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Talamotomia e palidotomia estereotáxica no tratamento da doença de Parkinson

CORRESPONDÊNCIA

Talamotomia e palidotomia estereotáxica no tratamento da doença de Parkinson

Nós lemos com um grande prazer o artigo excelente de Ferraz, Aguiar e os seus colegas1 sobre talamotomia e palidotomia em pacientes com a doença de Parkinson. Nós lembramos das experiências de R. Meyers, mencionadas nas Referências deste artigo, nos Estados Unidos com a cirurgia na doença de Parkinson. O procedimento que, depois de várias tentativas com diversas técnicas, Meyers usava foi mais ou menos semelhante ao procedimento de Ferraz e Aguiar, mas a operação de Ferraz e Aguiar é bem mais sofisticada.

Entretanto, com o passar dos anos problemas psiquiátricos graves surgiram nos pacientes de Meyers e de todos os outros neurocirurgiões que faziam este tipo de cirurgia. Eles gradualmente ficaram impulsivos e insensíveis aos sentimentos de outras pessoas. Eles não tinham quaisquer sentimentos de culpa ou ansiedade sobre os seus atos anti-sociais e o sofrimento que eles causaram a outras pessoas, e eles não aprenderam de seus atos socialmente desastrosos. Um de nós (AHC) lembra de um destes pacientes que, jogando golfe mal, um dia subitamente atacou o seu parceiro fisicamente com uma das suas clavas de golfe. Este quadro foi mais ou menos semelhante à categoria de "personalidade psicopata" em algumas nomenclaturas psiquiátricas. Devido a estas complicações psiquiátricas severas, e não devido à introdução de l-dopa, no fim da década de 1960, quase todos os neurocirurgiões com o tempo abandonaram esse procedimento.

O procedimentos dos autores é bem mais específico do que o procedimento de Meyers mas é, na nossa opinião, basicamente semelhante. O período de observação pós-operatória de Ferraz e Aguiar é curto. Nós esperamos, e queremos, que os pacientes deles não venham a ter problemas psiquiátricos com o tempo, porque os resultados neurológicos, de Meyers e de Ferraz e Aguiar, são bons e às vezes extraordinários. Mas observação durante 5 a 10 anos é necessária.

Um de nós (AHC) em 1963 em Kansas City, Missouri, ouviu um discurso que Meyers deu sobre o seu procedimento a um grupo de médicos. Ele foi nacionalmente aceito como o líder neste campo nos Estados Unidos. Meyers nunca perdeu confiança no procedimento. No fim do discurso, durante o período de perguntas, um médico perguntou sobre problemas psiquiátricos pós-operatórios nesses pacientes. A resposta de Meyers foi: "É claro que você não opera pacientes psicóticos."

REFERÊNCIA

1. Ferraz FP, Aguiar PMC, Ferraz HB, Bidó JO, Souza AA, Andrade LAF. Talamotomia e palidotomia com planejamento estereotáxico no tratamento da doença de Parkinson. Arq Neuropsiquiatr 1998;56:789-797.

Conquista, 7 de dezembro de 1998.

A. H. Chapman; Djalma Vieira e Silva; Miriam Chapman Santana

Hospital Samur, Caixa Postal 98 - 45100-000 Vitória da Conquista BA

RESPOSTA DOS AUTORES

Agradecemos os comentários enviados por Dr. Chapman e colaboradores a respeito de nossa publicação1. Complicações psiquiátricas podem ocorrer em decorrência da cirurgia ablativa para o tratamento da doença de Parkinson. Mesmo os pacientes que não são submetidos ao tratamento cirúrgico podem vir a apresentá-las em decorrência da própria doença, ou do uso de drogas antiparkinsonianas 2. O perfil do paciente selecionado para o tratamento cirúrgico atualmente difere, em alguns aspectos, daqueles operados antigamente, quando a cirurgia era indicada mesmo em formas não- idiopáticas de parkinsonismo e, na maioria das vezes, sem que os pacientes fossem submetidos a uma avaliação neuropsicológica mais minuciosa. Felizmente, o refinamento tecnológico, e a seleção mais rigorosa dos pacientes candidatos à cirurgia, têm contribuído para que essa e outras complicações cirúrgicas sejam minimizadas. Em estudos mais recentes, que acompanharam os pacientes submetidos a talamotomia ventro-lateral ou a palidotomia póstero-ventral por períodos que variaram entre 1 e 13 anos, não foram observadas complicações psiquiátricas a longo prazo 3-10. Quando essas ocorriam, eram no pós- operatório imediato, e de caráter transitório. O nosso artigo relatou apenas o acompanhamento a curto prazo de nossos pacientes. Na casuística apresentada, três pacientes apresentaram complicações psiquiátricas, que regrediram completamente já no primeiro mês pós-operatório. Além desses, em nosso setor tivemos mais dois casos, um de depressão, e outro de agitação psicomotora, ambas transitórias. Os procedimentos cirúrgicos para o tratamento da doença de Parkinson vêm sendo realizados no nosso setor há 3 anos e 4 meses; os pacientes vêm sendo acompanhados neste período, e até o momento não observamos complicações psiquiátricas persistentes em nenhum dos cerca de 70 casos operados.

Acreditamos que uma seleção criteriosa dos pacientes candidatos à cirurgia, excluindo aqueles com antecedentes de distúrbios psiquiátricos, ou com comprometimento cognitivo moderado ou acentuado, é fundamental para diminuir a incidência de complicações pós-operatórias.

REFERÊNCIAS

1. Ferraz FP, Aguiar PMC, Ferraz HB, Bidó JO, Bouza AA, Andrade LAF. Talamotomia e palidotomia estereotáxica com planejamento computadorizado no tratamento da doença de Parkinson: avaliação do desempenho motor a curto prazo de 50 pacientes. Arq Neuropsiquiatr 1998;56:789-797.

2. Rajput AH. Clinical features and natural history of Parkinson's disease (special consideration of aging). In Calne DB (ed.). Neurodegenerative diseases.. Philadelphia: Saunders,1994; 555-571.

3. Fazzini E, Dogali M, Stereo D, Eidelberg D, Beric A. Stereotactic pallidotomy for Parkinson's disease: a long-term follow-up of unilateral pallidotomy. Neurology 1997;48:1273-1277.

4. Iacono RP, Shima F, Lonser RR, Kiniyoshi S, Maeda G, Yamada S. The results, indications, and physiology of posteroventral pallidotomy for patients with Parkinson's disease. Neurosurgery 1995;36:1118-1127.

5. Jankovic J, Cardoso F, Grossman RG, Hamilton WJ. Outcome after stereotactic thalamotomy for parkinsonian, essential, and other types of tremor. Neurosurgery 1995;37:680-687.

6. Kelly PJ, Gillignham FJ. The long term results of stereotaxic surgery and L-dopa therapy in patients with Parkinson's disease. J Neurosurg 1980;53:332-337.

7. Laitinen LV, Bergheim AT, Hariz MI. Leksell's posteroventral pallidotomy in the treatment of Parkinson's disease. J Neurosurg 1992;76:53-61.

8. Lang AE, Lozano AM, Montgomery E, Duff J, Tasker R, Hutchinson W. Posteroventral medial pallidotomy in advanced Parkinson's disease. N Engl J Med 1997;337:1036-1042.

9. Nagaseki Y, Shibazaki T, Hirai T, et al. Long-term follow-up rsults of VIM-thalamotomy. J Neurosurg 1986;65:296-302.

10. Samuel M, Caputo E, Brooks DJ, et al. A study of medial pallidotomy for Parkinson's disease: clinical outcome, MRI location and complications. Brain 1998;121:59-75.

São Paulo, 13 de janeiro de 1999.

Fernando P. Ferraz, Patrícia M. C. Aguiar*, Henrique B. Ferraz

Departamento de Neurologia e Neurocirurgia, Escola Paulista de Medicina UNIFESP

*Rua Bela Cintra 67 / 117, 01415-000 São Paulo SP

Publication Dates

  • Publication in this collection
    06 Nov 2000
  • Date of issue
    Mar 1999
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