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Estratégias de aquisição da casa própria: a trajetória de algumas famílias negras paulistanas nas décadas de 1920 a 1940

Property ownership strategies: black paulista families’ life history between 1920s and 1940s

Resumo

No Brasil, há uma crença cultural de que a atitude mais sábia para garantir uma economia doméstica segura e estável é a aquisição da casa própria. Por gerações, o “sonho da casa própria” tem sido cultivado como um horizonte a se atingir. Confirmando essa tendência, desde a década de 1920, a “casa própria” torna-se uma noção mobilizada nos periódicos da imprensa negra, circulando em diversos artigos como uma aspiração desejável e uma orientação ao público dos jornais. Entre 1924 e 1937, dois dos principais jornais da imprensa negra paulista, O Clarim da Alvorada e A Voz da Raça, realizaram uma campanha em favor da casa própria, difundindo entre as famílias negras paulistanas a ideia da importância da aquisição imobiliária. Essas campanhas constituem um indício importante da relevância da aquisição residencial para as famílias negras do período. Neste trabalho, procuramos analisar essa importância como estratégia de seguridade social intergeracional, por meio da apresentação de três casos de famílias negras que realizaram esse objetivo entre as décadas de 1920 e 1940. Os depoimentos das famílias negras aqui reportados indicam precocidade, especificidades e estratégias que representam novos desafios para a reflexão sobre a formulação do problema da casa própria, a partir do ponto de vista racial.

Palavras-chave:
Questões raciais urbanas; Casa própria; Imprensa negra paulista; Famílias negras paulistas

ABSTRACT

In Brazil, there is a cultural belief that property acquisition is the wisest attitude to ensure a safe and stable economy. For generations, the "dream of property ownership" has been cultivated as a horizon to be achieved. Confirming this tendency, since the 1920s, "casa propria" (home ownership) became a notion mobilized in the black press periodicals, circulating as a desirable aspiration and an orientation to the journals public. Between 1924 and 1937, two of the main newspapers of São Paulo black press, O Clarim da Alvorada and A Voz da Raça, carried out a campaign in favor of property ownership, spreading among paulista black families the importance of property acquisition. These campaigns are an important sign for the relevance of buying a property for black families at that time. In this paper, we seek to analyze it as an intergenerational social security strategy, through the presentation of three cases of black families that accomplished this goal between 1920s and 1940s. The black families testimonies reported here indicate precocity, specificities and strategies that represent new challenges for the formulation of property ownership problem, from a racial point of view.

Key-words:
Urban racial issues; Home ownership; Black press in São Paulo; Black families in São Paulo

O discurso da “casa própria” foi algo novo, mas não exclusivo, da classe dominante. Ele nasce também, nesse final dos anos 20, nos “bairros operários”. No instante em que seus moradores passam a redefinir suas concepções de cidade e de habitação. Para os setores dominantes, a casa própria significava o elemento eficaz para a moralização e controle do trabalhador urbano; já para os operários, ela representava uma questão de necessidade, sobretudo, de luta pelo direito de sobrevivência na cidade.2 2 Arquiteta e urbanista; docente do Departamento de Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP). E-mail: <anabarone@usp.br>.

No Brasil, há uma crença cultural de que a atitude mais sábia para garantir uma economia doméstica segura e estável é a aquisição da casa própria. Por gerações, o “sonho da casa própria” tem sido cultivado como um horizonte a se atingir. Ao mesmo tempo, na literatura sobre urbanismo, a casa própria tem sido tratada como uma categoria explicativa central para a compreensão do processo de urbanização no país ao longo do século XX, apontada como uma das alternativas fundamentais para a solução do problema da habitação popular, sobretudo por meio da autoconstrução em loteamentos periféricos, oficiais ou clandestinos.

A maior parte dos autores trata a questão da casa própria como um tema emergente a partir da década de 1940, quando inicia no Brasil a formulação de uma política de Estado voltada para o atendimento à habitação, articulada à política de previdência social.3 3 Carpintéro (1997, p. 15). Muitos trabalhos indicam que a Lei do Inquilinato, de 1942, que definiu o congelamento dos aluguéis e decorrente desinteresse do mercado em oferecer habitações para essa modalidade provisional, contribuiu sumariamente para disseminar a ideologia da casa própria como solução da questão da moradia.4 4 Cf. Lago; Ribeiro (1996), Bonduki (2004). Ao mesmo tempo, apontam que as primeiras formulações de uma política nacional de habitação ampla e abrangente para as classes populares foram desenhadas no contexto da Fundação da Casa Popular, em 1946.5 5 Cf. Sampaio (1994), Bonduki, op. cit.

No entanto, como já evidenciou Carpintéro no trecho em epígrafe, no cotidiano popular, a aquisição da casa própria parece ser uma urgência desde muito antes. Em meados do século XIX, além de significar a “sede” de alguma instituição, a expressão “casa própria” já era usada para diferenciar a propriedade residencial da condição de moradia de aluguel.6 6 Cf. Azevedo; Andrade (1982). A valoração da casa própria como sonho de vida aparece na imprensa antes mesmo da instauração da República. O narrador de um texto de folhetim descreve que “era rico, e permitiam-me que vivesse em casa própria”.7 7 Nos classificados de imóveis urbanos, desde esse período, a expressão “casa própria” era utilizada genericamente para identificar imóveis “apropriados” para uso residencial (Correio Paulistano, 30 ago 1870, p. 3), ou simplesmente para indicar uma oferta para venda ou aluguel (Correio Paulistano, 3 jan. 1883, p. 5), conotações que permanecem nos anúncios das primeiras décadas do século XX. Já para anúncios comerciais, o termo significava que o dono do estabelecimento era proprietário do imóvel (A Gazeta, 5 jun. 1914); ou ainda que um serviço, como amas de leite ou aulas de piano, por exemplo, seria oferecido na casa do anunciante (Correio Paulistano, 12 ago. 1916, p. 2). Os artigos de imprensa referidos neste texto foram consultados por meio da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. Décadas depois, em matéria sobre um suicídio, o personagem é retratado como “excelente oficial” que “conseguiu reunir pecúlio para a realização de seu melhor ideal, que era residir em casa própria”.8 8 Cf. Os filhos perdidos... 1881) Já a preferência por imóveis próprios aparece expressa em outro jornal, por um arquiteto que defendia a criação de bairros proletários, apontando as vantagens da moradia popular em imóveis adquiridos, em nome da “moralidade” da população.9 9 Cf. Incoherencia de louco (1909).

O sonho brasileiro da casa própria é alimentado pela determinação constitucional do direito de propriedade. Desde a Constituição imperial de 1824, a propriedade privada é um valor inviolável, o mais sólido entre os direitos subjetivos. Algumas mudanças substantivas no estatuto da propriedade foram implementadas constitucionalmente, sem afetar a sua centralidade. A mais importante delas talvez tenha sido a incorporação, em 1934, da função social da propriedade, limitando o direito de propriedade mediante o interesse social e coletivo, na forma da lei, mas sem ser regulamentada naquele momento. O direito perpétuo à propriedade, independentemente do uso, e sem possibilidade de perda pelo não uso, dava lugar à possibilidade da aplicação do instrumento da desapropriação por interesse público. Anteriormente, o dispositivo da desapropriação era aplicável somente na usucapião rural, nos casos de ocupação longeva das terras por usuários não proprietários.

Seguindo o marco constitucional definidor da ordem jurídica nacional, as políticas públicas relacionadas ao direito à habitação têm sido elaboradas, sistematicamente, sob a orientação do princípio da posse do imóvel. Destacam-se os grandes marcos definidores da política pública de habitação brasileira, nas décadas de 1940 (Fundação da Casa Popular), 1960 (Banco Nacional da Habitação - BNH) e 2010 (Programa Minha Casa Minha Vida), todos fundamentados na aquisição imobiliária como modo de provisão predominante.

Desde meados da década de 1970, o problema da ideologia da casa própria tem sido sistematicamente analisado e criticado pela bibliografia especializada sobre o tema. Os autores engajados nessas análises estavam mobilizados pela crítica à política de criação do BNH e a forma de aplicação dos recursos públicos disponíveis para habitação dela decorrente. Bolaffi10 10 Cf. Casas baratas para... (1917). foi um dos principais autores a elucidar as contradições de uma política habitacional majoritariamente voltada para a provisão das unidades na forma da propriedade. Anos depois, Azevedo e Andrade11 11 Bollafi (1975, p. 37-70). identificaram, na política formulada nos anos 1940, calcada na criação da Fundação Casa Popular, as mesmas premissas fundamentadas na ideologia da casa própria, favorecendo o populismo e o clientelismo. A “casa própria” era o princípio definidor questionado por esses e outros autores, na medida em que a política pública era concebida antes para responder como mecanismo propulsor do setor da construção civil em um contexto de crise econômica que propriamente para salvaguardar o direito universal à moradia. Mobilizando valores como a segurança, o status, o desejo de posse, a política ajudou a difundir a aspiração à casa própria como horizonte entre as classes trabalhadoras, embora tenha contribuído muito pouco para a sua realização. No mesmo período, por exemplo, falava-se em “déficit da casa própria” ao se referir ao déficit de habitação no Brasil.

Na mesma época, Oliveira12 12 Cf. Azevedo; Andrade, op. cit. demonstrava outra face do problema da provisão habitacional no Brasil, ao revelar, entre outras coisas, que o princípio balizador da propriedade privada como solução para a questão da moradia era referenciado, em primeiro lugar, na regulação do salário, e que os valores praticados no salário do trabalhador não incluíam os custos da habitação. Assim, a casa era convertida no maior bem material que alguém pode obter,13 13 Cf. Oliveira (1972) mas o salário não cobria o custo da sua aquisição. Nesse sentido, o princípio da propriedade como norte e horizonte da política de habitação reduzia o direito baseado na necessidade de habitar em direito a possuir um bem, transformado em necessidade de adquiri-lo. O Estado passava a ser o agente desse processo, à medida que conduzia a política no sentido da posse, porém não garantia meios suficientes para sua obtenção.14 14 Cf. Maricato (1982).

Durante esse período, famílias negras da cidade compreenderam a importância de guardar dinheiro para um único fim: comprar uma casa para escapar do pagamento de aluguéis. A fuga da situação de aluguel tinha um duplo objetivo: em primeiro lugar, representava a garantia de uma vida economicamente mais estável no futuro; em segundo, especificamente no caso dos negros, consistia em uma forma de evitar se expor ao penoso, frustrante e constrangedor processo de busca por um imóvel de aluguel.15 15 Cf. Araújo (2015).

Ao longo das décadas de 1920 e 1930, a “casa própria” também se torna uma noção mobilizada em alguns periódicos da imprensa negra, presente em diversos artigos como uma aspiração desejável e uma orientação ao seu público. Os periódicos da imprensa negra são um conjunto de fontes históricas importantes da expressão do grupo negro na cidade de São Paulo desde a virada do século, uma coleção de jornais feitos “por negros e para negros”.16 16 A título de exemplo, veja-se o caso atual descrito no jornal Gazeta do Povo: “Enquanto Ana Claudia visitava o apartamento, o pro prietário simplesmente desistiu da locação, sem motivo aparente. ‘Os contratos não davam certo depois da visita. Houve um caso em que o dono até falou que não era para eu pensar que fosse por causa da minha cor’, lembra”. Porta fechada para... (2013). São diferentes títulos, de vida breve, normalmente distribuídos gratuitamente, mantidos por meio dos recursos dos próprios editores e alguma publicação de anúncios publicitários. Inicialmente, versavam sobre a vida social negra, suas agremiações e festas, tornando-se mais combativos e reivindicatórios à medida que a necessidade de conscientização política passava a permear os interesses em torno das organizações negras.17 17 Cf. Ferrara (1986). A existência desses jornais é uma das evidências mais expressivas do nível de organização do grupo negro nesse período, sendo também uma fonte relevante e contra-hegemônica da história da cidade, à medida que apresenta o negro como sujeito de sua própria existência.

Nosso objetivo é refletir sobre a importância da aquisição imobiliária residencial entre famílias negras nesse período. Para realizar esse objetivo, o artigo divide-se em três partes. A primeira tem o propósito de apresentar uma análise das campanhas em favor da casa própria divulgadas pelos dois principais jornais da imprensa negra paulista, O Clarim da Alvorada e A Voz da Raça, por meio dos artigos e anúncios publicados em suas páginas. Trata-se dos dois jornais mais relevantes e longevos da imprensa negra paulistana. O Clarim da Alvorada foi fundado em 6 de janeiro de 1924 por José Correia Leite e Jaime de Aguiar, no bairro da Bela Vista. Já o periódico A Voz da Raça, órgão de imprensa da Frente Negra Brasileira, foi lançado em 18 de março de 1933, na Liberdade. Seus fundadores foram os irmãos Isaltino e Arlindo da Veiga. Ambos se mantiveram ativos até 1937, quando o Estado Novo, em ação repressiva à imprensa, pôs fim a todos esses jornais. Essa primeira parte do texto organiza-se em torno da análise desse material, incluindo referências aos autores que trataram dele anteriormente, que nos servem de baliza. Por meio desse valioso corpo documental, temos acesso a uma importante fonte acerca do modo como a questão da casa própria foi vista pelo negro paulistano, do ponto de vista do grupo organizado em torno dessa imprensa.

Na segunda parte, recuperamos a discussão sobre as ações realizadas por diversas sociedades mútuas presentes no Brasil desde o século XIX, e particularmente as sociedades prediais do início do XX, que tiveram uma importante atuação no sentido de defender os interesses dos grupos populares, sobretudo no contexto urbano. Essa discussão é retomada com vistas a refletir sobre a possível referência das campanhas pela casa própria entre os negros de São Paulo, suas motivações e seus limites, no contexto das organizações de solidariedade mútua e sociedades prediais. Em seguida, fazemos uma apreciação sobre uma outra influência sobre as campanhas da imprensa negra em prol da casa própria: o jornal negro norte-americano Chicago Defender.

Finalmente, na última parte, apresentamos entrevistas realizadas com descendentes de três famílias negras que tiveram a oportunidade de adquirir imóvel próprio entre as décadas de 1920 e 1940, ampliando em uma década o período de influência que as campanhas da imprensa negra pudessem ter sobre a capacidade de poupança e aplicação de recursos para a aquisição imobiliária. O objetivo dessas entrevistas é trazer elementos para uma maior reflexão sobre o significado da casa própria para essas famílias, no contexto da sua luta por inserção e mobilidade social, bem como as estratégias utilizadas para se obter sucesso no cumprimento desse objetivo.

Tendo em vista que a preocupação das famílias negras com a casa própria antecedeu a periodização sugerida pela bibliografia consolidada sobre o assunto, fica evidente que há outras perspectivas possíveis para a compreensão dessa questão. Nesse sentido, a análise dessas entrevistas, à luz do esforço empreendido pelos jornais da imprensa negra do período, mostra a relevância do ponto de vista dos negros no sentido de engendrar uma nova narrativa sobre o acesso à casa própria no Brasil na primeira metade do século XX. Portanto, não se trata apenas de retomar o calejado debate sobre a aspiração à casa própria, mas sim de observar as especificidades do modo como essas famílias negras construíram a questão da aquisição imobiliária na sua história, quais estratégias usaram para atingir esse objetivo e de que forma esse bem tornou-se um valor essencial como princípio norteador de sua economia doméstica familiar. É importante ressaltar que o interesse mobilizado na pesquisa que gerou este artigo não reside na defesa da casa própria como meio de solucionar o problema da habitação dos negros nas cidades brasileiras. Interessa antes observar como, em razão da centralidade ocupada pela propriedade imobiliária no âmbito da economia doméstica familiar urbana, algumas famílias que tiveram êxito na conquista desse patrimônio em São Paulo puderam estender o benefício dessa realização para as gerações seguintes, não apenas pela transmissão do bem em si, mas também pela melhoria das condições da vida familiar por ele engendradas.

Em termos metodológicos, algumas questões merecem ser explicitadas. De forma geral, longe de constituírem um universo amostral quantitativo que demonstre um fenômeno social, sua dimensão e seu impacto, as entrevistas trazidas neste trabalho são estudos de caso. Assim, revelam elementos que permitem dar legibilidade ao nosso problema central, do ponto de vista negro. Procuramos amparar essa análise nos artigos e anúncios da imprensa geral da época, para capturar a centralidade e a importância atribuída à casa própria junto à opinião pública do período. Ao mesmo tempo, buscamos na imprensa negra os registros de época que indicam a centralidade da questão da casa própria e como ela é compreendida pelo grupo negro. Finalmente, cotejamos a discussão também no âmbito do mutualismo e das associações de construção de moradias, com a finalidade de avaliar a situação do negro frente a essa modalidade de aquisição residencial. Em vista do esforço de contextualização dos dados trazidos por essas entrevistas, é relevante pontuar que se trata do depoimento dos herdeiros, membros da segunda ou terceira geração em relação aos indivíduos que fizeram a aquisição dos imóveis. Portanto, essa história é recomposta a partir de suas memórias subjetivas, permeadas por valores afetivos sobre processos que eles não viveram. Tem-se em conta, ainda assim, que dar voz a essas memórias é uma forma de reaver conteúdos que dificilmente poderiam ser recuperados por outro tipo de metodologia científica, à medida que elas revelam muitos processos que não foram gravados nas fontes impressas tradicionais ou oficiais. Vale dizer, portanto, que a história do negro no Brasil tem aqui uma importante fonte alternativa de dados que dificilmente seriam capturados sem se trazer à tona esses testemunhos.

CAMPANHA

Na sua sétima edição, ainda em 1924, o jornal O Clarim da Alvorada trazia um texto intitulado “A Vida”, em que o autor fazia uma reflexão sobre o próprio processo de urbanização em São Paulo e suas consequências para a gente preta.

Si observarmos com todo o critério possível a mudança que tem sofrido a nossa capital, notaremos que em tudo encontramos um grande progresso. Já se não notam como nos tempos idos, aquelles casarões antigos, feitos de barro socado; as ruas, que eram estreitas e mal calçadas, hoje as contemplamos asfaltadas algumas centraes e outras bem arborizadas. Novas construções encontramos em todos os recantos: palacetes riquíssimos, bungalows, bairros chics, etc.; logares que ha pouco eram regeitados devido à distância do centro hoje estão com belas construções; tudo quanto noutros tempos era despresado e sem proveito, hoje vemos aproveitado.

Avenidas, alamedas e ruas centraes vemo-las completamente tomadas pelos automóveis; os carros que restavam nas estações ferroviárias e nas praças públicas são substituídos pelos taxis e fords, e, daqui há pouco, as carroças que estacionam em seus pontos predilectos, serão dali banidas para outros logares distantes... E, o progresso tudo vae modificando. O pobre trabalhador já não pode morar perto da cidade; vive lutando sempre para manter a sua família.18 18 Cf. Bastide (1973).

Moysés Cintra, pseudônimo de Jayme de Aguiar, sistematicamente publicava no jornal textos e crônicas que elogiavam o “progresso” e a “evolução da raça”, incentivando o trabalho, a economia, a conduta moral, desaprovando o alcoolismo entre seus leitores. Preocupado especialmente com o futuro da juventude negra, estimulava a educação dos jovens para uma melhor preparação para o futuro.

Chama a atenção que, em um jornal recém-lançado, voltado para a população negra de São Paulo, um artigo levantasse o tema da cidade, do crescimento urbano e das transformações da capital. A visão predominante no trecho associava essas aceleradas mudanças à ideia de progresso, interpretação hegemônica naquele período. Assim, a substituição dos antigos casarões e ruas estreitas do século XIX por “palacetes riquíssimos”, avenidas “centraes” e alamedas arborizadas, tomadas por táxis e fords, e até mesmo a ocupação de “logares que há pouco eram regeitados” por “belas construções” eram vistas com o entusiasmo típico do momento, exceto pelo reconhecimento de que o “pobre trabalhador já não pode morar perto da cidade”. Sendo assim, a visão do desenvolvimento urbano n’O Clarim da Alvorada já não era totalmente configurada pela doutrina positivista de identificação com o progresso, à medida que percebia seus efeitos e os danos sobre os trabalhadores negros.

[...] O salário que recebe em pagamento do seu árduo trabalho poderia chegar para manter sua prole; mas, devido serem aumentados de momento em momento os gêneros de primeira necessidade, tudo lhes chega às mãos por elevados.

O dono da casa em que mora, sem compaixão lhe aumenta o aluguel. Tudo lhe torna difícil; e assim vae o pobre trabalhador lutando com mil difficuldades.

De nada lhe vale um augmento no salario porque tudo quanto necessita para a vida lhe é augmentado. Hoje reside aqui, amanhã é obrigado a se retirar para mais longe e assim vae vivendo até quando deixar esse mundo de sofrimentos. Feliz daquele que tem a sua casa; porque não padecerá tanto quanto os que não a tem. De que modo poderemos viver nestes tempos a não ser morando em casas mal acomodados e sujeitanto-nos ás irregularidades do proprietário inconsciente?

O único meio que temos em mão é o de economias. Hoje guardamos uma fracção do nosso trabalho; amanhã outra e, assim sucessivamente.19 19 Cintra (1924, p. 2).

Na segunda parte do artigo, fica clara a intenção do autor de indicar as dificuldades enfrentadas pelo trabalhador com o custo de vida, às quais se somava o valor mensal do aluguel. Nesse sentido, o autor sugeria as “economias”, apresentadas como único meio para o enfrentamento do problema. O modo de aplicar tais economias foi delineado em outro artigo, publicado em 1926. “Evolução” estimulava os jovens negros a trabalhar para garantir um futuro melhor. Nesse sentido, sugeria: “Não sejamos perdulários, mas sim econômicos!” E, mais à frente, comparando os pretos aos imigrantes:

Vejamos, bondosos patrícios, o bello exemplo que nos dá uma numerosa colônia extrangeira, nesta capital que, com seu trabalho incessante e proveitoso conseguira já reunir a sua economia e é a que actualmente adquire por compra, casas e terrenos nesta capital e mesmo no interior.20 20 Ibid.

Nesses artigos, fica clara a orientação do jornal no sentido de estimular seus leitores a fazer reservas de provisão voltadas para a aquisição da casa própria, em uma campanha de conscientização que iria se estender no meio negro ao longo da década de 1930.

A campanha tornava-se ainda mais incisiva à medida que apontava meios para a realização da compra. Uma nota intitulada “A Economia” anunciava:

Não é privilégio dos brancos! Todos têm direito de possuir alguma cousa. Procurem o Sr. JOÃO LUCIO ou diretamente o escriptorio do Eng.o Cerqueira Leite e Alcides da Costa, que têm optimos terrenos em Villa Paulicéia, Districto de Sant’Anna, e no 4o. Desvio do tramway de Sto. Amaro, que podem ser adquiridos com mensalidades de 66$000 para cima. Rua São Bento, 14, 1o. Andar, sala 28.21 21 Cunha (1926, p. 1).

Em sua clássica pesquisa sobre o meio negro paulistano, Florestan Fernandes identificou a orientação em favor da casa própria presente nesses periódicos:

Nas campanhas desencadeadas pelo Clarim d’Alvorada e pela Frente Negra, apontavam-se as vantagens econômicas, higiênicas, materiais e morais da aquisição de terrenos a prestação, nos arrabaldes, a construção da “casa própria”, etc.22 22 O Clarim da Alvorada (12 ago. 1928, p. 4).

A orientação da pesquisa de Fernandes voltava-se para investigar os meios e os obstáculos à ascensão social do negro no Brasil. O sociólogo defendeu que o desajustamento social do negro era fruto de fatores como a falta de iniciativa e preparo para o trabalho livre e a ausência histórica de meios para a organização da sua vida pessoal e social, associados a questões psicossociais e anomia, que o colocavam em situação de desvantagem com relação ao concorrente imigrante no mercado de oferta de mão de obra. Dessa forma, a campanha em favor da aquisição da casa própria, na sua interpretação, era invocada antes como estratégia de aspiração a um status e adoção dos padrões de vida e de comportamento semelhantes aos dos brancos, como meio necessário para sua assimilação e integração social, que como instrumento de ascensão social per si. Ou seja, para o autor, a fuga à precariedade dos cortiços e aluguéis não representaria, para os negros, uma iniciativa contra a situação de exploração a que estavam submetidos, mas um esforço no sentido de modificar o modo como a sociedade os imaginava, os representava e construía o preconceito racial.23 23 Fernandes (2008 [1964], p. 35).

Além de Fernandes, Pinto24 24 Fernandes (2008 [1964], p. 35). também se deteve na análise dessa campanha, com especial atenção para sua veiculação no jornal A Voz da Raça, o órgão de imprensa da Frente Negra Brasileira. Conforme a autora, a campanha d’A Voz da Raça iniciou-se com vistas a estabelecer uma estratégia para a aquisição da “casa própria” (no sentido de sede) da Frente Negra, ampliando-se posteriormente para a questão do incentivo à aquisição imobiliária entre seu público. Na sua interpretação, a autora ressaltou o aspecto estratégico envolvido, de fomentar a garantia da segurança da família negra.

Rolnik também mencionou a campanha da Frente Negra em sua análise dos territórios negros em São Paulo no pós-abolição. A autora fez referência ao reconhecimento da necessidade dos negros de sair dos cômodos e porões para conquistar uma condição de igualdade em relação aos brancos.25 25 Pinto (1993, p.108-109).

No terceiro número d’A Voz da Raça, a campanha pela aquisição da sede para a Frente Negra foi iniciada por meio de artigo anunciando os estudos realizados por Emílio de Paula Batista, Isaltino Veiga dos Santos e José Souza Camargo com vistas a criar as bases para a compra do prédio que a agremiação alugava. A proposta era levantar doações junto aos “irmãos negros”. Eram sugeridas doações de dez mil-réis. José Souza Camargo, dentista que oferecia serviços aos frentenegrinos, com consultório gabinete instalado na própria sede alugada da associação, à rua da Liberdade, 196, desde 1933, se dispunha a prestar esclarecimentos e receber donativos. O artigo também ressaltava a transparência da campanha: para cada depósito no Banco do Brasil, seria emitido um recibo no qual apareceria também o valor total já arrecadado, de modo que os doadores poderiam acompanhar os seus avanços.26 26 A análise de Rolnik (1997, p. 90) fica prejudicada pela ausência de fontes atestando suposta compra de terrenos em loteamentos recém-abertos como ação concreta da agremiação. Em edições como o n. 33, de 17 de março de 1934A VOZ DA RAÇA. São Paulo, ano II, n. 33, 17 mar. 1934., publicaram-se no jornal os valores arrecadados para a construção da sede da entidade.

No entanto, essa tentativa mostrou-se frustrada, pois os valores arrecadados pela campanha foram insuficientes para a aquisição do imóvel antes da extinção da própria Frente Negra, em 1937. Interessa, porém, que além desse objetivo, a campanha voltou-se para o incentivo da casa própria entre famílias negras, tal como havia feito O Clarim da Alvorada, desde 1924. Assim, no mesmo artigo de 1933, aparece a intenção de expandir a campanha no sentido de estimular a criação de uma poupança para a promoção de habitação para negros:

[...] é também por esse processo, que futuramente haveremos de construir Vilas e casas modestas para a moradia de nossa gente que necessita de conforto moral e material, pois, que são essas as bases essenciais para que a Raça vença em toda linha.27 27 A Voz da Raça (1º abr. 1933, p. 3).

Aqui se percebe a intenção da Frente Negra, por intermédio de seu jornal, de promover empreendimentos imobiliários por meio do associativismo, diferentemente da campanha feita n’O Clarim da Alvorada, que se ateve ao estímulo e à orientação do público leitor, por meio da sugestão de compra de lotes e terrenos em anúncios veiculados. Um debate nesse sentido foi encorajado nas páginas do jornal ao longo da década de 1930. Em 28 de abril de 1933, Arlindo Veiga dos Santos publicou um texto de página inteira, apresentando o programa de sua candidatura à Assembleia Constituinte do Estado de São Paulo. Orientado no sentido do sindicalismo e contra o bolchevismo, o programa defendia a integração do negro “na vida política, social, religiosa, econômica, operária, militar, diplomática, etc.” e a promoção de condições de igualdade para negros e brancos no sentido da formação física, técnica, intelectual, moral, para a “igualdade perante a lei”. O programa também incluía a prerrogativa de “que todos os Brasileiros, na desgraça, tenham ao menos garantia de casa de moradia”.28 28 Ibid.

Seis meses depois, Veiga retomava seus argumentos de forma ainda mais contundente:

Precisa o negro saber que êle tem família ou há-de ter; que precisa conquistar o futuro para si e para os seus; que precisa prever os maus dias da vida, que ninguém está escapo; precisa ter propriedades, seja pelo menos A CASA PRÓPRIA. Cada pai negro, cada família negra deve cultivar esse IDEAL e trabalhar por êle: TER UMA CASA PRÓPRIA VINCULADA. O pai negro que, trabalhando toda a vida e ganhando bem, morre sem deixar uma moradia para os seus, pequenina que seja, é um pai criminoso, indigno, que merece ser desenterrado e fuzilado pela imensa falta que cometeu.29 29 A Voz da Raça (29 abr. 1933, p. 1).

Em seguida, Castelo Alves publica “Flores do Campo”, em que diz:

Lendo o “APELO À ECONOMIA” do Sr. Arlindo Veiga, lembrei de visitar aqui em Sorocaba o nosso irmão frentenegrino sr. Virgílio dos Santos, que vive à testa de numerosa família que tem sido mantida, graças à sua atividade de bom ferroviário, e o morigerar incessante de sua distinta esposa. Pude ver o prédio por ele construído para o seu patrimônio; não é cousa de outro mundo, nem tão pouco uma cousa que assombre a nossa urbe, todavia poderá chamar muito a nossa atenção porque entre os de nossa raça é dos primeiros, e, bem mostra que os nossos vão pouco a pouco progredindo.

O que é mais notável para nós, e, que por certo nos enche a alma de conforto, é a união, (essa fatora inestimável) que presidiou o espírito de todos os membros daquela família frentenegrina que assim pode possuir hoje a sua CASA PRÓPRIA.30 30 Santos (1933, p. 1).

Finalmente, em 1933, aparece pela primeira vez um anúncio de terrenos em Santo Amaro para venda à prestação, em lotes de 10 m x 15 m. O responsável pelas negociações era o próprio dr. Camargo, que também estava empenhado na campanha para a aquisição da sede da Frente Negra Brasileira. O pequeno anúncio seria publicado sistematicamente a partir de então, na maior parte das edições. Textos como o que segue aparecem regularmente nas edições posteriores:

CASAS E TERRENOS A PRESTAÇÕES MÓDICAS

Não pague mais aluguel de casa - faça a sua casa - pois com uma pequena entrada inicial tereis a sua casa própria em lindo bairro da Capital - depois de 60 dias da assinatura do contrato. Para melhor esclarecimento procure hoje mesmo o Dr. Camargo à Rua Liberdade 196 - telefone [...] 31 31 Alves (1933, p. 1).

Fica claro, portanto, que os dois principais jornais da Imprensa Negra de São Paulo nas décadas de 1920 e 1930 estimulavam seus leitores a fazer economias com vistas a realizar a aquisição de imóveis para sua moradia, cada um à sua maneira, mas com estratégias e focos semelhantes. Nesse sentido, é fundamental identificar o empenho dessas campanhas em ampliar a consciência do público negro acerca da importância da casa própria nesse período.

REFERÊNCIAS

As campanhas d’O Clarim da Alvorada e d’A Voz da Raça não eram propriamente originais. Anúncios da Companhia Santista de Crédito Predial, publicados nos diários de grande circulação de São Paulo, mais que apenas sugerir e apontar as vantagens da aquisição de imóvel para moradia, ofereciam um sistema de favorecimento para a construção da casa própria, operando por meio da venda de terrenos a prestações aos mutuários, sem juros e a prazos longos. Assim, uma das possíveis inspirações da campanha pela casa própria nos veículos da imprensa negra paulistana eram as Sociedades Mútuas e Companhias Prediais que operavam no período, no sentido da construção e do financiamento de moradias populares, algumas vezes com isenção de impostos, a exemplo da Companhia Economizadora, da Associação Predial de Santos e da Companhia Santista de Crédito Predial.

A história do mutualismo no Brasil, por sua vez, remete ao período anterior à Proclamação da República e à abolição da escravidão. As primeira Sociedades Mútuas e Beneficentes remontam à década de 1830, mas é no final do século XIX que essa prática se populariza, articulando a solidariedade em torno de questões étnicas, profissionais, religiosas, etc.32 32 A Voz da Raça (29 dez. 1934, p. 2). De Luca33 33 Cf. Batalha (1999). localiza 250 sociedades mutualistas na cidade de São Paulo entre 1855 e 1935, e outras tantas na cidade de Santos e no interior do Estado. Sua finalidade estava associada à proteção social, na forma de indenizações, pensões, previdência, aposentadoria ou socorro para problemas de saúde, de acidentes de trabalho ou morte. Segundo a autora, o processo de urbanização intensa associado à política de imigração e substituição da mão de obra negra escravizada pela branca imigrante, sobretudo após 1880, “estimulava a solidariedade operária, que se manifestava em ligas de resistência, sociedades de socorro mútuo e uniões”.34 34 Luca (1990, p. 20). Basicamente, as sociedades de socorro mútuo funcionavam por meio de contribuições mensais e doações, como uma forma de poupança coletiva para salvaguardar os interesses privados dos grupos mais pobres, independentemente da ação dos seus empregadores, embora algumas dessas sociedades fossem patronais.

Uma parte das sociedades de socorro mútuo era organizada segundo categorias profissionais. De Luca aponta que, entre 1890 e 1935, 18,2% das 68 sociedades identificadas por ela nas cidades de Santos e São Paulo tinham por finalidade “construir casas para os sócios”. Outra parte, totalizando 88 sociedades, organizava-se a partir da solidariedade étnica. Entre elas, predominaram as de nacionalidade europeia, organizadas entre os trabalhadores imigrantes.35 35 Ibid, p. 18.

Entre os negros, as associações mutualistas também foram recorrentes, sobretudo na segunda metade do século XIX. Elas tinham como finalidade prestar auxílio na conquista da liberdade, e foram mais presentes no Rio de Janeiro, sede da Corte Imperial. Jogas36 36 Ibid, p. 82, 124.. mostra, de diferentes ângulos, as transformações do associativismo afrodescendente, que deixou de se articular em torno de confrarias para se organizar em sociedades de assistência mútua, educativa, recreativa ou de religião afro-brasileira. Além disso, ainda percebemos que as associações negras modernas herdaram algumas das principais funções das Irmandades dos Homens Pretos, como a promoção da integração social e a defesa dos interesses dos grupos racialmente discriminados.37 37 Cf. Jogas (2018).. Para São Paulo, De Luca identificou apenas sete associações exclusivamente negras, fundadas entre 1902 e 1917, orientadas para o “desenvolvimento moral, intelectual e social dos membros”.38 38 As irmandades negras atuaram no estabelecimento de vínculos de solidariedade étnica entre escravos, livres e libertos, por meio da penetração da fé católica nesse grupo através do culto a santos negros, buscando reestabelecer antigas formas de sociabilidade rompidas em razão da violência do tráfico escravo. Sua ação incidia sobretudo na forma da ajuda mútua e da promoção da socialização, permitindo o acesso a benefícios sociais e cumprindo um papel que deveria ser da alçada do poder público. Souza (2006, p. 182-5).

No entanto, é de se esperar que, por seus salários baixos e ocupações mal remuneradas, as sociedades mútuas negras tivessem menor prosperidade que as demais. Além disso, os negros eram mal vistos em associações de socorro mútuo não negras e muitas vezes eram expulsos por causa de sua cor.39 39 De Luca, op. cit., p. 152.

Paralelamente à experiência do mutualismo no Brasil, cresceu também, a partir da década de 1880, a tendência à associação para realização de empréstimos financeiros por meio de hipotecas. Os bancos hipotecários foram inicialmente estruturados para o oferecimento de crédito rural. A partir do inicio do sec XIX, porém, surge uma série de sociedades mútuas urbanas que tinham a finalidade de pagar pecúlios e pensões aos seus associados. Nesse período, diversas sociedades prediais passam a captar a poupança de sociedades mútuas para realizar obras de construção civil para interessados em adquirir uma residência.40 40 Batalha (1999, p. 64) aponta que, para o caso das sociedades profissionais anteriores à abolição da escravidão, a rejeição de negros esteve ligada à luta dos trabalhadores livres contra a própria exploração do trabalho na forma da escravidão. Naquele período, os escravos de ganho eram concorrentes imediatos dos trabalhadores livres, representando uma razão para a exclusão de negros em suas associações, fossem eles cativos, libertos ou livres. No entanto, no mesmo trabalho, apresenta evidência de uma associação profissional carioca que, em 1875, não admitia “indivíduos de cor preta, os libertos de qualquer cor” entre seus associados, explicitando a exclusão por critério puramente racial.

Um exemplo dessas sociedades foi a Associação Predial de Santos, fundada em 1904, que administrava fundos mútuos de grupos de cooperados para a aquisição residencial. Cada grupo tinha cem cooperados que realizavam pagamentos fixos mensais para a aquisição de um dos imóveis construídos pela sociedade, com os recursos oriundos dos fundos. A aquisição dava-se por meio de sorteio entre os membros e a parte faltante do pagamento era coberta pela hipoteca do imóvel.41 41 Cf. Correa; Gómes (2013). Até 1942, havia 123 grupos de associados, e cerca de 2.300 casas foram entregues pela cooperativa, sendo que 1.200 já estavam quitadas.42 42 Fernandes (1942, p. 223).

Outra sociedade desse tipo foi a Companhia Santista de Crédito Predial. Anúncios publicados nos diários de grande circulação de São Paulo, como A Gazeta, por exemplo, ofereciam um sistema de favorecimento para a construção da casa própria, operando por meio da venda de terrenos a prestações aos mutuários, sem juros e a prazo longo. Em anúncio de 1927, a companhia publicava que dispunha de terrenos em Santos, São Vicente e São Bernardo.43 43 Ibid, p. 226.

No próprio Clarim da Alvorada, surge um anúncio da Empresa Construtora e Saneamento Predial, em 1929, chamando aqueles que eram inquilinos e que possuíam terrenos próprios a construírem por meio do mutualismo.44 44 A Gazeta (1927, p. 4). O anúncio indica a tendência da imprensa negra de buscar meios para a realização da empreitada que buscava estimular entre seus leitores.

Além da influência das sociedades mutualistas e associações prediais urbanas do início do século XX, uma outra deve ser levada em conta: a imprensa negra norte-americana, representada sobretudo pelo jornal pioneiro Chicago Defender, que foi uma importante referência para o ativismo negro paulistano no jornalismo nesse período. Francisco45 45 O Clarim da Alvorada (jul. 1929, p. 3). demonstra como as matérias publicadas no periódico negro estadunidense influenciaram os ativistas negros em São Paulo desde pelo menos a década de 1920, bem antes, portanto, das lutas pela emancipação na África ou pelos direitos civis norte-americanos. Segundo Francisco, o jornal chegava às mãos dos ativistas paulistas por meio de redes de vínculos transnacionais negros.

O Chicago Defender teve um papel preponderante no estímulo à migração de negros do sul dos EUA, onde sofriam linchamentos e outras violências, para as cidades do norte, onde poderiam encontrar melhores condições de vida e trabalho. O jornal anunciava em suas páginas oportunidades de emprego e indicava igrejas e outras instituições que pudessem ajudar famílias negras do sul a encontrar lugar para morar. Nesse sentido, era possível encontrar em suas páginas tanto anúncios imobiliários como diversas matérias defendendo a aquisição imobiliária.46 46 Francisco (2010, p. 3).

Margaret Garb, que analisou o mercado de aquisição imobiliária residencial em Chicago, contou que os anúncios de imóveis residenciais para famílias negras também eram comuns naquele jornal.47 47 South Side (1929, p. 1, 3); It’s cheaper to... (1945, p. 2). O estímulo à aquisição imobiliária esteve presente na sociedade estadunidense no início do século XX, sobretudo entre as décadas de 1910 e 1930, de forma generalizada, e não apenas na imprensa negra. Aparece por parte de diferentes agentes sociais, incluindo a imprensa geral e também sociólogos, economistas e, posteriormente, os órgãos públicos de fomento à habitação. Em dezembro de 1931, por exemplo, houve uma Conferência em Construção e Aquisição Residencial, promovida na capital federal pela própria Presidência da República. Cf. President’s Conference on... (1931). Em sua pesquisa, Garb indica como os afrodescendentes que tinham recursos suficientes para adquirir casas unifamiliares eram o grupo mais hostilizado no mercado imobiliário. Naquela cidade que foi um dos maiores destinos da Grande Migração, a maior parte dos negros provenientes do sul viviam de aluguel e muitos (cerca de 20% em torno de 1910) se concentraram no chamado Black Belt, uma região ao sul, distante três milhas do centro e precarizada pela falta de investimentos públicos e privados.

O objetivo de Garb foi demonstrar que, além dos proprietários e da própria política pública e legislação urbana, os corretores imobiliários, vendedores e especuladores tiveram um papel preponderante na construção da segregação urbana por cor em Chicago. Assim, um dos personagens apresentados por ela foi o banqueiro e especulador imobiliário negro Jesse Binga, um dos líderes de negócios imobiliários para negros em Chicago nesse período. Sua estratégia de negócio era provocar o medo entre os proprietários brancos de ver os valores de seus imóveis decair por causa da chegada de famílias negras nos bairros. A partir de então, convencia-os da venda de seus imóveis a valores depreciados e os revendia a negros por valores maiores. Forjando uma fronteira de expansão de capitais, os negócios imobiliários por substituição racial foram um empreendimento altamente rentável na Chicago das primeiras décadas do século XX.48 48 Garb (2006, p. 773- 787). Outra técnica para aumentar os rendimentos imobiliários usada por especuladores como Binga foi a de transformar quarteirões ocupados por casas unifamiliares brancas em casas multifamiliares negras, deteriorando a qualidade das residências sem investir nos imóveis e multiplicando os valores de aluguel.

Por meio das questões levantadas por Garb já se nota que as razões para o aparecimento de anúncios e matérias estimulando a propriedade residencial no Chicago Defender não eram idênticas àquelas encontradas nos jornais negros paulistas. No caso da cidade estadunidense, elas incluíam o valor mais alto pago por negros nos alugueis, a deterioração da condição da habitação de aluguel em bairros de concentração negra como o Black Belt, as diferenças de condições de moradia e de valores pagos nos imóveis, seja para compra ou aluguel, entre negros e brancos, as dificuldades de alugar e comprar casas em bairros melhores, a denúncia de pactos impedindo a negociação imobiliária com negros e a melhoria geral das condições de vida das próprias famílias, incluindo sua estabilidade econômica e prosperidade a longo prazo. No entanto, ainda que a situação do mercado imobiliário norte-americano fosse diferente, é importante considerar que os artigos contundentes relacionados à questão da casa própria ensejados naquele periódico foram formadores de opinião entre os ativistas negros de São Paulo, levando a uma intertextualidade, no sentido da transposição de temas, incluindo o da aquisição imobiliária, nos seus jornais.

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O contato com a história de famílias negras que se tornaram proprietárias de imóveis no mesmo período ou logo após as campanhas da imprensa negra paulista permite qualificar o significado da casa própria em relação à mobilidade social dessas pessoas. Com a finalidade de perscrutar esse aspecto envolvido na aquisição de bem imóvel residencial urbano, apresentaremos a seguir o resultado de entrevistas feitas com membros de três famílias negras cujos antepassados adquiriram imóveis para moradia própria nesse período em diferentes bairros da cidade de São Paulo. As famílias selecionadas foram identificadas a partir de contatos da pesquisadora com pessoas que conheciam esses casos. O tema central em foco foi a aquisição da casa própria da família entre as décadas de 1920 e 1940, envolvendo, portanto, uma questão intergeracional, uma vez que as pessoas entrevistadas não foram os agentes das histórias narradas, mas seus descendentes, filhos ou netos.

As entrevistas realizadas são entendidas como documentos orais, fontes capazes de lançar luz sobre temas não registrados em fontes impressas. O uso de entrevistas como fonte exige determinados cuidados por parte do pesquisador, pois envolve diretamente a manipulação de dados e informações produzidas a partir da intersubjetividade entre ele e o entrevistado. Nesse sentido, destaca-se, como orientação geral para a interpretação dos dados coletados nas entrevistas, a sugestão de Bosi, que considera a importância de uma teoria totalizante sobre o processo social que enquadra as narrativas pessoais levantadas: “muito mais que qualquer outra fonte, o depoimento oral ou escrito necessita esforço de sistematização e claras coordenadas interpretativas”.49 49 Ibid., p. 777. Da mesma forma, é necessário “respeitar os caminhos que os recordadores vão abrindo na sua evocação porque são o mapa afetivo da sua experiência e da experiência do seu grupo”.50 50 Bosi (2004, p. 49).

Além disso, intercorrências da subjetividade podem colorir as narrativas levantadas com os tons produzidos por uma memória seletiva e criativa, de modo que a ênfase do entrevistador e a situação do entrevistado interferem diretamente na produção da informação. Em trabalho precursor de coleta de lembranças e depoimentos de pessoas negras para criar um quadro da história do período pós-abolição por meio da técnica da história oral, Mattos reflete sobre os depoimentos como experiências de apropriação e ressignificação da memória daquele período pelos descendentes. Nesse sentido, a autora chama de “memória subjetiva” ou “forma de dizer o indizível” o procedimento que torna possível reportar como relativas a terceiros as memórias de experiências mais degradantes e brutais (torturas e humilhações), recuperando como arquétipo situações reais vividas. Da mesma forma, chama de “silêncio voluntário” a simples recusa à menção do tempo do cativeiro, interpretada por ela como dificuldade de construir uma identidade socialmente positiva com base na escravidão.51 51 Ibid., p. 56. Nesse sentido, a história familiar tenderá a ser contada de forma positiva, valorizando a memória dos personagens descritos. Tendo em vista essas questões, apresentamos aqui os critérios teórico-metodológicos para a coleta e tratamento das informações:

  • - As entrevistas foram previamente agendadas, no local escolhido pelos entrevistados (sua casa, nos três casos) com o tema previamente enunciado;

  • - Foram conduzidas por meio da liberdade de narração do entrevistado; por esse motivo, nos três casos, a historia da aquisição do imóvel se transformou rapidamente na história da família, à medida que demandava explicações sobre as fontes de recursos, quem residia nos imóveis, como foram construídos, etc.;

  • - Em alguma medida, os entrevistados se emocionaram com as lembranças evocadas, e essas emoções foram acolhidas sem a interferência da entrevistadora;

  • - Alguns lapsos de memória foram reconhecidos de forma muito consciente pelos entrevistados, outros foram percebidos pela pesquisadora;

  • - As entrevistas foram gravadas e escutadas várias vezes;

  • - Na medida do possível, os resultados levantados foram submetidos a terceiros para identificação de possíveis desvios decorrentes da intersubjetividade entrevistador-entrevistado, e confrontados com documentação que pudesse atestar as informações levantadas, muito embora algumas vezes seja impossível recuperar a documentação do imóvel (a casa em si é o principal “objeto” de cultura material analisado, tornando-se a principal fonte documental da pesquisa);

  • - Finalmente, o conjunto de casas configurado por meio dessas entrevistas nos leva a uma questão metodológica de outra ordem: por que foram essas e não outras as casas que nos apareceram - que qualidades elas possuem que as levaram a ser incluídas no conjunto a partir dos critérios da investigação?

A seguir, faremos a exposição dos casos levantados.

CASOS

O sr. Omar Gonçalves, entrevistado em 12 de setembro de 2018O. G. [Entrevista cedida a] Ana Claudia Castilho Barone. São Paulo, 12 set. 2018., contou que seus familiares estão entre os primeiros moradores do bairro da Lapa, tendo se mudado para lá em 1904. Seus avós paternos vieram de Macaé, no Rio de Janeiro, e eram “filhos de mães negras alforriadas” no século XIX, ambas casadas com portugueses. Seu avô, Nilontino,

foi aposentado muito cedo da S. P. Railway. Ele era caldeireiro [...] e teve um acidente: ele queimou a vista direita, mas não ficou inativo! Foi trabalhar na Cia. Sorocabana, de 1904 até 1932GONÇALVES, Nilontino. [Atestado]. Atestado de tempo de serviço para rescisão de contrato. São Paulo, 18 jan. 1932. , quando pediu as contas. Com esse dinheiro [mais o dinheiro que papai e as minhas tias davam], eles puderam pagar a construção desta casa.

Seu salário na Sorocabana era de 9$500 mensais, perfazendo um total de 114$000 anuais. Até então, a família morava de aluguel na rua Colle Latino (atual Pio XI), número 03. O casal teve oito filhos, dos quais sete mulheres e um homem.

Em torno de 1924, Nilontino comprou um terreno na rua S., n. 08.

Ele comprou um lote, e era um terreno muito grande, porque não tinha construção nenhuma pra lá [...] Daqui até a esquina estava vazio. Sei disso porque tem uma foto tirada lá daquela pracinha [assim que a casa ficou pronta], em que se vê (sic) todos os lotes de terrenos vazios [A ferrovia passa lá na rua de baixo].

O bairro da Lapa foi escolhido pelas facilidades de transporte. “Todos eles tomavam o trem. O mais perto que ficassem da estação era mais fácil para eles. Toda a movimentação era feita com o trem ou com o bonde”. Assim, deram preferência para morar próximo à estação ferroviária, que representava uma virtude em termos de mobilidade para a família inteira. O lote adquirido era o maior do loteamento. Tinha acesso pela rua S. e também por outra rua que passava pelos fundos.

Quando foi para comprar aqui, [a minha avó] escolheu o lote. Era o maior [...] Papai desenhou a casa mais ou menos, porque ele viu uma casa nesse sentido na Água Branca. Depois que ele desenhou, ele e esse Wolf52 52 Rios; Mattos (2005, p. 32; 53-4). fizeram o desenho de uma maneira que aproveitasse melhor o espaço e economizasse tijolos.

A família demorou anos para construir a casa, que foi finalizada em 1932, com os recursos provenientes da aposentadoria do avô na S. P. Railway e dos anos de trabalho na Sorocabana (figura 1).

Figura 1
Mapa da localização da residência do Sr. Nilontino Gonçalves. Elaboração: Karen Pessoa FreireFREIRE, Karen Pessoa. Mapa da localização da residência do Sr. Nilontino Gonçalves. [São Paulo], [s. d.]..

Tinha galinha, tinha cabra, tinha porco. Porque a casa é muito grande, o terreno é muito grande [...] A horta era para uso doméstico. E [com] as frutas todas vovó fazia doces. Não era para vender, era para nós mesmo. Bananada, cocada, doce de leite... Marmelo, manga, caqui, pera, laranja. Em compota.

O entrevistado descreveu a força do lado feminino da família. “Vovó fazia crochê para fora, então tinha um contato muito grande com pessoas que vinham encomendar”. Era ela quem organizava as contas da família, anotando todos os ganhos e gastos, economizando os recursos dos pagamentos do marido e dos filhos.

Ela era contadora. Eu não sei o significado de contadora na época, não sei se ela era contadora em alguma firma. Porque ela escrevia tudo [...] O seu Osvaldo de Oliveira, que era o advogado do papai [...] disse: sua avó era contadora, ela que organizava tudo para o seu avô [...] E a tia Aninha disse: os proventos de nós todas ela controlava... em um livro-caixa. A construção dessa casa deu muito trabalho. A vovó tinha tudo marcado, [os cimentos, as areias].

Todas as filhas fizeram a Escola Normal no Brás e formaram-se no magistério. Para ir à escola estudar ou trabalhar, usavam o bonde. A primeira casou-se com um funcionário branco da Sorocabana e foi morar “em casa de aluguel. Eles construíram lá na rua C (também na Lapa), onde moram até hoje, um pouco depois desta casa aqui ficar pronta”. No entanto, “seu marido era um homem violento”. As brigas entre o casal levaram a avó do sr. Omar a tomar consciência da importância da independência financeira das filhas. “Aí que me veio a [compreensão] de por que a vovó exigiu que todas as outras, ao casar, tivessem a casa no nome delas, porque aí o homem [poderia ser] posto pra fora e elas ficariam com as crianças [debaixo do] teto delas”. E reitera, em outro momento, por que sua avó fazia tanta questão de que todas as filhas “se casassem com o diploma e com o lote em seu nome: para que não dependessem dos maridos”. Além disso, “todas as tias em algum momento de sua vida tiveram que trabalhar para ajudar na casa [...] Para construírem e terem suas coisas, todas tiveram que ir para o magistério”. Assim, as sete filhas foram instruídas pela mãe a conquistar independência profissional antes do casamento, e obter recursos para adquirir o imóvel residencial em seu nome. Dessa forma, todas estudaram, trabalharam com crochê ou venderam doces até se formarem e ingressaram no magistério, onde ficaram pelo menos até cumprir esse objetivo. Depois de casadas, residiram ainda na casa dos pais até suas próprias casas serem construídas. Dessa forma, todos os primos do sr. Omar e ele próprio nasceram na casa do avô.

O pai de Omar, quarto filho de Nilontino e único homem, casou-se em 1941. “Meu pai ia [para o trabalho] de trem a vida toda. Ele era gerente de uma fábrica de embalagens, na Vinte e Cinco de Janeiro. Ele tomava o trem aqui na Lapa”. Antes de casar, ele trazia o salário para ajudar a família a comprar o terreno e construir a casa, e vivia de outros trabalhos que fazia, consertando flautas e fazendo outros pequenos serviços. Posteriormente, “papai montou uma firma no mesmo ramo; depois que ele encerrou a firma dele eu montei a minha, tudo aqui no meu quintal. Abriu na garagem da casa, depois foi aumentando até ocupar todo o terreno. A gente foi cortando todas as árvores frutíferas, todo o pomar, toda a horta... Foi embora tudo”. O sr. Omar trabalhou nessa firma durante toda sua vida. “Hoje eu vivo do aluguel do espaço e das máquinas”.

A Lapa era um bairro operário ocupado majoritariamente por imigrantes, embora houvesse muitas famílias negras com as quais os familiares do sr. Omar também conviviam. A presença de empresas como a Vidraria Santa Marina, em 1896, ligada às olarias existentes na Várzea do rio Tietê, a Cia. Mecânica Importadora, em 1900, a Fábrica de Tecidos e Bordados, em 1913, as indústrias metalúrgicas Martins Ferreira, em 1914, e Progresso, 1918, e o frigorífico Armour, 1919, reforçavam a caracterização operária do bairro. Antes da inauguração do Mercado da Lapa, em 1954, os moradores, incluindo Nilontino, se organizaram e fundaram uma Cooperativa de Consumo que operou até 1960, quando começou a funcionar mal até sua falência. A cooperativa, o Mercado da Lapa e a própria estação ferroviária contribuíram para reforçar o caráter comercial do bairro, além do industrial.

Alguns aspectos destacam-se, no caso da família do sr. Omar, em relação à questão da aquisição de imóveis. Um deles é a importância que a estação ferroviária da Lapa, e também a linha de bonde, exerceram na organização da vida urbana de toda a família. As três gerações em tela no seu depoimento dependeram ou se beneficiaram do transporte sobre trilhos e, por esse motivo, se fixaram ao seu redor, de forma concentrada, em um dos pontos de extremidade do sistema. A Lapa era ponto final da linha de bonde, onde se fazia a transição entre os dois modais. Sendo assim, o acesso ao centro da cidade era facilitado e permitia o deslocamento fácil do avô para o trabalho, na Sorocabana, das tias para a Escola Normal, localizada no Brás, e do pai para o escritório da firma onde trabalhava, no centro.

Outro aspecto fundamental parece ter sido a estratégia de sua avó de garantir o nome das filhas na escritura dos imóveis. Além disso, o fato de residirem na casa própria do pai, avô do sr. Omar, permitia uma série de condições, entre as quais: 1) não precisarem contribuir com pagamento de aluguéis enquanto estudavam; 2) fazerem um pecúlio antes e depois de formadas com vistas a comprar as suas próprias casas antes do casamento; e 3) continuarem na casa do sr. Nilontino após o casamento, antes das suas casas ficarem prontas. Essa incrível estratégia familiar garantiu não apenas que todos os membros da família estudassem e se formassem sem precisar trabalhar na infância, mas também que tivessem sua própria residência.

Também é notável a forma de utilização do lote adquirido pela família. Tendo escolhido o “maior lote” disponível no loteamento, foi possível, por um lado, construir uma casa de vários cômodos, sendo um reservado para as filhas recém-casadas e, por outro, construir uma pequena unidade produtiva nos fundos, inicialmente ligada à produção de alimentos, com pomar, horta e criação de animais, dando lugar, posteriormente, a uma pequena fábrica que funciona até hoje, com alguns funcionários. Sem dúvida, a estratégia garantiu meios para o sustento da família em diferentes fases dessa evolução, atravessando as gerações que ocuparam a casa.

Um aspecto importante da narrativa exposta é o grau de instrução e a inserção da linhagem feminina da família no mercado de trabalho, desde as bisavós libertas até as tias, que tiveram seu próprio sustento antes do casamento, configurando uma longa condição de persistência no sentido da diferenciação social e da garantia de construção de um patrimônio material transmitido e reproduzido entre as sucessivas gerações. A história da vertente feminina da família do sr. Omar complementa os estudos sobre a autonomia econômica e a participação da mulher como chefe de família desde o século XIX, pois evidencia a situação de mulheres casadas e que atuavam vivamente na composição do orçamento doméstico familiar, em contraste com as “mulheres sós de maridos ausentes” retratadas por Dias e as escravas e libertas em luta pelo direito do exercício da maternidade, estudadas por Machado e Ariza.53 53 Engenheiro Miguel Wolf, responsável técnico pelo projeto da casa. Informação constante no Habite-se do imóvel, emitido em 1º out. 1932. Cf. Prefeitura... (1932). Finalmente, destaca-se ainda que, dos três casos analisados, como se verá, esse é o único em que a família é miscigenada.

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Em entrevista realizada com D. Eloísa Lucrécio no dia 4 de outubro de 2018E. L. [Entrevista cedida a] Ana Claudia Castilho Barone. São Paulo, 4 out. 2018., ela nos contou a história de sua família. “A minha mãe veio muito pequena pra cá [...] Ela era de 1917.” Seus avós vieram de São José de Rio Pardo na década de 1920. Tinham sete filhos. “A minha avó era alfabetizada. Todos os meus tios eram alfabetizados. Tinham o primário”. Foram morar em casa própria, na rua E., n. 25, Vila Fachini, no Jabaquara.

O bairro de Vila Fachini fica localizado próximo ao Parque do Estado, do qual atualmente é separado pela Rodovia dos Imigrantes. D. Eloísa conta que “tinha muita família negra proprietária naquela região. Tinha porque ali [...] agora tem o Complexo Itaú, tem... mas naquele tempo era um lugar menos cotado, meio desprezado”. A região do Jabaquara foi um tradicional reduto da população negra em São Paulo. Um indício disso é a própria toponímia do local: a antiga rua E. nasce na Av. Barro Branco, na altura onde se localiza a Praça Caio Egydio de Souza Aranha, homenagem ao Pai Caio de Xangô (1925-1985), fundador do terreiro de Candomblé Axé Ilê Obá, sediado no bairro desde 1975 e tombado desde 1990 como patrimônio cultural pelo Condephaat (figura 2).

Era um terreno enorme. Só de comprimento tinha 50 metros por uns 25 metros de frente que minha avó comprou. Isso há quanto tempo, hein? Há muitos anos atrás, porque minha mãe era menina... quer dizer... era uma chácara [...] [Tinha até porão! Tinha um poço no quintal, em volta do poço tinha flor], tinha um balanço no quintal, tinha ameixeira, um pé de abacate [...]

Figura 2
Mapa da localização da residência da Sra. Florentina Pinto Ferraz. Elaboração: Karen Pessoa FreireFREIRE, Karen Pessoa. Mapa da localização da residência da Sra. Florentina Pinto Ferraz. [São Paulo], [s. d.]..

Seu avô faleceu jovem, algum tempo depois de vir para São Paulo. Todos os filhos estudaram pelo menos até o primário. A avó cuidou de todos sozinha. “Um dos filhos da minha avó, irmã da minha mãe, tinha uma casa onde é o Complexo Itaú agora, na Av. do Café [...] Um dos outros irmãos comprou uma casa que por sinal era muito bonita, num lugar chamado Predial, na Cidade Vargas”. Talvez se tratasse do loteamento promovido pela Federação dos Empregados do Comércio e do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, inaugurado em 1943 pelo próprio Presidente Vargas.54 54 Dias (1984, p. 25); Machado; Ariza (2018, p. 117- 142). “Esses meus tios quando mudaram lá eram motoristas, sabe? De famílias ricas. [Eles se orgulhavam disso!]” Ambos os irmãos, que eram os mais velhos, adquiriram essas casas.

Nessa época, a região do Jabaquara era muito pouco servida de infraestruturas.

Não tinha eletricidade. Embora aqui tivesse, lá não tinha. Não chegava até lá [...] Tinha ônibus. Só ônibus. O bonde chegava até São Judas. Eu lembro que a gente era pequena e ia visitar a minha avó, a gente andava algumas ruas e chegava no ponto do ônibus [...] Minha mãe não gostava de morar ali. Porque tinha muito mato... Então ela pediu para a minha avó por ela num colégio, para ela sair do mato.

Assim, sua mãe estudou no colégio São José, na Bela Vista. “Ela era interna. Porque para sair do Jabaquara para a Bela Vista...” justificou, insinuando a distância e a dificuldade de realizar esse trajeto diariamente na época.

Seu pai era um importante ativista do movimento negro reportado neste artigo e, portanto, um dos agentes das campanhas em favor da casa própria na imprensa negra. “Meu pai nasceu em Campinas e ficou órfão também pequeno. Ele tinha a mãe dele, que se chamava Margarida. Também não tenho lembrança de meu avô. Eles eram quatro filhos. Ele e mais três irmãos, eram três homens e uma mulher”. As crianças ficaram órfãs muito pequenas. “Quem cuidou deles foi uma tia, irmã do pai, que morava no Bixiga”. D. Eloísa descreve então o bairro: “esses lugares menos cotados que moravam os negros, era o Bixiga, era a vila Jabaquara... isso era a periferia antiga, significava as beiradas do mundo”.

Pela memória de sua infância, o lugar onde ela visitava a tia do pai no Bixiga era um cortiço. O cortiço era enorme, com um corredor central para onde davam os cômodos e um único banheiro nos fundos.

Essa tia se chamava Anacleta. Ela morava em um cortiço [...] Eu me lembro bem que era um portão grande de ferro e os cômodos eram assim, todos na lateral. E lá no fundo era o banheiro. [Me lembro como se fosse o dia de hoje. Eu me lembro que meu pai levava a gente lá. Essa tia ficou de cuidar dos quatro [...] Mas no lugar dela cuidar de todos os filhos, ela se fartou e distribuiu os filhos. Ela pegou cada um deles e não uniu os quatro, ela separou os quatro].

Assim, cada um teve um destino diferente. Cresceram separados e só se reencontraram depois de adultos. “Meu pai foi para uma família, ele chamava de padrinho, um homem branco até, que cuidou do meu pai até ele ficar mocinho. Porque meu pai não queria ficar, também, na dependência [...] Meu pai se fez sozinho, na verdade. Estudou sozinho, trabalhou sozinho, morou sozinho.”

Seu tio Moacir também foi adotado por uma família, com quem também não ficou por muito tempo. “Esse outro irmão dele, muito rigoroso, casou-se também, não teve filhos, e morava no bairro do Limão, em uma casa própria também, comprou a casa dele, casa grande...” A tia, Antônia, casou-se, mas não deixou referências na memória de D. Eloísa. O tio mais novo, José, mudou-se com a família adotiva para o Rio de Janeiro e não voltou mais para São Paulo, exceto para visitas e tratamentos de saúde.

Naquele tempo, o pai de D. Eloísa “ já frequentava a Frente Negra [...] Desde 17 ou 18 anos ele já estava envolvido com esse movimento”. Fez “escola prática de odontologia [...] e começou a trabalhar por conta própria [...] O primeiro consultório dele era na rua Pirapitingui, na Bela Vista.” Quando se casou, foi morar de aluguel na rua Napoleão de Barros. Comprou sua casa no bairro da Praça da Árvore por volta de 1940. O casal teve quatro filhos. Todos obtiveram formação superior. Dois são jornalistas, sendo que o mais velho ingressou na Universidade de São Paulo. A própria Dona Eloísa é musicista e técnica em instrumentação cirúrgica. O quarto irmão tornou-se funcionário público.

“Você vê, Bixiga, Jabaquara, Limão... E meu pai me compra uma casa aqui, fora do circuito!” Perguntada se havia outras famílias negras na Praça da Árvore, D. Eloísa respondeu com a memória do racismo sofrido no convívio com a vizinhança:

Nessa rua tinha uma família negra. Uma. E a nossa. Seu Tomás morreu com mais de 100 anos, morava na casa 5. Ele que era o dono desta casa. Até tinha uma vizinha, que morava na casa 19, da família Petrati, mas ela não deixava de subir e descer e falar bem alto: Aqui não é lugar de negro morar. E cuspia na calçada [...] E os filhos dela, quando a gente ia para a escola, a gente ia bem arrumado, minha mãe fazia um penteado bonito, ele ia atrás jogando pedra, porque a mãe mandava. Era um inferno essa mulher.

Uma marca profunda e indelével de tristeza em sua história familiar.

Neste depoimento, registra-se a forma de inserção urbana da linhagem materna, concentrada no bairro do Jabaquara e deslocada, na geração seguinte, para a Praça da Árvore, mais próxima do centro da cidade e mais bem servida em termos de transportes. A linhagem paterna fez o percurso inverso, se afastando do centro a partir do Bixiga, mas ainda assim o pai montou seu consultório dentário na área central. A aproximação ao centro, seja no endereço residencial ou no comercial, pode ser interpretada como um critério forte de ascensão social.

Da mesma forma que na família de Omar, percebe-se, nesse caso, que a casa própria serviu como esteio para a oportunidade dos filhos se prepararem melhor para a vida adulta, estudando sem precisar trabalhar durante a fase de formação. O fato de todos terem tido formação superior é um segundo critério claro de ascensão social. Surpreende, porém, o caso de superação do seu pai que, mesmo órfão, abriu caminhos para sua formação em profissão liberal e, com isso, pode obter meios para a aquisição imobiliária e a criação dos filhos. Ainda, assim, destaca-se, nesse depoimento, a dificuldade representada pela ascensão social em termos da inserção urbana. O convívio com famílias brancas na rua era interpelado por injúrias e violência, como afronta contra sua presença na sua própria residência.

* * *

Outra família entrevistada foi a de D. Amélia dos SantosA. S. [Entrevista cedida a] Ana Claudia Castilho Barone. São Paulo, 3 out. 2018., 88 anos, residente do Parque Peruche. Sua família foi uma das primeiras a adquirir lote no bairro, na rua V. M. (antiga rua 6 e rua A), n. 998, no início da década de 1940.55 55 Diário da Noite (21 dez. 1943, p. 2). “Nós morávamos no interior [...] Meu irmão trabalhava na aeronáutica e trouxe nós pra cá. Nós moramos na Vila Mariana um tempo, aí meu pai construiu o barraquinho e nós viemos.” Por influência do irmão mais velho, que trabalhava no Campo de Marte, seu pai decidiu comprar o imóvel e fixar residência na capital.

Ajudada por sua irmã, D. França, D. Amélia trouxe em seu depoimento a história pregressa do pai, Amélio Francisco dos Santos. “Meu pai foi escravo [...] Ele casou três vezes. Quando eu nasci, o filho da segunda mulher dele ia casar.” Além disso, “ele falava na língua dele. Quando ele ficava nervoso ele falava em africano”. A família não sabe ao certo com quantos anos ele faleceu, mas calcula mais de cem anos. Segundo D. Amélia, o pai tinha mais de cinquenta anos quando ela nasceu. As irmãs relataram que o pai contava que, quando era pequeno, trabalhava numa fazenda perto de Igarapava, divisa com o Estado de Minas Gerais, de onde fugiu ainda criança. “Ele disse que viu minha avó matada no tronco.” Sobre a vida errante do pai, D. França ainda brincou: “Ele sempre falava para nós: cuidado que eu não sei quem é meus filhos, e vocês vão casar com irmão.”

A revelação da condição escrava do pai em criança nos fez refletir acerca da possibilidade histórica desse fato. Segundo as irmãs, o pai falecera há mais de quarenta anos, já que já havia morrido quando elas perderam a mãe, por volta de 1980. A informação confere com os dados registrados na matrícula de partilha do imóvel da família, registrada em cartório, onde se lê que o sr. Amélio faleceu em 15 de junho de 1973.56 56 Embora a compra tenha sido efetuada na década de 1940, o título aquisitivo (transcrição 43.901) é de 23 ago. 1962, conforme registro de partilha. Cf. 8º Oficial de... (1994, p. 1). Se contava mais de 100 anos nessa data, deve ter nascido antes de 1873. É verossímil, portanto, que ele tenha nascido antes da promulgação da Lei do Ventre Livre, de 1871. D. Amélia e D. França têm hoje 88 e 80 anos, respectivamente, ou seja, nasceram em 1930 e 1938. No nascimento da última filha, o pai teria em torno de 68 anos, idade limite para a geração de filhos. Em termos estritamente matemáticos, a história é possível, embora pouco comum.

“Meu pai era pedreiro, fazia construção [...] Era construtor aqui do Peruche. Quantas casas tem por aí que meu pai fez”. Sabia escrever. Quando veio para a capital, trabalhou durante anos numa firma de cimento no Bom Retiro e, depois de aposentado, tornou-se pedreiro. “Minha mãe trabalhava, ela lavava roupa lá no Bom Retiro, coitada! Trabalhava durante o dia e à noite ela vinha pra casa. Ali na Água Virtuosa passava um córrego e ela lavava roupa lá, com uma porção de senhoras que eu conheci” (figura 3).

Figura 3
Mapa da localização da residência do Sr. Santos. Elaboração: Karen Pessoa FreireFREIRE, Karen Pessoa. Mapa da localização da residência do Sr. Santos. [São Paulo], [s. d.]..

Inicialmente, após a aquisição do terreno, a família construiu apenas um barracão de madeira. D. Amélia conta que, antes de se mudar com a família para o Peruche, ficou trabalhando “numa casa como empregada doméstica. Fiquei cinco anos nessa casa, longe deles. Meu pai e minha mãe aqui e eu lá”. Nessa época, ela tinha apenas 11 anos. “Eu trabalhei 33 anos numa firma só [de guarda-chuvas no Bom Retiro] e a maior parte eu ia a pé.” Ela conta como seus pagamentos ajudaram o pai a pagar a casa. “Meu pai era muito bravo. Ele chegava, o outro mês começava, hoje ele já estava na Vila Mariana. Hoje ele estava lá na porta, ia buscar meu ordenado pra pagar aqui [...] Depois que eu trabalhei nessa firma por 33 anos, eu trabalhei no Buffet Escalla, no Mandaqui, por mais 14 anos”. E ainda trabalhava como voluntária na creche da igreja do bairro, aos sábados.

Os irmãos também ajudavam.

Nós somos três mulheres e três homens [...] Os meus irmãos, quando eram menores, pequenos, meu pai ensinou eles a fazerem [...] aquelas latinhas de massa de tomate, eles punham asas e vendiam. Aí depois eles foram lutar boxe. Um chamava Eurípedes dos Santos, ainda há pouco tempo ainda tinha jornal deles aí. O Éder Jofre [vizinho do bairro] arrumou para ele [...] Ele foi no Japão, na Inglaterra, na Itália.

Todos começaram a trabalhar cedo e não chegaram a concluir os estudos. “Aí meu pai não pode estudar ninguém. Cada um foi um pouco, mas não estudo como tem agora, se formar... aprendeu um pouquinho, estava bom. Tem que trabalhar. Meu pai era assim. Todos começaram a trabalhar cedo”. Depois da carreira no boxe, trabalhavam em serviços mecânicos e metalúrgicos.

O terreno era compartilhado por toda a família. Foram construídas três casas independentes, com suas entradas voltadas para o quintal lateral, para as famílias dos filhos que se casavam. “Minha mãe contava que quando eles estavam morando aqui, era um barraco de madeira.”

Nos anos 40, o deslocamento do Peruche para o Bom Retiro era feito a pé. “Mas o Bom Retiro era tão cheio d’água que batia na bunda da gente de enchente. O patrão da gente deixava a gente na estação da Luz e de lá a gente vinha a pé, porque não tinha transporte. Quando começou, o bonde caiu dentro do rio, aí a gente ia a pé mesmo, até a ponte e de lá a gente ia até o Bairro do Limão.” A linha de bonde chegava até a Casa Verde, mas para além disso não havia meios de transporte.

O bairro, implantado numa porção da Fazenda Mandaqui em 1935, era ainda vazio no início dos anos 1940. Na carta da cidade feita pela São Paulo Tramway Light & Power, em 1943, o loteamento aparece tracejado, porém as ruas estão sem denominação, apenas anotadas por números ou letras. Inicialmente denominado Jardim Esther, o bairro começou a ser implantado em torno de 1916.57 57 Ibid., p. 2. O loteamento recém-aberto ainda não tinha asfalto. As ruas de terra e os lotes ainda não comercializados eram ocupados pela mata. “Aqui não tinha nada. Morria uma pessoa aqui em baixo, tinha que levar no ombro lá perto da delegacia para o carro vir pegar. Erra horrível esse Peruche. Você entrava num carro, ele falava - Onde a senhora vai? - Peruche. - Ah, não, pode descer, lá eu não vou.” Mas explicou: “Não é que é longe. É desavença.”

D. Amélia lembra que o bairro foi sendo ocupado sobretudo por famílias negras. “Tudo gente de cor [...] Não sei se era porque os terrenos eram mais baratos. Ninguém podia comprar em Santana nem na Casa Verde.” Sua mãe contava que “vinham muitos colegas que ficavam uma semana, duas, depois já comprava um pedacinho, meu pai ajudava eles, já fazia um barraquinho, já ficava morando”. Muitas famílias vinham de Minas Gerais.

Diferentemente das narrativas anteriores, aqui a depoente indica que seu pai era africano, ex-cativo e fugitivo, tendo se tornado pedreiro quando fixou endereço no imóvel adquirido no Parque Peruche. A condição do pai determinou uma vida errante por longas décadas antes que pudesse constituir sua terceira família, a única com a qual foi possível ter estabilidade, e teve consequências sentidas ao longo das gerações seguintes. Entre elas, a casa adquirida fica num bairro com piores condições de acesso que os mencionados nos depoimentos anteriores. Além disso, diferentemente dos casos anteriores, em que os descendentes puderam constituir família em imóveis próprios independentes, aqui a família de D. Amélia mantém o padrão agregado até hoje, a partir das diversas unidades construídas no lote adquirido por seu pai.

ESTRATÉGIAS

Alguns dos propósitos das campanhas da imprensa negra em favor da casa própria não surtiram efeito imediato. A compra da sede da Frente Negra foi frustrada, como indicam as prestações de contas publicadas nos jornais, e a proposta de criar um fundo que pudesse ser gerido para financiar a aquisição de imóveis coletivamente nunca pode se realizar. Nesse sentido, se é certo que as possíveis inspirações para essas campanhas viessem por parte das lutas dos negros de Chicago pela garantia do direito de morar e da experiência contemporânea das sociedades prediais, tão bem-sucedidas, mas onde os negros tinham pouco espaço e presença, ou da experiência prévia das associações de socorro mútuo, nas quais os negros tiveram melhor entrada, mas poucos resultados práticos, as campanhas pela casa própria demonstram ser mais uma tentativa de organização negra de grande apelo no sentido da conscientização do grupo. Assim, se algum resultado prático pode ser obtido, ele não se deu por meio de empreendimento realizado coletivamente, como era o desejo daqueles líderes ativistas que propuseram as associações de socorro mútuo, nem tampouco com algum subsídio ou apoio de política pública, seja no financiamento do imóvel ou na forma de aquisição. Pelo contrário, foi o esforço individual de cada família - associado à consciência da necessidade, das possibilidades criadas em função da propriedade do imóvel residencial e às oportunidades particulares abertas a cada uma - que permitiu realizar esses empenhos.

Além disso, essas campanhas são pioneiras e relevantes no sentido do reconhecimento do problema que a obstrução do acesso à casa própria representava para a inserção social do negro. Pioneiras porque se deram muito antes do que a própria bibliografia consolidada sobre o assunto tem identificado para o grupo que denomina genericamente como “classe trabalhadora”. Relevantes porque demonstram que a efetivação do plano de obtenção de imóvel para residência realmente surtiu efeito não apenas na economia doméstica familiar imediata, mas também do ponto de vista geracional.

Essa interpretação fica clara na análise das entrevistas realizadas. Os depoimentos nelas contidos revelam algumas estratégias surpreendentes adotadas por famílias negras ao longo do século XX com vistas a realizar a aquisição da casa própria, bem como seus propósitos e particularidades. Nesta última sessão, faremos uma avaliação dos resultados indicados por essas entrevistas, a fim de tecer comentários sobre alguns aspectos importantes das estratégias adotadas.

Uma primeira questão que parece pertinente e digna de comentário é a recorrência, nos três casos, de alusão a negros alfabetizados entre os familiares mais antigos, engendrando descendentes escolarizados e formados. A alfabetização de pessoas escravizadas é analisada por Wissenbach, que usa atos criminais para discutir a relevância “das práticas de escrita entre escravos e forros na sociedade escravista brasileira” e a “existência de escravos alfabetizados, sublinhando as situações históricas que provocaram tal aprendizado”.58 58 Correio Paulistano (15 fev. 1916). Segundo a autora, a alfabetização era condição extremamente rara entre os escravos, mas foi muito mais comum no meio urbano, sobretudo entre os plantéis do clero e da igreja, mas também entre aqueles que exerciam atividade autônoma, como os escravos de ganho, por exemplo. Nos casos aqui apresentados, as duas avós do sr. Omar, originais de Macaé, haviam sido escravizadas e eram alfabetizadas. No segundo caso, a avó de D. Eloísa, nascida no interior do Estado de São Paulo, também, assim como seus pais. No terceiro, o pai de D. Amélia, vindo da divisa dos estados de Minas Gerais e São Paulo, era africano, havia sido escravizado e sabia ler, porém sua trajetória foi marcada pela fuga do cativeiro. Não é possível estabelecer aqui o grau de alfabetização dessas pessoas. Entretanto, essa recorrência sugere uma relação entre a capacidade de leitura e expressão escrita desses antepassados e sua diferenciação quanto à conquista da propriedade dos seus imóveis residenciais e a capacidade de engendrar famílias que preservaram esses bens nas gerações que se sucederam.

Outro aspecto relevante é que, em todos os casos, os terrenos adquiridos têm características similares: localizam-se em pontos extremos da mancha urbanizada, embora distantes entre si, seja a Norte (Parque Peruche), Oeste (Lapa) ou Sul (Jabaquara), e são relativamente grandes (figura 4).

Figura 4
Mapa da localização dos imóveis das famílias dos entrevistados. Fonte: São Paulo Tramway Light and Power. Planta da Cidade de São Paulo e Municípios Circunvizinhos, escala 1:50.000, 1943. Elaboração: Karen Pessoa FreireREPARTIÇÃO de Eletricidade da The São Paulo Tramway, Light & Power Co. Ltd. Planta da Cidade de São Paulo e Municípios Circunvizinhos [mapa]. São Paulo: The São Paulo Tramway, Light & Power Co. Ltd; 1943..

Essas características nos dão pistas para compreender por que esses foram os exemplos reunidos a partir da pergunta central da investigação, sobre imóveis residenciais adquiridos por famílias negras entre as décadas de 1920 e 1940 em São Paulo, os quais permaneceram em propriedade das mesmas ao longo das sucessivas gerações até hoje. Ou seja, nos provocam a reflexão sobre as características comuns entre esses imóveis, que fizeram com que fossem incluídos nesta investigação. Por um lado, a compra de lotes periféricos, nas franjas da urbanização, indica o menor poder aquisitivo dessas famílias em relação a famílias brancas. A localização dos três imóveis nos limites externos do sistema de transportes sobre trilhos é sintomática tanto da sua localização periférica como da posição estratégica de ligação com o centro pela rede de transportes disponível. Por outro, indica também a inteligência da estratégia de garantir uma fixação urbana em locais menos visados pelos processos de expulsão decorrentes de grandes obras urbanas, nos bairros mais distantes de uma cidade que crescia e se expandia a olhos vistos. Em pouco tempo, portanto, terrenos com aquelas dimensões não poderiam mais ser adquiridos. O valor imobiliário de lotes vazios nas franjas da urbanização na década de 1920 era relativamente baixo e a autoconstrução em prazos longos permitia atingir um padrão de vida diferenciado nesses bairros. Além disso, o tamanho dos terrenos remetia ao espaço externo amplo das residências rurais, com seus quintais e seu múltiplo aproveitamento. Permitia, por um lado, algum cultivo vegetal ou criação animal, posteriormente substituído pela implantação de espaço para alguma unidade produtiva, como a fabrica doméstica de embalagens do pai do sr. Omar, por exemplo, e por outro, também a exemplo dos costumes do campo, dava condições para a família agregada, ou seja, a permanência dos filhos na casa depois de casados, o que se mostrou uma estratégia excelente para fomentar novas aquisições imobiliárias na segunda geração.

Além disso, a preservação da propriedade na mesma família durante longo prazo é uma excepcionalidade que requer certa estabilidade familiar, um patamar de receita doméstica, um grau de educação, etc. Por isso, é importante destacar também o tipo de profissão dos compradores de imóveis. Temos, na primeira família, um empregado de duas Companhias de Estradas de Ferro, a São Paulo Railway e a Sorocabana, com sua esposa no controle da economia doméstica, as filhas professoras e um filho funcionário de firma; na segunda um profissional liberal, no caso, dentista, e seus filhos jornalistas, uma profissional de saúde e um funcionário público e, na terceira, um pedreiro casado com uma lavadeira, cuja filha foi funcionária de empresas diversas, industriais ou de serviços, um filho militar e um esportista, além das mulheres que trabalhavam “para fora” ou em serviços domésticos. Fica clara a posição menos favorecida da última família em relação às demais, incorrendo em sua condição de maior dificuldade na segunda geração.

Ainda assim, destaca-se a estratégia familiar adotada no último caso, em que a família construiu inicialmente um barraco e posteriormente foi reunindo recursos para a construção definitiva, composta por diversas unidades no mesmo lote. Leva a refletir também acerca do prolongamento da situação instável inicial, no período da aquisição do lote, e conquista efetiva da casa própria posteriormente, com a reunião das condições para a realização da construção por vários membros da família.

A bibliografia sobre as companhias ferroviárias tem anotado que, como empregadoras, sua preferência era por trabalhadores nacionais sobre os estrangeiros, mas excluía pretos e pardos. Esses, quando eram empregados, assumiam as posições mais baixas, geralmente em ocupações manuais. Mesmo assim, é digno de nota que as companhias férreas eram empregadoras estáveis e ofereciam salários atraentes para seus funcionários, representando uma oportunidade de ingresso no mercado de trabalho para todos os perfis. No caso dos negros, destaca-se a viabilização da aquisição do bem de maior valor, o imóvel, entre os trabalhadores ferroviários, uma vez que as ferrovias ofereciam aos seus funcionários, além da estabilidade, uma série de direitos trabalhistas, como seguro e aposentadoria, cobertura contra acidentes de trabalho, etc., garantindo a formação de uma renda adicional que constituiu a poupança com a qual o imóvel pode ser adquirido.

A diversidade dos outros empregos citados demonstra o gradiente no qual os negros foram absorvidos no mercado de trabalho: profissionais liberais, professores e funcionários públicos, funcionários de pequenas indústrias e de serviços, pedreiros, lavadeiras e domésticas.

Finalmente, um último aspecto merecedor de análise é o entendimento acerca da negritude dos entrevistados em relação às gerações envolvidas. Os três casos são bastante distintos nesse sentido. No primeiro, o entrevistado demonstrou orgulho em se apresentar como membro de uma família negra de sucesso, porém demarcando a importante passagem do casamento de ambas as bisavós com homens portugueses. A presença branca na família é um claro indício do embranquecimento familiar que o depoente buscou registrar em sua fala. No segundo caso, nenhuma menção à cor dos familiares foi feita pela entrevistada. Tampouco alusão ao período da escravidão. Sua fala, porém, deixou subentendida a raça negra de todos os membros aludidos no depoimento, uma vez que era consensual a informação do ativismo negro de seu pai. Já no último caso, em que a família era claramente mais pobre que as anteriores, não houve resistência em vincular a origem familiar à condição cativa, ao que se soma o tratamento desse elemento de vinculação com o heroísmo e a singularidade do negro em fuga.

As campanhas dos jornais da imprensa negra permitem reconhecer as razões pelas quais foi feita a defesa da casa própria, sob o ponto de vista dos negros socialmente organizados. Esses resultados dialogam diretamente com a defesa “oficial” da casa própria pelas políticas públicas que, justamente entre os negros, foram tão inábeis no sentido de garantir o emprego estável, os recursos financeiros na forma dos salários e benefícios e facilidades para a aquisição do imóvel.

As dificuldades enfrentadas pelos negros para encontrar locais para residir na cidade eram muitas. Expressam-se, por exemplo, nas barreiras também para se organizarem coletivamente para adquirir uma casa, seja na forma de sociedades negras pensadas para esse fim, por escassez de recursos, seja na forma de sua inclusão em sociedades já existentes, porém quase sempre feitas por e para trabalhadores brancos.

Vale a pena também ressaltar como o método da história oral nos remete à reconstrução de um panorama geracional, possibilitando avaliar os resultados de ações realizadas há cerca de cem anos sobre as sucessivas gerações que delas puderam se beneficiar. Assim, essas entrevistas demonstram que os motivos que levaram os negros a adquirir suas casas no período em que a imprensa negra divulgava suas campanhas divergem em boa parte das razões de higiene e de conforto moral pressupostas pelos dois jornais. Na verdade, a estabilidade encontrada nas entrevistas diz respeito à aplicação das economias dessas famílias em um bem de raiz que representava, por um lado, um patrimônio transmissível e, por outro, uma condição imprescindível para a formação pessoal e profissional completa das gerações seguintes até a idade adulta.

À luz de todas essas dificuldades, os casos aqui analisados trazem pistas para uma nova formulação do problema da casa própria, a partir do ponto de vista racial. Em um momento em que a compra de lotes urbanos se fazia à vista, que os preços do solo urbano nas franjas do tecido urbanizado eram mais acessíveis e que não havia nenhum tipo de financiamento para a realização da compra, os depoimentos das famílias negras aqui reportados indicam precocidade, especificidades e estratégias que representam novos desafios para a reflexão sobre as formas da provisão de habitação nas cidades brasileiras. Como havia lembrado Carpintéro no seu importante trabalho da década de 1990, os trabalhadores também tinham como horizonte a casa própria, já nas primeiras décadas do século XX. Alguns negros realizaram esse empenho. Hoje, eles se tornam uma fonte indispensável da narrativa de sua própria história, na qual a luta pela obtenção da casa se mistura à luta pela sobrevivência e pela ascensão social ao longo das sucessivas gerações.

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  • JOGAS, Camila Menegardo Mendes. Mutualismo e Fronteira Racial: Sociedades De Trabalhadores Negros e Conselho de Estado no Rio De Janeiro do Século XIX. Revista Trilhas da História: revista do curso de história da UFMS, Três Lagoas, v. 7, n. 14, p. 5-25, jan-jun 2018.
  • LAGO, Luciana Corrêa; RIBEIRO, Luiz C. Queiroz. A casa própria em tempo de crise: Os novos padrões de provisão de moradia nas grandes cidades. In: RIBEIRO, Luiz C. Queiroz; AZEVEDO, Sérgio (orgs.). A crise da moradia nas grandes cidades: Da questão da habitação à reforma urbana. Rio de Janeiro: UFRJ, 1996.
  • MACHADO, Maria Helena; ARIZA, Marília. Escravas e libertas na cidade: experiências de trabalho, maternidade e emancipação na cidade de São Paulo (1870-1888). In: BARONE, Ana Cláudia Castilho; RIOS, Flávia. Negros nas cidades Brasileiras São Paulo: Intermeios: Fapesp: LabRaça, 1988, p. 117-142.
  • MARICATO, Ermínia. Autoconstrução: a arquitetura possível. In: MARICATO, Ermínia. A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial São Paulo: Alfa-Ômega, 1982.
  • OLIVEIRA, Francisco de. Economia Brasileira: crítica da razão dualista. Estudos Cebrap, n. 2. São Paulo: Brasiliense , 1971.
  • PINTO, Regina Paim. O movimento negro em São Paulo: luta e identidade. 1993. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1993.
  • RIOS, Ana Lugão; MATTOS, Hebe. Memórias do Cativeiro Família, Trabalho e Cidadania no Pós-Abolição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.
  • ROLNIK, Raquel. A cidade e a lei Legislação, Política Urbana e Territórios na Cidade de São Paulo. São Paulo: Studio Nobel: Fapesp, 1997.
  • SAMPAIO, Maria Ruth Amaral de. O papel da iniciativa privada na formação da periferia paulistana. Espaço e Debates, São Paulo, v. 37, p. 19-33, 1994.
  • SOUZA, Mariana de Mello. Reis Negros no Brasil Escravista História da Festa de Coroação de Rei Congo. Belo Horizonte: UFMG, 2006.

ENTREVISTAS

  • A. S. [Entrevista cedida a] Ana Claudia Castilho Barone. São Paulo, 3 out. 2018.
  • E. L. [Entrevista cedida a] Ana Claudia Castilho Barone. São Paulo, 4 out. 2018.
  • O. G. [Entrevista cedida a] Ana Claudia Castilho Barone. São Paulo, 12 set. 2018.
  • 3
    Carpintéro (1997CARPINTÉRO, Marisa Varanda T. A Construção de um Sonho: Os engenheiros-arquitetos e a formulação da política habitacional no Brasil. Campinas: Unicamp, 1997., p. 15).
  • 4
    Cf. Lago; Ribeiro (1996LAGO, Luciana Corrêa; RIBEIRO, Luiz C. Queiroz. A casa própria em tempo de crise: Os novos padrões de provisão de moradia nas grandes cidades. In: RIBEIRO, Luiz C. Queiroz; AZEVEDO, Sérgio (orgs.). A crise da moradia nas grandes cidades: Da questão da habitação à reforma urbana. Rio de Janeiro: UFRJ, 1996. ), Bonduki (2004BONDUKI, Nabil G. As Origens da Habitação Social no Brasil: Arquitetura Moderna, Lei do Inquilinato e Difusão da Casa Própria. 4. ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2004. ).
  • 5
    Cf. Sampaio (1994SAMPAIO, Maria Ruth Amaral de. O papel da iniciativa privada na formação da periferia paulistana. Espaço e Debates, São Paulo, v. 37, p. 19-33, 1994.), Bonduki, op. cit.
  • 6
    Cf. Azevedo; Andrade (1982AZEVEDO, Sérgio de; ANDRADE, Luis Aureliano Gama de. Habitação e Poder: da Fundação da Casa Popular ao Banco Nacional. São Paulo: Zahar, 1982.).
  • 7
    Nos classificados de imóveis urbanos, desde esse período, a expressão “casa própria” era utilizada genericamente para identificar imóveis “apropriados” para uso residencial (Correio Paulistano, 30 ago 1870CORREIO PAULISTANO. São Paulo, 30 ago. 1870, p. 3., p. 3), ou simplesmente para indicar uma oferta para venda ou aluguel (Correio Paulistano, 3 jan. 1883CORREIO PAULISTANO, São Paulo, 3 jan.1883, p. 5., p. 5), conotações que permanecem nos anúncios das primeiras décadas do século XX. Já para anúncios comerciais, o termo significava que o dono do estabelecimento era proprietário do imóvel (A Gazeta, 5 jun. 1914A GAZETA. São Paulo, 5 jun. 1914.); ou ainda que um serviço, como amas de leite ou aulas de piano, por exemplo, seria oferecido na casa do anunciante (Correio Paulistano, 12 ago. 1916CORREIO PAULISTANO, São Paulo, 12 ago. 1916, p. 2., p. 2). Os artigos de imprensa referidos neste texto foram consultados por meio da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.
  • 8
    Cf. Os filhos perdidos... 1881OS FILHOS perdidos. Correio Paulistano. São Paulo, 19 jul. 1881.)
  • 9
    Cf. Incoherencia de louco (1909INCOHERENCIA de louco. Correio Paulistano. São Paulo, 13 dez. 1909, p. 5.).
  • 10
    Cf. Casas baratas para... (1917CASAS baratas para operários. A Gazeta. São Paulo, 19 maio 1917, p. 2.).
  • 11
    Bollafi (1975BOLAFFI, Gabriel. Habitac?a?o e urbanismo: O problema e o falso problema. In: MARICATO, E. (Org.). A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial. São Paulo: Alfa-Omega, 1982. p. 37-70., p. 37-70).
  • 12
    Cf. Azevedo; Andrade, op. cit.
  • 13
    Cf. Oliveira (1972OLIVEIRA, Francisco de. Economia Brasileira: crítica da razão dualista. Estudos Cebrap, n. 2. São Paulo: Brasiliense , 1971.)
  • 14
    Cf. Maricato (1982MARICATO, Ermínia. Autoconstrução: a arquitetura possível. In: MARICATO, Ermínia. A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial. São Paulo: Alfa-Ômega, 1982.).
  • 15
    Cf. Araújo (2015ARAÚJO, Ana Cristina da Silva. A casa [própria] alugada: questões da política pública habitacional. Risco: revista de pesquisa em arquitetura e urbanismo do IAU-USP, São Paulo, v. 7, n. 1, 2015.).
  • 16
    A título de exemplo, veja-se o caso atual descrito no jornal Gazeta do Povo: “Enquanto Ana Claudia visitava o apartamento, o pro prietário simplesmente desistiu da locação, sem motivo aparente. ‘Os contratos não davam certo depois da visita. Houve um caso em que o dono até falou que não era para eu pensar que fosse por causa da minha cor’, lembra”. Porta fechada para... (2013PORTA fechada para discriminação. Gazeta do Povo. São Paulo, 14 maio 2013. Disponível em: <Disponível em: https://bit.ly/2HNNe49 >. Acesso em: 21 jan. 2019.
    https://bit.ly/2HNNe49...
    ).
  • 17
    Cf. Ferrara (1986FERRARA, Miriam Nicolau. A imprensa negra paulista (1915-1963). São Paulo: EDUSP, 1986. ).
  • 18
    Cf. Bastide (1973BASTIDE, Roger. A Imprensa Negra do Estado de São Paulo. In: BASTIDE, Roger. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Perspectiva, 1973.).
  • 19
    Cintra (1924CINTRA, Moysés. O Clarim da Alvorada. São Paulo, ano I, n. 7, 12 out. 1924, p. 2. , p. 2).
  • 20
    Ibid.
  • 21
    Cunha (1926CUNHA, Horácio da. Evolução. O Clarim da Alvorada. São Paulo, ano I, n. 236, 24 jul. 1926, p. 1., p. 1).
  • 22
    O Clarim da Alvorada (12 ago. 1928O CLARIM DA ALVORADA. São Paulo, ano I, n. 07, 12 ago. 1928, p. 4., p. 4).
  • 23
    Fernandes (2008FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. 2 v. Obras reunidas de Florestan Fernandes. São Paulo: Globo, 2008 [1964]. [1964], p. 35).
  • 24
    Fernandes (2008FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. 2 v. Obras reunidas de Florestan Fernandes. São Paulo: Globo, 2008 [1964]. [1964], p. 35).
  • 25
    Pinto (1993PINTO, Regina Paim. O movimento negro em São Paulo: luta e identidade. 1993. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1993., p.108-109).
  • 26
    A análise de Rolnik (1997ROLNIK, Raquel. A cidade e a lei. Legislação, Política Urbana e Territórios na Cidade de São Paulo. São Paulo: Studio Nobel: Fapesp, 1997., p. 90) fica prejudicada pela ausência de fontes atestando suposta compra de terrenos em loteamentos recém-abertos como ação concreta da agremiação.
  • 27
    A Voz da Raça (1º abr. 1933A VOZ DA RAÇA. São Paulo, ano I, n. 03, 1º abr. 1933, p. 3. , p. 3).
  • 28
    Ibid.
  • 29
    A Voz da Raça (29 abr. 1933A VOZ DA RAÇA. São Paulo, ano I, n. 07, 29 abr. 1933, p. 1. , p. 1).
  • 30
    Santos (1933SANTOS, Arlindo Veiga dos. Apelo à economia. A voz da raça. São Paulo, ano I n. 24, 28 out. 1933, p. 01. , p. 1).
  • 31
    Alves (1933ALVES, Castelo. Flores do Campo. A voz da Raça. São Paulo, ano I, n. 26, 25 nov. 1933, p. 1 , p. 1).
  • 32
    A Voz da Raça (29 dez. 1934A VOZ DA RAÇA. São Paulo, ano II, 29 dez. 1934, p. 2., p. 2).
  • 33
    Cf. Batalha (1999BATALHA, Cláudio. Sociedades de trabalhadores no Rio de Janeiro do século XIX: algumas reflexões em torno da classe operária. Cadernos AEL, Campinas, v. 6, n. 10/11, p. 41-68, 1999.).
  • 34
    Luca (1990De LUCA, Tânia Regina. O Sonho do Futuro Assegurado (O Mutualismo em São Paulo). São Paulo: Contexto, 1990., p. 20).
  • 35
    Ibid, p. 18.
  • 36
    Ibid, p. 82, 124..
  • 37
    Cf. Jogas (2018JOGAS, Camila Menegardo Mendes. Mutualismo e Fronteira Racial: Sociedades De Trabalhadores Negros e Conselho de Estado no Rio De Janeiro do Século XIX. Revista Trilhas da História: revista do curso de história da UFMS, Três Lagoas, v. 7, n. 14, p. 5-25, jan-jun 2018.)..
  • 38
    As irmandades negras atuaram no estabelecimento de vínculos de solidariedade étnica entre escravos, livres e libertos, por meio da penetração da fé católica nesse grupo através do culto a santos negros, buscando reestabelecer antigas formas de sociabilidade rompidas em razão da violência do tráfico escravo. Sua ação incidia sobretudo na forma da ajuda mútua e da promoção da socialização, permitindo o acesso a benefícios sociais e cumprindo um papel que deveria ser da alçada do poder público. Souza (2006SOUZA, Mariana de Mello. Reis Negros no Brasil Escravista. História da Festa de Coroação de Rei Congo. Belo Horizonte: UFMG, 2006., p. 182-5).
  • 39
    De Luca, op. cit., p. 152.
  • 40
    Batalha (1999BATALHA, Cláudio. Sociedades de trabalhadores no Rio de Janeiro do século XIX: algumas reflexões em torno da classe operária. Cadernos AEL, Campinas, v. 6, n. 10/11, p. 41-68, 1999., p. 64) aponta que, para o caso das sociedades profissionais anteriores à abolição da escravidão, a rejeição de negros esteve ligada à luta dos trabalhadores livres contra a própria exploração do trabalho na forma da escravidão. Naquele período, os escravos de ganho eram concorrentes imediatos dos trabalhadores livres, representando uma razão para a exclusão de negros em suas associações, fossem eles cativos, libertos ou livres. No entanto, no mesmo trabalho, apresenta evidência de uma associação profissional carioca que, em 1875, não admitia “indivíduos de cor preta, os libertos de qualquer cor” entre seus associados, explicitando a exclusão por critério puramente racial.
  • 41
    Cf. Correa; Gómes (2013CORREA, Fábio Rogério Cassimiro; GÓMEZ, Juan Lucas. Un acercamiento al financiamento hipotecario en Argentina y Brasil durante la primera mitad del siglo XX: las experiencias de F.I.N.C.A. y la Associação Predial de Santos. In: 7° Congresso CEISAL, 2013, Porto. 7° Congresso CEISAL, 2013.).
  • 42
    Fernandes (1942FERNANDES, Amando B. A Associação Predial de Santos como Pioneira da ‘Casa Própria’ e o Muito que ela Podera? Fazer Nesse Sentido. Revista do Arquivo Municipal (Jornada da Habitação Econômica). Sa?o Paulo, v. 83, n. 7, p. 219-226, 1942. , p. 223).
  • 43
    Ibid, p. 226.
  • 44
    A Gazeta (1927A GAZETA. São Paulo, 29 jul. 1927, p. 4., p. 4).
  • 45
    O Clarim da Alvorada (jul. 1929, p. 3).
  • 46
    Francisco (2010FRANCISCO, Flávio. Fronteiras em definição: identidades negras e imagens dos Estados Unidos e da África no jornal O Clarim da Alvorada (1924-1932). 2010. Dissertação (Mestrado em História Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010., p. 3).
  • 47
    South Side (1929SOUTH Side. Chicago Defender, 18 maio 1929, p. 1, 3., p. 1, 3); It’s cheaper to... (1945IT’S CHEAPER to own than to pay rent. Chicago Defender, 13 out. 1945, p. 2. , p. 2). O estímulo à aquisição imobiliária esteve presente na sociedade estadunidense no início do século XX, sobretudo entre as décadas de 1910 e 1930, de forma generalizada, e não apenas na imprensa negra. Aparece por parte de diferentes agentes sociais, incluindo a imprensa geral e também sociólogos, economistas e, posteriormente, os órgãos públicos de fomento à habitação. Em dezembro de 1931, por exemplo, houve uma Conferência em Construção e Aquisição Residencial, promovida na capital federal pela própria Presidência da República. Cf. President’s Conference on... (1931PRESIDENT'S Conference on Home Building and Home Ownership. Washington, D.C.: 1931.).
  • 48
    Garb (2006GARB, Margaret. Drawing the “color line”: Race and Color Line in Early Twentieth-Century Chicago. Journal of Urban History, vol. 32, n. 5, p. 773-787, jul. 2006., p. 773- 787).
  • 49
    Ibid., p. 777.
  • 50
    Bosi (2004BOSI, Ecléa. O tempo vivo da memória. Ensaios de Psicologia Social. São Paulo: Ateliê, 2004., p. 49).
  • 51
    Ibid., p. 56.
  • 52
    Rios; Mattos (2005RIOS, Ana Lugão; MATTOS, Hebe. Memórias do Cativeiro. Família, Trabalho e Cidadania no Pós-Abolição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005., p. 32; 53-4).
  • 53
    Engenheiro Miguel Wolf, responsável técnico pelo projeto da casa. Informação constante no Habite-se do imóvel, emitido em 1º out. 1932. Cf. Prefeitura... (1932PREFEITURA do Município de São Paulo. Habite-se, 1 out. 1932.).
  • 54
    Dias (1984DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e Poder em São Paulo no século XIX. São Paulo: Brasiliense, 1984., p. 25); Machado; Ariza (2018MACHADO, Maria Helena; ARIZA, Marília. Escravas e libertas na cidade: experiências de trabalho, maternidade e emancipação na cidade de São Paulo (1870-1888). In: BARONE, Ana Cláudia Castilho; RIOS, Flávia. Negros nas cidades Brasileiras. São Paulo: Intermeios: Fapesp: LabRaça, 1988, p. 117-142., p. 117- 142).
  • 55
    Diário da Noite (21 dez. 1943DIÁRIO DA NOITE. São Paulo, 21 dez. 1943, p. 2., p. 2).
  • 56
    Embora a compra tenha sido efetuada na década de 1940, o título aquisitivo (transcrição 43.901) é de 23 ago. 1962, conforme registro de partilha. Cf. 8º Oficial de... (19948º OFICIAL de Registro de Imóveis da Capital. Matrícula 110.283, 25 maio 1994., p. 1).
  • 57
    Ibid., p. 2.
  • 58
    Correio Paulistano (15 fev. 1916CORREIO PAULISTANO, São Paulo, 15 fev. 1916.).
  • 1
    Agradeço ao colega Petrônio Domingues pela sugestão do objeto desta pesquisa
  • 59
    Wissenbach (2002, p. 109-111).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    25 Mar 2019
  • Aceito
    21 Nov 2019
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