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Fatores associados à qualidade de vida dos idosos

Factores asociados a la calidad de vida de las personas mayores

Resumo

Objetivo:

Examinar as relações entre qualidade de vida, nutrição e fragilidade em indivíduos não institucionalizados com idade acima de 75 anos.

Método:

Estudo observacional, transversal e analítico realizado através da aplicação de um questionário com uma amostra de indivíduos com mais de 75 anos de idade residentes na comunidade e selecionados através de amostragem por conveniência durante o ano de 2015.

Resultados:

Uma proporção maior de mulheres apresentou baixa qualidade de vida em relação aos homens: 20,9% contra 9% (p<0,01). O risco de desnutrição foi associado a baixa qualidade de vida (35%) (23,4%) (p<0,000). Uma proporção maior de indivíduos fragilizados apresentou baixa qualidade de vida: 55,7% contra 17,4% (p<0.000).

Conclusão:

A qualidade de vida dos idosos é influenciada pela presença de sintomas de depressão, estado nutricional, sexo, fragilidade e incapacidade básica e instrumental.

Descritores
Idoso; Qualidade de vida; Idoso fragilizado

Resumen

Objetivo:

Examinar las relaciones entre calidad de vida, nutrición y fragilidad en individuos no institucionalizados con edad superior a 75 años.

Método:

Estudio observacional, transversal y analítico realizado durante el año 2015, a través de la aplicación de un cuestionario con una muestra de individuos con más de 75 años de edad residentes en la comunidad y seleccionados a través de muestreo por conveniencia.

Resultados:

Una proporción mayor de mujeres presentó baja calidad de vida en relación con los hombres: 20,9% contra 9% (p <0,01). El riesgo de desnutrición se asoció a una baja calidad de vida (35%) (23,4%) (p <0,000). Una proporción mayor de individuos fragilizados presentó baja calidad de vida: 55,7% contra 17,4% (p <0.000).

Conclusión:

La calidad de vida de los ancianos es influenciada por la presencia de síntomas de depresión, estado nutricional, sexo, fragilidad e incapacidad básica e instrumental.

Descriptores
Anciano; Calidad de vida; Anciano frágil

Abstract

Objective:

Examine the relationships between quality of life, nutrition and frailty in non-institutionalized people older than 75 years of age.

Methods:

Observational, cross-sectional, analytical study conducted using a questionnaire with a sample of individuals older than 75 years of age residing in the community, who were selected via convenience sampling during 2015.

Results:

A larger proportion of women had poor quality of life than men: 20.9% as opposed to 9% (p<0.01). Malnutrition risk was associated with low quality of life (35%) (23.4%) (p<0.000). A larger proportion of frail individuals had poor quality of life: 55.7% against 17.4% (p<0.000).

Conclusion:

Quality of life of older people is influenced by the presence of depression symptoms, nutritional status, sex, frailty and basic and instrumental disability.

Keywords
Elderly; Quality of life; Frail elderly

Introdução

A OMS define qualidade de vida como “a percepção de um indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistemas de valores no qual vive e em relação às suas metas, expectativas, padrões e preocupações”.(11. Casado J, Gonzalez N, S M, Orueta R, Carmona J, RM GC. Calidad de vida relacionada con la salud en pacientes ancianos en atención primaria. Atención Primaria. 2001;28(3):47–55.) A análise da qualidade de vida de idosos envolve compreender como eles vivem e ter informações que permitam avaliar seu nível de satisfação de acordo com suas necessidades e as melhorias que eles podem necessitar para manter um nível adequado de qualidade.(22. Munita P. Calidad de vida y vejez. Quality. 1994;2001(26):582–4.) Estudos recentes analisaram a qualidade de vida de idosos em relação ao comportamento, prescrição de medicamentos, problemas de saúde e em termos sociais.(33. Gois AC, Pernambuco LA, Lima KC. Factors associated with voice disorders among the elderly: a systematic review. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84(4):506-513.77. Koo KM, Park CH, Kim CJ. Development of strategies for changing in physical activity behaviors on older adults with disabilities. J Exerc Rehabil. 2017;13(6):676–83.) A qualidade de vida dos idosos tem aspectos em comum com a de outros grupos populacionais, como relações sociais, atividades recreativas e satisfação, fatores sociais e ambientais, suporte social, condições econômicas e uso de tecnologias da informação, os quais possuem um impacto importante nos idosos.(88. Ap?stolo J, Cooke R, Bobrowicz-Campos E, Santana S, Marcucci M, Cano A, et al. Effectiveness of interventions to prevent pre-frailty and frailty progression in older adults. JBI Database Syst Rev Implement Reports. 2018;16(1):140–232.,99. Khalaila R, Vitman-Schorr A. Internet use, social networks, loneliness, and quality of life among adults aged 50 and older: mediating and moderating effects. Qual Life Res. 2018;27(2):479–89.)

As diferenças mais relevantes associadas a qualidade de vida entre os idosos e o restante da sociedade podem ser observadas em aspectos relacionados à incapacidade e dependência. Nesse contexto, a fragilidade é um estado anterior à incapacidade, e consequentemente à dependência.(1010. Salado Morales L. La Fragilidad en el anciano. Cantabria: Universidad de Cantabria; 2014.) Ao entender a existência da fragilidade, identificar os fatores de risco que podem desencadeá-la e investigá-la com escalas e instrumentos de pontuação, é possível detectar a população fragilizada e pré-fragilizada. Isso representa um passo à frente na melhoria da qualidade de vida dos idosos. Estudos apontam que o uso de instrumentos simples e uma promoção da saúde adequada possibilitam retardar a dependência, melhorar a qualidade de vida, e consequentemente reduzir os custos de longo prazo nos sistemas social e de saúde.(1111. Behm L, Eklund K, Wilhelmson K, Zidén L, Gustafsson S, Falk K, et al. Health Promotion Can Postpone Frailty: Results from the RCT Elderly Persons in the Risk Zone. Public Health Nurs. 2016;33(4):303–15.)

A prevalência da fragilidade e de suas causas varia, e pode ser encontrada em 5% a 58% dos idosos.(1212. Sternberg SA, Wershof Schwartz A, Karunananthan S, Bergman H, Mark Clarfield A. The identification of frailty: a systematic literature review. J Am Geriatr Soc. 2011;59(11):2129–38.) Um fator que contribui para o aumento da fragilidade entre os idosos é um estado nutricional ruim(1313. Ahmed T, Haboubi N. Assessment and management of nutrition in older people and its importance to health. Clin Interv Aging. 2010;5:207–16.,1414. Abellan Van kan G, Vellas B. Is the Mini Nutritional Assessment an appropriate tool to assess frailty in older adults? J Nutr Health Aging. 2011;15(3):3.) considerado um indicador de longevidade e qualidade de vida durante essa fase,(1414. Abellan Van kan G, Vellas B. Is the Mini Nutritional Assessment an appropriate tool to assess frailty in older adults? J Nutr Health Aging. 2011;15(3):3.) uma vez que está associado a mudanças fisiológicas como perda da função oral, refletida em atividades motoras da boca, como mastigação, deglutição, salivação e perda de partes dentárias.(1515. Vafaei Z, Mokhtari H, Sadooghi Z, Meamar R, Chitsaz A, Moeini M. Malnutrition is associated with depression in rural elderly population. J Res Med Sci. 2013;18 Suppl 1:S15–9.) Também se manifesta por alteração ou diminuição do discernimento do sabor dos alimentos e bebidas (geralmente relativo ao consumo de determinados medicamentos, neuropatias, transtornos gastrointestinais ou endócrinos, doenças inflamatórias, doenças crônicas, neoplasmas, imobilidade, isolamento social, limitações econômicas e baixa qualidade de vida).(1515. Vafaei Z, Mokhtari H, Sadooghi Z, Meamar R, Chitsaz A, Moeini M. Malnutrition is associated with depression in rural elderly population. J Res Med Sci. 2013;18 Suppl 1:S15–9.,1616. van Asselt DZ, van Bokhorst-de van der Schueren MA, van der Cammen TJ, Disselhorst LG, Janse A, Lonterman-Monasch S, et al. Assessment and treatment of malnutrition in Dutch geriatric practice: consensus through a modified Delphi study. Age Ageing. 2012;41(3):399–404.)

Como consequência, parece generalizar-se que os idosos, por vezes, ingerem menos alimentos que o necessário, uma situação que quando persiste desencadeia um estado catabólico que leva a uma redução progressiva de massa muscular, perda de peso e redução da força e funcionalidade.(1616. van Asselt DZ, van Bokhorst-de van der Schueren MA, van der Cammen TJ, Disselhorst LG, Janse A, Lonterman-Monasch S, et al. Assessment and treatment of malnutrition in Dutch geriatric practice: consensus through a modified Delphi study. Age Ageing. 2012;41(3):399–404.,1717. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, et al.; Cardiovascular Health Study Collaborative Research Group. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2001;56(3):M146–56.) Nesse sentido o estado nutricional tem um papel fundamental no processo de fragilização dos idosos.(1414. Abellan Van kan G, Vellas B. Is the Mini Nutritional Assessment an appropriate tool to assess frailty in older adults? J Nutr Health Aging. 2011;15(3):3.)

Dada a importância da nutrição e fragilidade como elementos críticos na qualidade de vida dos idosos, o objetivo deste estudo foi analisar as relações entre qualidade de vida, nutrição e fragilidade em indivíduos não institucionalizados com mais de 75 anos de idade.

Métodos

Estudo observacional transversal com fatores analisados em relação à qualidade de vida. Os dados foram extraídos da “Pesquisa FRALLE”(1818. Jürschik P, Nunin C, Botigué T, Escobar MA, Lavedán A, Viladrosa M. Prevalence of frailty and factors associated with frailty in the elderly population of Lleida, Spain: the FRALLE survey. Arch Gerontol Geriatr. 2012;55(3):625–31.) consistindo em 172 perguntas feitas através de instrumentos de medição validados, que medem a fragilidade, o risco de desnutrição e a qualidade de vida relacionada à saúde (HRQoL). Os dados foram coletados ao longo do ano de 2015. A amostra foi formada por indivíduos não institucionalizados com idade superior a 75 anos. O estudo incluiu pessoas de ambos os sexos, residentes em domicílios familiares, que tinham cartões de saúde e concordaram em participar do estudo, além de pessoas com déficit cognitivo com acompanhante (nesse caso, perguntas relativas a dados subjetivos não foram feitas). Indivíduos em estágios terminais da vida, institucionalizados, com déficit cognitivo e sem acompanhante, bem como aqueles que não aceitaram participar, foram excluídos. A amostra foi obtida através de amostragem intencional em consultas de enfermagem em unidades de atenção primária à saúde no departamento de Castellón (Espanha). Uma amostra de 400 indivíduos foi obtida de acordo com o cálculo estabelecido. Qualidade de vida: medida através do questionário de saúde Short-Form 36(1919. Ware JE, Sherbourne CD. The MOS 36-item short-form health survey (SF-36). I. Conceptual framework and item selection. Med Care. 1992;30(6):473–83.,2020. Alonso J, Prieto L, Antó JM. La versión española del SF-36 Health Survey (Cuestionario de Salud SF-36): un instrumento para la medida de los resultados clínicos. Med Clin (Barc). 1995;104(20):771–6.) consistindo em 36 itens em uma escala de 0 (pior estado de saúde) a 100 (melhor estado de saúde). Os itens são organizados em 8 dimensões, divididos em duas escalas: um componente físico (funcionamento físico, funcionamento da função física e dor no corpo) e um componente mental (saúde mental, funcionamento da função emocional, funcionamento da função social e vitalidade). A qualidade de vida foi categorizada como boa (pontuação maior ou igual a 50) ou ruim (abaixo de 50). Sociodemografia: Estado civil (“Sozinho” para pessoas que viviam por conta própria em suas casas e “Com alguém” quando viviam com um familiar ou cuidador). Renda mensal (< 900 euros e > 900 euros) e sexo (feminino e masculino). Risco de desnutrição: medido através do formulário simplificado Mini Avaliação Nutricional (MNA-SF)(2121. Vellas B, Guigoz Y, Garry PJ, Nourhashemi F, Bennahum D, Lauque S, Albarede JL. The Mini Nutritional Assessment (MNA) and its use in grading the nutritional state of elderly patients. Nutrition. 1999;15(2):116-22. Review.) consistindo de 6 perguntas com uma pontuação máxima de 14. Uma pontuação entre 12 e 14 indica “estado nutricional normal”, entre 8 e 11 “em risco de desnutrição” e de 0 a 7 “subnutrido”. A fragilidade foi definida de acordo com os critérios de Fried et al.:(1717. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, et al.; Cardiovascular Health Study Collaborative Research Group. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2001;56(3):M146–56.) Os indivíduos foram considerados “fragilizados” quando apresentavam três ou mais critérios de fragilidade, “pré-fragilizados” quando apresentavam um ou dois critérios, e “não fragilizados” quando não apresentavam nenhum critério. A comorbidade foi medida com o índice de Charlson,(2222. Charlson ME, Pompei P, Ales KL, MacKenzie CR. A new method of classifying prognostic comorbidity in longitudinal studies: development and validation. J Chronic Dis. 1987;40(5):373–83.) cuja pontuação total é 37, e considera-se comorbidade a pontuação ≥ 3. Atividades básicas da vida diária (ABVD) foram medidas com a escala Lawton-Brody.(2323. Katz S, Ford AB, Moskowitz RW, Jackson BA, Jaffe MW. Studies of illness in the aged: the index of ADL: a standardized measure of biological and psychosocial function. JAMA. 1963;185(12):914–9.) Uma pontuação de 0 a 1 foi considerada “sem ou com leve incapacidade”, pontuações de 2 ou mais foram consideradas “incapacidade moderada-severa”. Atividades instrumentais da vida diária (AIVD) também foram medidas com a escala de Lawton-Brody,(2424. Lawton MP, Brody EM. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist. 1969;9(3):179–86.) categorizadas da seguinte forma: ausência e incapacidade instrumental (incapacidade de executar 1 ou mais das atividades). Sintomas de depressão: a Escala de Depressão do Centro de Estudos Epidemiológicos (CES-D)(2525. Radloff L. The CES-D scale a self-report depression scale for research in the general population. Appl Psychol Meas. 1977;1(3):385–401.) foi utilizada para medir a presença de sintomas de depressão. Ela contém um questionário com 22 itens e uma pontuação ≥17 indica depressão.

Antes de iniciar o estudo o Comitê de Ética em Pesquisa Clínica do Departamento de Saúde de Castellón aprovou a solicitação do projeto de estudo. Os entrevistados assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, e a confidencialidade dos dados foi plenamente mantida. Uma análise descritiva foi realizada através de medidas de tendência central e percentuais de frequência. Na análise bivariada utilizou-se o teste qui-quadrado de Pearson para as variáveis qualitativas, com nível de significância de p<0.05. Posteriormente realizou-se uma análise multivariada de regressão logística binária, incluindo resultados anteriores estatisticamente significativos ao modelo. O nível de não-resposta foi avaliado (indivíduos que preferiram não responder certas perguntas da pesquisa ou pessoas com déficit cognitivo). Considerando-se que de acordo com Demaio(2626. Sanchez Carrión J. La bondad en la encuesta, el caso de la no respuesta. Madrid: Alianza Editorial; 2000. 120 p.) quando o nível de não-resposta fica abaixo de 10% uma inferência pode ser feita com os casos disponíveis, optou-se por não utilizar nenhum processo de imputação. O programa estatístico SPSS, versão 21.0, foi utilizado para análise dos dados.

Resultados

Foram entrevistados 400 indivíduos, 52,8% eram mulheres, com idade média de 81,3 anos, variando de 75 a 96 anos. Observou-se uma prevalência de baixa qualidade de vida nos componentes mental (8,8%) e físico (15,3%).

Componente físico

Diferenças significativas na qualidade de vida foram observadas em relação ao sexo; a proporção de mulheres com baixas pontuações (20,9%) foi mais elevada do que nos homens (9%) (p<0,01).

A tabela 1 resume os resultados obtidos na análise bivariada para o componente físico da qualidade de vida. Uma associação entre risco de desnutrição e qualidade de vida foi observada. A proporção de indivíduos que obtiveram pontuação baixa no componente físico da qualidade de vida foi mais elevada entre pessoas em risco de desnutrição ou que se encontravam desnutridas (35% e 13,3%) que a proporção de indivíduos com boa qualidade de vida que apresentavam risco de desnutrição ou estavam desnutridos (23,4% e 1,2%) (p<0.000).

Tabela 1
Componente físico da qualidade de vida em relação às variáveis do estudo

Em relação à fragilidade, os resultados demonstraram que a proporção de indivíduos com baixa qualidade de vida aumentou de acordo com o nível de fragilidade. A proporção de indivíduos fragilizados com baixa qualidade de vida (55,7%) foi mais elevada do que a de indivíduos fragilizados com boa qualidade de vida (17,4%). No caso de não fragilidade ou condição pré-fragilidade a proporção de indivíduos com boa qualidade de vida (25,4 e 57,2%) foi maior do que a de indivíduos com baixa qualidade de vida (4,9 e 39,3%, respectivamente) (p<0,000).

A presença de sintomas de depressão foi associada a uma pontuação mais baixa no componente físico da qualidade de vida, em uma proporção mais elevada: 77% contra 49,3% que não apresentava sintomas de depressão (p<0,000). Além disso, os resultados mostraram uma diferença estatisticamente significativa para as variáveis incapacidade básica e instrumental, em que a proporção de indivíduos com incapacidade básica para atividades da vida diária (moderada-severa) obteve piores pontuações de qualidade de vida (9,8%) do que indivíduos sem ou com leve incapacidade (3,3%) (p=0,019). Uma boa pontuação em qualidade de vida física foi associada a nenhuma ou leve incapacidade básica (99%) (p=0,019). A proporção de indivíduos com incapacidade instrumental que apresentou baixa qualidade de vida nos componentes físicos foi maior: 62,1% contra 47,3% (p=0,46) para aqueles que não apresentaram.

Não foi encontrada associação para a comorbidade e variáveis sociodemográficas (estado civil e renda).

Componente mental

Para o componente de saúde mental da qualidade de vida (Tabela 2), os resultados mostraram diferenças estatisticamente significativas em relação ao sexo, em que as pontuações das mulheres foram mais baixas do que as dos homens: 22,9% contra 77,1% respectivamente (p=0,003). Houve também diferenças estatisticamente significativas em relação ao risco de desnutrição e fragilidade: a proporção de indivíduos que obtiveram uma pontuação baixa no componente mental de qualidade de vida foi mais elevada para indivíduos apresentando risco de desnutrição e que encontravam-se fragilizados: 62,9% e 60%, respectivamente (p=0,000).

Tabela 2
Componente mental da qualidade de vida com relação às variáveis do estudo

Os resultados indicaram uma associação significativa entre qualidade de vida e comorbidade. A proporção de indivíduos sem nenhuma comorbidade que apresentaram um bom componente mental de qualidade de vida foi maior (58,4%) que entre aqueles com baixa ou alta comorbidade (21,4% e 20,3%, respectivamente) (p= 0,026).

Observou-se que a depressão é um fator associado a uma baixa pontuação no componente mental da qualidade de vida em que houve uma maior proporção de indivíduos com sintomas de depressão (71,9%) com baixa qualidade de vida do que indivíduos sem nenhum sintoma (26,7%) (p=0,000). Com relação à incapacidade básica, os resultados indicaram que entre indivíduos com incapacidade moderada ou severa a proporção de baixa qualidade de vida (5,7 e 2,9%) foi maior que entre aqueles com boa qualidade de vida (1,5% e 0,3%) (p=0,028).

Ao analisar o efeito das variáveis associadas aos componentes da qualidade de vida no modelo estimado (Tabela 3) as variáveis que explicaram o componente físico da qualidade de vida foram fragilidade e incapacidade básica. O risco de apresentar baixa qualidade de vida física foi 1,5 vezes maior entre idosos fragilizados que em não-fragilizados (OR=1,566, CI=0,047-0,924) e o risco de apresentar uma pontuação baixa no componente físico da qualidade de vida foi 0,6 vezes maior entre idosos com incapacidade básica para atividades da vida diária. Para o componente mental da qualidade de vida (Tabela 3) as variáveis que o explicam são estado nutricional (OR=1,393, CI=0,107-0,579) e sintomas de depressão (OR=1,223, CI=0,130-0,664).

Tabela 3
Fatores associados a componentes físicos e mentais da qualidade de vida

Discussão

Embora haja uma série de instrumentos para medir a HRQoL, o SF-36 foi escolhido para o presente estudo por ser amplamente utilizado por sua confiabilidade e consistência interna. Neste estudo a prevalência de baixa qualidade de vida para ambos os componentes foi baixa em comparação com os resultados do estudo realizado por Jürschik et al.(1818. Jürschik P, Nunin C, Botigué T, Escobar MA, Lavedán A, Viladrosa M. Prevalence of frailty and factors associated with frailty in the elderly population of Lleida, Spain: the FRALLE survey. Arch Gerontol Geriatr. 2012;55(3):625–31.) Esses resultados podem ser explicados pelo fato de que o estudo não incluiu indivíduos institucionalizados, entre os quais poderia ter havido uma maior prevalência de baixa qualidade de vida, além de o estudo ter sido realizado em uma cidade de porte médio em comparação aos resultados obtidos em cenários rurais.(2727. Wedgeworth M, LaRocca MA, Chaplin WF, Scogin F. The role of interpersonal sensitivity, social support, and quality of life in rural older adults. Geriatr Nurs. 2017;38(1):22–6.,2828. dos Santos Tavares DM, Fernandes Bolina A, Aparecida Dias F, dos Santos Ferreira PC, José Haas V. Quality of life of elderly. Comparison between urban and rural areas. Invest Educ Enferm. 2014;32(3):401–13.)

Existe uma vasta literatura demonstrando uma associação entre baixas pontuações para percepção da qualidade de vida nos dois componentes e no sexo feminino,(2929. García HI, Vera C Y, Lugo LH. Calidad de vida relacionada con la salud en Medellín y su área metropolitana, con aplicación del SF- 36. Rev Fac Nac Salud Pública. 2013;32(1):26–39.3131. Coronado G. Ivez JM, Díaz Vélez C, Apolaya Segura MA, Manrique González LM, Arequipa Benavides JP. Percepción de la calidad de vida relacionada con la salud del adulto mayor residente en la ciudad de Chiclayo. Acta Méd Peru. 2009;26(4):230–8.) coincidindo com os achados do presente estudo. Esses dados poderiam explicar, como no caso dos autores citados, porque as mulheres veem o envelhecimento como um fator negativo da vida e os homens se adaptam melhor a esse processo.

Embora o presente estudo não tenha sido capaz de estabelecer uma associação entre qualidade de vida e renda mensal, Morcillo et al.,(3232. Morcillo Cebolla V, de Lorenzo-Cáceres Ascanio A, Domínguez Ruiz de León P, Rodríguez Barrientos R, Torijano Castillo MJ. Desigualdades en la salud autopercibida de la población española mayor de 65 años. Gac Sanit. Sociedad Española de Salud Pública y Administración Sanitaria. 2014;28(6):511–21.) Ploubidis et al. e Coronado et al.(3131. Coronado G. Ivez JM, Díaz Vélez C, Apolaya Segura MA, Manrique González LM, Arequipa Benavides JP. Percepción de la calidad de vida relacionada con la salud del adulto mayor residente en la ciudad de Chiclayo. Acta Méd Peru. 2009;26(4):230–8.,3333. Ploubidis GB, Dale C, Grundy E. Later life health in Europe: how important are country level influences? Eur J Ageing. 2012;9(1):5–13.) observaram que a qualidade de vida era pior entre idosos com menor renda mensal. Isso pode se dever ao fato de que o nível de não-resposta nesse ponto foi maior na amostra do presente estudo.

Como no presente estudo, observou-se que a qualidade de vida em relação à saúde é afetada por diversas patologias,(3434 Naveiro-Rilo JC, Diez-Juárez D, Flores-Zurutuza ML, Javierre Pérez P, Alberte Pérez C, Molina Mazo R. La calidad de vida en ancianos polimedicados con multimorbilidad. Rev Esp Geriatr Gerontol. Elsevier; 2014;49(4):158–64.) embora esteja também relacionada a uma redução nos dois componentes da HRQoL em pacientes com apenas uma patologia,(3535. Wu JR, Lennie TA, Frazier SK, Moser DK. Health-related quality of life, functional status, and cardiac event-free survival in patients with heart failure. j Cardiovasc Nurs. 2016;31(3):236–44.,3636. Barros HIggins L, Herazo Beltrán Y, Aroca Martínez G, Martínez GA. Calidad de vida relacionada con la salud en pacientes con enfermedad renal crónica. Rev la Fac Med. 2015;63(4):641–7.) geralmente associada a condições crônicas. É importante notar que uma associação foi encontrada na população idosa de Castellón entre o componente mental da qualidade de vida e comorbidade, como em um estudo realizado em Tarragona com uma população adulta.(3737. Aragonès E, Lluís Piñol J, Labad A. Comorbilidad de la depresión mayor con otros trastornos mentales comunes en pacientes de atención primaria. Atención Primaria. Elsevier Doyma; 2009;41(10):545–51.)

Outro fator associado à qualidade de vida é a depressão, que no presente estudo afetou os dois componentes, conforme observado também em estudos de Coronado et al. e Capote et al.(3030. Capote Leyva E, Casamayor Laime Z. Castaner Moreno J. Calidad de vida y depresión en el adulto mayor con tratamiento sustitutivo de la función renal. Rev Cuba Med Mil. 2012;41(3):237–47.,3131. Coronado G. Ivez JM, Díaz Vélez C, Apolaya Segura MA, Manrique González LM, Arequipa Benavides JP. Percepción de la calidad de vida relacionada con la salud del adulto mayor residente en la ciudad de Chiclayo. Acta Méd Peru. 2009;26(4):230–8.)

Além disso, observou-se uma associação entre incapacidade básica e instrumental e o componente físico da HRQoL. Isso pode ocorrer porque surgem doenças em idades avançadas que podem resultar em deterioração mental e funcional dos idosos, criando dependências em atividades da vida diária e impondo restrições à autonomia, conforme também observado por Coronado et al.(3131. Coronado G. Ivez JM, Díaz Vélez C, Apolaya Segura MA, Manrique González LM, Arequipa Benavides JP. Percepción de la calidad de vida relacionada con la salud del adulto mayor residente en la ciudad de Chiclayo. Acta Méd Peru. 2009;26(4):230–8.)

As relações encontradas entre fragilidade e qualidade de vida são semelhantes às que foram observadas em um estudo de Toledo.(3838. Orueta Sánchez R, Rodríguez de Cossío Á, Carmona de la Morena J, Moreno Álvarez-Vijande A, García López A, Pintor Córdoba C. Anciano Frágil y Calidad de Vida. Rev Clín Med Fam. 2008;2(3):101–5.) Neste estudo uma relação causal positiva foi observada entre qualidade de vida, fragilidade e incapacidade básica no componente físico e entre estado nutricional e sintomas de depressão no componente mental, confirmando que a qualidade de vida da população idosa de Castellón foi influenciada por múltiplos fatores, incluindo sociodemográficos e relativos à saúde, assim como no caso do estudo realizado por Miranda et al.(3939. Miranda LC, Soares SM, Silva PA. Qualidade de vida e fatores associados em idosos de um Centro de Referência à Pessoa Idosa. Ciênc Saude Coletiva. 2016;21(11):3533–44.)

Os achados ressaltam o papel da fragilidade e incapacidade básica no componente físico da qualidade de vida, e o estado nutricional e depressão no componente mental da qualidade de vida, identificando assim essas variáveis como áreas importantes de intervenção para melhoria dos resultados em matéria de saúde.(4040. Akosile CO, Mgbeojedo UG, Maruf FA, Okoye EC, Umeonwuka IC, Ogunniyi A. Depression, functional disability and quality of life among Nigerian older adults: prevalences and relationships. Arch Gerontol Geriatr. 2018;74:39–43.,4141. Hernández-Galiot A, Goñi I. Quality of life and risk of malnutrition in a home-dwelling population over 75 years old. Nutrition. 2017;35:81–6.)

Embora existam diversos estudos sobre qualidade de vida, os resultados deste estudo enfatizam a importância de avaliar e abordar a percepção negativa que os idosos têm de si, e determinar quais fatores influenciam essa percepção. A promoção da saúde é um conceito interdisciplinar, e a função dos enfermeiros é essencial, pois são os profissionais que mais frequentemente prestam cuidados a idosos que vivem em suas residências. É importante que os enfermeiros avaliem a qualidade de vida de seus pacientes idosos e implementem intervenções para melhoria da qualidade de vida.

Uma limitação do estudo foi o baixo número de centros participantes. Embora não tenha representado todos os centros do departamento, a amostra obtida foi representativa das características sociodemográficas. Houve ainda perdas ocorridas nas respostas às perguntas subjetivas da pesquisa, pois os participantes com déficit cognitivo não puderam respondê-las.

Conclusão

A maioria dos idosos de Castellón residentes na comunidade apresentou boa qualidade de vida. A qualidade de vida dos idosos foi influenciada pela presença de sintomas de depressão, estado nutricional, sexo, fragilidade e incapacidade básica e instrumental. Fragilidade, incapacidade básica e instrumental e sexo aumentaram a probabilidade de baixa qualidade de vida no componente físico. Estado nutricional, comorbidade, sintomas de depressão e sexo aumentaram a probabilidade de baixa qualidade de vida no componente mental.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2018
  • Aceito
    10 Set 2018
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