Acessibilidade / Reportar erro

Questionário para avaliação das ações de controle do HIV/Aids na Atenção Básica

Resumo

Objetivo

Validar o conteúdo de um questionário para a avaliação da atenção ofertada pelos profissionais de saúde para o controle da epidemia do HIV/Aids na atenção básica.

Métodos

Estudo metodológico realizado a partir da construção de questionário por meio de uma revisão integrativa, com posterior validação por juízes, utilizando-se a técnica Delphi em duas rodadas. Os dados foram analisados tomando o nível de consenso das respostas, associado ao índice Kappa. Os critérios para a permanência das questões foram: porcentagem de concordância ≤ 75% e Kappa ≤ 0,41.

Resultados

Na primeira rodada, 16 questões foram eliminadas, 05 questões sofreram mudanças para atender à solicitação dos especialistas quanto aos critérios de vocabulário, abrangência ao tema e clareza e Na segunda rodada, as 31 questões foram consideradas adequadas.

Conclusão

O questionário, inédito tanto no âmbito nacional quanto no internacional, encontra-se validado em relação ao seu conteúdo, após cuidadosa revisão de suas questões.

Síndrome da imunodeficiência adquirida; HIV; Atenção primária à saúde; Estudos de validação

Abstract

Objective

To validate the content of a questionnaire to assess the care provided by healthcare professionals to control the HIV/AIDS epidemic in primary care.

Methods

A methodological study was conducted, based on the development of a questionnaire using an integrative review, and subsequent validation by experts, using a two-round Delphi technique. Data were analyzed by considering the level of consensus responses, associated with the Kappa index. The criteria for retaining the questions were: ≤ 75% agreement, and Kappa ≤ 0.41.

Results

The first round eliminated 16 questions, five questions were revised according to vocabulary changes requested by experts, and criteria for topic coverage and clarity. In the second round, 31 questions were considered appropriate.

Conclusion

This questionnaire, unpublished nationally or internationally, achieved acceptable content validity after a careful review of its questions.

Acquired immunodeficiency syndrome; HIV; Primary health care; Validation studies

Introdução

A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) corresponde ao estágio mais avançado da infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV).11. Pereira BS, Costa MC, Amaral MT, Costa HS, Silva CA, Sampaio VS. Fatores associados à infecção pelo HIV/AIDS entre adolescentes e adultos jovens matriculados em Centro de Testagem e Aconselhamento no Estado da Bahia, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2014; 19(3):747-58. Desde a sua descoberta, apresenta-se como um desafio global que se relaciona a aspectos epidemiológicos, socioculturais, econômicos e clínicos, caracterizando a necessidade da implementação de políticas para o enfrentamento das barreiras sociais e estruturais para o diagnóstico e cuidados, bem como discriminação e estigma associados ao portador de HIV.22. Dantas MS, Abrão FM, Freitas CM, Oliveira DC. Representações sociais do HIV/AIDS por profissionais de saúde em serviços de referência. Rev Gaúcha Enferm. 2014; 35(4):94-100.

Estima-se que 1,6 milhões de pessoas vivem com o HIV na América Latina, só no Brasil, os dados acumulados de 2007 a 2016, revelam 136.946 casos de infecção.33. Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). Global Report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic/2012. [Internet]. [cited 2017 May 28]. Available from: http://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/20121120_UNAIDS_Global_Report_2012_with_annexes_en_1.pdf.
http://www.unaids.org/sites/default/file...
,44. Brasil. Ministério da Saúde. Programa Nacional de DST e AIDS. Boletim epidemiológico AIDS – DST. Brasília(DF): Ministério da Saúde; 2016. A epidemia de Aids apresentou aumento tendencioso no número de casos nos estratos populacionais mais pobres e redução, de forma geral, na razão homem/mulher na população brasileira. Diante de tal contexto, combater o HIV/Aids exige compromisso e esforço por parte de toda sociedade, uma vez que envolve aspectos não apenas de ordem comportamental, mas questões que contribuem com o aumento da vulnerabilidade.55. Taquette SR, Matos HJ, Rodrigues Ade O, Bortolotti LR, Amorim E. The AIDS epidemic in adolescents between the ages of 13 and 19 in the City of Rio de Janeiro, Brazil: space-time description. Rev Soc Bras Med Trop. 2011; 44(4):467-70.

Face ao desafio de combater/controlar o HIV/Aids foram erigidas políticas públicas que culminaram em uma atenção à saúde voltada para a melhoria da qualidade de vida de pessoas soropositivas,11. Pereira BS, Costa MC, Amaral MT, Costa HS, Silva CA, Sampaio VS. Fatores associados à infecção pelo HIV/AIDS entre adolescentes e adultos jovens matriculados em Centro de Testagem e Aconselhamento no Estado da Bahia, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2014; 19(3):747-58. destacando a disponibilidade do tratamento antirretroviral na rede do Sistema Único de Saúde (SUS), a criação de Serviço de Assistência Especializada (SAEs) às pessoas com HIV/Aids, ações de biossegurança dos trabalhadores da saúde com o intuito de minimizar o risco de infecção pelo HIV advindos de acidentes ocupacionais, além da ampliação da oferta de testes diagnósticos e insumos voltados à prevenção.66. Mora Cárdenas CM, Monteiro S, Moreira CO. Ampliación de las estratégias de conserjería y prueba del VIH: desafios técnicos y tensiones ético-políticas. Salud Colectiva. 2014; 10(2):253-64.

Vislumbrando essa epidemia, foram pactuadas globalmente no ano de 2014 as metas 90-90-90 que referem à: 90 % de pessoas vivendo com HIV/Aids (PVHA) devem ser diagnosticadas, 90% das PVHA diagnosticadas em tratamento e 90% das PVHA em tratamento apresentando supressão viral.77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Manual técnico de elaboração da cascata de cuidado contínuo do HIV. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Vigilância, Prevenção, Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017. Para atender a essas metas, faz-se necessário repensar a construção e operacionalização de respostas na rede atenção à saúde, com destaque para a Atenção Básica, que se apresenta como lócus privilegiado para atuar no combate ao HIV/Aids por se conformar como ordenadora e uma das principais portas de entrada na rede de atenção à saúde do sistema, bem como possuir o compromisso de atribuir ações para o controle do HIV/Aids, tais como: educação em saúde, prevenção do HIV, diagnóstico precoce e acesso ao tratamento adequado.88. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Secretaria de Atenção à Saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012.

A relevância do estudo relaciona-se à necessidade de mensurar a atenção ofertada para o controle do HIV/Aids pelos profissionais de saúde na Atenção Básica com finalidade de desenvolver um diagnóstico situacional que subsidie a reconstrução dos saberes e práticas voltadas à prevenção e manejo do agravo.

Nesse sentido um questionário validado fomentará a produção de conhecimentos teóricos e operacionais voltados à compreensão e avaliação do desempenho das ações de prevenção e controle do HIV/Aids no contexto da Atenção Básica à Saúde, em especial, diante dos diferentes modelos organizacionais adotados no Brasil, em consonância com a diversidade dos contextos locorregionais, configurando um pluralismo assistencial (Unidades Básicas tradicionais, Programa de Agentes Comunitários de Saúde e Estratégia de Saúde da Família). Assim, a disponibilidade de ferramentas que permitam a avaliação do desempenho destes serviços é fundamental para a qualificação das práticas de saúde, em especial, no que se refere ao controle do HIV/Aids.Além disso, possibilita colaborar para o direcionamento de políticas públicas a esse nível de atenção à saúde, auxiliando no planejamento de intervenções com vista ao alcance das metas 90-90-90 do Ministério da Saúde do Brasil.

O objetivo foi desenvolver uma validação de conteúdo de questionário voltado para a avaliação do controle do HIV/Aids na rede de atenção básica de saúde por meio da atenção ofertada pelos profissionais de saúde.

Métodos

Pesquisa metodológica de abordagem quantitativa, para validação aparente e amostral do conteúdo de questionário.99. Stein LM, Falcke D, Predebon JC, Rocha KB, Ávila LM, Azambuja MP. A construção de um instrumento de avaliação discente de um programa de pós-graduação. Psico-USF. 2005; 10(2):141-7.,1010. Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady D, Hearst N, Newman TB. Delineando a pesquisa clínica: uma abordagem epidemiológica. 3a ed. Porto Alegre: Editora Artmed; 2008., realizada por um grupo de juízes com o uso da técnica Delphi.1111. Akins RB, Tolson H, Cole BR. Stability of response characteristics of a Delphi panel: application of bootstrap data expansion. BMC Med Res Method. 2005; 5:37.O estudo foi desenvolvido em duas fases sequenciais. Na primeira, realizou-se uma revisão integrativa para a construção do instrumento e na segunda, a validação de conteúdo.

Construção do instrumento

A elaboração do questionário desenvolveu-se após uma revisão integrativa de literatura acerca do controle do HIV/Aids em periódicos publicados nos últimos 10 anos dispostos na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS); Literatura Latino-Americana e do Caribe (LILACS); Literatura Internacional em Ciências da Saúde e Biomédica (MEDLINE); SCOPUS e Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), empregando-se os seguintes Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): atenção primária à saúde; síndrome da imunodeficiência adquirida e HIV. De forma complementar, utilizaram-se materiais disponibilizados pelo Ministério da Saúde, associado às experiências dos pesquisadores.

O questionário elaborado compõe-se de duas seções: caracterização sociodemográfica e econômica dos participantes (contendo sete questões referentes ao sexo, idade, renda familiar, religião, estado civil, profissão e tempo de atuação na rede básica de saúde), caracterização da atenção ofertada (parte específica constituída por quarenta e sete questões relacionadas à avaliação do controle do HIV/Aids ancoradas nos seguintes pilares: conhecimento dos profissionais acerca do controle da epidemia ao nível da atenção básica; educação em saúde; diagnóstico; continuidade do cuidado; disponibilidade de recursos materiais e espaço físico na unidade de saúde; acessibilidade a serviços de saúde e aos insumos para prevenção da infecção pelo HIV).

Validação de conteúdo do instrumento

Precedendo a validação de conteúdo, foi desenvolvida uma revisão por pares junto a um comitê de especialistas, selecionados por conveniência, formado por três docentes acadêmicos com experiência em políticas públicas para enfrentamento do HIV/Aids que realizaram uma avaliação sobre a equivalência conceitual e semântica do questionário.

Para conferir a validade de conteúdo, o questionário foi submetido à apreciação de especialistas, pessoas consideradas capacitadas para avaliar a clareza, conteúdo, disposição e compreensão de um questionário,1212. Silva MB, Argenta C, Saurin G, Crossett MG, Almeida MA. Utilização da técnica delphi na validação de diagnósticos de enfermagem. Rev Enferm UFPE. 2013; 7(1):262-8. analisando se as questões que o compõem constituem uma amostra representativa do que se propõe mensurar.1313. Miranda AR, Araújo CS, Castro FS. Instrumento para coleta de dados de pacientes com artrite reumatoide. Rev Enferm Cent O Min. 2012; 2(2):228-42.

Por não haver na literatura um consenso para definição do número de sujeitos que deve participar da validação de conteúdo, a definição da amostra fica a critério e acessibilidade do pesquisador, contudo, para minimizar vieses, a delimitação dos critérios de inclusão dos participantes deve estar em consonância com o objeto de estudo.1414. Scarparo AF, Laus AM, Azevedo AL, Freitas MR, Gabriel CS, Chaves LD. Reflexões sobre o uso da técnica delphi em pesquisas na enfermagem. Rev Rene. 2012; 13(1):242-51.

Os especialistas foram selecionados por meio do currículo lattes pautados nos seguintes critérios de inclusão: docentes de graduação e/ou profissionais da saúde atuantes na atenção básica; pós-graduação lato sensu ou stricto sensu na área de saúde pública, saúde coletiva, ciências da saúde e/ou gestão em saúde, pesquisas relacionadas ao controle do HIV/Aids nos últimos cinco anos; atuação profissional igual ou superior a dois anos e, os referidos critérios de exclusão: retorno do instrumento preenchido incompletamente tanto para os profissionais de saúde da atenção básica quanto para os docentes.

A amostra foi composta por vinte participantes, sendo dez profissionais de saúde e dez docentes de graduação que atenderam aos critérios de inclusão e desenvolvida por meio do correio eletrônico no período de fevereiro de 2014 a abril de 2014. O contato inicial foi realizado por meio de carta-convite, especificando os critérios de avaliação e a solicitação para apreciação e, após o aceite, o instrumento e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), foi enviado aos participantes.

Os dados coletados junto aos especialistas na validação amostral foram apreendidos por meio de escala de dois pontos para avaliação individual das questões referentes à concordância (C) e discordância (D) com a permanência no questionário. Na validação aparente, os especialistas desenvolveram seus julgamentos, inferindo em espaços destinados para comentários/sugestões.

O percurso metodológico ocorreu em duas rodadas, tendo em vista que na primeira, realizada com vinte participantes, não foi alcançado o consenso adotado nessa pesquisa. Prosseguiu-se a coleta com oito especialistas, pois os demais não contribuíram com sugestões e comentários na primeira rodada.1414. Scarparo AF, Laus AM, Azevedo AL, Freitas MR, Gabriel CS, Chaves LD. Reflexões sobre o uso da técnica delphi em pesquisas na enfermagem. Rev Rene. 2012; 13(1):242-51.

Os dados foram analisados por meio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 20.0. A análise dos dados para validade de conteúdo procedeu-se por meio do nível de consenso das respostas,1414. Scarparo AF, Laus AM, Azevedo AL, Freitas MR, Gabriel CS, Chaves LD. Reflexões sobre o uso da técnica delphi em pesquisas na enfermagem. Rev Rene. 2012; 13(1):242-51. associado ao índice Kappa para mensuração do nível de concordância e consistência dos juízes em relação à permanência ou não das questões no instrumento, esse varia de +1 a - 1, sendo, valores entre 0,41 e 0,60, classificados como moderados, 0,61 a 0,80 substanciais e 0,81 a 1,0, excelentes.1414. Scarparo AF, Laus AM, Azevedo AL, Freitas MR, Gabriel CS, Chaves LD. Reflexões sobre o uso da técnica delphi em pesquisas na enfermagem. Rev Rene. 2012; 13(1):242-51.

Considerou-se como critério para permanência das questões o valor do coeficiente Kappa variando entre moderado, substancial e excelente, associado a uma porcentagem de concordância ≥ 75,0%. Questões que apresentaram o coeficiente Kappa e/ou porcentagem de concordâncias menores que os valores referidos, foram automaticamente excluídos do questionário e as demais questões foram refeitas, mediante as sugestões e comentários apresentados na validação aparente, e submetidas a uma reavaliação.1515. Melo RP, Moreira RP, Fontenele FC, Aguiar AS, Joventino ES, Carvalho EC. Critérios de seleção de experts para estudos de avaliação de fenômenos de enfermagem. Rev Rene. 2011; 12(2):424-31.

O desenvolvimento do estudo atendeu as normas de ética em pesquisa envolvendo seres humanos (Certificado de Apresentação para Apreciação Ética - CAAE: 23067613.0.0000.5537).

Resultados

Na primeira rodada, os especialistas concordaram 100% com as questões que compuseram as secções de caracterização sociodemográfica e econômica, obtendo valores Kappa de +1. Das quarenta e sete questões que compunham o questionário na versão inicial, treze obtiveram nível de porcentagem de concordância 100% e Kappa +1 e não apresentaram nenhuma sugestão de modificação, conforme observado na tabela 1.

Tabela 1
Julgamento dos especialistas sobre as questões

Dezesseis questões foram automaticamente eliminadas por não apresentarem o índice de concordância estabelecido na pesquisa: K ≥ 0,41 e/ou porcentagem de concordância ≥ 75,0. As demais questões foram avaliadas com valores Kappa variando entre substanciais, moderados e excelentes, com uma aprovação de 75% a 100% quanto à permanência no questionário, contudo foram analisadas com necessidades de modificações na validação aparente (Quadro 1).

Quadro 1
Sugestões dos especialistas acerca das questões consideradas adequadas com necessidades de alterações

Realizada a reformulação das questões descritas no quadro 1 e exclusão das questões que apresentaram valores Kappa sofríveis, o questionário foi submetido à segunda rodada de apreciação. Trinta e uma questões compuseram o questionário na segunda versão e, dentre elas, quinze apresentaram nível de concordância excelente na versão inicial e, posteriormente, continuaram apresentando esse resultado. Das questões que sofreram modificações para atender às sugestões dos avaliadores, chegou-se ao total de cinco. Onze questões do instrumento apresentaram valores Kappa variando entre moderados, substanciais e excelentes e nível de consenso de 75% a 100% na validação amostral e sem sugestões/comentários por parte dos avaliadores.

Todas as questões analisadas na segunda rodada foram aprovadas em relação aos os critérios de pertinência, clareza, objetividade, precisão, vocabulário e abrangência. O questionário, em sua versão final (quadro 2), compõe-se de duas seções, contendo sete questões voltadas para a caracterização sociodemográfica e econômica dos profissionais de saúde e trinta e uma questões para avaliar o controle do HIV/Aids na atenção básica.

Quadro 2
Versão final do questionário para avaliar o controle do HIV/Aids na atenção básica sob a ótica dos profissionais de saúde

Discussão

A introdução da Terapia Antirretroviral Altamente Eficaz (HAART) ocorrida no ano de 1996 acabou por determinar uma diminuição considerável da incidência da Aids em consequência da redução da carga viral dos portadores de Aids, contribuindo para a redução da transmissão do vírus.1616. Boletim Epidemiológico de AIDS, HIV/DST e Hepatites B e C do Município de São Paulo. São Paulo: Secretaria Municipal da Saúde, Coordenação de Vigilância em Saúde. Bol Epidemiol AIDS, HIV/DST. 2011; 14(13):12-91. Apesar do controle relativo, alguns desafios ao enfrentamento do HIV/Aids se fazem persistentes e dentre eles, a ampliação das ações de prevenção e de diagnóstico precoce nos serviços de saúde.1717. Paula IA, Guibu IA. DST/aids e rede básica: uma integração necessária. São Paulo: Secretária de Estado da Saúde; 2007.

No âmbito nacional, as ações de prevenção que se restringiam aos serviços de referência vêm sofrendo uma descentralização, fazendo-se presentes na Atenção Básica, que tem desenvolvido ações voltadas ao enfrentamento do HIV/Aids em diferentes graus de complexidade e qualidade. Apesar dos avanços, existem grandes desafios para o seu aprimoramento.1717. Paula IA, Guibu IA. DST/aids e rede básica: uma integração necessária. São Paulo: Secretária de Estado da Saúde; 2007.

Mediante a responsabilidade da rede básica para o controle do HIV/Aids, torna-se relevante investigar diagnósticos da atenção que vem sendo operacionalizada nesse serviço. No entanto, na inobservância de questionários propostos para esse fim, acentua-se a importância do questionário e a avaliação por meio de um comitê de especialistas, pois, o julgamento coletivo organizado é mais produtivo que o individual ou de grupos desprovidos de conhecimentos específicos.1616. Boletim Epidemiológico de AIDS, HIV/DST e Hepatites B e C do Município de São Paulo. São Paulo: Secretaria Municipal da Saúde, Coordenação de Vigilância em Saúde. Bol Epidemiol AIDS, HIV/DST. 2011; 14(13):12-91.

Acredita-se que questionários validados podem conduzir a uma construção de diagnósticos mais precisos, uma vez que ancoram a tomada de decisões na medida em que permitem sistematicamente, a coleta de dados os quais são traduzidos em informações pertinentes sobre determinada realidade, buscando, portanto, identificar as necessidades de cada contexto.1313. Miranda AR, Araújo CS, Castro FS. Instrumento para coleta de dados de pacientes com artrite reumatoide. Rev Enferm Cent O Min. 2012; 2(2):228-42. Os dados apresentados neste estudo reafirmam a importância da operacionalização de técnicas metodológicas rigorosas e responsabilidade pelos dados coletados para o desenvolvimento de questionários validados.1212. Silva MB, Argenta C, Saurin G, Crossett MG, Almeida MA. Utilização da técnica delphi na validação de diagnósticos de enfermagem. Rev Enferm UFPE. 2013; 7(1):262-8.

Ao ouvir a opinião dos especialistas, foi possível o desenvolvimento de um questionário mais preciso.1818. Brêtas AC, Pereira AL. Gestão em unidades básicas de saúde. In: Harada MJ, organizador. Gestão em enfermagem: ferramenta para prática segura. São Caetano do Sul (SP): Yendis; 2011. p. 377-83. Após a primeira rodada, parte significativa das sugestões apresentadas, referentes aos requisitos vocabulário clareza e abrangência foi atendida. Das sete questões consideradas adequadas, mas com necessidades de alterações, cinco foram modificadas mediante a sua relevância e correspondência com a literatura.

Três das cinco questões supracitadas que se referem ao teste anti-HIV foram modificadas de acordo com as sugestões dos especialistas: “O teste rápido ou sorológico é ofertado aos parceiros de pessoas diagnosticadas com HIV/Aids?”, “O teste rápido ou sorológico de HIV é solicitado a mulheres que apresentam queixas sugestivas de infecção ginecológica?” e “O teste rápido ou sorológico de HIV é ofertado aos usuários desta unidade?”. Essas modificações permitiram a inclusão do teste rápido junto ao sorológico, possibilitando investigar como a equipe de saúde operacionaliza as ações para o diagnóstico de HIV de maneira mais ampla, contribuindo desta forma para o alcance da meta de 90% de pessoas diagnosticadas com HIV. O Brasil tem até 2020 para atingir a meta 90-90-90 estabelecida pelo país, perante a Organização das Nações Unidas, e que foi assumida também r pelo bloco dos BRICS (formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). A meta mundial prevê novas infecções limitadas a 500 mil ao ano e zero discriminação.77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Manual técnico de elaboração da cascata de cuidado contínuo do HIV. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Vigilância, Prevenção, Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017.

Atualmente, a ampliação dos centros de testagem de diagnóstico e a inserção dos testes rápidos na rede básica de saúde, além de possibilitarem um diagnóstico precoce, fornecem uma oportunidade de realizar intervenções individualizadas entre um grande número de pessoas.1919. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para prevenção da transmissão vertical de HIV, sífilis e hepatites virais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2015.,2020. Soares PS, Brandão ER. O aconselhamento e a testagem anti-HIV como estratégia preventiva: uma revisão da literatura internacional. Saúde Soc. 2012; 21(4):940-53. A despeito do aumento da testagem no país, há uma realidade preocupante que consiste na ausência, em grande parte, da oferta do aconselhamento, sem a devida atenção à decisão autônoma das pessoas, com desigualdades inerentes ao nível de escolaridade, região e raça.2121. Paiva V, Pupo LR, Barbosa R. O direito à prevenção e os desafios da redução da vulnerabilidade ao HIV no Brasil. Rev Saúde Pública. 2006; 40 Supl:109-19.,2222. Araújo MA, Farias FL, Rodrigues AV. Aconselhamento pós-teste anti-HIV: análise a luz de uma teoria humanística de Enfermagem. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2006; 10(3):425-31.

Para a implantação adequada do teste rápido de HIV é preciso basear-se em quatro dimensões: sensibilização da equipe e divulgação dos procedimentos de testagem rápida para público alvo; espaço físico e equipamentos adequados; disponibilidade dos insumos e material de apoio e organização do fluxo e definição de papéis. Baseando-se nisso, a questão “A unidade possui um espaço físico adequado para a realização de atividades educativas?” foi sugerida pelos especialistas alteração referente ao vocabulário e clareza, em razão pela qual a permanência de termos ou expressões de difícil compreensão podem gerar dubiedade e suscitar respostas que não condizem com a realidade.

A sugestão apresentada na questão: “No primeiro contato com pessoas sugestivas de HIV/Aids tem-se a oportunidade de diagnóstico?” referente ao aspecto vocabulário e clareza, foi atendida por facilitar a compreensão da pergunta e conferir objetividade e clareza no conteúdo do questionário.1212. Silva MB, Argenta C, Saurin G, Crossett MG, Almeida MA. Utilização da técnica delphi na validação de diagnósticos de enfermagem. Rev Enferm UFPE. 2013; 7(1):262-8.

Na questão: “Após a confirmação de gravidez por mulheres que procuraram os serviços de saúde é realizada a consulta pré-natal o mais rápido possível?” a sugestão foi pertinente, entendendo que a detecção precoce de ISTs e a redução da transmissão vertical do HIV podem ser alcançadas, caso esses agravos sejam prevenidos e/ou diagnosticados durante o pré-natal, assim, quanto antes for à adesão ao pré-natal de qualidade, mais efetiva pode ser a redução dessa transmissão conforme discorre a Política Nacional de DST/Aids e acentua as estratégias da Rede Cegonha que possui a Atenção Básica como um dos pilares.1919. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para prevenção da transmissão vertical de HIV, sífilis e hepatites virais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2015. No entanto, não foi considerada, pois no próprio questionário já existe outra questão que engloba essa propositura: “Na primeira consulta de pré-natal é solicitada a sorologia para HIV/Aids?”

Conforme preconiza o Ministério da Saúde, o pré-natal deve se iniciar no primeiro trimestre e, juntamente, serem solicitados os exames complementares, dentre eles, o teste rápido de triagem para sífilis e/ou VDRL/RPR, teste rápido diagnóstico Anti-HIV; toxoplasmose IgM e IgG e sorologia para hepatite B (HbsAg). A sugestão de enfocar não apenas a consulta pré-natal também não foi aceita.1818. Brêtas AC, Pereira AL. Gestão em unidades básicas de saúde. In: Harada MJ, organizador. Gestão em enfermagem: ferramenta para prática segura. São Caetano do Sul (SP): Yendis; 2011. p. 377-83.

As limitações deste estudo estão relacionadas à ausência de algumas questões relacionadas ao manejo da infecção pelo HIV na Atenção Básica na versão validada. Ressalta-se que foram incluídas no instrumento inicial questões que contemplavam esse aspecto, tais como: acolhimento e avaliação inicial das pessoas diagnosticadas com HIV, realização do manejo da infecção pelo HIV, identificação dos usuários que poderão ser acompanhados na unidade e encaminhados para serviço especializado e a detecção precoce de falha à terapia antirretroviral. Os juízes justificaram a retirada destas questões baseado na falta de educação permanente de profissionais de saúde para atuarem diante dessa nova demanda, estrutura física inadequada das Unidades, falta de uma rede integrada e articulada de apoio e matricialmente para suporte no caso de falhas terapêuticas na Atenção Básica.

No entanto, diante da mudança no panorama do manejo da infecção pelo HIV no Brasil, onde observa-se o manejo de pacientes estáveis, em uso de esquemas simplificados de tratamento, que se assemelha ao cuidado de pacientes portadores de doenças crônicas, um novo modelo de atenção vem-se estabelecendo em municípios brasileiros. Este, apresenta uma evolução dos modelos centrados em serviços especializados para matriciados, dinâmicos, em que diferentes pontos de atenção participam da linha de cuidado ao HIV/Aids, formando uma rede integrada e articulada.2323. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. O Manejo da Infecção pelo HIV na Atenção Básica - Manual para Profissionais Médicos. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2015.

Nesse novo modelo, o desenho da linha de cuidado passa a contar com a Atenção Básica como porta de entrada e ordenadora do cuidado. Estratégias como o suporte dos serviços especializados para atenção básica e o atendimento compartilhado entre esses serviços garantem maior acesso dos usuários ao sistema de saúde. A decisão pela implementação desse novo modelo é local, e um dos pontos fundamentais é que os profissionais de saúde estejam inseridos em processos de educação permanente, garantindo assim qualificação adequada para resposta às novas demandas.2323. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. O Manejo da Infecção pelo HIV na Atenção Básica - Manual para Profissionais Médicos. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2015.

Conclusão

A validação de conteúdo por meio da apreciação de juízes mostrou-se útil para a elaboração e aperfeiçoamento, resultando na disposição de um questionário válido, composto por trinta e uma questões voltadas para avaliar as ações de controle do HIV/Aids na Atenção Básica. O questionário inédito no nacionalmente e internacionalmente se apresenta como possível ferramenta a ser considerada pelos gestores e profissionais de saúde para desenvolver um diagnóstico situacional das potencialidades e fragilidades da atenção básica frente ao controle do HIV/Aids, podendo subsidiá-los na definição de um planejamento estratégico. Contribuindo assim, para mudanças no quadro epidemiológico, resultando em benefícios para a família, comunidade e usuários da rede básica de saúde.

Referências

  • 1
    Pereira BS, Costa MC, Amaral MT, Costa HS, Silva CA, Sampaio VS. Fatores associados à infecção pelo HIV/AIDS entre adolescentes e adultos jovens matriculados em Centro de Testagem e Aconselhamento no Estado da Bahia, Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2014; 19(3):747-58.
  • 2
    Dantas MS, Abrão FM, Freitas CM, Oliveira DC. Representações sociais do HIV/AIDS por profissionais de saúde em serviços de referência. Rev Gaúcha Enferm. 2014; 35(4):94-100.
  • 3
    Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). Global Report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic/2012. [Internet]. [cited 2017 May 28]. Available from: http://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/20121120_UNAIDS_Global_Report_2012_with_annexes_en_1.pdf
    » http://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/20121120_UNAIDS_Global_Report_2012_with_annexes_en_1.pdf
  • 4
    Brasil. Ministério da Saúde. Programa Nacional de DST e AIDS. Boletim epidemiológico AIDS – DST. Brasília(DF): Ministério da Saúde; 2016.
  • 5
    Taquette SR, Matos HJ, Rodrigues Ade O, Bortolotti LR, Amorim E. The AIDS epidemic in adolescents between the ages of 13 and 19 in the City of Rio de Janeiro, Brazil: space-time description. Rev Soc Bras Med Trop. 2011; 44(4):467-70.
  • 6
    Mora Cárdenas CM, Monteiro S, Moreira CO. Ampliación de las estratégias de conserjería y prueba del VIH: desafios técnicos y tensiones ético-políticas. Salud Colectiva. 2014; 10(2):253-64.
  • 7
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Manual técnico de elaboração da cascata de cuidado contínuo do HIV. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Vigilância, Prevenção, Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017.
  • 8
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Secretaria de Atenção à Saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012.
  • 9
    Stein LM, Falcke D, Predebon JC, Rocha KB, Ávila LM, Azambuja MP. A construção de um instrumento de avaliação discente de um programa de pós-graduação. Psico-USF. 2005; 10(2):141-7.
  • 10
    Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady D, Hearst N, Newman TB. Delineando a pesquisa clínica: uma abordagem epidemiológica. 3a ed. Porto Alegre: Editora Artmed; 2008.
  • 11
    Akins RB, Tolson H, Cole BR. Stability of response characteristics of a Delphi panel: application of bootstrap data expansion. BMC Med Res Method. 2005; 5:37.
  • 12
    Silva MB, Argenta C, Saurin G, Crossett MG, Almeida MA. Utilização da técnica delphi na validação de diagnósticos de enfermagem. Rev Enferm UFPE. 2013; 7(1):262-8.
  • 13
    Miranda AR, Araújo CS, Castro FS. Instrumento para coleta de dados de pacientes com artrite reumatoide. Rev Enferm Cent O Min. 2012; 2(2):228-42.
  • 14
    Scarparo AF, Laus AM, Azevedo AL, Freitas MR, Gabriel CS, Chaves LD. Reflexões sobre o uso da técnica delphi em pesquisas na enfermagem. Rev Rene. 2012; 13(1):242-51.
  • 15
    Melo RP, Moreira RP, Fontenele FC, Aguiar AS, Joventino ES, Carvalho EC. Critérios de seleção de experts para estudos de avaliação de fenômenos de enfermagem. Rev Rene. 2011; 12(2):424-31.
  • 16
    Boletim Epidemiológico de AIDS, HIV/DST e Hepatites B e C do Município de São Paulo. São Paulo: Secretaria Municipal da Saúde, Coordenação de Vigilância em Saúde. Bol Epidemiol AIDS, HIV/DST. 2011; 14(13):12-91.
  • 17
    Paula IA, Guibu IA. DST/aids e rede básica: uma integração necessária. São Paulo: Secretária de Estado da Saúde; 2007.
  • 18
    Brêtas AC, Pereira AL. Gestão em unidades básicas de saúde. In: Harada MJ, organizador. Gestão em enfermagem: ferramenta para prática segura. São Caetano do Sul (SP): Yendis; 2011. p. 377-83.
  • 19
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para prevenção da transmissão vertical de HIV, sífilis e hepatites virais. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2015.
  • 20
    Soares PS, Brandão ER. O aconselhamento e a testagem anti-HIV como estratégia preventiva: uma revisão da literatura internacional. Saúde Soc. 2012; 21(4):940-53.
  • 21
    Paiva V, Pupo LR, Barbosa R. O direito à prevenção e os desafios da redução da vulnerabilidade ao HIV no Brasil. Rev Saúde Pública. 2006; 40 Supl:109-19.
  • 22
    Araújo MA, Farias FL, Rodrigues AV. Aconselhamento pós-teste anti-HIV: análise a luz de uma teoria humanística de Enfermagem. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2006; 10(3):425-31.
  • 23
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. O Manejo da Infecção pelo HIV na Atenção Básica - Manual para Profissionais Médicos. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2015.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2017

Histórico

  • Recebido
    9 Mar 2017
  • Aceito
    29 Maio 2017
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: actapaulista@unifesp.br