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Automedicação entre estudantes de graduação do interior do Amazonas

Automedicación entre estudiantes universitarios del interior del estado de Amazonas

Resumo

Objetivo

Estimar a prevalência e fatores associados à automedicação entre estudantes de cursos de graduação do interior do Amazonas.

Métodos

Estudo transversal com 694 estudantes de uma universidade pública do interior do Amazonas, entre março a julho de 2018. Definiu-se automedicação como uso de, no mínimo, um medicamento sem prescrição. Estimaram-se Odds Ratio (OR) e Intervalos de Confiança de 95% (IC 95%) pela Regressão Logística.

Resultados

Dos 694 graduandos, 483 indicaram consumo medicamentoso. Destes, 80,1% referiram automedicação. Os analgésicos foram os mais utilizados (51,8%) e os motivos que mais levaram a se automedicarem foram os problemas álgicos (54,3%). As variáveis “ter filhos” (OR: 1,83; IC 95%: 1,06-3,16) e “ter a prática de indicar medicamentos para terceiros” (OR: 2,38; IC 95%: 1,47-3,86) permaneceram independentemente associadas à automedicação.

Conclusão

Observou-se alta prevalência da automedicação entre os estudantes, evidenciando a necessidade de discussão sobre o uso racional de medicamentos no ambiente universitário.

Uso de medicamentos; Automedicação; Estudantes; Assunção de riscos; Farmacoepidemiologia

Resumen

Objetivo

Estimar la prevalencia y factores asociados con la automedicación entre estudiantes de cursos universitarios del interior del estado de Amazonas.

Métodos

Estudio transversal con 694 estudiantes de una universidad pública del interior del estado de Amazonas, entre marzo a julio de 2018. Se definió la automedicación como el uso de, como mínimo, un medicamento sin prescripción. Se estimaron Odds Ratio (OR) e Intervalos de Confianza del 95 % (IC 95 %) por Regresión Logística.

Resultados

De los 694 estudiantes universitarios, 483 indicaron un consumo medicamentoso. De estos, 80,1 % mencionaron automedicación. Los analgésicos fueron los más utilizados (51,8 %) y los motivos que más llevaron a la automedicación fueron los problemas álgicos (54,3 %). Las variables “tener hijos” (OR: 1,83; IC 95 %: 1,06-3,16) y “tener la práctica de indicar medicamentos a terceros” (OR: 2,38; IC 95 %: 1,47-3,86) permanecieron independientemente asociadas a la automedicación.

Conclusión

Se observó alta prevalencia de automedicación entre los estudiantes, evidenciando la necesidad de discusión sobre el uso racional de medicamentos en el ambiente universitario.

Utilización de medicamentos; Automedicación; Estudiantes; Asunción de riesgos; Farmacoepidemiología

Abstract

Objective

To estimate the prevalence and factors associated with self-medication among undergraduate students in the countryside of Amazonas.

Methods

Cross-sectional study with a total of 694 students from a public university in the countryside of Amazonas, between March and July 2018. Self-medication was defined as the use of at least one medication without a prescription. Odds Ratio (OR) and 95% Confidence Intervals (95% CI) were estimated by Logistic Regression.

Results

Of the 694 undergraduate students, 483 indicated drug use. Of these, 80.1% reported self-medication. Analgesics were the most used (51.8%) and the reasons that most led to self-medicating were pain problems (54.3%). The variables “having children” (OR: 1.83; 95% CI: 1.06-3.16) and “having the practice of recommending medication to other people” (OR: 2.38; 95% CI: 1.47 -3.86) remained independently associated with self-medication.

Conclusion

There was a high prevalence of self-medication among students, highlighting the need for discussion about the rational use of medication in the university environment.

Drug utilization; Self-medication; Students; Risk-taking; Pharmacoepidemiology

Introdução

Os medicamentos são produtos farmacêuticos essenciais à saúde, produzidos tecnicamente com a finalidade de prevenir, curar, controlar, aliviar e diagnosticar as doenças e seus sintomas.(11. Brasil. Imprensa Nacional. Diário Oficial da União. Resolução - RDC Nº 301, de 21 de agosto de 2019. Dispõe sobre as Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos. Diário Oficial da União. 22 ago 2019. Brasília (DF): Diário Oficial da União; 2019 [citado 2021 Abr 25]. Disponível em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-rdc-n-301-de-21-de-agosto-de-2019-211914064
https://www.in.gov.br/web/dou/-/resoluca...
) Dentre as formas de consumo medicamentoso, destaca-se a automedicação, que pode ser considerada como o uso de medicamentos por iniciativa própria para tratar problemas de saúde auto reconhecido.(22. World Health Organization (WHO). The Role of the pharmacist in self-care and self-medication: report of the 4th WHO Consultative Group on the Role of the Pharmacist, The Hague, The Netherlands, 26-28 August 1998. Genève: WHO; 2020 [cited 2019 Apr 1]. Available from: https://apps.who.int/iris/handle/10665/65860
https://apps.who.int/iris/handle/10665/6...
)

Os riscos da automedicação são inúmeros, envolvendo interações medicamentosas, intoxicações, mascaramento de doenças e até a morte,(33. Automedicação [editorial]. Rev Assoc Med Bras. 2001;47(4):269-70.) e podem estar interligados a experiência prévia do indivíduo com o medicamento, a disponibilidade dos medicamentos nas residências e a facilidade de aquisição nas farmácias.(44. Pons ED, Knauth DR, Vigo Á; PNAUM Research Group, Mengue SS. Predisposing factors to the practice of self-medication in Brazil: results from the National Survey on Access, Use and Promotion of Rational Use of Medicines (PNAUM). PLoS One. 2017;12(12):e0189098.)

Neste contexto, a prática da automedicação tem sido amplamente estudada em diferentes países,(44. Pons ED, Knauth DR, Vigo Á; PNAUM Research Group, Mengue SS. Predisposing factors to the practice of self-medication in Brazil: results from the National Survey on Access, Use and Promotion of Rational Use of Medicines (PNAUM). PLoS One. 2017;12(12):e0189098.

5. Helal RM, Abou-ElWafa HS. Self-Medication in University Students from the City of Mansoura, Egypt. J Environ Public Health. 2017;2017:9145193.

6. Alraddadi KK, Barakeh RM, Alrefaie SM, Alyahya LS, Adosary MA, Alyahya KI. Determinants of self-medication among undergraduate students at King Saud university: knowledge, attitude and practice. J Heal Spec. 2017;5(2):95–101.

7. Alshogran OY, Alzoubi KH, Khabour OF, Farah S. Patterns of self-medication among medical and nonmedical University Students in Jordan. Risk Manag Healthc Policy. 2018;2018(11):169–76.

8. Haghighi S, Ashrafizadeh H, Sayadi N. Self-medication and related factors among university students in Iran. J Nurs Midwifery Sci. 2016;3(2):47–51.
-99. Okyay RA, Erdoğan A. Self-medication practices and rational drug use habits among university students: a cross-sectional study from Kahramanmaraş, Turkey. Peer J. 2017;5:e3990.) e grupos etários (idosos,(1010. Secoli SR, Marquesini EA, Fabretti SC, Corona LP, Romano-Lieber NS. Self-medication practice trend among the Brazilian elderly between 2006 and 2010: SABE Study. Rev Bras Epidemiol. 2019;21(Suppl 2):e180007.) adultos,(1111. Sadio AJ, Gbeasor-Komlanvi FA, Konu RY, Bakoubayi AW, Tchankoni MK, Bitty-Anderson AM, et al. Assessment of self-medication practices in the context of the COVID-19 outbreak in Togo. BMC Public Health. 2021;21:58.) crianças e adolescentes,(1212. Belo N, Maio P, Gomes S. Automedicação em idade pediátrica. Nascer Crescer. 2017;26(4):234-9.) profissionais da saúde(1313. Riveros ER, Lienqueo AR, Medina LB. Consumo de medicamentos en profesionales y técnicos/administrativos de la salud: situación de prescripción. Enfermería Cuid Humaniz. 2018;7(2):63-82.) e universitários.(1414. Tarley MG, Henrique E, Miguel MA, Costa MH, Gonzaga HF, Boas FV, et al. Estudo comparativo do uso da automedicação entre universitários da área da saúde e universitários de outras áreas não relacionados à saúde na universidade de Marília-SP. Brazilian J Surg Clin Res. 2018;23(1):22–7.) Neste último, alguns estudos indicam que o conhecimento adquirido durante o curso de graduação pode influenciar tal prática.(1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.,1616. Montanari CM, Souza WA, Vilela DO, Araújo FS, Cardoso MH, Ferreira EB. Automedicação em acadêmicos de uma universidade pública do sul de Minas Gerais. Tempus Acta Saúde Colet. 2014;8(4):257–68.)

Estudos internacionais realizados entre 2014 e 2015, revelam altas taxas de prevalência da automedicação entre universitários, com valores entre 50,9% até 96,0%.(55. Helal RM, Abou-ElWafa HS. Self-Medication in University Students from the City of Mansoura, Egypt. J Environ Public Health. 2017;2017:9145193.

6. Alraddadi KK, Barakeh RM, Alrefaie SM, Alyahya LS, Adosary MA, Alyahya KI. Determinants of self-medication among undergraduate students at King Saud university: knowledge, attitude and practice. J Heal Spec. 2017;5(2):95–101.

7. Alshogran OY, Alzoubi KH, Khabour OF, Farah S. Patterns of self-medication among medical and nonmedical University Students in Jordan. Risk Manag Healthc Policy. 2018;2018(11):169–76.

8. Haghighi S, Ashrafizadeh H, Sayadi N. Self-medication and related factors among university students in Iran. J Nurs Midwifery Sci. 2016;3(2):47–51.
-99. Okyay RA, Erdoğan A. Self-medication practices and rational drug use habits among university students: a cross-sectional study from Kahramanmaraş, Turkey. Peer J. 2017;5:e3990.) No Brasil, as taxas de automedicação entre universitários variaram entre 76,0% a 100% nos estudos realizados entre 2009 a 2017.(1414. Tarley MG, Henrique E, Miguel MA, Costa MH, Gonzaga HF, Boas FV, et al. Estudo comparativo do uso da automedicação entre universitários da área da saúde e universitários de outras áreas não relacionados à saúde na universidade de Marília-SP. Brazilian J Surg Clin Res. 2018;23(1):22–7.,1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.,1717. Rodrigues CR, Pereira IA. Prevalência da automedicação entre acadêmicos da universidade estadual de Goiás – Campus Ceres. Rev Biotecnol Cien. 2016;5(1):36–52.

18. Freitas VP, Marques MS, Duarte SF. Automedicação em Universitários do curso de Graduação da área de Saúde em uma Instituição de Ensino Superior Privada em Vitória da Conquista. Rev Mult Psic Interd. 2017;11(39):25-37.

19. Iuras A, Marques AA, Garcia LF, Santiago MB, Santana LK. Prevalência da automedicação entre estudantes da universidade do estado do Amazonas (Brasil). Rev Port Estomatol Med Dentária Cir Maxilofac. 2016;57(2):104–11.
-2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.) Na análise por regiões do país, maior parte dos estudos concentram-se na região Sudeste e Sul, com menor proporção de investigações na região Norte. Em estudo realizado com 342 universitários de Santa Catarina em 2009, região Sul, foi identificado que a prevalência de automedicação foi de 96,5%.(1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.) No Sudeste, entre 768 graduandos investigados em São Paulo entre 2016 e 2017, a prevalência foi de, aproximadamente, 90%.(1414. Tarley MG, Henrique E, Miguel MA, Costa MH, Gonzaga HF, Boas FV, et al. Estudo comparativo do uso da automedicação entre universitários da área da saúde e universitários de outras áreas não relacionados à saúde na universidade de Marília-SP. Brazilian J Surg Clin Res. 2018;23(1):22–7.) No Centro-Oeste, especificamente na cidade de Goiás, investigando 133 alunos em 2016, a prevalência foi de 90,8%.(1717. Rodrigues CR, Pereira IA. Prevalência da automedicação entre acadêmicos da universidade estadual de Goiás – Campus Ceres. Rev Biotecnol Cien. 2016;5(1):36–52.) No Nordeste, Vitória da Conquista – com 189 participantes, a proporção foi de 95,8% em 2017.(1818. Freitas VP, Marques MS, Duarte SF. Automedicação em Universitários do curso de Graduação da área de Saúde em uma Instituição de Ensino Superior Privada em Vitória da Conquista. Rev Mult Psic Interd. 2017;11(39):25-37.) Na região Norte, em Manaus – capital do Amazonas, autores estimaram prevalência de 89% entre 180 alunos,(1919. Iuras A, Marques AA, Garcia LF, Santiago MB, Santana LK. Prevalência da automedicação entre estudantes da universidade do estado do Amazonas (Brasil). Rev Port Estomatol Med Dentária Cir Maxilofac. 2016;57(2):104–11.) enquanto outra investigação realizada em 2014, com 116 estudantes de Enfermagem no interior do estado encontrou prevalência de 76,0%.(2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.)

A literatura tem apontado que diferentes fatores podem estar associados à prática da automedicação entre os estudantes de graduação no Brasil, destacando as variáveis sexo,(1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.) influência das propagandas, prescrições antigas, indicações de terceiros, conhecimento próprio(1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.) e desconhecimento dos riscos de tal comportamento.(2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.) Contudo, estes fatores precisam ser melhor explorados.(1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.,1616. Montanari CM, Souza WA, Vilela DO, Araújo FS, Cardoso MH, Ferreira EB. Automedicação em acadêmicos de uma universidade pública do sul de Minas Gerais. Tempus Acta Saúde Colet. 2014;8(4):257–68.)

Diante do exposto, considerando a relevância da temática e as elevadas taxas de automedicação entre graduandos nas diferentes regiões do país, este estudo justificou-se pela necessidade de conhecer este comportamento entre universitários em áreas mais remotas, como do interior do estado do Amazonas. Assim o estudo teve como objetivo estimar a prevalência e fatores associados à automedicação entre os estudantes de cursos de graduação do interior do Amazonas.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal e analítico, realizado com estudantes do interior do Amazonas, regularmente matriculados nos cursos de graduação do Instituto de Saúde e Biotecnologia (ISB) da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), entre março a julho de 2018.

O ISB está localizado no município de Coari, interior do Amazonas, cujo acesso se dá somente por via fluvial ou aérea, estando a 363 Km da capital – Manaus. No Instituto, são ofertados sete cursos de graduação presenciais, sendo: Nutrição, Ciências: Matemática e Física, Biotecnologia, Ciências: Biologia e Química, Fisioterapia, Enfermagem e Medicina.

Destaca-se que foi utilizado o Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) para nortear a metodologia deste artigo.(2121. von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gøtzsche PC, Vandenbroucke JP; STROBE Initiative. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. J Clin Epidemiol. 2008;61(4):344-9.)

Para o cálculo amostral, consideraram-se os 992 estudantes matriculados nos sete cursos de graduação ofertados pelo ISB/UFAM, no primeiro semestre de 2018 – período de coleta de dados do estudo. Assim, optou-se por uma amostragem não-probabilística por cota, calculando-se, proporcionalmente, por curso e considerando 70% de cada um, resultando nas seguintes proporções: [1] Ciência: Biologia e Química, total de 183 matriculados (n = 128); [2] Ciência: Matemática e Física, total de 142 matriculados (n = 99); [3] Biotecnologia, total de 110 matriculados (n = 77); [4] Enfermagem, total de 194 matriculados (n = 136); [5] Fisioterapia, total de 162 matriculados (n=113); [6] Medicina, total de 37 matriculados (n = 26); [7] Nutrição, total de 164 matriculados (n = 115). Assim, a amostra final totalizou em 694 participantes.

Os critérios de inclusão do estudo foram: ter idade mínima de 18 anos, ambos os sexos, estar devidamente matriculado no curso de graduação e ter frequentado a universidade no período vigente do estudo. Os critérios de exclusão foram: estudantes indígenas (devido os trâmites e burocracia para realização de estudos com o público somado ao prazo máximo de 1 ano para a finalização da pesquisa) e discentes ausentes após três tentativas de coleta de dados nas salas de aula.

A coleta dos dados ocorreu entre março a julho de 2018, utilizando questionário autoaplicável, previamente testado (piloto com 30 estudantes, não foi necessário ajuste no instrumento e os dados dos participantes foram aproveitados na amostra do estudo). Os estudantes foram abordados nas salas de aula, após consentimento do docente responsável no momento, nos intervalos das aulas, ou nas dependências da universidade. O questionário foi composto por variáveis socioeconômicas, demográficas, doenças autorreferidas e informações relativas ao consumo de medicamentos.

Considerou-se como variável dependente a prática de automedicação, a qual foi avaliada pelo uso de, pelo menos, um medicamento sem a prescrição médica ou de dentista, nos últimos 30 dias,(2222. Domingues PH, Galvão TF, Andrade KR, Araújo PC, Silva MT, Pereira MG. Prevalence and associated factors of self-medication in adults living in the Federal District, Brazil: a cross-sectional, population-based study. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(2):319-30.) sendo classificada de forma dicotômica (sim, não).

As variáveis independentes foram as demográficas (sexo, faixa etária), socioeconômicas (estado civil, ter filhos, companhia na moradia/residência, renda familiar mensal), acadêmicas (área do curso, curso, semestre) e sobre os medicamentos (estocagem de medicamentos na residência, leitura das bulas dos medicamentos, acha que os medicamentos trazem riscos à saúde, faz indicação de medicamentos a terceiros).

Os dados foram armazenados no programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS) versão 20.0, com dupla entrada dos mesmos. Os medicamentos alopáticos foram classificados através do sistema de Classificação Anatômico Terapêutica Química (ATC) (utilizou-se apenas o nível 2) da Organização Mundial da Saúde (OMS).(2323. . World Health Organization (WHO). Drug Statistics Methodology. Genève: WHO; 2019 [cited 2020 Apr 20]. Available from: https://www.whocc.no/atc_ddd_index/
https://www.whocc.no/atc_ddd_index/...
) Para o agrupamento dos motivos de saúde que levaram a automedicação, utilizou-se a Classificação Internacional de Doenças, versão 10 (CID-10).(2424. World Health Organization (WHO). International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems 10th Revision. Genève: WHO; 2019 [cited 2020 Apr 20]. Available from: https://icd.who.int/browse10/2019/en
https://icd.who.int/browse10/2019/en...
)

Realizou-se a caracterização dos participantes por meio de frequências absolutas e relativas das variáveis independentes, segundo a adoção da automedicação. Na análise bivariada, conduziu-se o teste de qui-quadrado de Pearson. Todas as variáveis que apresentaram associação com nível de significância menor a 20% (p<0,20) na análise bivariada foram incluídas no modelo multivariado. Utilizou-se o método Stepwise Forward de entrada das variáveis.

A razão de chance foi estimada por Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%) a partir da regressão logística multivariada. Para determinar a qualidade do ajuste das variáveis no modelo final, foram observados os valores do teste de Hosmer e Lemeshow. Nesta etapa, considerou-se o nível de significância de 5%.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas e registrado com o CAAE 74919717.1.0000.5020. Aos estudantes que consentiram em participar do estudo, foi disponibilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para assinatura em duas vias.

Resultados

Dos 694 estudantes que responderam ao questionário, 69,6% (n=483) reportaram algum consumo de medicamentos. Entre os 483, 80,1% (n=387) indicaram automedicação nos últimos 30 dias; e 19,9% (n=96) referiram que os medicamentos utilizados foram prescritos por um profissional. As características sociodemográficas, acadêmicas e comportamentais relacionadas aos medicamentos dos participantes segundo a prática da automedicação são apresentadas na tabela 1. Em comparação aos participantes que não referiram automedicação, aqueles que tinham filhos, que faziam a leitura das bulas e os que indicavam medicamentos a terceiros apresentaram, estatisticamente, maiores prevalências ao desfecho (p<0,05).

Tabela 1
Prática de automedicação entre universitários, segundo variáveis socioeconômicas, demográficas, acadêmicas e de comportamentos sobre medicamentos (n = 483)

Os participantes mencionaram o uso de 130 medicamentos diferentes, consumidos em 832 ocasiões distintas (04 participantes consumiram até seis medicamentos). Os medicamentos foram adquiridos, principalmente, nas farmácias (89,9%; n=545), com os familiares (5,0%; n=30), vizinho/amigo (2,6%; n=16), no hospital (0,8%; n=5), nas unidades básicas de saúde (0,5%; n=3), com o agente comunitário de saúde (0,2%; n=1), e outros (1,0%; n=6) (dado não apresentado em tabela). Entre os 387 estudantes que referiram automedicação nos últimos 30 dias, os medicamentos mais consumidos, de acordo com o segundo nível da classificação ATC, foram os analgésicos (51,8%), seguido dos anti-inflamatórios e antirreumáticos (10,4%), anti-histamínicos para uso sistêmico (10,2%) e os antibacterianos para uso sistêmico (6,3%) (Figura 1).

Figura 1
Principais medicamentos consumidos por automedicação segundo subgrupo terapêutico, conforme Classificação Anatômico Terapêutica Química (ATC) - nível 2 (n = 387)

Outros* - antidiarreicos, agentes anti-inflamatórios e anti-infecciosos intestinais; antiprotazoários; agentes antiespasmódicos, anticolinérgicos e propulsivos; anti-helmínticos; preparados estomatológicos; preparados antianémicos; antifúngicos para uso dermatológico; preparados para uso nasal; produtos oftalmológicos e otológicos


Em relação aos motivos de saúde que levaram os estudantes a praticarem a automedicação, destacaram-se os problemas álgicos (54,3%), doenças do aparelho respiratório (15,5%) e as doenças do aparelho geniturinário (9,9%) (dado não apresentado em tabela). A tabela 2 apresenta os resultados finais da análise multivariada, indicando que as variáveis “ter filhos” (OR: 1,83; IC 95%: 1,06-3,16) e “ter a prática de indicar medicamentos a terceiros” (OR: 2,38; IC 95%: 1,47-3,86) permaneceram associadas à automedicação independentemente de outros fatores (Tabela 2).

Tabela 2
Razão de chances (Odds Ratio) estimadas por regressão logística multivariada para as variáveis associadas à automedicação entre os estudantes de graduação (n = 387)

Discussão

Este estudo apresenta como limitação o uso da amostragem não-probabilística por cota, uma vez que considerou apenas 70% dos estudantes matriculados. Mesmo que se tenha optado por este tipo de abordagem amostral, proporcionou-se a inclusão de estudantes de áreas diferentes, respeitando a proporcionalidade de cada curso. Outro ponto refere-se ao autorrelato, o que poderia repercutir numa subnotificação. Contudo, sugere-se que este item não tenha influenciado os resultados da amostra, tendo em vista que os relatos foram elevados e semelhantes aos resultados de outros estudos em diferentes regiões e localidades.

O estudo avança no sentido de trazer mais informações sobre a prática da automedicação entre universitários, investigando fatores que se associam a tal comportamento. Ademais, considera uma região remota, de interior, pouco explorada em inquéritos epidemiológicos, elucidando parte da realidade de como o grupo se comporta. Analisar o uso irracional de medicamentos é importante, pois permite que esta temática possa ser considerada na formação de Enfermeiros e Enfermeiras, com necessidade de qualificação em bases sólidas e direcionadas para entenderem que esta poderá ser uma demanda dos serviços, requerendo atuação para minimizar os riscos e conscientização da população. Ressalta-se ainda que a investigação direciona para que os serviços de saúde possam considerar a população universitária como um grupo que apresenta comportamentos que podem impor riscos à saúde individual e coletiva – quando indicam medicamentos a terceiros.

A prevalência de automedicação entre os estudantes de graduação investigados foi elevada (80,1%), corroborando com os achados de outras pesquisas.(1414. Tarley MG, Henrique E, Miguel MA, Costa MH, Gonzaga HF, Boas FV, et al. Estudo comparativo do uso da automedicação entre universitários da área da saúde e universitários de outras áreas não relacionados à saúde na universidade de Marília-SP. Brazilian J Surg Clin Res. 2018;23(1):22–7.,1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.,1717. Rodrigues CR, Pereira IA. Prevalência da automedicação entre acadêmicos da universidade estadual de Goiás – Campus Ceres. Rev Biotecnol Cien. 2016;5(1):36–52.

18. Freitas VP, Marques MS, Duarte SF. Automedicação em Universitários do curso de Graduação da área de Saúde em uma Instituição de Ensino Superior Privada em Vitória da Conquista. Rev Mult Psic Interd. 2017;11(39):25-37.

19. Iuras A, Marques AA, Garcia LF, Santiago MB, Santana LK. Prevalência da automedicação entre estudantes da universidade do estado do Amazonas (Brasil). Rev Port Estomatol Med Dentária Cir Maxilofac. 2016;57(2):104–11.
-2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.)Além disso, chama atenção o fato de que todos os cursos apresentaram percentuais de automedicação superiores a 70,0%.

Destaca-se que a alta taxa de automedicação entre o grupo pode estar, provavelmente, relacionada à facilidade de compra e acesso aos medicamentos nas farmácias do município de Coari somado às dificuldades de uso dos serviços de saúde enfrentados pela população da região.(2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.)Além disso, as intensas atividades acadêmicas como provas, trabalhos, estágios, ações de extensão, iniciação científica e outros compromissos, podem atuar como influenciadoras para a automedicação.(1616. Montanari CM, Souza WA, Vilela DO, Araújo FS, Cardoso MH, Ferreira EB. Automedicação em acadêmicos de uma universidade pública do sul de Minas Gerais. Tempus Acta Saúde Colet. 2014;8(4):257–68.)

Entre os cursos, observou-se que o consumo de medicamentos sem prescrição é prevalente entre estudantes de graduação independentemente da área de conhecimento. Entretanto, aponta-se que a prevalência elevada de automedicação, entre os estudantes de medicina, foi semelhante ao encontrado nas pesquisas executadas no Espírito Santo (71,42% - 3º e 4º ano do curso),(2525. Moraes LG, Bernardina LS, Andriato LC, Dalvi LR, Loyola YC. Automedicação em acadêmicos de Medicina. Rev Soc Bras Clín Méd. 2018;16(3):167-70.) São Paulo (96,56%).(2626. Tognoli TA, Tavares VO, Ramos AP, Batigália F, Godoy JM, Ramos RR. Automedicação entre acadêmicos de medicina de Fernandópolis São Paulo. J Health Biol Sci. 2019;7(4):382-6.) A presença dessa conduta entre os graduandos em Medicina pode estar relacionada à autoconfiança com os conhecimentos adquiridos durante o curso, requerendo esforços de acompanhamento desses estudantes para que esta prática seja desencorajada.(2525. Moraes LG, Bernardina LS, Andriato LC, Dalvi LR, Loyola YC. Automedicação em acadêmicos de Medicina. Rev Soc Bras Clín Méd. 2018;16(3):167-70.)

A prática da automedicação entre os estudantes do curso de Enfermagem revelada no presente estudo foi de 86,0%, sendo o curso com a segunda maior prevalência. Em comparação com os resultados da investigação realizada em 2014 no ISB/UFAM (76,0%), somente com esse público,(2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.) observou-se que houve aumento nesta conduta. Isto indica e reforça a necessidade de ações institucionais nas universidades fora os campus da capital, que promovam o uso e a indicação racional de medicamentos, pois, por serem futuros profissionais de saúde que estarão à frente dos cuidados com a saúde no contexto Amazônico, inclusive de grupos tradicionais onde já se evidenciou a problemática da automedicação,(2727. Gama AS, Secoli SR. Self-medication practices in riverside communities in the Brazilian Amazon Rainforest. Rev Bras Enferm. 2020;73(5):e20190432.) faz-se necessário que estes tenham conhecimentos dos riscos, evitando a adesão e o incentivo dessa conduta.

Houve maior percentual de estudantes que praticavam automedicação nos semestres iniciais dos cursos, podendo indicar a presença desse comportamento antes do ingresso na universidade, impulsionado pela herança cultural de automedicar-se transmitido de pais para filhos, realizada também no interior do estado. Ademais, no início do curso, os estudantes são defrontados com uma realidade diferente do ensino médio, momento de adaptação que, expõem os mesmos a estressores como a sobrecarga acadêmica(2828. Dias AC, Carlotto RC, Oliveira CT, Teixeira MA. Dificuldades percebidas na transição para a universidade. Rev Bras Orientação Profissional. 2019;20(1):19-30.) podendo dificultar a conciliação de horários para buscar os serviços de saúde.

Sobre a classe dos medicamentos, os achados do estudo foram similares aos encontrados por pesquisadores em Manaus (70,0% e 78,3%),(1919. Iuras A, Marques AA, Garcia LF, Santiago MB, Santana LK. Prevalência da automedicação entre estudantes da universidade do estado do Amazonas (Brasil). Rev Port Estomatol Med Dentária Cir Maxilofac. 2016;57(2):104–11.) Santa Catarina (87,7%)(1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.) e Piauí (95,71%),(1818. Freitas VP, Marques MS, Duarte SF. Automedicação em Universitários do curso de Graduação da área de Saúde em uma Instituição de Ensino Superior Privada em Vitória da Conquista. Rev Mult Psic Interd. 2017;11(39):25-37.) com os analgésicos liderando a lista de consumidos por automedicação. O uso elevado dessa classe terapêutica pelos estudantes de graduação de Coari pode estar relacionado ao fato desses medicamentos serem isentos de prescrição, baixo custo e possuírem ação paliativa quando utilizados para o alívio de dores,(1919. Iuras A, Marques AA, Garcia LF, Santiago MB, Santana LK. Prevalência da automedicação entre estudantes da universidade do estado do Amazonas (Brasil). Rev Port Estomatol Med Dentária Cir Maxilofac. 2016;57(2):104–11.,2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.) o que torna os analgésicos preferenciais para as pessoas que dispõem de pouco tempo para consultarem um médico, fazendo com que procurem um atendimento ou consulta apenas quando os sinais e sintomas se agravam.(1616. Montanari CM, Souza WA, Vilela DO, Araújo FS, Cardoso MH, Ferreira EB. Automedicação em acadêmicos de uma universidade pública do sul de Minas Gerais. Tempus Acta Saúde Colet. 2014;8(4):257–68.)

Em geral, as dores foram o principal fator desencadeante para que os universitários praticassem a automedicação, corroborando com outros estudos.(1515. Galato D, Madalena J, Pereira GB. Automedicação em estudantes universitários: a influência da área de formação. Cien Saude Colet. 2012;17(12):3323-30.,1717. Rodrigues CR, Pereira IA. Prevalência da automedicação entre acadêmicos da universidade estadual de Goiás – Campus Ceres. Rev Biotecnol Cien. 2016;5(1):36–52.

18. Freitas VP, Marques MS, Duarte SF. Automedicação em Universitários do curso de Graduação da área de Saúde em uma Instituição de Ensino Superior Privada em Vitória da Conquista. Rev Mult Psic Interd. 2017;11(39):25-37.

19. Iuras A, Marques AA, Garcia LF, Santiago MB, Santana LK. Prevalência da automedicação entre estudantes da universidade do estado do Amazonas (Brasil). Rev Port Estomatol Med Dentária Cir Maxilofac. 2016;57(2):104–11.
-2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.) Tal achado sugere que o hábito da automedicação entre os participantes investigados possa ocorrer devido à necessidade dos estudantes de aliviar a dor, podendo contribuir para o mascaramento de outras doenças de base.

A prática de automedicação com antibióticos foi mencionada por 6,3% dos estudantes. No Brasil, embora a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) determine a venda dessa classe terapêutica apenas sob prescrição médica, foi possível observar que alguns alunos conseguiram adquirir e consumir estes medicamentos sem prescrição, evidenciando desta forma, que a venda irregular pode estar ocorrendo no município, talvez pela pouca fiscalização dos órgãos governamentais, permitindo que a prática seja comum nos interiores do Amazonas. Salienta-se que automedicação, para além dos riscos de intoxicação, pode contribuir para as resistências bacterianas na população do município.(2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.,2929. Brasil. Ministério da Saúde. Resolução-RDC nº 20, de 5 de maio de 2011. Dispõe sobre o controle de medicamentos à base de substâncias classificadas como antimicrobianos, de uso sob prescrição, isoladas ou em associação. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011 [citado 2020 Ago 27]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2011/rdc0020_05_05_2011.html#:~:text=Disp%C3%B5e%20sobre%20o%20controle%20de,prescri%C3%A7%C3%A3o%2C%20isoladas%20ou%20em%20associa%C3%A7%C3%A3o.&text=Par%C3%A1grafo%20%C3%BAnico.,Art.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
)

Ressalta-se que a maioria dos medicamentos (89,9%; n=545) foi adquirida nas farmácias, ilustrando a facilidade de acesso aos medicamentos, resultado semelhante à outros inquéritos epidemiológicos no município com populações ribeirinhas da região também encontraram esse achado.(2020. Gama AS, Secoli SR. Self-medication among nursing students in the state of Amazonas – Brazil. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(1):e65111.,3030. Guimarães AF, Barbosa VL, Silva MP, Portugal JK, Reis MH, Gama AS. Acesso a serviços de saúde por ribeirinhos de um município no interior do estado do Amazonas, Brasil. Rev Pan-Amaz. 2020;11:e202000178.)

O estudo indicou que ter filhos é uma variável que aumenta a prevalência e a chance da automedicação. Embora não tenha sido investigado questões relacionadas à automedicação na família, é sugestivo que os pais mantenham um itinerário terapêutico nas residências para emergências com seus filhos, aumentando o estoque de medicamentos (80,0% dos estudantes estocavam medicamentos na residência), com sobras de receitas anteriores. Além disso, como os pais geralmente são responsáveis pela terapêutica de seus filhos, é possível que isto confira certa segurança para prática da automedicação.(3131. Silva JG, Gomes GC, Costa AR, Juliano LF, Arruda CP, Carvalho LN. A prática da automedicação em crianças por seus pais: atuação da enfermagem. Rev Enfermagem UFPE On line. 2018;12(6):1570-7.) Diante disso, desperta atenção especial aos estudantes que são pais e mães, pois esta condição pode agravar comportamentos de risco. Grupos de apoio a estes estudantes precisam ser criados pelas universidades, a fim de orientar quanto a importância do uso racional desses produtos.

Outra variável que se manteve associada à automedicação na análise multivariada foi a prática da indicação de medicamentos a terceiros, demonstrando que o comportamento de se automedicar entre os estudantes transpassa o hábito e o risco individual, pois pode oferecer risco a outras pessoas, evidenciando uma conduta irracional. Este achado reforça a necessidade de ações da universidade que promovam o uso racional de medicamentos por seus estudantes, além problematizar a necessidade de ações de controle e fiscalização da venda e distribuição dos medicamentos no município.

Conclusão

A automedicação entre os universitários investigados, nos 30 dias que antecederam a pesquisa, foi elevada, principalmente entre os discentes dos cursos de Medicina e Enfermagem, tendo os analgésicos como a classe terapêutica mais consumida sem prescrição e os problemas álgicos os principais motivos para tal prática. Destaca-se a característica de ter filhos como fator que aumentava a prevalência do desfecho. Assim, além de considerar que os graduandos vivenciam situações de transição na universidade que pode influenciar na adoção de comportamentos de risco à saúde, deve-se ter atenção especial aos alunos (as) que são pais e mães. Estratégias de ensino que fortalecem a conscientização dos estudantes devem ser intensificadas pelas universidades, visando protegê-los de eventuais agravos advindos da automedicação e da prática de indicarem a utilização de medicamentos a outras pessoas, a fim de promover a saúde individual e coletiva. Por fim, ações de controle na venda de medicamentos nas farmácias do município precisam ser pensadas pelos gestores, de forma a coibir a aquisição de medicamentos que necessitam de receituário e controle pelos órgãos sanitários.

Agradecimentos

Agradecemos a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), pelo apoio financeiro, por meio do Projeto do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC/UFAM 2017/2018 e Programa de Apoio à Pós-graduação Stricto Sensu (POSGRAD) 2020/2021, como também, aos participantes e colaboradores do estudo.

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Edvane Birelo Lopes De Domenico (https://orcid.org/0000-0001-7455-1727) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    5 Jan 2021
  • Aceito
    19 Jul 2021
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