revista, José Hamilton Ribeiro41 41 Ribeiro (2010). defende que Realidade contribuiu para o fotojornalismo no Brasil ao buscar apresentar fotografias tidas como mais “jornalísticas”, distanciando-se do modelo encenado, apresentado na revista O Cruzeiro, ou com grande apelo visual, que era recorrente na revista Manchete. Claudia Andujar42 42 Andujar (2013). ainda afirma que o trabalho cotidiano dos fotógrafos da revista era feito com a autonomia e independência em relação ao trabalho dos jornalistas.

Segundo o pesquisador Ângelo Manjabosco, a revista foi inicialmente concebida com foco nos textos, e a valorização da fotografia surgiu ao longo do tempo. Nesse processo, fotógrafos estrangeiros como Lew Parrella, David Zingg e George Love, dos Estados Unidos, foram essenciais. De acordo com o pesquisador, esses fotógrafos introduziram no Brasil novas práticas relacionadas à linguagem fotográfica e ao processo de edição das imagens.43 43 Manjabosco (2016, p. 130).

Manjabosco questiona o caráter autoral atribuído aos fotógrafos da revista, ao constatar que os temas das fotografias eram originados em reuniões de pauta, nas quais todos os integrantes da equipe participavam. Isso revela um processo de produção coletivo e diverso, o que enfraquece a ideia de autoria individual das imagens na revista. No entanto, o pesquisador também observa que os fotógrafos desfrutavam de certa liberdade criativa e confiança em seu trabalho. Essa condição possibilitou o desenvolvimento de um olhar parcial, crítico e interpretativo de profissionais como Claudia Andujar, nascida na Suíça e naturalizada brasileira, e Maureen Bisilliat, de origem inglesa.44 44 Ibid.

Considerando especificamente as contribuições de George Love e Claudia Andujar para a Realidade, é possível concluir, por meio da bibliografia consultada, que ambos foram figuras proeminentes que ajudaram a moldar o papel da fotografia na revista. Para a pesquisadora Thais Camargo, George Love e Claudia Andujar

encontraram [na revista] cenário propício para desenvolverem a habilidade de contar histórias de maneira criativa e pouco óbvia. Ou melhor, exercitaram a capacidade de oferecer uma impressão da história que queriam contar, quebrando com certos paradigmas do uso da fotografia em reportagens.45 45 Camargo (2023, p. 102).

Para Douglas Canjani, as fotografias de Love estabeleceram “uma linguagem inusitada no ambiente jornalístico, com fotos ‘borradas’ ou abstratas que não correspondiam aos critérios clássicos do fotojornalismo apoiado na verossimilhança documental”46 46 Canjani (2015, p. 6). . Marcelo Eduardo Leite47 47 Leite (2013). afirma que a atuação de Love na publicação foi marcada pela ousadia, devido a suas ligações com fotógrafos de Nova York de tendência abstrata. Segundo ele, as imagens subvertiam a vertente documental estabelecida historicamente pelo fotojornalismo. Isso se deve aos efeitos de captação, revelação e impressão que Love utilizava em suas fotografias, nas quais o uso da cor era notável e evidente.

Já Claudia Andujar48 48 Andujar, op. cit. ficou conhecida como uma fotógrafa que não hesitava em abordar temas desafiadores. Ela produzia fotografias de lugares de difícil acesso, situações tensionadas e temas polêmicos, como áreas de prostituição, locais clandestinos frequentados por homossexuais e levantes negros nos Estados Unidos. José Carlos Marão49 49 Marão (2013). destaca a dramaticidade e o impacto visual recorrentes nas fotografias de Claudia Andujar. Por sua vez, a pesquisadora Aline dos Santos Nogueira identifica que as mulheres são personagens centrais nas fotografias de Andujar na Realidade, ressaltando que a fotógrafa produziu representações que humanizaram suas retratadas, evitando estereótipos recorrentes na imprensa da época.50 50 Nogueira (2020, p. 111).

A EDIÇÃO ESPECIAL SOBRE A AMAZÔNIA

Mais de um ano antes de seu lançamento, a Realidade Amazônia já chamava a atenção da imprensa. Segundo nota51 51 Fernandes (1970, p. 3). publicada em maio de 1970, no jornal Tribuna da Imprensa, a edição especial teria sido “acertada” definitivamente com o ex-deputado Mário Palmério, referindo-se à possível importância do político na concepção da revista.

Palmério foi escritor, deputado na região de Uberaba, MG, e assumiu o cargo de embaixador do Brasil no Paraguai, nomeado pelo presidente João Goulart em 1962. Entretanto, com o golpe de 1964, Palmério deixou a função. Em 1969, embarcou em uma viagem à floresta amazônica, onde permaneceu por um período de um ano. Posteriormente, proferiu palestras na Europa sobre a região e se autodenominou o “maior conhecedor da Amazônia em todo o mundo”52 52 Costa ([20--?]). .

Em agosto de 1972, Palmério afirmou ser utópica a ideia de se preservar o “índio do contato com a civilização”53 53 Ibid. , uma vez que não se podia deter o desenvolvimento e integração da Amazônia. Entretanto, o político pontuava a necessidade de se adotar uma série de proteções aos povos originários para que fossem evitadas as invasões dos territórios por empresas e mineradoras. Tais proteções deveriam ocorrer através de forte policiamento das áreas indígenas e de ações de frentes de atração e pacificação para evitar conflitos.

Ao analisarmos a posição de Palmério, podemos perceber que a questão da inevitabilidade da colonização da floresta é um tema crucial, que provavelmente foi considerado desde o início do planejamento da Realidade Amazônia. Entretanto, é importante ter em conta que tal avaliação não era exclusiva do político. Se Marcos Palmério opinava de modo mais ponderado sobre o assunto, a imprensa em geral demonstrou um apoio explícito aos planos do governo federal de explorar a floresta. Isso ocorreu, sobretudo, através da ampla divulgação da construção da rodovia Transamazônica. Os jornais noticiavam diariamente cada etapa da construção da estrada, que se tornou o símbolo maior da conquista da região. Essa cobertura constante contribuiu para a consolidação de uma imagem positiva do governo militar e reforçou a ideia de que o país estava atravessando um momento de prosperidade, graças aos altos índices de crescimento econômico que possibilitavam a construção de obras faraônicas.54 54 Cf. Silva, Silva e Smith Júnior (2018), Braga e César (2019).

A partir das reflexões do historiador Magno Michell Marçal Braga, os pesquisadores José Valtemir Ferreira da Silva, Francisco Pereira Smith Júnior e Aline Costa da Silva defendem que essa relação entre imprensa e governo militar se converteu em “uma espécie de prostituição midiática, em que mesmo os jornais menores, por ideologia, troca de favores ou sob os riscos de perseguição corroboram da mesma forma que o projeto político econômico do governo”55 55 Silva, Silva e Smith Júnior, 2018, p. 107). . Isso nos leva a compreender que a defesa da colonização do território feita pelos jornalistas na Realidade Amazônia não era um caso isolado, mas um dos elementos da construção daquilo que Marilena Chauí denominou de verdeamarelismo. Entretanto, veremos como os fotógrafos da revista apresentam um discurso dissonante, especialmente no que se refere à Transamazônica.

A edição especial integra a segunda fase da revista (1969-1973), correspondente ao período de maior repressão por parte dos militares, que forçaram uma mudança de abordagem dos conteúdos publicados. É o momento, portanto, no qual a Realidade ainda manifestava o desejo de mostrar o país aos seus leitores, mas de uma maneira positiva, esperançosa e até ufanista, alinhando-se ideologicamente ao governo militar. Entretanto, é mantida, ainda, uma estrutura semelhante à da primeira fase, com reportagens extensas baseadas em pesquisas consistentes.

Durante a segunda fase, a revista viu seus números de venda caírem consideravelmente. Isso possivelmente se deveu à dissolução da equipe que garantiu o sucesso na primeira fase, o que ocasionou o fim das reportagens com os controversos temas que tornaram a revista conhecida. Na tentativa de reverter essa situação, iniciou-se a produção de números especiais, dentre os quais podemos citar a edição sobre as cidades brasileiras (maio de 1972), sobre o Nordeste (novembro de 1972) e a própria edição sobre a Amazônia, a primeira a ser lançada. Esta demandou o maior investimento da Editora Abril em uma única edição, transformando-se em sucesso de vendas, com todas as mais de 300 mil cópias esgotadas na primeira semana.56 56 Pereira (2013). O reconhecimento da revista não veio apenas das vendas, mas também por meio de premiações. A Realidade Amazônia ganhou três categorias na edição de 1972 do Prêmio Esso: melhor equipe, melhor trabalho e melhor contribuição à imprensa.57 57 “Realidade, sete…” (1973, p. 13).

A coordenação da edição especial ficou a cargo do jornalista Raimundo Rodrigues Pereira, que já havia trabalhado em edições publicadas em 1968 e 1970. A equipe foi composta por mais de quarenta pessoas,58 58 Os nomes da equipe completa da revista podem ser encontrados em Realidade (1971, p. 32), disponível em: https://bit.ly/41OahlD. Acesso em: 10 set. 2023. com diversos jornalistas59 59 Os repórteres foram Carlos Azevedo, Domingos Meirelles, Octavio Ribeiro, J. P. Martinez, Hamilton A. F., R. R. Pereira, Norma Freire, Luís Carlos Bardawill. A coordenação da equipe em Belém foi feita por Sérgio Buarque. A coordenação em Manaus foi feita por Roberto Dantas. A pesquisa foi feita por Lúcio Flavio Pinto, Palmério Vasconcelos e Fernando Gomes. Ainda houve as colaborações especiais de José Hamilton Ribeiro, Sergio Ribeiro Pompeu, Milton Severiano, Geraldo Mayrink, Antônio Euclides, José Carlos Marão e de Mino Carta na supervisão. e seis fotógrafos,60 60 . Os fotógrafos foram Maureen Bisilliat, Claudia Andujar, George Love, Amancio Chiodi, Darcy Trigo e Jean Solari. que viajaram milhares de quilômetros, visitaram dezenas de cidades e entrevistaram diversos líderes políticos e empresários da região,61 61 Cf. Carta (1971, p. 30). tendo permanecido por seis meses na floresta. Considerando os períodos de preparação, produção e finalização, a equipe levou entre dez e doze meses para concluir a edição da revista.62 62 Cf. Pereira, op. cit.

Raimundo Rodrigues Pereira pontua a ousadia e grandeza do projeto, pois na época não havia, especialmente no jornalismo, nenhum trabalho sobre a região amazônica com a densidade que a revista se propôs a fazer. Sobre o conteúdo das reportagens, o jornalista afirma que a equipe teve que ser muito habilidosa e objetiva, evitando interpretações que poderiam incomodar os militares.63 63 Ibid. É importante recordar que, nesse período, a revista estava sob a direção de Milton Coelho, que, como já foi apresentado, era alinhado às práticas de autocensura impostas pelos militares.

Durante os seis meses que permaneceram na floresta, foram produzidas mais de 30 mil fotografias, que depois foram editadas nas 342 páginas, cuja maioria é colorida, de grande formato, com 23,8 x 30,5 cm. Segundo Raimundo Rodrigues Pereira, a edição das imagens durou dois meses e ocorreu em sua casa e na de Claudia Andujar e George Love. O casal teve papel central na seleção das imagens, juntamente com a fotógrafa Maureen Bisilliat.64 64 Ibid.

A revista apresentou por volta de quinhentas fotografias. Entretanto, uma observação mais detida indica que pouco mais da metade integra os inúmeros anúncios estampados nas páginas, capa e contracapa.65 65 A revista contém um total de 494 fotografias, variando em tamanhos distintos. Algumas ocupam uma página inteira, enquanto outras são menores, ocupando apenas alguns centímetros da página, geralmente como detalhes em anúncios. Dessas 494 fotografias, 254 estão nos anúncios da revista, enquanto 240 fazem parte das reportagens, ensaios e capa. Portanto, cerca de 51,42% das fotografias apresentadas na Realidade Amazônia estão integradas a anúncios. Os 48,58% restantes consistem em fotografias produzidas pela equipe de fotógrafos da revista. É possível que um olhar mais desatento não perceba que muitas das fotografias presentes na edição não foram produzidas pela equipe de fotógrafos.

Essa análise quantitativa revela a existência de uma espécie de amálgama que envolve o discurso dos jornalistas, do governo militar e das empresas anunciantes. No entanto, as fotografias produzidas pelos fotógrafos da revista66 66 As autorias das fotografias foram atribuídas de acordo com as informações presentes na própria revista. A única exceção foi a fotografia presente na figura 12, de Amancio Chiodi, cuja autoria foi informada pelo próprio fotógrafo por meio de uma conversa em uma rede social. , em alguns momentos, desestabilizam a narrativa que defende enfaticamente a ocupação da floresta. Vejamos como essa complexa relação se estabelece, primeiramente na capa e, posteriormente, nas reportagens67 67 As reportagens da revista não têm autoria atribuída. e ensaios68 68 Seguiremos as categorizações definidas pelo pesquisador Angelo Manjabosco em seu estudo sobre a fotografia nas edições da primeira fase da revista Realidade. Essas categorias se mostram relevantes, visto que percebemos a persistência desses padrões na Realidade Amazônia. Manjabosco destaca que o layout da revista se baseia principalmente em dois modelos distintos: reportagens e ensaios. Nas reportagens ocorre uma fusão entre o texto e as imagens fotográficas, enquanto nos ensaios há um conjunto de fotografias que podem ou não ser acompanhadas por um texto menos denso que o das reportagens (Manjabosco, op. cit., p. 86-91). que integram as sete seções da revista.69 69 Ao analisarmos as reportagens e ensaios que compõem a edição especial da Realidade Amazônia, é possível identificar que elas foram divididas em sete seções. As seções são as seguintes: seção introdutória, sem título (p. 7-69); “Amazônia, ontem” (p. 70-86); “Amazônia, hoje” (p. 87-118); “Amazônia, amanhã” (p. 119-140); “Amazônia, problemas” (p. 141-230); “Amazônia, Indicações” (p. 231-326) e, por último, o suplemento “A conquista da última fronteira: o mais poderoso rio do mundo”, com 8 páginas.

A capa

Comecemos nossa análise pela capa (Figura 1). Ela é formada por uma página dupla que se dobra. Quando dobrada, vemos a capa tradicional da revista, com destaque para o simétrico rosto de uma jovem indígena, em primeiríssimo plano, que nos encara. O retrato foi produzido por Claudia Andujar. A simetria também é utilizada em todo o layout da capa. O título da revista é da cor verde, e o tema, “Amazônia”, foi impresso com a cor amarela, já demonstrando determinado ufanismo da edição. Ao abrirmos a dobra, vemos uma fotografia aérea, de autoria de George Love, do rio Paru, afluente do rio Amazonas, no estado do Pará. Sobre a foto, uma legenda refere-se às duas imagens: “A corredeira do rio Paru d’Oeste, afluente da margem esquerda do Amazonas, desenha uma figura humana no verde da floresta. Ao lado, menina uaicá,70 70 Grupo indígena que hoje é conhecido como Yanomami (SARMENTO, 2019, p. 48). do alto rio Negro”. Diante da sugestão da legenda, o enquadramento e o ângulo da imagem aérea do rio Paru permitem reconhecer braços, pernas e até uma cabeça humana no desenho do sinuoso rio.

Figura 1
Capa dupla da edição especial da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografias de Claudia Andujar e George Love.

Ao virarmos essa dupla capa, há em seu verso um anúncio publicitário da Petrobrás (Figura 2), empresa estatal de petróleo. O anúncio não é aleatório, e integra-se à capa da revista, tornando-se uma espécie de terceira capa. A imagem do anúncio faz referência direta à foto de Andujar, na medida em que também apresenta o rosto de uma jovem indígena em primeiríssimo plano. Mas, diferentemente da primeira, essa nova personagem tem um sorriso aberto e aparece colocando flores em seu próprio cabelo. Seu olhar encara a câmera com tranquilidade, demonstrando que já estava habituada a ser retratada. A frase na parte superior da página dupla reforça a escolha das duas imagens de crianças como metáforas para o futuro promissor: “O amanhã está chegando”. À esquerda da menina, há outro texto que podemos considerar como uma espécie de legenda: “O homem brasileiro aceitou o desafio da floresta densa, para construir um país mais forte. Integral. Total. Para nossos irmãos da Amazônia, o amanhã será diferente. E êste amanhã já está chegando”.

Figura 2
Anúncio da Petrobrás presente no verso da capa dupla da revista Realidade, de outubro de 1971.

A Petrobrás ocupou importante papel estratégico durante a ditadura militar, recebendo forte investimento. Ela foi considerada pela cúpula das Forças Armadas como uma das instituições indispensáveis à segurança nacional, com o objetivo de colaborar com a emancipação econômica do país.71 71 Cf. Praun e Costa (2016). Dessa maneira, o texto do anúncio da petrolífera evidencia as principais funções estratégicas da empresa, assim como estabelece, logo de início, o tom verdeamarelista da revista. Este tom, por sua vez, explicita o vínculo ideológico com o regime, que via na exploração da floresta a peça-chave para que o Brasil finalmente alcançasse a condição de país do futuro. As fotografias de Andujar e Love, nesse caso, reforçam esse discurso.

Além desse anúncio, existem dezenas de outros que dominam pouco mais de um terço72 72 Considerando a capa, a revista tem 342 páginas. Dessas, aproximadamente 124 são de anúncios, ou seja, cerca de 36% da publicação. Existe uma grande variedade de anunciantes, da qual podemos destacar construtoras (Mendes Júnior S.A., Queiroz Galvão S.A. e Andrade Gutierrez S.A.), bancos (Banco de Londres e Grupo União de Bancos), empresas automobilísticas (Mercedes-Benz e General Motors), além de governos estaduais e prefeituras. da revista, criando uma fusão entre os discursos das reportagens, do governo e das empresas. Afinal, são os empresários que financiam a revista, dentro de um governo com alto poder de controle ideológico. A título de ilustração, apresentamos (Figuras 3a a 3h) alguns exemplos dos inúmeros anúncios da revista que apresentam de modo explícito o entusiasmo das empresas, tanto públicas quanto privadas, com a colonização da floresta.

Figura 3a
Anúncio publicitário da Construtora Mendes Júnior S.A. Realidade, out. de 1971, p. 18-19.

Figura 3b
Anúncio publicitário da Mercedes-Benz. Realidade, out. de 1971, p. 105.

Figura 3c
Anúncio publicitário da AGRIMSA. Realidade, out. de 1971, p. 213.

Figura 3d
Anúncio publicitário da CPRM. Realidade, out. de 1971, p. 227.

Figura 3e
Anúncio publicitário do governo de Goiás. Realidade, out. de 1971, p. 232.

Figura 3f
Anúncio publicitário do Grupo União de Bancos. Realidade, out. de 1971, p. 255.

Figura 3g
Anúncio publicitário da General Motors. Realidade, out. de 1971, p. 275.

Figura 3h
Anúncio publicitário do Banco do Brasil S.A. Realidade, out. de 1971, p. 305.

Na impossibilidade de analisar tantos anúncios, podemos considerar como caso exemplar desse amálgama a própria capa da revista, sobre a qual discorremos anteriormente, sendo ainda possível adicionar outro elemento importante: a “Carta do editor”, escrita por Victor Civita.73 73 Civita (1971).

Em seu texto, o dono da Editora Abril informa que o principal mote da revista é atentar ao fato de que a sociedade brasileira desconhece importantes informações referentes à floresta. Civita entende como absurda a constatação de que “a opinião pública do país acha que ‘os estrangeiros’ podem roubar a Amazônia, mas não tem sequer uma noção razoável sôbre seu tamanho e sua história”74 74 Ibid., p. 3. . Para sanar esse equívoco, ele elenca uma série de dados,75 75 Os dados apontam a construção de mais 12 mil quilômetros de estradas, a instalação ou projeção de mais de trezentas fazendas de gado nos últimos quatro anos, a existência de uma corrida nacional e internacional em busca de minérios na região e ainda a estimativa de migração de mais 100 mil famílias para a região amazônica em cinco anos. buscando comprovar quão desinformado o cidadão brasileiro estaria não apenas no que se refere à floresta, mas também à rodovia Transamazônica. Além disso, é mencionado o potencial da região para produzir alimentos, energia elétrica e água potável em abundância, o que poderia ajudar a mitigar prováveis crises globais de escassez desses recursos no futuro, colocando a floresta em uma discussão de ordem geopolítica.

Desse modo, os dois principais objetivos da revista são devidamente apresentados: “informar corretamente a opinião pública brasileira sôbre o maior de todos os mitos, a Amazônia”, e “documentar o instante mais extraordinário da vida dessa última grande reserva natural do planêta”76 76 Ibid., p. 3. . Civita finaliza seu texto em tom utópico, ao indagar: “A Amazônia não seria o local para a maravilhosa experiência do progresso em harmonia com a natureza? Não seria a nossa ilha da Utopia onde se fará o progresso limpo e colorido que ainda existe no coração de todos os homens?”77 77 Ibid., p. 3. . Tais indagações reiteram o prenúncio de que “O amanhã está chegando” presente no anúncio da Petrobrás.

Esse otimismo não é a única perspectiva apresentada pela revista. É possível também pontuar discursos dissonantes da tônica estabelecida na “Carta do editor”, como no texto “Realidade na Amazônia”, de Luis CartaCARTA, Luis. Realidade na Amazônia. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 30-32, out. 1971.,78 78 O texto integra a primeira seção da revista. diretor editorial da Abril. Para Carta, o objetivo da revista era “documentar de maneira definitiva o momento mais dramático da vida da Amazônia” que estava perdendo sua condição de região isolada ao ser “invadida por estradas, cientistas, colonos, gado, mineradores, industriais”79 79 Carta, op. cit., p. 31. . Desse modo, a revista tinha como proposta mostrar a história da floresta pelo ponto de vista do “herói diário, do seringueiro, do técnico, do pescador, do desempregado, do índio”80 80 Ibid., p. 31. .

Os dois jornalistas apresentam, portanto, visões opostas. Civita defende a colonização, pois vê nela uma possível saída para a exagerada exploração de todo o globo terrestre, mas ressalta a importância de manter determinada harmonia com a natureza. Já Carta afirma que a floresta está sendo invadida e que, para sabermos melhor sobre essa situação, devemos ouvir os moradores da região. Embora a perspectiva de Civita domine a edição, é possível identificar que essa contrariedade de discursos se apresenta com determinada frequência na revista. Veremos que a visão de Civita reverbera, especialmente nos textos, enquanto o ponto de vista de Carta está presente em algumas das fotografias feitas pelo grupo de fotógrafos da revista.

A primeira seção

A primeira seção, sem denominação, apresenta alguns aspectos introdutórios sobre a região. Ela é inaugurada com “Amazônia, Opinião”81 81 “Amazônia, Opinião” (1971). , um texto que procura manter um discurso imparcial ao apresentar diversas perspectivas sobre a colonização da floresta. Isso é feito por meio de trechos de entrevistas com figuras políticas de destaque. São compiladas afirmações que defendem a qualquer custo a construção das rodovias,82 82 Rodrigo Octávio Jordão Ramos, ex-diretor da Escola Superior de Guerra (ibid.). enquanto outras criticam a falta de estudo prévio das construções e pontuam uma preocupação de ordem ambiental.83 83 Olympio Mourão Filho, ex-ministro do Superior Tribunal Militar (ibid.). Sobre a questão indígena, constatam-se desde a defesa da catequização dos povos originários84 84 Rodrigo Octávio Jordão Ramos, ex-diretor da Escola Superior de Guerra (ibid.). até a demarcação de terras.85 85 Oscar Jerônimo Bandeira de Mello, presidente da Funai (ibid.). Entretanto, no geral as opiniões defendem, em graus distintos, a aculturação dos povos.

O primeiro ensaio apresentado na revista recebeu o título de “Viagem ao planêta do verde, da água e do sol”86 86 “Viagem…” (1971). , e é formado por fotografias de paisagens da floresta amazônica. A maioria dessas imagens foram feitas por George Love, porém o ensaio ainda conta com fotografias de Jean Solari, Claudia Andujar e Maureen Bisilliat.

O ensaio se inicia com uma fotografia do pôr do sol (Figura 4), caracterizada por tons quentes. A página onde a imagem está impressa é dupla e se abre em uma dobra, apresentando uma nova imagem (Figura 5). Essa segunda fotografia nos chama a atenção por sua composição. Tirada de um avião, Love a cria a partir de um trecho do rio Amazonas em ângulo não usual, onde o horizonte se desloca para a direita e assume uma posição quase vertical. A fotografia ocupa, portanto, duas páginas, que dividem a composição ao meio. Na primeira página, é possível observar a superfície do rio e um forte reflexo do sol. Na segunda parte da imagem, são retratados o curso do rio, o horizonte, o céu e suas nuvens.

Figura 4
Página dupla (p. 30-31) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de George Love.

Figura 5
Página tripla (p. 32-34) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de George Love.

Essa imagem já nos dá pistas de algumas das fotos que virão, marcadas por enquadramentos pouco usuais. A variedade cromática das fotografias de Love, assim como algumas de suas composições, que tendem à abstração, reforçam a diversidade das paisagens amazônicas que o texto apresenta. Entretanto, em determinadas imagens (Figura 6), o grau de abstração é tão marcante que se fez necessário inserir legendas informativas, cuja objetividade na descrição das paisagens contrasta com as fotografias.

Figura 6
Página dupla (p. 38-9) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografias de George Love.

Esse aspecto abstrato não está presente em todas as fotografias que integram o ensaio. Algumas das imagens, de autoria tanto de Love quanto dos outros fotógrafos, apresentam paisagens da floresta onde é possível reconhecer com facilidade pássaros, árvores e quedas d’água.

Figura 7
Página dupla (p. 46-47) da revista Realidade, de outubro de 1971. A maior imagem é de autoria de Maureen Bisilliat, assim como a imagem do meio, localizada na página 46. A imagem do canto superior esquerdo é de George Love, e a imagem no canto inferior esquerdo é de Jean Solari.

O pequeno texto que acompanha o ensaio procura desvincular a ideia de que a região é um lugar monótono e formado apenas por mato. Para isso, exalta-se sua diversidade e riqueza, assim como a importância para o meio ambiente. É atribuído um aspecto de grandiosidade à Amazônia, sobretudo ao rio Amazonas, destacando também o tamanho da Ilha de Marajó, com seus 48 mil km². Adicionalmente, apresenta-se uma série de números relacionados à fauna e à flora da floresta. Além disso, esboça-se uma visão serena da região: “O viajante pode andar dias na mata ouvindo ruídos misteriosos, mas sem encontrar qualquer grupo de animais”87 87 Ibid., p. 45. . A beleza das imagens, nesse discurso, pode ser entendida como um estímulo a uma visita do público, apresentando a floresta como lugar de paisagens sedutoras e diversificadas - e não o “inferno verde”, como era conhecida de modo geral pelo restante do país - e sem grandes perigos naturais, demonstrando determinado potencial turístico da região.

Por outro lado, a abstração das imagens de George Love também pode ser interpretada como um ponto dissonante dessa perspectiva, uma vez que elas apresentam uma série de elementos que parecem mais confundir do que representar a paisagem amazônica com maior clareza. Em depoimento para o fotógrafo Zé de Boni, Love chegou a comentar sobre as fotografias aéreas feitas para a revista.

O Raimundo Pereira, editor, me perguntava como seria possível fotografar a paisagem amazônica. E eu disse que, do meu ponto de vista, isso só poderia ser feito pelo ar, por causa da imensidão, da necessidade de deslocamentos numa área muito grande para obter uma variedade de imagens. Comparo isso hoje como se recebesse a missão de retratar a Terra. Voando, voando, voando… Quando voltamos com o material e após as primeiras reuniões, nosso intuito era que a revista ficasse fiel à impressão que havíamos tido lá… Eu escondia as fotos que não deseja publicar, como a da Transamazônica rasgando a selva, que o editor esperneava reclamando que eu não fizera, e que a Manchete88 88 A reportagem da Manchete a que George Love se refere pode ser encontrada em: https://bit.ly/3OuDbmj. (Acesso em: 3 ago. 2023.) já havia mostrado com certo furor. Eu tinha a mesma imagem. A edição [da Realidade Amazônia], de uns trezentos mil exemplares, sumiu das bancas no final do segundo dia. No terceiro, estava no mercado negro por três vezes o valor. No quarto dia discutia-se, na editora, a viabilidade de se fazer uma reimpressão. Para mim isso mostrava que, quando o impulso criador jornalístico é encarado com seriedade, vira comercialmente viável. A revista vendia como pipoca, quando se baseava na criação da equipe. Quando se seguia as exigências dos editores, a venda caía. Isso eu posso generalizar em todas as experiências que pude acompanhar. E vejo que hoje, mundialmente, a maioria totalitária dos empresários não quer acreditar nisso. E, na verdade, eles não estão interessados nessa história de verdades pessoais, mas sim em servir interesses próprios e de terceiros. Fazer o que?89 89 De Boni (1994, p. 18).

A declaração do fotógrafo é esclarecedora ao abordar questões fundamentais não só sobre suas imagens, mas também referentes ao processo de produção da revista. Love explica que escolheu fotografias aéreas para capturar a grandiosidade da floresta e optou por não publicar as imagens da construção da Transamazônica, apesar da reação exagerada de Raimundo Pereira. Além disso, a declaração de Love revela que o processo coletivo de produção da revista não ocorria nas edições anteriores, o que pode ter contribuído para as baixas vendas na segunda fase da revista. Sua postura também demonstra uma certa insubordinação, pois ele acreditava que a abordagem do editor para Realidade Amazônia poderia divergir daquela da equipe da primeira fase da revista, que foi a mais bem-sucedida comercialmente.

Importante ainda considerar que a postura de Love refletiu no conjunto de fotografias produzidas pela equipe da revista, uma vez que, como vimos, Love, Andujar e Bisilliat foram figuras centrais no processo de seleção das imagens. Isso se confirma ao verificarmos que, das 32 fotografias que retratam a construção das rodovias federais publicadas na revista, apenas nove foram tiradas pela equipe de fotógrafos, enquanto as outras 23 estão presentes nos anúncios.90 90 Foram localizadas 32 fotografias que retratam a construção de rodovias na floresta, como a Transamazônica e a Manaus-Porto Velho. Dessas, 23 imagens estão nos anúncios, enquanto apenas nove aparecem em reportagens e ensaios. Ou seja, cerca de 72% das fotos que mostram as rodovias atravessando a mata amazônica foram veiculadas em anúncios de empresas e órgãos públicos. As fotos dos anúncios variam em tamanho: três ocupam uma página inteira, oito ocupam entre meia e uma página inteira, três ocupam entre um quarto e meia página e nove têm um espaço menor do que um quarto de página. Referente às nove fotografias apresentadas nas reportagens e ensaios, apenas uma imagem, de autoria de Claudia Andujar, ocupa uma página inteira e uma parte da página seguinte, enquanto as outras ocupam menos de um quarto de página. Algumas dessas imagens de anúncios (Figura 3a a 3h) mostram rodovias em longas perspectivas ou ocupadas por potentes tratores. Essa imagética se contrapõe à apresentada, por exemplo, por Claudia Andujar, que adota uma perspectiva mais humanizadora, retirando o destaque à rodovia para priorizar as pessoas que vivem em condições precárias ao seu redor, como veremos posteriormente.

Essa postura do trio pode ser explicada pelo fato de que todos os fotógrafos que integraram a equipe de Realidade Amazônia participaram do grupo da primeira fase da revista, considerada ousada e progressista. A declaração de Love nos leva a crer que havia um esforço, pelo menos por parte dele, em se manter o estilo de trabalho da equipe da primeira fase, agindo com certa resistência às exigências que foram estabelecidas através de meios repressivos depois de 1968.

A opção por retratar os moradores na região, em sintonia com o texto de Luis Carta, é evidente em várias fotografias presentes na edição da revista. Destacamos, especialmente, aquelas que compõem um mosaico nas páginas 58 e 59 (Figura 8). Nesse conjunto, é possível ver os retratos de diversas pessoas que, segundo a legenda, moravam na beira das estradas e dos rios.

Figura 8 -
Página dupla (p. 58-59) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografias de Amancio Chiodi, Claudia Andujar, Jean Solari e Maureen Bisilliat.

As imagens fazem parte de uma reportagem intitulada “A nossa vida nos trópicos”91 91 “A nossa…” (1971). , que descreve o cotidiano em algumas regiões urbanizadas. Nela, é narrada a experiência dos repórteres nas três maiores cidades da região - Belém e Santarém, no Pará, e Manaus, no Amazonas -, acompanhadas por algumas fotografias desses locais.

O texto, que também se assemelha a uma crônica, comenta determinado charme e decadência das cidades, assim como destaca a convivência dos saberes tradicionais com tecnologias modernas. Além disso, são apresentados relatos sobre o cotidiano de alguns de seus moradores, com destaque para homens brancos migrantes e bem-sucedidos, com uma lista de vantagens de se morar nas cidades e as possibilidades de geração de renda na região. Nesse sentido, as imagens do mosaico diferem do que é apresentado no texto, pois nelas a maioria das pessoas são mulheres e crianças. Apenas três homens são retratados, e nenhum deles é branco. O que fica evidente nas fotografias é a diversidade étnica presente na população amazônica.

A segunda seção: “Amazônia, ontem”

A segunda seção da revista - a menor delas, com 16 páginas - recebeu o título de “Amazônia, ontem”, e conta apenas com o texto “A ocupação do mundo das amazonas”92 92 “A ocupação…” (1971). . Esse artigo destoa de todos outros apresentados, pois é o único feito através de pesquisa exclusivamente bibliográfica e impresso em papel diferente - na cor, formato e gramatura -, sendo disposto como um livreto encadernado em meio às páginas da revista. Nele, é apresentada de forma romantizada a história de cinco homens considerados heróis da região amazônica, todos brancos e oriundos de outras regiões do país ou estrangeiros.93 93 São eles: o explorador espanhol Don Francisco de Orellana, o militar português Pedro Teixeira, a liderança política Eduardo Francisco Nogueira, o jornalista espanhol Don Luís Galvez Rodrigues de Arias, o militar gaúcho José Plácido de Castro e etnólogo alemão Curt Unkel. É possível perceber como é reforçada a presença de não nativos como força motriz do desenvolvimento da região, algo que se torna recorrente na publicação. Desse modo, a revista busca contribuir com um dos principais objetivos do governo militar: incentivar a migração intensa ao apresentar trajetórias - em sua maioria exitosas e até mesmo heroicas - de migrantes. Essa seção não apresenta nenhuma fotografia, apenas algumas poucas ilustrações.

A terceira seção: “Amazônia, hoje”

A seção Amazônia, hoje, que ocupa 31 páginas da revista, apresenta um contraponto aos supostos heróis do passado. Nessa seção, são apresentadas as condições de vida dos ribeirinhos e trabalhadores, que ainda dependem do extrativismo como meio de subsistência.

Os retratos de pessoas moradoras da região se mantêm nessa seção. No entanto, o foco principal está nas situações precárias em que vivem ou nos momentos em que estão trabalhando como extrativistas. Nesse sentido, uma das fotografias de Amancio Chiodi é representativa (Figura 9). A imagem foi feita com uma lente grande angular e retrata uma família que vive na região do lago Aiapuá, no estado do Amazonas. Nela, podemos ver uma numerosa família sentada no chão de uma casa de madeira, com poucas paredes, fazendo suas refeições em círculo. O prato principal, uma caldeira de peixe com farinha, encontra-se ao centro da cena.

Figura 9
Página dupla (p. 92-93) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de Amancio Chiodi.

Se as fotografias denunciam a situação precária dos trabalhadores da região e suas famílias, os textos da seção projetam um contexto mais promissor, em que a extração de recursos naturais seria realizada por meio de máquinas modernas, uma prática que já estava sendo adotada em alguns pontos da floresta. A defesa da industrialização - ou da chamada racionalização da produção - é constante, quando se propõe, por exemplo, que sejam feitas grandes plantações de monoculturas de seringueiras e castanheiras, como em outros países, substituindo as árvores nativas que ocupavam uma área muito maior que as plantações. Embora se mantenha um constante discurso de humanização dos trabalhadores, o que parece estar por trás é a demonstração de que a região, riquíssima em recursos naturais, vivia uma condição de atraso e necessitava urgentemente de investimentos para que enfim pudesse se desenvolver economicamente. Embora seja percebida uma intenção em humanizar as pessoas envolvidas com o extrativismo, a fotografia de Chiodi acaba reforçando o aspecto de precariedade vivido por elas, ampliando o discurso de que os regimes de trabalho no local devem ser industrializados.

A terceira sessão ainda narra94 94 “A fronteira…” (1971). uma viagem de 11.600 km que relata a situação da fronteira da Amazônia brasileira, defendida pelas Forças Armadas, com cada um dos sete países limítrofes: Bolívia, Peru, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa.

A quarta seção: “Amazônia, amanhã”

A quarta seção, “Amazônia, amanhã”, tem como foco o crescimento exponencial da mineração e da pecuária na região, e apresenta perspectivas para o futuro. A primeira fotografia da seção é de autoria de George Love e apresenta uma paisagem aérea marcada pelo uso experimental da cor. Ela integra a reportagem “A caça aos tesouros do subsolo amazônico: o grande acontecimento do mundo da mineração”95 95 “A caça…” (1971). , que conta com apenas duas páginas. Nela, são apresentadas quatro imagens, uma de George Love e três de Amancio Chiodi. A fotografia de Love (Figura 10) é consideravelmente maior que as outras e ocupa grande espaço reservado à reportagem.

Figura 10
Página dupla (p. 120-121) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de George Love (em destaque) e fotografias Amancio Chiodi.

De acordo com o texto, a fotografia “poderia ser proibida”, uma vez que “forneceria pistas para revelar segredos do subsolo amazônico”96 96 Ibid., p. 121. , fazendo referência ao fato de que o RADAM (Radar da Amazônia) produzia imagens semelhantes por meio de um avião especialmente equipado com câmeras e radares capazes de identificar as radiações do solo. O objetivo do governo era levantar dados sobre a geografia e os recursos da região, sobretudo os minerais. Eram dados que interessavam às grandes mineradoras estrangeiras, pois acreditava-se que os anos de 1970 seriam “os da grande corrida aos minérios da Amazônia”97 97 Ibid., p. 121. . Por fim, a reportagem conclui que, apesar das aparências, a fotografia de George Love, feita na região de Santarém, seria inocente, por não ser feita com os equipamentos do RADAM, mas com filme infravermelho.

O RADAM foi a principal fonte de informações sobre a existência das jazidas minerais da floresta, cujas descobertas foram amplamente divulgadas pelo governo militar. De acordo com o jornalista Rubens Valente,98 98 Valente (2017). o projeto era controlado pelo Ministério de Minas e Energia e pelo Departamento Nacional de Produção Mineral, e seu principal objetivo era mapear as potencialidades naturais de uma região com cerca de 1,5 milhão de km2 em torno da rodovia Transamazônica, utilizando tecnologias como radares e filmes infravermelhos. No primeiro bimestre de 1975, o radar detectou sinais importantes da existência de minérios, especialmente urânio e ouro, no território yanomami.

A divulgação dessas descobertas é envolta em declarações polêmicas. Podemos citar, como exemplo, a do então governador de Roraima,99 99 Parte considerável do território yanomami está no estado de Roraima. coronel Fernando Ramos Pereira, datada de fevereiro de 1975: “Sou de opinião que uma área rica como essa não pode se dar o luxo de conservar meia dúzia de tribos indígenas atravancando o seu desenvolvimento”100 100 Ibid., p. 189. .

Em janeiro de 1976, alguns meses depois de confirmar publicamente a presença de urânio na região,101 101 Ibid., p. 190. o ministro do interior, Rangel Reis, fez uma declaração desconcertante que reforçou a perversa política indigenista adotada pelo governo federal. Ele afirmou que os “índios não podem impedir a passagem do progresso”, e previu que “dentro de 10 a 20 anos não haverá mais índios no Brasil”102 102 Comissão Nacional da Verdade (2014, p. 251). .

Esse tipo de declaração dos agentes políticos era frequentemente veiculado na imprensa, reforçando a ideia de que os indígenas eram um empecilho para o desenvolvimento econômico do país. Para o relatório da Comissão Nacional da Verdade, esse entendimento serviu de base para que os direitos humanos dos povos originários fossem violados pelo governo brasileiro.103 103 Ibid.

É nesse contexto que a Terra Indígena Yanomami foi invadida por exploradores. Em 1975, poucas semanas após as divulgações das descobertas do RADAM, os garimpeiros começaram a chegar na região dos Surucucus, e no ano de 1976 já se contabiliza mais de quatrocentos deles e duas pistas de pouso em pleno território.104 104 Valente (op. cit., p. 190).

Jarbas Passarinho, que foi governador do Pará (1964-1965) e senador pelo mesmo estado (1967-1982), reconheceu, em 1993, que em decorrência da descoberta de ouro no território yanomami e da abertura da rodovia Perimetral Norte, metade dos habitantes da aldeia de Catrimani morreram devido a doenças que não são letais para os não indígenas, como a gripe. O ex-governador confirmou que a presença dos garimpeiros poluiu os rios com mercúrio e afastou a caça, causando fome e desnutrição aos indígenas. Passarinho assume: “contra nós avolumava-se a acusação de que praticávamos o genocídio.105 105 Segundo o Relatório da Comissão Nacional da Verdade, foi estimado que cerca de 8.350 indígenas morreram entre 1946 e 1988 (período de investigação da comissão), principalmente entre os anos da ditadura civil-militar, em decorrência de ações diretas de agentes do governo brasileiro ou de suas omissões. Entretanto, o documento afirma ser esse número apenas uma estimativa, uma vez que não foram investigadas ações em diversos territórios indígenas, o que aponta que o número real de mortos pode ser consideravelmente maior (COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE, 2014). Não era exagerada a denúncia”106 106 Ibid., p. 210. .

Na impossibilidade de utilizar o material produzido pelo RADAM, a fotografia de Love emula o tipo de imagem o que órgão produzia. Mesmo tida como inocente, a fotografia causa impacto visual poderoso. Ela se alinha ao conteúdo da breve reportagem e a outras imagens do avião equipado com o radar. Essa associação visa transmitir a mensagem de que o governo brasileiro estava investindo em alta tecnologia que facilitaria a exploração do território por “grandes emprêsas mundiais de mineração”107 107 “A caça…” (1971, p. 121). .

Nessa seção também são apresentadas a maioria das fotografias da Transamazônica e de outras rodovias feitas pela equipe de fotógrafos. Das nove fotografias que aparecem em toda a revista, cinco estão nesse segmento. A maioria delas é pequena, ocupando menos de um quarto da página, mas uma em específico chama a atenção pelo tamanho, composição e cor. A fotografia (Figura 11) é de autoria de Claudia Andujar e integra a reportagem “Estradas: cinco como a Transamazônica”.

Figura 11
Página dupla (p. 124-125) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografias de Claudia Andujar.

A imagem retrata uma mulher acompanhada por quatro crianças. De acordo com a legenda, elas são colonas na Transamazônica e residem nas proximidades da cidade de Altamira, no Pará. As cinco pessoas estão em fila, acompanhando a extensa perspectiva da estrada. As crianças seguram o que aparenta ser um pedaço fino e longo de madeira ou até mesmo um cano, como se estivessem aproveitando restos deixados pela construção da estrada. A mulher, que se encontra no final da fila, evita encarar a lente de Andujar. A criança que lidera o grupo também desvia o olhar. Os pés estão descalços, tocando o chão coberto por pedregulhos. As roupas, as peles das pessoas e a terra têm a mesma cor, como se fossem feitas do mesmo material.

A reportagem ainda conta com mais três outras fotografias de Andujar, nas quais podemos observar trabalhadores envolvidos na hercúlea atividade de construção das rodovias. O texto informa que a ideia de construir uma estrada para ligar os extremos navegáveis dos grandes afluentes da margem direita do rio Amazonas partiu de um dos funcionários do Departamento de Estradas de Rodagem do Pará, o alemão Friedrich Hoepke, tido como “um desses estrangeiros extraordinários que se apaixonaram pela Amazônia”108 108 “Estradas…” (1971, p. 125). . Segundo o texto, o anúncio da construção da Transamazônica ocorreu em junho de 1970, um mês após o falecimento de Hoepke. Além dos planos iniciais, foi acrescentado que a rodovia deveria ligar o “nordeste sêco e supervoado à Amazônia úmida e desabitada”109 109 Ibid. . A estrada, assim como todas as outras que estavam sendo construídas ou planejadas, foi entendida como “uma espécie de convite para a colonização da selva”110 110 Ibid. , e deveria tirar do isolamento as cidades da região.

Desse modo, percebemos a oposição entre as imagens e o texto, especialmente a grande imagem com as colonas na rodovia. Enquanto o texto enaltece a influência dos “extraordinários estrangeiros” no plano de colonização da floresta, as fotografias apresentam as pessoas comuns diretamente envolvidas na construção das estradas. Essas pessoas são tanto moradoras das margens das estradas ou trabalhadores que empregam sua força para contribuir na concretização do plano militar.

O último parágrafo, que encerra a seção, apresenta um resumo do que havia sido discutido ao longo do exemplar e como a revista, especialmente os jornalistas, via com grande empolgação a colonização da região.

Em Altamira termina o nosso filme de andanças pela Amazônia de ontem, hoje e amanhã. É uma história sem conclusão, porque está em andamento. A tentativa atual de conquista definitiva não é a primeira. Mas nunca foi tão espetacular; as maiores companhias mineradoras do mundo investindo e disputando bilhões de cruzeiros; os maiores grupos industriais do sul do país construindo as superpastagens da maior aventura da pecuária mundial no momento; milhares de quilômetros de estradas sendo abertos no coração milenar da floresta; um plano de colonização que prevê um deslocamento humano comparável ao êxodo do povo hebreu. Qual será o resultado? Alguma coisa que pode não ser a melhor nem a desejável, mas que parece grandiosa e destinada a ter grandes conseqüências, foi irreversivelmente disparada na Amazônia.111 111 “Amazônia, amanhã” (1971, p. 136).

A quinta seção: “Amazônia, problemas”

Para entender os possíveis rumos desse plano de colonização, tido como espetacular e grandioso, a revista traz a quinta seção, “Amazônia, problemas”, uma das maiores, com 89 páginas. Esse longo segmento busca apresentar ao leitor não apenas os principais desafios que deveriam ser encarados, como também meios de os resolver.

A primeira reportagem, “Os estrangeiros (um fato) roubam a Amazônia (uma opinião). Roubam mesmo? (uma questão)”112 112 “Os estrangeiros” (1971). , já apresenta no título um recurso retórico que busca retirar os estrangeiros da condição de ladrões da região, como eram vistos de modo geral pela população.113 113 A reportagem, no afã de reconstruir a imagem dos estrangeiros na Amazônia, apresenta uma pesquisa de opinião, encomendada pela revista, que aponta que 68% dos entrevistados acreditavam em uma ameaça estrangeira que almejava dominar a Amazônia, sendo que 38% deles afirmaram que os minérios da região já estavam em mãos estrangeiras. O início do texto destaca a contradição do povo brasileiro, que vê como figuras pacíficas os estrangeiros que fazem parte do cotidiano urbano, e que, ao mesmo tempo, os consideram vilões quando vistos na Amazônia. A reportagem tenta, portanto, conferir ao estrangeiro radicado na floresta uma imagem pacífica. Essa tentativa é feita por meio de um jogo discursivo, estabelecido entre texto e imagem, que demonstra a destreza dos editores em usar a fotografia como ferramenta ideológica. A reportagem conclui: “Finalmente saímos atrás dos estrangeiros. Êles estão nas páginas seguintes”. Ao virarmos a página, temos uma fotografia que ocupa quase a totalidade da página dupla (Figura 12).

Figura 12
Página dupla (p. 172-173) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de Amancio Chiodi.

A fotografia, feita por Amancio Chiodi,114 114 Informação fornecida pelo próprio fotógrafo através de conversa em uma rede social em setembro de 2023. retrata dezenas de crianças brancas, com a maioria sendo loiras. Essa cena nos remete, por contraste, àquela dos ribeirinhos apresentada anteriormente (Figura 9), produzida pelo mesmo fotógrafo. As duas foram feitas com lentes grande angulares, e o ângulo da câmera foi posicionado de cima para baixo. Uma diferença fundamental está na coloração. A fotografia das crianças nativas é em preto e branco, acentuando o caráter dramático da imagem, ao passo que a imagem das crianças estrangeiras é colorida, contribuindo para uma sensação de alegria intensificada pelos sorrisos de muitas delas. As crianças nativas estão retratadas como se estivessem em uma situação de profunda precariedade, enquanto as estrangeiras desfrutam de ótimas condições de vida em plena floresta - ao menos é o que indicam as suas alinhadas roupas. Elas são filhas dos missionários estabelecidos na floresta, de diferentes nacionalidades, entre canadenses, estadunidenses, inglesas e irlandesas.

Nas páginas seguintes, encontram-se fotografias e textos que se referem a estrangeiros adultos levando uma vida simples e ocupando funções como as de missionários, pescadores e até um futurólogo. Tudo sugere que eles seriam tão inofensivos quanto as crianças retratadas na fotografia. Na mesma reportagem, também são abordadas as grandes mineradoras estrangeiras115 115 São citadas as estadunidenses U.S. Steel, Kaiser Aluminum e Bethlehem & Steel, a canadense Alcan, a suíça Alusuisse e a francesa Pechiney. que dominavam a extração de minério de ferro e alumínio. Logo em seguida, um extenso texto116 116 “Dizem…” (1971). descreve o cotidiano do estadunidense Daniel Ludwig na Amazônia, um dos maiores latifundiários no mundo naquela época.

Desse modo, o problema da invasão internacional é tratado como um equívoco, uma vez que a revista procura desmistificar a ideia de que os estrangeiros estariam na floresta para roubá-la. A publicação defende que sem a presença de pessoas de outros países, a região não seria capaz de alcançar o desenvolvimento econômico.117 117 “Os estrangeiros…” (1971). Discurso que remete às operações verdeamarelistas, apontadas por Marilena Chauí, que se referem à condição periférica e subordinada do Brasil frente ao capital internacional.

A seção ainda apresenta diversos outros impasses. A questão da caça ilegal seria resolvida com a criação de animais em cativeiro para posterior exportação118 118 “Imagens…” (1971) e “A lei…” (1971). ou por meio da transformação da região em um local turístico. Embora não detalhadas, as soluções para o desmatamento e a previsão da infertilidade do solo deveriam ser criativas, fugindo do tradicional. Isso também contribuiria para a situação do povoamento da região, promovendo condições mais sustentáveis e atraindo colonos de forma contínua.119 119 “A busca…” (1971). Quanto à instalação de indústrias e à urbanização, a revista apresenta propostas utópicas, que parecem ter sido retiradas de filmes de ficção científica, como a construção de indústrias e cidades móveis que percorreriam rios e céus, utilizando estruturas flutuantes ou sustentadas por balões.120 120 “Morreram…” (1971). O tema das populações indígenas suscitou uma resposta mais crítica da revista, revelando sua discordância em relação às intenções governamentais de integração por meio da reportagem “A última chance dos últimos guerreiros”121 121 “A última…” (1971). , que contou com fotografias feitas por Claudia Andujar.

A fotógrafa viajou durante seis meses para produzir as imagens, percorrendo os 850 km do rio Negro que separam Manaus da cidade de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas.122 122 Ricardo (2005, p. 245). Ainda em Manaus, ela foi informada da morte de um padre salesiano, que trabalhava em uma missão religiosa em Maturacá, uma aldeia yanomami distante 150 km de São Gabriel da Cachoeira. Assim, com o objetivo de registrar os conflitos em torno da morte do padre, a fotógrafa chega à região, mas o contato com os indígenas a faz mudar de pauta. Isso apesar de ela ter sido advertida pelos editores a não produzir fotografias de indígenas, tendo em vista que a situação política da época era sensível.123 123 Andujar (2005). Essa situação aponta que Andujar, assim como George Love, também teve uma postura de insubordinação, ao abordar um tema rejeitado pelos editores da revista.

As imagens124 124 Desde 2015, essas fotografias estão sendo expostas na Galeria Claudia Andujar em Inhotim, um museu de arte contemporânea localizado na cidade de Brumadinho, interior de Minas Gerais. Foram incluídas outras fotografias que não foram publicadas na revista. Elas foram organizadas em uma série intitulada “Maturacá” e foram datadas entre os anos de 1970 e 1971. Para mais informações, consultar Inhotim (2015), disponível em: https://bit.ly/457Kwjd. acabaram sendo publicadas, e uma delas foi escolhida para a capa da revista, como já vimos. Segundo a fotógrafa, elas foram aceitas “porque eram índios bonitos, ainda não havia interferência, eram índios de primeiro contato. Então foi aceito… E esquecemos o padre”125 125 Andujar (2015, p. 243). . Essa é a primeira vez que Andujar fotografa os Yanomami, povo com quem manterá forte relação durante toda a sua trajetória como fotógrafa e ativista.126 126 Persichetti (2008, p. 22).

Ao todo, a reportagem contou com quatro fotografias (Figuras 13 a 16), duas delas ocupando uma página inteira cada. As outras duas foram impressas em páginas duplas, todas sangradas. Segundo o texto, os retratos são dos aharaibus, uma comunidade yanomami127 127 Knobloch (1970). que vivia no alto do Rio Negro, região que seria cortada pela rodovia Perimetral Norte. A fotografia inicial da reportagem (Figura 13) exibe um rosto em close de um Yanomami que nos encara com confiança, como se nos cobrasse por respostas, como bem aponta a pesquisadora Thais Camargo.128 128 Camargo, op. cit.

Figura 13
Página dupla (p. 202-203) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de Claudia Andujar.

Figura 14
Página dupla (p. 204-205) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de Claudia Andujar.

Figura 15
Página dupla (p. 208-209) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de Claudia Andujar.

Figura 16
Página dupla (p. 210-211) da revista Realidade, de outubro de 1971, com fotografia de Claudia Andujar.

O artigo constitui uma das raras críticas explícitas à colonização da região apresentadas na revista. Logo no título, o extermínio se faz presente ao destacar a luta pela sobrevivência daqueles que seriam os últimos remanescentes da floresta. O texto da reportagem ocupa cinco páginas completas e traça um longo histórico dos indígenas em território brasileiro, especialmente na Amazônia, considerada o último refúgio desses povos. Essa trajetória histórica é interpretada como uma tragédia.129 129 “A última…” (1971). São abordadas as explorações e a matança indiscriminada pelas quais os indígenas passaram por três séculos, citando exemplos de escravização na capitania de São Vicente e algumas guerras, como a Guerra dos Tamoios, que resultou na morte de todos os indígenas envolvidos. Também são listados extermínios causados por invasões e doenças, como a varíola. O texto ressalta que essa situação se altera parcamente quando a mão de obra dos indígenas começa a ser substituída pela dos africanos escravizados, mas afirma que ainda ocorreram muitos massacres, alguns deles legalizados, quando houve confronto de interesses por terras indígenas, situação que teria persistido até aquele momento.

A pessoa autora do texto ainda lamenta que o governo brasileiro, durante os anos 1970, tenha adotado uma integração imediata, forçando a população indígena a “participar do esforço do desenvolvimento nacional”130 130 Ibid., p. 212. , destoando de orientações de determinadas convenções internacionais que defendiam uma integração mais lenta, humanizada e voluntária.

Ao final, a reportagem volta a relatar episódios de violência ao afirmar que a construção das rodovias Transamazônica e Perimetral Norte atravessaria diversos territórios indígenas. O texto critica a contraditória política da Funai, que defendia que a assistência aos povos originários não deveria obstruir o desenvolvimento nacional, apontando que o papel da fundação era evitar conflitos.

Claudia Andujar optou por apresentar fotografias que contrastam com o discurso denunciatório da reportagem, visto que os Yanomami estão representados em situações cotidianas de repouso, afeto e alegria. Ao serem justapostas ao texto, essas imagens ganham um aspecto melancólico, pois registram momentos de uma tranquilidade que estaria próxima do fim. A última imagem da reportagem apresenta um detalhe que pode passar desapercebido, mas é representativo.

Na fotografia (Figura 16), uma mulher mexe nos cabelos de um homem, enquanto ele segura um bebê que, por sua vez, está sendo amamentado por ela. Tanto a mulher quanto o bebê usam colares indígenas. Já o homem tem um terço católico em seu pescoço, com a cruz posicionada na altura de sua barriga. Isso sugere que os Yanomami da região estavam em contato com religiosos. É notável que o homem tenha trocado o colar indígena por um terço, um gesto que simboliza como os missionários atuaram para substituir a cosmovisão e cultura yanomami pelos ensinamentos da fé católica.131 131 Davi Kopenawa relata alguns dos conflitos enfrentados pelos Yanomami com as missões religiosas em seu livro A queda do céu. O xamã descreve a chegada dos primeiros missionários estadunidenses na região do rio Demini, no norte do estado do Amazonas, e seus esforços para evangelizar os indígenas, persuadindo-os a abandonar certos rituais tradicionais de seu povo. Cf. Albert e Kopenawa (2016).

Passados mais de cinquenta anos da publicação, é possível afirmar que a pessoa autora da reportagem tinha razão ao temer o extermínio dos Yanomami em decorrência da colonização da floresta amazônica. Centenas de pessoas foram atingidas diretamente com a construção da Perimetral Norte. Segundo o Relatório da Comissão Nacional da Verdade, a Funai não realizou campanhas de vacinação adequadas e não promoveu ações de controle sanitário para os trabalhadores que entraram em contato com os Yanomami. Além disso, houve falhas consideráveis no controle do acesso de pessoas não autorizadas na região, no apoio às missões religiosas que auxiliavam os indígenas e no fornecimento de suporte adequado para lidar com os momentos de crise durante o período de construção da estrada.132 132 Comissão Nacional da Verdade, op. cit.

O xamã Davi Kopenawa deu um depoimento sobre a tragédia causada pela construção das estradas.

Eu não sabia que o governo ia fazer estradas aqui. Autoridade não avisou antes de destruir nosso meio ambiente, antes de matar nosso povo. […] A Funai, que era pra nos proteger, não nos ajudou nem avisou dos perigos. Hoje estamos reclamando. Só agora está acontecendo, em 2013, que vocês vieram aqui pedir pra gente contar a história. Quero dizer: eu não quero mais morrer outra vez.133 133 Ibid., p. 234.

O contundente depoimento do líder yanomami não apenas evidencia a revolta de seu povo, mas também sua força e resistência ao sobreviver a tantos ataques sistemáticos.

A sexta seção, “Amazônia, Indicações”, e o suplemento especial

A sexta seção da revista, “Amazônia, Indicações”134 134 “Amazônia, Indicações” (1971). , configura-se como um panorâmico guia informativo, com a apresentação de dados que indicam a grandeza da floresta. Segundo um anúncio veiculado no Jornal do Brasil, esse segmento foi desenvolvido para o público escolar,135 135 “Pequena…” (1971). o que explica seu caráter enciclopédico. Nela, há uma presença massiva de anúncios, que por vezes se confundem com os textos. Estes, por sua vez, têm a função de apresentar dados sobre a região, mas também de esclarecer equívocos acerca de animais perigosos e doenças, informando ao provável leitor que desejasse colonizar, ou apenas visitar a região, que a viagem e a estadia poderiam ser encaradas com mais tranquilidade. Os dados são organizados em três grandes grupos divididos em assuntos específicos: ambiente (clima, relevo, rios, floresta, fauna, salubridade e população), economia (extrativismo, agricultura, pecuária, indústria, madeiras, minérios, estradas, portos e pesquisa) e turismo (barcos, roteiro, comidas, frutas e a Zona Franca de Manaus). As fotografias que integram essa seção são, na grande maioria, dos anúncios. Nelas, é possível observar estradas de terra no meio da imensidão da mata, rebanhos de gado, carros e caminhões. As poucas fotografias produzidas pela equipe da revista apresentam paisagens áreas, trabalhadores locais e uma plantação da região.

Por fim, temos “A conquista da última fronteira: o mais poderoso rio do mundo”, um suplemento especial com mapas, que configura a última seção da revista. Os mapas impressionam pelo nível de detalhamento: são apresentadas centenas, talvez milhares de cidades, portos, rios, minas, fazendas, além dos trajetos previstos das estradas e alguns curtos comentários sobre diversas regiões.

Analisando de modo geral as sessões, podemos concluir que a revista se encaixa na ideologia verdeamarelista, explicitada por Marilena Chauí, ao investir na ideia de “Brasil Grande”, destinado a atrair investimentos oriundo de outras regiões do país e especialmente do capital internacional. Isso se dá através do estabelecimento de um caminho discursivo que busca defender a colonização da floresta através de sua ocupação industrial, mineradora e agropecuária. As sessões partem do princípio de que não se deve perder a oportunidade de extrair a riqueza que integra nosso território. Os caminhos sugeridos são fundamentados em discursos retóricos que constantemente buscam justificar os motivos da colonização, através de dados que apresentam a grandeza da região e de declarações que revelam a possibilidade de um migrante viver e fazer fortuna na floresta. Em contraposição, são apresentados textos e fotografias que assumem a função de demonstrar a situação de pobreza dos habitantes de um território que, contraditoriamente, é rico em recursos naturais. Assim, a construção acelerada das estradas e a segurança da fronteira, garantida pelas Forças Armadas, contribuiria para a promoção do desenvolvimento econômico da Amazônia e, consequentemente, do país. As projeções para o futuro também são apresentadas na revista com grande empolgação. Ainda são listados os principais desafios que deveriam ser encarados para a colonização, como também meios de os resolver. Alguns desses problemas são tidos como equívocos; para outros, há sugestões de resolução, com ações utópicas e inexequíveis; e ainda há os que apenas são mencionados, com a projeção de resoluções criativas e sustentáveis, sem detalhes de como deveriam ser postas em prática. A revista apresenta ainda um panorâmico guia informativo, com a apresentação de dados que indicam a grandeza da floresta e mapas que detalham a região, que parecem funcionar também como meio para que os empresários se sintam incentivados a explorar a floresta.

No que se refere às fotografias, pudemos observar que elas nem sempre se alinham a esse discurso. Talvez seja por esse motivo que elas tenham passado a figurar em outros meios, que defendiam as causas ambientais e indígenas de maneira mais explícita.

OUTROS USOS DAS MESMAS IMAGENS

As fotografias produzidas por George Love e, especialmente, Claudia Andujar foram posteriormente utilizadas em diversas ocasiões, mostrando o potencial que as imagens têm em não se alinhar ao discurso ideológico imposto pela Realidade Amazônia. Embora tenham sido usadas, a princípio, em situações que apoiavam a colonização da floresta,136 136 Um caso emblemático é a exposição “Hileia Amazônica”, apresentada no Museu de Arte de São Paulo em 1972-1973 no Museu de Arte de São Paulo (MASP). Cf. Camargo, op. cit., e Silva (2023). posteriormente foram veiculadas em meios que questionam a política dos militares em relação à Amazônia. Entre eles, podemos mencionar o livro A política de genocídio contra os índios do Brasil,137 137 Embora não tenha sido possível manusear um exemplar físico do livro, apuramos que se trata de uma brochura que encaderna suas 46 páginas com um único grampo. O livro tem capa mole e mede 21 x 15 cm. Tais informações foram encontradas na plataforma de vendas de livros AbeBooks, disponível em: https://bit.ly/3Ij2uWl. (Acesso em: 12 maio 2023.) lançado no ano de 1976, que serviu como modo de denunciar internacionalmente138 138 Uma versão prévia do livro em francês chegou a ser enviada a Bruxelas no ano de 1975, na ocasião do segundo Tribunal Penal Internacional, conhecido como Tribunal Bertrand Russel II, que tinha como objetivo denunciar a repressão na América Latina, embora não tivesse legitimidade jurídica (OLIVEIRA, 2015). a violenta política indigenista brasileira. Duas fotografias dos Yanomami feitas por Claudia Andujar, previamente publicadas na Realidade Amazônia, foram incluídas no livro. Uma delas é a fotografia da capa da revista, que integrou a capa do livro (Figura 17), e a outra é um recorte da fotografia que apresenta uma mulher amamentando uma criança enquanto mexe nos cabelos de um homem (Figura 18).

Figura 17
Capa e contracapa do livro A política de genocídio contra os índios do Brasil, com fotografia de Claudia Andujar.

Figura 18
Página dupla do livro A política de genocídio contra os índios do Brasil, com fotografia de Claudia Andujar.

A política de genocídio contra os índios do Brasil foi publicado pela Associação de Ex-presos Políticos Antifascistas (AEPPA), sediada em Portugal.139 139 A AEPPA foi fundada em junho de 1974. A associação era ligada a setores maoístas que se reuniam, a partir de dezembro de 1974, na sede da União Democrática Nacional (UDN), e que posteriormente formariam o Partido Comunista Português (Reconstruído) (PCP(R)) (Oliveira, op. cit.). A publicação foi escrita por antropólogos que optaram por não divulgar seus nomes devido ao regime repressivo no Brasil.140 140 Associação de Ex-presos Políticos Antifascistas (1976). Para eles, o que estava acontecendo na Amazônia caracterizava crime de genocídio. O apelo expresso é muito semelhante ao que clamamos hoje diante das ações do governo do ex-presidente Bolsonaro contra os povos indígenas. Eles pressionavam para que os responsáveis pela política indigenista do governo militar fossem investigados e submetidos a julgamento.141 141 Ibid., p. 40.

Em 1976, quando o livro foi lançado, Claudia Andujar já não atuava como fotógrafa. Seu primeiro contato com os Yanomami redefiniu sua trajetória. A partir daí, ela se dedicou a estudar e fotografar o povo em seu território, realizando estadias que duravam meses. Nesse período, ela já estava profundamente envolvida com os indígenas e contribuía para a luta contra os ataques que sofriam.

Uma das formas que Andujar encontrou para contribuir com a defesa dos povos indígenas foi por meio da divulgação de suas fotografias, que foram utilizadas em diversas publicações e cartazes em prol da causa indígena. A capa do livro A política de genocídio contra os índios do Brasil foi uma delas. No ano de 1978, Andujar publicou três livros que também serviram como meios de divulgação da causa indígena. São eles Yanomami: frente ao eterno, com suas fotografias; Mitopoemas Yãnomam, apresentando desenhos feitos pelos Yanomami; e Amazônia, feito em parceria com George Love.142 142 Cf. Silva, op. cit.

Também em 1978, Claudia Andujar cria, em conjunto com o missionário Carlo Zacquini e o antropólogo Bruce Albert, a Comissão para a Criação do Parque Yanomami (CCPY), na qual assume a função de coordenadora.143 143 Nogueira (2018). No ano de 1979, toma a frente da campanha nacional e internacional em defesa do povo Yanomami através da CCPY144 144 Andujar (2005). e entrega ao ministro do interior, Mário Andreazza, o projeto de criação do parque.145 145 Nogueira, op. cit. Entretanto, o território yanomami só foi demarcado treze anos depois, em 1992.

Desde a promulgação, esta demarcação tem sido alvo de diversas tentativas por parte de Jair Bolsonaro para ser revogada,146 146 Cf. Neto (2023). algo que, felizmente, nunca se concretizou. No entanto, o território foi sistematicamente invadido por garimpeiros nos anos de seu governo. É justamente em meio a essa nova e tensa situação que o retrato da jovem yanomami, feito por Andujar, voltou a circular nas bancas de jornal, através do lançamento de uma versão fac-similar de Realidade Amazônia(Figura 19), ocorrido em setembro de 2020.

Figura 19
Capa da edição facsimilar de Realidade Amazônia. Setembro, 2020.

Ao analisar a reedição, percebemos, imediatamente, as diferenças entre ela e a original. A nova edição é consideravelmente mais fina e com formato um pouco menor (20,5 x 26,5 cm). Das 342 páginas originais, sobraram apenas 130. Ao folhearmos a nova versão da revista, percebemos que todos os anúncios foram retirados, o que reduziu um terço de seu volume.

Uma análise mais detida, no entanto, aponta que alguns trechos e reportagens também foram suprimidos. Essas supressões são reveladoras. Entre elas, podemos destacar duas: a “Carta do editor”, escrita por Victor Civita; e a reportagem “Dizem que êle tem um exército secreto no País. Mas o que êle tem é um País”147 147 “Dizem…” (1971). , que descreve a atuação do empresário estadunidense Daniel Ludwig. Vimos que o texto de Civita informa um dos principais objetivos da edição especial, desmistificar a presença estrangeira na Amazônia. Já a reportagem parece ter sido escrita para cumprir esse objetivo, pois narrava como o empresário estava construindo um grande latifúndio148 148 Ludwig era proprietário de um dos maiores latifúndios da Amazônia, com cerca de 1,5 milhão de hectares, que equivalia a metade do território da Holanda. O empresário estava instalando o que ficou conhecido como Projeto Jari, localizado na confluência dos rios Jari e Amazonas, que consistia em uma grande plantação de monocultura para a produção de polpa de papel (“DIZEM…”, 1971, p. 190-196). na floresta. Ludwig foi desenhado como uma espécie de herói contemporâneo, que estaria contribuindo para o desenvolvimento econômico da região, independente da devastação promovida.

Ao considerar essas supressões, entendemos que a editora parece querer apagar de sua trajetória a defesa que fez da colonização da floresta. O texto de apresentação da reedição menciona a “ousadia” da equipe em tratar de assuntos polêmicos como, por exemplo, a Amazônia, “um desses temas espinhosos”149 149 “Realidade, uma jornada…” (2020, p. 4). . Já o texto que encerra a reedição distorce os fatos, ao afirmar que o “Especial REALIDADE Amazônia já alertava sobre a urgência da manutenção dessa grande reserva natural”, apresentando “matérias profundas, que revelavam a abertura de extensas rodovias no coração da região, a instalação de inúmeras fazendas de gado e a corrida em busca da exploração de minérios”150 150 Amazônia (2020, p. 130). . Como vimos, as reportagens da edição original podem até ser consideradas profundas, mas a revista, na realidade, não defendia a preservação da floresta, a não ser em passagens específicas.

Outro ponto importante que deve ser considerado é o momento no qual o fac-símile foi lançado. Apenas entre agosto de 2020 e julho de 2021, uma área da floresta amazônica equivalente a nove vezes o tamanho da cidade do Rio de Janeiro foi desmatada, marcando o ápice de uma década em termos de devastação. Sabemos que essa situação foi sistematicamente apoiada pelo governo de Jair Bolsonaro, que atuou em prol da exploração da floresta e do extermínio das populações indígenas, assim como o governo militar. Ou seja, em um momento que parece ser uma reedição da ditadura, é relançada uma revista que buscou promover justamente os interesses daquele regime. Assusta-nos a similaridade entre o momento atual e aqueles tenebrosos anos de repressão. Preocupa-nos o esforço de certas instituições para apagar as atrocidades promovidas pelos ditadores.

Marcelo Zelic alerta que há um ciclo contínuo de violência e exploração sofridas pelos indígenas que se repete constantemente, desde a época da ditadura militar.151 151 O autor descreve o ciclo em etapas. “A primeira etapa consiste na publicização das ações de combate à situação denunciada. Essa etapa promove outra, a médio prazo, o abafamento do assunto e a saída de foco do problema no país e fora dele. Uma vez o assunto abafado, na próxima etapa, ocorre a desmobilização das ações preventivas, de monitoramento e de repressão adotadas, acompanhadas da precarização da saúde da comunidade. Em meio a isso, acontece em um crescente a etapa de re-invasão do território, a reutilização e abertura de pistas clandestinas para exploração garimpeira e a repetição das graves violações de direitos humanos até que a próxima denúncia consiga chamar a atenção da sociedade no Brasil e no exterior. Cada etapa possui dinâmica própria e tem tempo de duração distinto, que varia de governo para governo, em cada ciclo de repetição do mecanismo.” (ZELIC, 2023, p. 1-2). Segundo o pesquisador, sempre que surge uma denúncia tão grave como a que vimos no início de 2023, um ciclo de ataques contra os indígenas se fecha e inaugura-se um novo. Esse padrão resulta em violações contínuas dos direitos humanos dos Yanomami, que ocorrem há mais de cinquenta anos, devido às explorações predatórias das riquezas presentes em seu território. As ações e omissões do Estado, juntamente com estímulos a terceiros, contribuem para essa perpetuação da violência.152 152 Ibid.

De acordo com Zelic, Bolsonaro é responsável pelo crime de genocídio contra os Yanomami, já que a precarização do sistema de saúde que atendia essas comunidades acelerou o ciclo de desmobilização das ações preventivas. O pesquisador afirma que desde antes da promulgação da Constituição, em 1988, não ocorria uma sabotagem de ações públicas da saúde dos indígenas durante a execução das ações exploratórias.153 153 Ibid.

Esse ataque recente aos Yanomami foi exposto principalmente através de fotografias. As imagens desse extermínio em curso foram amplamente divulgadas. Durante os meses de janeiro e fevereiro de 2023, era comum entrarmos em redes sociais como o Instagram e o Twitter e nos depararmos com imagens de corpos esqueléticos e extremamente frágeis. Algumas dessas imagens que viralizaram foram feitas pelos próprios indígenas ou por profissionais de saúde que conseguiram atuar na Terra Indígena Yanomami, mesmo com a presença de mais de 20 mil garimpeiros ilegais na região. Elas foram publicadas na reportagem “Não estamos conseguindo contar os corpos”, de Talita Bedinelli, Eliane Brum e Ana Maria Machado,154 154 Bedinelli, Brum e Machado (2023). produzida pela plataforma de jornalismo Sumaúma. As jornalistas informam que a divulgação das imagens ocorreu apenas após a obtenção de autorização das lideranças indígenas. Algumas das fotografias mais impactantes não foram publicadas, seja por apresentarem risco de retaliação a seus autores, seja por não se adequarem aos preceitos éticos dos Yanomami.

Esse posicionamento reforça nossa intenção de demonstrar como a fotografia pode ser entendida como uma consistente ferramenta política. Nesse caso específico, ela procurou servir ao desejo dos próprios Yanomami em divulgar a situação de crise vivida, como forma de pressionar o governo e a sociedade civil a tomarem providências. Entretanto, esse controle dos indígenas sobre sua própria imagem fotografada é algo raro. Nesse sentido, é importante ressaltar a importância do trabalho de Claudia Andujar, que se dispôs a conviver com os Yanomami e conquistar sua confiança para depois fotografá-los.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise da Realidade Amazônia nos permitiu constatar que a revista teve como principal função convencer seus leitores de que a colonização da floresta deveria ser feita por empresas privadas, nacionais e estrangeiras, por meio de plantações de monoculturas, instalação de fábricas e abertura de pastos e áreas de mineração. Essa constatação nos permite afirmar que a Realidade Amazônia estava filiada ideologicamente ao governo militar, servindo como meio não apenas para defender a colonização da região, mas também na proposição de como essa exploração deveria ocorrer. Nesse sentido, foi possível observar que a revista levantou uma série de problemas e obstáculos a serem encarados pela sociedade, propondo caminhos que muitas das vezes não eram viáveis. Também pudemos observar como havia uma indissociabilidade do discurso oficial do governo com as reportagens e os anúncios publicitários.

Contudo, percebemos que algumas das fotografias estampadas na revista constituíram elementos dissonantes dentro desse discurso. Verificamos que tanto George Love quanto Claudia Andujar demonstraram certa insubordinação em relação aos editores da revista. Love escolheu ocultar fotografias da Transamazônica, enquanto Andujar fotografou a população indígena, desconsiderando a advertência que recebeu. Também foi notado que o casal, em conjunto com Maureen Bisilliat, adotou uma postura mais autônoma no que diz respeito à seleção das fotografias que integraram a Realidade Amazônia. Isso fica evidente pela representação da rodovia, com poucas imagens e destaque limitado. O grupo optou por apresentar imagens que colocassem os habitantes da região como protagonistas, em consonância com o texto de Luis Carta que mencionamos no início deste artigo. Deve-se considerar que as fotografias selecionadas não são capazes de mostrar a história da Amazônia pelo ponto de vista dos nativos e imigrantes locais, como desejava Carta, uma vez que elas representam a perspectiva dos próprios fotógrafos. Contudo, é evidente que esses fotógrafos buscaram humanizar essa população, frequentemente se opondo à tônica geral de incentivo à colonização predatória adotada pela grande maioria dos textos e dos anúncios.

Mas também foi observado que essa oposição não está presente em todas as fotografias. Algumas delas contribuem para reforçar visualmente os discursos presentes nos textos das reportagens. É importante considerar ainda que a maioria das fotografias estampadas na Realidade Amazônia integram os anúncios, que, em boa parte, fazem uma defesa explícita do processo de colonização. O que se pode concluir é que, no geral, a revista incentiva a colonização da floresta de modo veemente, e, em determinadas passagens, as fotografias da equipe se colocam como um contraponto a esse incentivo.

Essa análise nos parece inédita, pois não identificamos na bibliografia consultada nenhuma referência a um apoio sistemático da revista ao governo ditatorial, a não ser em passagens pontuais, como observado por Migotto Filho,155 155 Migotto Filho, op. cit. nos perfis dos ditadores escritos por Luiz Fernando Mercadante. Há de se considerar que esse alinhamento é consequência direta da repressão promovida pelos militares, que pressionaram a equipe de jornalistas a abandonar os temas polêmicos.

Todas essas questões nos ajudam a compreender o modo como a floresta era vista, não apenas pela Realidade, mas pelos empresários e pelo governo militar. Também ajudaram a construir a opinião pública sobre o que deveria ser feito com a região. É difícil identificar como essa construção se deu, mas o fato de a revista ter sido um grande sucesso de vendas e premiada nos dá pistas de que esse objetivo foi alcançado. Hoje, com a ampla divulgação das pautas das questões indígena e ambiental, pode nos parecer fácil identificar os absurdos estampados nas páginas de Realidade Amazônia. Mas há de se considerar que, naquele período, a defesa de tais ideias parece ter sido naturalizada pela sociedade, de modo geral, e acreditamos que a revista foi um veículo importante de difusão dessa mensagem.

Contudo, as fotografias produzidas para a revista não se restringiram ao respaldo da colonização da floresta. Esse aspecto pode ter sido um ponto crucial para a posterior utilização das imagens em meios que denunciavam a exploração da floresta. Um exemplo notório é o uso das fotografias de Andujar na capa e no miolo do livro-protesto A política de genocídio contra os índios do Brasil, que como vimos, pressionavam para que houvesse um julgamento da trágica política indigenista do governo militar.

Mesmo sob a ameaça da tese do marco temporal,156 156 O marco temporal representa uma abordagem jurídica que sustenta que uma terra indígena pode ser demarcada somente se puder ser comprovado que os povos indígenas estavam presentes nela no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Para muitos especialistas, essa tese é considerada um retrocesso significativo e uma ameaça substancial aos povos originários (Batista, 2023). Em outubro de 2023, o presidente Lula vetou parcialmente a Lei 14.701/23, que ficou conhecida como "PL do Marco Temporal", em conformidade com decisão do Supremo Tribunal Federal de que esta era inconstitucional. Entretanto, a permanência de alguns artigos da lei ainda preocupa algumas organizações indígenas (Pajolla e Moncau, 2023). um movimento similar parece estar ganhando força mais uma vez. A pressão para investigar as ações de Bolsonaro, especialmente em relação aos Yanomami, aumentou significativamente desde a divulgação da situação de crise sanitária apresentada em janeiro de 2023, embora tenha sido ofuscada em meio a tantas outras denúncias de crimes que ocorreram nos anos de governo do ex-presidente. Marcelo Zelic entende que esse período pode ser um momento-chave para que o governo brasileiro abandone de fato a cartilha de extermínio dos povos indígenas repetida desde a ditadura. Um dos indícios dessa mudança é a criação do Ministério dos Povos Indígenas, comandado por Sônia Guajajara, a primeira indígena ministra de Estado. Para o autor, deve ainda haver uma Comissão Nacional Indígena da Verdade para investigar os crimes do Bolsonaro. Zelic entende que, ao repetir a impunidade, os ciclos promotores de genocídio também tendem a se repetir.157 157 Zelic, op. cit.

Embora não possa extinguir esses ciclos, a análise do papel da fotografia dentro deles é capaz de torná-los mais visíveis e, assim, evitar que sejam esquecidos.

Fontes impressas

  • A BUSCA da terra (inferno ou paraíso?) prometida. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 215-224, out. 1971.
  • A CAÇA aos tesouros do subsolo amazônico: o grande acontecimento do mundo da mineração. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 120-121, out. 1971.
  • A FRONTEIRA da aventura. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 106-14, out. 1971.
  • A LEI proíbe. Mas quem cumpre? Realidade, São Paulo, n. 67, p. 164-168, out. 1971.
  • A NOSSA vida nos trópicos. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 50-66, out. 1971.
  • A OCUPAÇÃO do mundo das amazonas. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 71-86, out. 1971.
  • A ÚLTIMA chance dos últimos guerreiros. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 202-212, out 1971.
  • ASSOCIAÇÃO DE EX-PRESOS POLÍTICOS ANTIFASCISTAS. A política de genocídio contra os índios do Brasil. Lisboa: Associação de Ex-presos Políticos Antifascistas, 1976. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Mizzmy Acesso em 13 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3Mizzmy
  • AMAZÔNIA, opinião. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 7-26, out. 1971.
  • AMAZÔNIA, amanhã. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 119-140, out. 1971.
  • AMAZÔNIA, Indicações. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 231-326, out. 1971.
  • AMAZÔNIA. Realidade, São Paulo, p. 130, set. 2020. Edição facsimilar.
  • BRASIL. Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973. Dispõe sobre o Estatuto do Índio. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 21 dez. 1973. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3W73i6l Acesso em 15 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3W73i6l
  • BUZAID manda rever registro de publicações. O Estado, Florianópolis, p. 5, 17 abr. 1973.
  • CARTA, Luis. Realidade na Amazônia. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 30-32, out. 1971.
  • CENSURA exige registro prévio. O Estado, Florianópolis, p. 2, 16 abr. 1973.
  • CIVITA, Victor. Carta do Editor. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 3, out. 1971.
  • COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. Violações de direitos humanos dos povos indígenas. Brasília, DF: Comissão Nacional da Verdade, 2014. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/42GEQLD Acesso em: 08 mai. 2023. Relatório, vol. II, texto 5.
    » https://bit.ly/42GEQLD
  • DIZEM que êle tem um exército secreto no País. Mas o que êle tem é um País. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 190-196, out. 1971.
  • ESTRADAS: cinco como a Transamazônica. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 124-125, out. 1971.
  • FERNANDES, Hélio. Fatos e rumores em primeira mão. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, p. 3, 19 maio 1970.
  • IMAGENS de um massacre. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 157-163, out. 1971.
  • IMPRENSA debate censura. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 23 nov. 1971. Caderno Geral, p. 25.
  • MORRERAM as cidades e o homem. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 150-154, out. 1971.
  • OS ESTRANGEIROS (um fato) roubam a Amazônia (uma opinião). Roubam mesmo? (uma questão). Realidade, São Paulo, n. 67, p. 171-188, out. 1971.
  • PARA o índio, reservas bem policiadas. O Estado de S. Paulo, São Paulo, p. 64, 29 ago. 1972.
  • PEQUENA amostra das coisas fantásticas que a revista Realidade está revelando sôbre a Amazônia. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18 out. 1971. Primeiro Caderno, p. 36.
  • REALIDADE, sete anos e dez prêmios. Realidade, São Paulo, n. 88, p. 13, junho de 1973.
  • REALIDADE, uma jornada que segue atual. Realidade, São Paulo, p. 4, set. 2020. Edição facsimilar.
  • REALIDADE. São Paulo: Editora Abril, n. 67, out. 1971. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3sqD83M Acesso em: 16 maio 2023.
    » https://bit.ly/3sqD83M
  • REALIDADE. São Paulo: Editora Abril, set. 2020. Edição facsimilar.
  • VIAGEM ao planêta do verde, da água e do sol. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 34-47, out. 1971.

Livros, artigos e teses

  • ALBERT, Bruce; KOPENAWA, Davi. A missão. In: ALBERT, Bruce; KOPENAWA, Davi. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. p. 255-273.
  • ANDUJAR, Claudia. A vulnerabilidade do ser. São Paulo: Cosac Naify, 2005.
  • ANDUJAR, Claudia. No lugar do outro. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2015.
  • BRAGA, Magno Michell Marçal; CÉSAR, Martins de Souza. Transamazônica: terra, trabalho e sonhos. Revista Territórios & Fronteiras, Cuiabá, v. 12, n. 1, p. 172-191, 2019. DOI: 10.22228/rt-f.v12i1.898.
    » https://doi.org/10.22228/rt-f.v12i1.898
  • CAMARGO, Thais Lopes. Museu de arte, fotografia e arquivo: a atuação de Claudia Andujar e George Love no MASP (1971-1976). 2023. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3E9JBml Acesso em: 3 ago. 2023.
    » https://bit.ly/3E9JBml
  • CANJANI, Douglas. O fotojornalismo expandido de George Love no Brasil: breve aproximação. Nhengatu: Revista Ibero-americana para Comunicação e Cultura Contra-hegemônicas, São Paulo, v. 2, n. 3, 2015. Disponível em Disponível em https://bit.ly/3YSKSHL Acesso em: 4 ago. 2023.
    » https://bit.ly/3YSKSHL
  • CHAUI, Marilena. Brasil: mito fundador e sociedade autoritária. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2000.
  • CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia?. São Paulo: Brasiliense, 2008.
  • COSTA, Helouise. A invenção da revista ilustrada. In: COSTA, Helouise (org.). As origens do fotojornalismo no Brasil: um olhar sobre O Cruzeiro. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2012. p. 302-323.
  • DE BONI, Zé. Verde lente: fotógrafos brasileiros e a natureza. São Paulo: Empresa das Artes, 1994.
  • FARO, J. S. Realidade, 1966-1968: tempo da reportagem na imprensa brasileira. Porto Alegre: ULBRA/AEG, 1999.
  • FICO, Carlos. História do Brasil contemporâneo. São Paulo: Contexto, 2015.
  • KNOBLOCH, Francis J. The aharaibu indians: a “White” tribe in the Amazon. The Mankind Quarterly, Edinburgh, v. 10, n. 4, p. 185-198, 1970. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/457kfBt Acesso em: 22 jun. 2019.
    » https://bit.ly/457kfBt
  • MANJABOSCO, Ângelo Augusto. O Brasil não é para principiantes: Lew Parrella, George Love e David Zingg, fotógrafos norte-americanos na revista Realidade (1966-1968). 2016. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/45hSSUG Acesso em: 31 jul. 2023.
    » https://bit.ly/45hSSUG
  • MARÃO, José Carlos; RIBEIRO, José Hamilton. Realidade re-vista. Santos: Realejo Edições, 2010.
  • MIGOTTO FILHO, J. A legitimação de Costa e Silva nas páginas da revista Realidade (1966-1967). Oficina do Historiador, Porto Alegre, v. 14, n. 1, p. 2, 29 jul. 2021. DOI: 10.15448/2178-3748.2021.1.39656.
    » https://doi.org/10.15448/2178-3748.2021.1.39656
  • MIRA, Maria Celeste. Constituição e segmentação do mercado de revistas no Brasil: o caso da Editora Abril. CONGRESSO BRASILEIRO DA COMUNICAÇÃO, 21., 1998. Portcom. [S. l.]: Intercom, 1998. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3W8Dirg Acesso em: 23 dez. 2021.
    » https://bit.ly/3W8Dirg
  • NOGUEIRA, Aline dos Santos. Claudia Andujar na busca pela Outra: as narrativas fotográficas sobre a mulher brasileira na revista Realidade. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, 2020. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/47toecK Acesso em: 2 ago. 2023.
    » https://bit.ly/47toecK
  • NOGUEIRA, Thyago (org.). Claudia Andujar: a luta Yanomami. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2018. Catálogo de exposição.
  • OLIVEIRA, Tatiana Gonçalves. Política de genocídio contra os índios do Brasil: memória e contestação contra a política indigenista adotada pelo regime militar (1970-1974). SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, 28., Florianópolis. Anais […]. Florianópolis: ANPUH, 2015. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Oi1eGG Acesso em: 14 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3Oi1eGG
  • PERSICHETTI, Simonetta. Claudia Andujar. São Paulo: Lazuli Editora, 2008.
  • PRAUN, Luci; COSTA, Claudia. Pistas sobre a estrutura e as ações de repressão do Estado Brasileiro no pós 1964 e sua configuração no interior da Petrobras. Revista do Arquivo, São Paulo, n. 2, 2016. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3oaEBcD Acesso em: 21 mar. 2023.
    » https://bit.ly/3oaEBcD
  • RIBEIRO, José Hamilton. Um outro olhar, também nas fotos. In: MARÃO, José Carlos; RIBEIRO, José Hamilton. Realidade re-vista. Santos: Realejo Edições, 2010. p. 414-417.
  • RICARDO, Beto. Norami. In: ANDUJAR, Claudia. A vulnerabilidade do ser. São Paulo: Cosac Naify, Pinacoteca do Estado, 2005. p. 243-249. Catálogo de exposição.
  • SARMENTO, Francisco. O Alto Rio Negro indígena em mais de dois mil anos de história. Revista Brasileira de Linguística Antropológica, v. 11, n. 2, p. 41-72, 2019. DOI: 10.26512/rbla.v11i02.26900
    » https://doi.org/10.26512/rbla.v11i02.26900
  • SEVERIANO, Mylton. Realidade: história da revista que virou lenda. Florianópolis: Insular, 2013.
  • SILVA, José Valtemir Ferreira da; SILVA, Aline Costa da; Francisco Pereira, SMITH JÚNIOR. Migração e colonização da Transamazônica na obra de Odette de Barros Mott. Nova Revista Amazônica, Belém, v. 6, n. 2, p. 103-122, jun. 2018. DOI: 10.18542/nra.v6i2.6194
    » https://doi.org/10.18542/nra.v6i2.6194
  • SILVA, Vitor Marcelino da. A construção coletiva de Amazônia: fotografia e política no livro de e George Love. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3OUwjix Acesso em 25 ago. 2023.
    » https://bit.ly/3OUwjix
  • VALENTE, Rubens. Os fuzis e as flechas: história de sangue e resistência indígena na ditadura. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.

Sites

  • ANDUJAR, Claudia. Claudia Andujar: depoimento. Entrevistadores: Leylianne Alves Vieira e Marcelo Eduardo Leite. Realidade: o fotojornalismo (autoral de uma revista), São Paulo, 2 maio 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Mv9yBF Acesso em: 02 mai. 2023.
    » https://bit.ly/3Mv9yBF
  • BATISTA, Juliana de Paula. Marco temporal: naturalização de um estado de indigência para os povos indígenas. Instituto Socioambiental, [s. l.], 7 jun. 2023. Disponível em Disponível em http://bit.ly/3OvpPWX Acesso em: 10 ago. 2023.
    » http://bit.ly/3OvpPWX
  • BEDINELLI, Talita; BRUM, Eliane; MACHADO, Ana Maria. Diário de guerra: ‘Não estamos conseguindo contar os corpos’. Sumaúma, [s. l.], 20 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3o1XTB0 Acesso em: 10 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3o1XTB0
  • COSTA, Marcelo. Mario de Ascenção Palmério. In: FGV-CPDCOC. Dicionário histórico-biográfico brasileiro. Rio de Janeiro: FGV-CPDOC, [20--?]. Verbete. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/42Fqvz5 Acesso em 29 mar. 2023.
    » https://bit.ly/42Fqvz5
  • HUTUKARA ASSOCIAÇÃO YANOMAMI; ASSOCIAÇÃO WANASSEDUUME YE’KWANA. Yanomami sob ataque: Garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e propostas para combatê-lo. Boa Vista: Hutukara Associação Yanomami, 2022. Dossiê. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3pSpFQE Acesso em: 2 abr. 2023.
    » https://bit.ly/3pSpFQE
  • INHOTIIM. Galeria Claudia Andujar. Brumadinho: Inhotim, 2015. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/457Kwjd Acesso em: 16 maio 2023.
    » https://bit.ly/457Kwjd
  • LEITE, Marcelo Eduardo. Realidade: o fotojornalismo (autoral) de uma revista. 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Wa2tcO Acesso em: 8 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3Wa2tcO
  • MARÃO, José Carlos. José Carlos Marão: depoimento. Entrevistadores: Carla Adelina Craveiro Silva e Marcelo Eduardo Leite., Água de São Pedro, 17 abr. 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3WhXPcT Acesso em: 12 abr. 2023.
    » https://bit.ly/3WhXPcT
  • MELLO, Igor. Tragédia anunciada: Governo Bolsonaro sabia de avanço na Terra Yanomami, mas não agiu. UOL Notícias, 12 maio 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/458HHP6 Acesso em: 12 maio 2023.
    » https://bit.ly/458HHP6
  • MODELLI, Laís. Desmatamento na Amazônia na temporada 2020/2021 é o maior dos últimos dez anos, diz Imazon. G1, 19 ago. 2021. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/43409pY Acesso em: 11 maio 2023.
    » https://bit.ly/43409pY
  • NETO, Lira. Como Bolsonaro planejou extinguir a reserva Yanomami. Jornalistas Livres, 26 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Mxr5ct Acesso em: 9 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3Mxr5ct
  • NEVES, Rafael. Obras da ditadura militar facilitaram invasões à Terra Indígena Yanomami. UOL Notícias, 24 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3OgV4GN Acesso em: 9 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3OgV4GN
  • NUNES, Vinicius. Dino diz ver crime de genocídio contra yanomamis em Roraima. UOL Notícias, 23 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3McdLsx Acesso em: 9 fev. 2023.
    » https://bit.ly/3McdLsx
  • PAJOLLA, Murilo; MONCAU, Gabriela. Marco temporal: veto de Lula barrou principais retrocessos, mas pontos sancionados preocupam indígenas e indigenistas. Brasil de Fato, São Paulo, 25 out. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3SeAsAV Acesso em: 25 out. 2023.
    » https://bit.ly/3SeAsAV
  • PEREIRA, Raimundo. Raimundo Pereira: depoimento. Entrevistador: Marcelo Eduardo Leite. Realidade: o fotojornalismo (autoral) de uma revista, São Paulo, 28 jun. 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3OgGCib Acesso em: 15 abr. 2023.
    » https://bit.ly/3OgGCib
  • PINTO, Lúcio Flávio. A Realidade da Amazônia. Observatório da Imprensa, 15 nov. 2011. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/47EvsuX Acesso em: 9 ago. 2023.
    » https://bit.ly/47EvsuX
  • ZELIC, Marcelo. Justiça de Transição: remodelando práticas do Estado para o Bem Viver. Jornal Grupo Gente Nova, [s. l.], 29 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3IheCHi Acesso em: 10 fev 2023.
    » https://bit.ly/3IheCHi
  • 1
    O artigo é uma versão atualizada de um capítulo da tese de doutorado A construção coletiva de "Amazônia": fotografia e política no livro de Claudia Andujar e George Love, de Vitor Marcelino da Silva, sob orientação da Prof.ª Dra. Helouise Costa, realizada no Programa Interunidades em Estética e História da Arte da Universidade de São Paulo (USP) e defendida no ano de 2022. Foi realizada uma investigação complementar, que resultou nesta nova versão em formato de artigo.
  • 3
    Bedinelli, Brum e Machado (2023BEDINELLI, Talita; BRUM, Eliane; MACHADO, Ana Maria. Diário de guerra: ‘Não estamos conseguindo contar os corpos’. Sumaúma, [s. l.], 20 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3o1XTB0 . Acesso em: 10 fev. 2023.
    https://bit.ly/3o1XTB0...
    ).
  • 4
    De acordo com documentos divulgados pela imprensa, o governo Bolsonaro recebeu um aviso formal sobre a invasão de garimpeiros em território indígena, porém optou por não tomar nenhuma medida. Em agosto de 2022, a Funai elaborou um relatório que identificou mais de oitenta pontos relacionados ao garimpo dentro da Terra Indígena Yanomami. Contudo, o relatório foi arquivado dois dias depois de chegar ao Ministério da Justiça, que na época era comandado por Anderson Torres (MELLO, 2023)MELLO, Igor. Tragédia anunciada: Governo Bolsonaro sabia de avanço na Terra Yanomami, mas não agiu. UOL Notícias, 12 maio 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/458HHP6 . Acesso em: 12 maio 2023.
    https://bit.ly/458HHP6...
    .
  • 5
    Hutukara Associação Yanomami e Associação Wanasseduume Ye’kwana (2022)HUTUKARA ASSOCIAÇÃO YANOMAMI; ASSOCIAÇÃO WANASSEDUUME YE’KWANA. Yanomami sob ataque: Garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami e propostas para combatê-lo. Boa Vista: Hutukara Associação Yanomami, 2022. Dossiê. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3pSpFQE . Acesso em: 2 abr. 2023.
    https://bit.ly/3pSpFQE...
    .
  • 6
    Cf. Nunes (2023NUNES, Vinicius. Dino diz ver crime de genocídio contra yanomamis em Roraima. UOL Notícias, 23 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3McdLsx . Acesso em: 9 fev. 2023.
    https://bit.ly/3McdLsx...
    ).
  • 7
    A partir desse ponto, tal edição será referida como Realidade Amazônia. Uma versão digitalizada da revista na íntegra pode ser consultada em https://bit.ly/3sqD83M. (Acesso em: 16 mai. 2023.)
  • 8
    Cf. Pinto (2011PINTO, Lúcio Flávio. A Realidade da Amazônia. Observatório da Imprensa, 15 nov. 2011. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/47EvsuX . Acesso em: 9 ago. 2023.
    https://bit.ly/47EvsuX...
    ).
  • 9
    Claudia Andujar é uma fotógrafa, artista e ativista naturalizada brasileira. Ela nasceu no ano de 1931, na cidade de Neuchatêl, Suíça, e mudou-se para a cidade de São Paulo no ano de 1955, onde passou a atuar como fotógrafa em diversas revistas brasileiras. Organizou algumas exposições no Museu de Arte de São Paulo (MASP). Desenvolveu uma série de trabalhos em parceria com George Love, com quem foi casada entre os anos de 1968 e 1974. Desde os primeiros anos de sua vinda para o Brasil, procurou fotografar grupos indígenas, mas foi seu contato com os Yanomami, estabelecido no início dos anos 1970, que foi responsável por uma mudança significativa em sua trajetória. Nesse período, abandona sua profissão de fotógrafa e passa atuar como pesquisadora e ativista da causa indígena, criando e coordenando a Comissão para a Criação do Parque Yanomami (CCPY), no ano de 1978. Atualmente, Andujar tem exposto sua extensa produção fotográfica sobre os Yanomami em diversos museus de arte pelo mundo, estabelecendo-se como uma artista de projeção internacional (NOGUEIRA, 2018NOGUEIRA, Thyago (org.). Claudia Andujar: a luta Yanomami. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2018. Catálogo de exposição., p. 274-280).
  • 10
    George Love foi um fotógrafo estadunidense. Ele nasceu na cidade de Charlotte, Estados Unidos, no ano de 1931. Mudou-se para São Paulo em 1966, onde passou a atuar em diversas revistas brasileiras. Também atuou no MASP, em parceria com Claudia Andujar, e ainda desenvolveu uma série de trabalhos para empresas privadas, como agendas, calendários e apresentações audiovisuais. Love foi um dos poucos fotógrafos negros atuantes no Brasil durante as décadas de 1960 e 1970. Durante anos, visitou com frequência a floresta amazônica. Morreu no ano de 1995, na cidade de São Paulo.
  • 11
    Fico (2015FICO, Carlos. História do Brasil contemporâneo. São Paulo: Contexto, 2015., p. 62).
  • 12
    No entanto, essa situação econômica não perdurou por muito tempo. Em 1973, tanto a inflação quanto a dívida externa passaram a crescer consideravelmente. O salário-mínimo estagnou, resultando na diminuição do poder aquisitivo, e ocorreu uma intensa concentração de renda. Cf. Fico, op. cit.
  • 13
    A rodovia, construída entre 1969 e 1974, foi projetada para conectar as regiões Norte e Nordeste do Brasil com Peru e Equador. Inicialmente foi projetada para ter 8 mil km de extensão, entretanto, apenas 4.223 km foram construídos, e de maneira precária, sem pavimentação. Durante a maior parte do ano, a estrada é intransitável, devido às chuvas recorrentes da floresta tropical. A construção dessa e de outras estradas na região Norte do país faz parte do ambicioso Plano de Integração Nacional (PIN).
  • 14
    Fico, op. cit., p. 80-81.
  • 15
    Chauí (2008CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia?. São Paulo: Brasiliense, 2008., p. 24).
  • 16
    Id., 2000, p. 4.
  • 17
    Ibid., p. 4.
  • 18
    Ibid., p. 33.
  • 19
    Ibid., p. 34.
  • 20
    Em referência à classificação de Eric Hobsbawm, em Nações e nacionalismo desde 1780, de que a partir de 1918 até os anos 1950-60 pode-se falar em “questão nacional”, que “enfatiza a consciência nacional, definida por um conjunto de lealdades políticas” em um discurso de nacionalidade que emana principalmente dos partidos políticos e do Estado (Ibid., p. 14).
  • 21
    Ibid., p. 36.
  • 22
    Ibid., p. 32.
  • 23
    Costa (2012COSTA, Helouise. A invenção da revista ilustrada. In: COSTA, Helouise (org.). As origens do fotojornalismo no Brasil: um olhar sobre O Cruzeiro. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2012. p. 302-323., p. 302).
  • 24
    Ibid., p. 315.
  • 25
    Mira (1998MIRA, Maria Celeste. Constituição e segmentação do mercado de revistas no Brasil: o caso da Editora Abril. CONGRESSO BRASILEIRO DA COMUNICAÇÃO, 21., 1998. Portcom. [S. l.]: Intercom, 1998. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3W8Dirg . Acesso em: 23 dez. 2021.
    https://bit.ly/3W8Dirg...
    , p. 5).
  • 26
    Ibid.
  • 27
    Ibid.
  • 28
    Migotto Filho (2021)MIGOTTO FILHO, J. A legitimação de Costa e Silva nas páginas da revista Realidade (1966-1967). Oficina do Historiador, Porto Alegre, v. 14, n. 1, p. 2, 29 jul. 2021. DOI: 10.15448/2178-3748.2021.1.39656.
    https://doi.org/10.15448/2178-3748.2021....
    .
  • 29
    Ibid., p. 4.
  • 30
    Faro (1999FARO, J. S. Realidade, 1966-1968: tempo da reportagem na imprensa brasileira. Porto Alegre: ULBRA/AEG, 1999., p. 85)
  • 31
    “A juventude diante do sexo”, de Pacheco Duarte, publicada no n. 5 da revista (agosto de 1966) e a “A mulher brasileira, hoje”, publicada no n. 10 da revista (janeiro de 1967).
  • 32
    Migotto Filho, op. cit., p. 2.
  • 33
    São eles: Victor Civita (proprietário da editora), seus filhos Robert Civita (diretor da Realidade) e Richard Civita, Luis Carta (diretor editorial), Domingo Alzugaray (diretor da divisão de revistas) e possivelmente o advogado Edgard de Sílvio Faria, diretor-responsável da Abril, que após a saída da equipe assumiu a função de censor (SEVERIANO, 2013SEVERIANO, Mylton. Realidade: história da revista que virou lenda. Florianópolis: Insular, 2013., p. 296-297).
  • 34
    Severiano (op. cit., p. 286).
  • 35
    Marão (2010MARÃO, José Carlos; RIBEIRO, José Hamilton. Realidade re-vista. Santos: Realejo Edições, 2010., p. 17).
  • 36
    Severiano (op. cit., p. 15).
  • 37
    “Imprensa…” (1971, p. 25)IMPRENSA debate censura. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 23 nov. 1971. Caderno Geral, p. 25..
  • 38
    “Buzaid…” (1973, p. 5)BUZAID manda rever registro de publicações. O Estado, Florianópolis, p. 5, 17 abr. 1973..
  • 39
    “Censura…” (1973, p. 2)CENSURA exige registro prévio. O Estado, Florianópolis, p. 2, 16 abr. 1973..
  • 40
    Os principais fotógrafos que passaram pela Realidade foram os brasileiros Walter Firmo, Geraldo Mori, Jorge Butsuem e Amancio Chiodi, os estadunidenses George Love, David Drew Zingg e Lew Parrella, os ingleses Maureen Bisilliat e Roger Bester, o italiano Luigi Mamprim, o francês Jean Solari e a suíça Claudia Andujar, que se naturalizou brasileira em 1976.
  • 41
    Ribeiro (2010RIBEIRO, José Hamilton. Um outro olhar, também nas fotos. In: MARÃO, José Carlos; RIBEIRO, José Hamilton. Realidade re-vista. Santos: Realejo Edições, 2010. p. 414-417.).
  • 42
    Andujar (2013ANDUJAR, Claudia. Claudia Andujar: depoimento. Entrevistadores: Leylianne Alves Vieira e Marcelo Eduardo Leite. Realidade: o fotojornalismo (autoral de uma revista), São Paulo, 2 maio 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Mv9yBF . Acesso em: 02 mai. 2023.
    https://bit.ly/3Mv9yBF...
    ).
  • 43
    Manjabosco (2016MANJABOSCO, Ângelo Augusto. O Brasil não é para principiantes: Lew Parrella, George Love e David Zingg, fotógrafos norte-americanos na revista Realidade (1966-1968). 2016. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/45hSSUG . Acesso em: 31 jul. 2023.
    https://bit.ly/45hSSUG...
    , p. 130).
  • 44
    Ibid.
  • 45
    Camargo (2023CAMARGO, Thais Lopes. Museu de arte, fotografia e arquivo: a atuação de Claudia Andujar e George Love no MASP (1971-1976). 2023. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3E9JBml . Acesso em: 3 ago. 2023.
    https://bit.ly/3E9JBml...
    , p. 102).
  • 46
    Canjani (2015CANJANI, Douglas. O fotojornalismo expandido de George Love no Brasil: breve aproximação. Nhengatu: Revista Ibero-americana para Comunicação e Cultura Contra-hegemônicas, São Paulo, v. 2, n. 3, 2015. Disponível em Disponível em https://bit.ly/3YSKSHL . Acesso em: 4 ago. 2023.
    https://bit.ly/3YSKSHL...
    , p. 6).
  • 47
    Leite (2013LEITE, Marcelo Eduardo. Realidade: o fotojornalismo (autoral) de uma revista. 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Wa2tcO . Acesso em: 8 fev. 2023.
    https://bit.ly/3Wa2tcO...
    ).
  • 48
    Andujar, op. cit.
  • 49
    Marão (2013MARÃO, José Carlos. José Carlos Marão: depoimento. Entrevistadores: Carla Adelina Craveiro Silva e Marcelo Eduardo Leite., Água de São Pedro, 17 abr. 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3WhXPcT . Acesso em: 12 abr. 2023.
    https://bit.ly/3WhXPcT...
    ).
  • 50
    Nogueira (2020NOGUEIRA, Aline dos Santos. Claudia Andujar na busca pela Outra: as narrativas fotográficas sobre a mulher brasileira na revista Realidade. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, 2020. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/47toecK . Acesso em: 2 ago. 2023.
    https://bit.ly/47toecK...
    , p. 111).
  • 51
    Fernandes (1970FERNANDES, Hélio. Fatos e rumores em primeira mão. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, p. 3, 19 maio 1970., p. 3).
  • 52
    Costa ([20--?])COSTA, Marcelo. Mario de Ascenção Palmério. In: FGV-CPDCOC. Dicionário histórico-biográfico brasileiro. Rio de Janeiro: FGV-CPDOC, [20--?]. Verbete. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/42Fqvz5 . Acesso em 29 mar. 2023.
    https://bit.ly/42Fqvz5...
    .
  • 53
    Ibid.
  • 54
    Cf. Silva, Silva e Smith Júnior (2018SILVA, José Valtemir Ferreira da; SILVA, Aline Costa da; Francisco Pereira, SMITH JÚNIOR. Migração e colonização da Transamazônica na obra de Odette de Barros Mott. Nova Revista Amazônica, Belém, v. 6, n. 2, p. 103-122, jun. 2018. DOI: 10.18542/nra.v6i2.6194
    https://doi.org/10.18542/nra.v6i2.6194...
    ), Braga e César (2019BRAGA, Magno Michell Marçal; CÉSAR, Martins de Souza. Transamazônica: terra, trabalho e sonhos. Revista Territórios & Fronteiras, Cuiabá, v. 12, n. 1, p. 172-191, 2019. DOI: 10.22228/rt-f.v12i1.898.
    https://doi.org/10.22228/rt-f.v12i1.898...
    ).
  • 55
    Silva, Silva e Smith Júnior, 2018SILVA, José Valtemir Ferreira da; SILVA, Aline Costa da; Francisco Pereira, SMITH JÚNIOR. Migração e colonização da Transamazônica na obra de Odette de Barros Mott. Nova Revista Amazônica, Belém, v. 6, n. 2, p. 103-122, jun. 2018. DOI: 10.18542/nra.v6i2.6194
    https://doi.org/10.18542/nra.v6i2.6194...
    , p. 107).
  • 56
    Pereira (2013PEREIRA, Raimundo. Raimundo Pereira: depoimento. Entrevistador: Marcelo Eduardo Leite. Realidade: o fotojornalismo (autoral) de uma revista, São Paulo, 28 jun. 2013. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3OgGCib . Acesso em: 15 abr. 2023.
    https://bit.ly/3OgGCib...
    ).
  • 57
    “Realidade, sete…” (1973, p. 13)REALIDADE, sete anos e dez prêmios. Realidade, São Paulo, n. 88, p. 13, junho de 1973..
  • 58
    Os nomes da equipe completa da revista podem ser encontrados em Realidade (1971, p. 32)REALIDADE. São Paulo: Editora Abril, n. 67, out. 1971. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3sqD83M . Acesso em: 16 maio 2023.
    https://bit.ly/3sqD83M...
    , disponível em: https://bit.ly/41OahlD. Acesso em: 10 set. 2023.
  • 59
    Os repórteres foram Carlos Azevedo, Domingos Meirelles, Octavio Ribeiro, J. P. Martinez, Hamilton A. F., R. R. Pereira, Norma Freire, Luís Carlos Bardawill. A coordenação da equipe em Belém foi feita por Sérgio Buarque. A coordenação em Manaus foi feita por Roberto Dantas. A pesquisa foi feita por Lúcio Flavio Pinto, Palmério Vasconcelos e Fernando Gomes. Ainda houve as colaborações especiais de José Hamilton Ribeiro, Sergio Ribeiro Pompeu, Milton Severiano, Geraldo Mayrink, Antônio Euclides, José Carlos Marão e de Mino Carta na supervisão.
  • 60
    . Os fotógrafos foram Maureen Bisilliat, Claudia Andujar, George Love, Amancio Chiodi, Darcy Trigo e Jean Solari.
  • 61
    Cf. Carta (1971, p. 30)CARTA, Luis. Realidade na Amazônia. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 30-32, out. 1971..
  • 62
    Cf. Pereira, op. cit.
  • 63
    Ibid.
  • 64
    Ibid.
  • 65
    A revista contém um total de 494 fotografias, variando em tamanhos distintos. Algumas ocupam uma página inteira, enquanto outras são menores, ocupando apenas alguns centímetros da página, geralmente como detalhes em anúncios. Dessas 494 fotografias, 254 estão nos anúncios da revista, enquanto 240 fazem parte das reportagens, ensaios e capa. Portanto, cerca de 51,42% das fotografias apresentadas na Realidade Amazônia estão integradas a anúncios. Os 48,58% restantes consistem em fotografias produzidas pela equipe de fotógrafos da revista.
  • 66
    As autorias das fotografias foram atribuídas de acordo com as informações presentes na própria revista. A única exceção foi a fotografia presente na figura 12, de Amancio Chiodi, cuja autoria foi informada pelo próprio fotógrafo por meio de uma conversa em uma rede social.
  • 67
    As reportagens da revista não têm autoria atribuída.
  • 68
    Seguiremos as categorizações definidas pelo pesquisador Angelo Manjabosco em seu estudo sobre a fotografia nas edições da primeira fase da revista Realidade. Essas categorias se mostram relevantes, visto que percebemos a persistência desses padrões na Realidade Amazônia. Manjabosco destaca que o layout da revista se baseia principalmente em dois modelos distintos: reportagens e ensaios. Nas reportagens ocorre uma fusão entre o texto e as imagens fotográficas, enquanto nos ensaios há um conjunto de fotografias que podem ou não ser acompanhadas por um texto menos denso que o das reportagens (Manjabosco, op. cit., p. 86-91).
  • 69
    Ao analisarmos as reportagens e ensaios que compõem a edição especial da Realidade Amazônia, é possível identificar que elas foram divididas em sete seções. As seções são as seguintes: seção introdutória, sem título (p. 7-69); “Amazônia, ontem” (p. 70-86); “Amazônia, hoje” (p. 87-118); “Amazônia, amanhã” (p. 119-140); “Amazônia, problemas” (p. 141-230); “Amazônia, Indicações” (p. 231-326) e, por último, o suplemento “A conquista da última fronteira: o mais poderoso rio do mundo”, com 8 páginas.
  • 70
    Grupo indígena que hoje é conhecido como Yanomami (SARMENTO, 2019SARMENTO, Francisco. O Alto Rio Negro indígena em mais de dois mil anos de história. Revista Brasileira de Linguística Antropológica, v. 11, n. 2, p. 41-72, 2019. DOI: 10.26512/rbla.v11i02.26900
    https://doi.org/10.26512/rbla.v11i02.269...
    , p. 48).
  • 71
    Cf. Praun e Costa (2016PRAUN, Luci; COSTA, Claudia. Pistas sobre a estrutura e as ações de repressão do Estado Brasileiro no pós 1964 e sua configuração no interior da Petrobras. Revista do Arquivo, São Paulo, n. 2, 2016. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3oaEBcD . Acesso em: 21 mar. 2023.
    https://bit.ly/3oaEBcD...
    ).
  • 72
    Considerando a capa, a revista tem 342 páginas. Dessas, aproximadamente 124 são de anúncios, ou seja, cerca de 36% da publicação. Existe uma grande variedade de anunciantes, da qual podemos destacar construtoras (Mendes Júnior S.A., Queiroz Galvão S.A. e Andrade Gutierrez S.A.), bancos (Banco de Londres e Grupo União de Bancos), empresas automobilísticas (Mercedes-Benz e General Motors), além de governos estaduais e prefeituras.
  • 73
    Civita (1971)CIVITA, Victor. Carta do Editor. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 3, out. 1971..
  • 74
    Ibid., p. 3.
  • 75
    Os dados apontam a construção de mais 12 mil quilômetros de estradas, a instalação ou projeção de mais de trezentas fazendas de gado nos últimos quatro anos, a existência de uma corrida nacional e internacional em busca de minérios na região e ainda a estimativa de migração de mais 100 mil famílias para a região amazônica em cinco anos.
  • 76
    Ibid., p. 3.
  • 77
    Ibid., p. 3.
  • 78
    O texto integra a primeira seção da revista.
  • 79
    Carta, op. cit., p. 31.
  • 80
    Ibid., p. 31.
  • 81
    “Amazônia, Opinião” (1971)AMAZÔNIA, opinião. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 7-26, out. 1971..
  • 82
    Rodrigo Octávio Jordão Ramos, ex-diretor da Escola Superior de Guerra (ibid.).
  • 83
    Olympio Mourão Filho, ex-ministro do Superior Tribunal Militar (ibid.).
  • 84
    Rodrigo Octávio Jordão Ramos, ex-diretor da Escola Superior de Guerra (ibid.).
  • 85
    Oscar Jerônimo Bandeira de Mello, presidente da Funai (ibid.).
  • 86
    “Viagem…” (1971)VIAGEM ao planêta do verde, da água e do sol. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 34-47, out. 1971..
  • 87
    Ibid., p. 45.
  • 88
    A reportagem da Manchete a que George Love se refere pode ser encontrada em: https://bit.ly/3OuDbmj. (Acesso em: 3 ago. 2023.)
  • 89
    De Boni (1994, p. 18)DE BONI, Zé. Verde lente: fotógrafos brasileiros e a natureza. São Paulo: Empresa das Artes, 1994..
  • 90
    Foram localizadas 32 fotografias que retratam a construção de rodovias na floresta, como a Transamazônica e a Manaus-Porto Velho. Dessas, 23 imagens estão nos anúncios, enquanto apenas nove aparecem em reportagens e ensaios. Ou seja, cerca de 72% das fotos que mostram as rodovias atravessando a mata amazônica foram veiculadas em anúncios de empresas e órgãos públicos. As fotos dos anúncios variam em tamanho: três ocupam uma página inteira, oito ocupam entre meia e uma página inteira, três ocupam entre um quarto e meia página e nove têm um espaço menor do que um quarto de página. Referente às nove fotografias apresentadas nas reportagens e ensaios, apenas uma imagem, de autoria de Claudia Andujar, ocupa uma página inteira e uma parte da página seguinte, enquanto as outras ocupam menos de um quarto de página.
  • 91
    “A nossa…” (1971)A NOSSA vida nos trópicos. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 50-66, out. 1971..
  • 92
    “A ocupação…” (1971)A OCUPAÇÃO do mundo das amazonas. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 71-86, out. 1971..
  • 93
    São eles: o explorador espanhol Don Francisco de Orellana, o militar português Pedro Teixeira, a liderança política Eduardo Francisco Nogueira, o jornalista espanhol Don Luís Galvez Rodrigues de Arias, o militar gaúcho José Plácido de Castro e etnólogo alemão Curt Unkel.
  • 94
    “A fronteira…” (1971)A FRONTEIRA da aventura. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 106-14, out. 1971..
  • 95
    “A caça…” (1971)A CAÇA aos tesouros do subsolo amazônico: o grande acontecimento do mundo da mineração. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 120-121, out. 1971..
  • 96
    Ibid., p. 121.
  • 97
    Ibid., p. 121.
  • 98
    Valente (2017VALENTE, Rubens. Os fuzis e as flechas: história de sangue e resistência indígena na ditadura. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.).
  • 99
    Parte considerável do território yanomami está no estado de Roraima.
  • 100
    Ibid., p. 189.
  • 101
    Ibid., p. 190.
  • 102
    Comissão Nacional da Verdade (2014, p. 251)COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. Violações de direitos humanos dos povos indígenas. Brasília, DF: Comissão Nacional da Verdade, 2014. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/42GEQLD . Acesso em: 08 mai. 2023. Relatório, vol. II, texto 5.
    https://bit.ly/42GEQLD...
    .
  • 103
    Ibid.
  • 104
    Valente (op. cit., p. 190).
  • 105
    Segundo o Relatório da Comissão Nacional da Verdade, foi estimado que cerca de 8.350 indígenas morreram entre 1946 e 1988 (período de investigação da comissão), principalmente entre os anos da ditadura civil-militar, em decorrência de ações diretas de agentes do governo brasileiro ou de suas omissões. Entretanto, o documento afirma ser esse número apenas uma estimativa, uma vez que não foram investigadas ações em diversos territórios indígenas, o que aponta que o número real de mortos pode ser consideravelmente maior (COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE, 2014)COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. Violações de direitos humanos dos povos indígenas. Brasília, DF: Comissão Nacional da Verdade, 2014. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/42GEQLD . Acesso em: 08 mai. 2023. Relatório, vol. II, texto 5.
    https://bit.ly/42GEQLD...
    .
  • 106
    Ibid., p. 210.
  • 107
    “A caça…” (1971, p. 121)A CAÇA aos tesouros do subsolo amazônico: o grande acontecimento do mundo da mineração. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 120-121, out. 1971..
  • 108
    “Estradas…” (1971, p. 125)ESTRADAS: cinco como a Transamazônica. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 124-125, out. 1971..
  • 109
    Ibid.
  • 110
    Ibid.
  • 111
    “Amazônia, amanhã” (1971, p. 136)AMAZÔNIA, amanhã. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 119-140, out. 1971..
  • 112
    “Os estrangeiros” (1971)OS ESTRANGEIROS (um fato) roubam a Amazônia (uma opinião). Roubam mesmo? (uma questão). Realidade, São Paulo, n. 67, p. 171-188, out. 1971..
  • 113
    A reportagem, no afã de reconstruir a imagem dos estrangeiros na Amazônia, apresenta uma pesquisa de opinião, encomendada pela revista, que aponta que 68% dos entrevistados acreditavam em uma ameaça estrangeira que almejava dominar a Amazônia, sendo que 38% deles afirmaram que os minérios da região já estavam em mãos estrangeiras.
  • 114
    Informação fornecida pelo próprio fotógrafo através de conversa em uma rede social em setembro de 2023.
  • 115
    São citadas as estadunidenses U.S. Steel, Kaiser Aluminum e Bethlehem & Steel, a canadense Alcan, a suíça Alusuisse e a francesa Pechiney.
  • 116
    “Dizem…” (1971)DIZEM que êle tem um exército secreto no País. Mas o que êle tem é um País. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 190-196, out. 1971..
  • 117
    “Os estrangeiros…” (1971)OS ESTRANGEIROS (um fato) roubam a Amazônia (uma opinião). Roubam mesmo? (uma questão). Realidade, São Paulo, n. 67, p. 171-188, out. 1971..
  • 118
    “Imagens…” (1971)IMAGENS de um massacre. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 157-163, out. 1971. e “A lei…” (1971)A LEI proíbe. Mas quem cumpre? Realidade, São Paulo, n. 67, p. 164-168, out. 1971..
  • 119
    “A busca…” (1971)A BUSCA da terra (inferno ou paraíso?) prometida. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 215-224, out. 1971..
  • 120
    “Morreram…” (1971)MORRERAM as cidades e o homem. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 150-154, out. 1971..
  • 121
    “A última…” (1971)A ÚLTIMA chance dos últimos guerreiros. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 202-212, out 1971..
  • 122
    Ricardo (2005RICARDO, Beto. Norami. In: ANDUJAR, Claudia. A vulnerabilidade do ser. São Paulo: Cosac Naify, Pinacoteca do Estado, 2005. p. 243-249. Catálogo de exposição., p. 245).
  • 123
    Andujar (2005ANDUJAR, Claudia. A vulnerabilidade do ser. São Paulo: Cosac Naify, 2005. ).
  • 124
    Desde 2015, essas fotografias estão sendo expostas na Galeria Claudia Andujar em Inhotim, um museu de arte contemporânea localizado na cidade de Brumadinho, interior de Minas Gerais. Foram incluídas outras fotografias que não foram publicadas na revista. Elas foram organizadas em uma série intitulada “Maturacá” e foram datadas entre os anos de 1970 e 1971. Para mais informações, consultar Inhotim (2015)INHOTIIM. Galeria Claudia Andujar. Brumadinho: Inhotim, 2015. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/457Kwjd . Acesso em: 16 maio 2023.
    https://bit.ly/457Kwjd...
    , disponível em: https://bit.ly/457Kwjd.
  • 125
    Andujar (2015ANDUJAR, Claudia. No lugar do outro. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2015. , p. 243).
  • 126
    Persichetti (2008PERSICHETTI, Simonetta. Claudia Andujar. São Paulo: Lazuli Editora, 2008., p. 22).
  • 127
    Knobloch (1970KNOBLOCH, Francis J. The aharaibu indians: a “White” tribe in the Amazon. The Mankind Quarterly, Edinburgh, v. 10, n. 4, p. 185-198, 1970. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/457kfBt . Acesso em: 22 jun. 2019.
    https://bit.ly/457kfBt...
    ).
  • 128
    Camargo, op. cit.
  • 129
    “A última…” (1971)A ÚLTIMA chance dos últimos guerreiros. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 202-212, out 1971..
  • 130
    Ibid., p. 212.
  • 131
    Davi Kopenawa relata alguns dos conflitos enfrentados pelos Yanomami com as missões religiosas em seu livro A queda do céu. O xamã descreve a chegada dos primeiros missionários estadunidenses na região do rio Demini, no norte do estado do Amazonas, e seus esforços para evangelizar os indígenas, persuadindo-os a abandonar certos rituais tradicionais de seu povo. Cf. Albert e Kopenawa (2016ALBERT, Bruce; KOPENAWA, Davi. A missão. In: ALBERT, Bruce; KOPENAWA, Davi. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. p. 255-273.).
  • 132
    Comissão Nacional da Verdade, op. cit.
  • 133
    Ibid., p. 234.
  • 134
    “Amazônia, Indicações” (1971)AMAZÔNIA, Indicações. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 231-326, out. 1971..
  • 135
    “Pequena…” (1971)PEQUENA amostra das coisas fantásticas que a revista Realidade está revelando sôbre a Amazônia. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18 out. 1971. Primeiro Caderno, p. 36..
  • 136
    Um caso emblemático é a exposição “Hileia Amazônica”, apresentada no Museu de Arte de São Paulo em 1972-1973 no Museu de Arte de São Paulo (MASP). Cf. Camargo, op. cit., e Silva (2023)SILVA, Vitor Marcelino da. A construção coletiva de Amazônia: fotografia e política no livro de e George Love. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação Interunidades em Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3OUwjix . Acesso em 25 ago. 2023.
    https://bit.ly/3OUwjix...
    .
  • 137
    Embora não tenha sido possível manusear um exemplar físico do livro, apuramos que se trata de uma brochura que encaderna suas 46 páginas com um único grampo. O livro tem capa mole e mede 21 x 15 cm. Tais informações foram encontradas na plataforma de vendas de livros AbeBooks, disponível em: https://bit.ly/3Ij2uWl. (Acesso em: 12 maio 2023.)
  • 138
    Uma versão prévia do livro em francês chegou a ser enviada a Bruxelas no ano de 1975, na ocasião do segundo Tribunal Penal Internacional, conhecido como Tribunal Bertrand Russel II, que tinha como objetivo denunciar a repressão na América Latina, embora não tivesse legitimidade jurídica (OLIVEIRA, 2015OLIVEIRA, Tatiana Gonçalves. Política de genocídio contra os índios do Brasil: memória e contestação contra a política indigenista adotada pelo regime militar (1970-1974). SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, 28., Florianópolis. Anais […]. Florianópolis: ANPUH, 2015. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Oi1eGG . Acesso em: 14 fev. 2023.
    https://bit.ly/3Oi1eGG...
    ).
  • 139
    A AEPPA foi fundada em junho de 1974. A associação era ligada a setores maoístas que se reuniam, a partir de dezembro de 1974, na sede da União Democrática Nacional (UDN), e que posteriormente formariam o Partido Comunista Português (Reconstruído) (PCP(R)) (Oliveira, op. cit.).
  • 140
    Associação de Ex-presos Políticos Antifascistas (1976)ASSOCIAÇÃO DE EX-PRESOS POLÍTICOS ANTIFASCISTAS. A política de genocídio contra os índios do Brasil. Lisboa: Associação de Ex-presos Políticos Antifascistas, 1976. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Mizzmy . Acesso em 13 fev. 2023.
    https://bit.ly/3Mizzmy...
    .
  • 141
    Ibid., p. 40.
  • 142
    Cf. Silva, op. cit.
  • 143
    Nogueira (2018NOGUEIRA, Thyago (org.). Claudia Andujar: a luta Yanomami. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2018. Catálogo de exposição.).
  • 144
    Andujar (2005ANDUJAR, Claudia. A vulnerabilidade do ser. São Paulo: Cosac Naify, 2005. ).
  • 145
    Nogueira, op. cit.
  • 146
    Cf. Neto (2023NETO, Lira. Como Bolsonaro planejou extinguir a reserva Yanomami. Jornalistas Livres, 26 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3Mxr5ct . Acesso em: 9 fev. 2023.
    https://bit.ly/3Mxr5ct...
    ).
  • 147
    “Dizem…” (1971)DIZEM que êle tem um exército secreto no País. Mas o que êle tem é um País. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 190-196, out. 1971..
  • 148
    Ludwig era proprietário de um dos maiores latifúndios da Amazônia, com cerca de 1,5 milhão de hectares, que equivalia a metade do território da Holanda. O empresário estava instalando o que ficou conhecido como Projeto Jari, localizado na confluência dos rios Jari e Amazonas, que consistia em uma grande plantação de monocultura para a produção de polpa de papel (“DIZEM…”, 1971, p. 190-196)DIZEM que êle tem um exército secreto no País. Mas o que êle tem é um País. Realidade, São Paulo, n. 67, p. 190-196, out. 1971..
  • 149
    “Realidade, uma jornada…” (2020, p. 4)REALIDADE, uma jornada que segue atual. Realidade, São Paulo, p. 4, set. 2020. Edição facsimilar..
  • 150
    Amazônia (2020, p. 130)AMAZÔNIA. Realidade, São Paulo, p. 130, set. 2020. Edição facsimilar..
  • 151
    O autor descreve o ciclo em etapas. “A primeira etapa consiste na publicização das ações de combate à situação denunciada. Essa etapa promove outra, a médio prazo, o abafamento do assunto e a saída de foco do problema no país e fora dele. Uma vez o assunto abafado, na próxima etapa, ocorre a desmobilização das ações preventivas, de monitoramento e de repressão adotadas, acompanhadas da precarização da saúde da comunidade. Em meio a isso, acontece em um crescente a etapa de re-invasão do território, a reutilização e abertura de pistas clandestinas para exploração garimpeira e a repetição das graves violações de direitos humanos até que a próxima denúncia consiga chamar a atenção da sociedade no Brasil e no exterior. Cada etapa possui dinâmica própria e tem tempo de duração distinto, que varia de governo para governo, em cada ciclo de repetição do mecanismo.” (ZELIC, 2023ZELIC, Marcelo. Justiça de Transição: remodelando práticas do Estado para o Bem Viver. Jornal Grupo Gente Nova, [s. l.], 29 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3IheCHi . Acesso em: 10 fev 2023.
    https://bit.ly/3IheCHi...
    , p. 1-2).
  • 152
    Ibid.
  • 153
    Ibid.
  • 154
    Bedinelli, Brum e Machado (2023BEDINELLI, Talita; BRUM, Eliane; MACHADO, Ana Maria. Diário de guerra: ‘Não estamos conseguindo contar os corpos’. Sumaúma, [s. l.], 20 jan. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3o1XTB0 . Acesso em: 10 fev. 2023.
    https://bit.ly/3o1XTB0...
    ).
  • 155
    Migotto Filho, op. cit.
  • 156
    O marco temporal representa uma abordagem jurídica que sustenta que uma terra indígena pode ser demarcada somente se puder ser comprovado que os povos indígenas estavam presentes nela no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Para muitos especialistas, essa tese é considerada um retrocesso significativo e uma ameaça substancial aos povos originários (Batista, 2023BATISTA, Juliana de Paula. Marco temporal: naturalização de um estado de indigência para os povos indígenas. Instituto Socioambiental, [s. l.], 7 jun. 2023. Disponível em Disponível em http://bit.ly/3OvpPWX . Acesso em: 10 ago. 2023.
    http://bit.ly/3OvpPWX...
    ). Em outubro de 2023, o presidente Lula vetou parcialmente a Lei 14.701/23, que ficou conhecida como "PL do Marco Temporal", em conformidade com decisão do Supremo Tribunal Federal de que esta era inconstitucional. Entretanto, a permanência de alguns artigos da lei ainda preocupa algumas organizações indígenas (Pajolla e Moncau, 2023PAJOLLA, Murilo; MONCAU, Gabriela. Marco temporal: veto de Lula barrou principais retrocessos, mas pontos sancionados preocupam indígenas e indigenistas. Brasil de Fato, São Paulo, 25 out. 2023. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3SeAsAV . Acesso em: 25 out. 2023.
    https://bit.ly/3SeAsAV...
    ).
  • 157
    Zelic, op. cit.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    16 Maio 2023
  • Aceito
    21 Ago 2023
Museu Paulista, Universidade de São Paulo Rua Brigadeiro Jordão, 149 - Ipiranga, CEP 04210-000, São Paulo - SP/Brasil, Tel.: (55 11) 2065-6641 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: anaismp@usp.br