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Telenfermagem na COVID-19 e saúde materna: WhatsApp® como ferramenta de apoio

Teleenfermería durante la COVID-19 y salud materna: WhatsApp® como herramienta de apoyo

Resumo

Objetivo:

Descrever o processo de criação do Fale com a Parteira Recife – PE como um serviço de telenfermagem utilizando o WhatsApp® como ferramenta de apoio para promoção da saúde materna na pandemia da COVID-19.

Método:

Estudo tipo relato de experiência. A criação do “Fale com a Parteira Recife – PE” seguiu as recomendações do Instituto de Medicina e Comitê de Qualidade da Assistência à Saúde da América em relação a prestação de cuidados a saúde. Trabalho remoto e virtual com construção de um layout para WhatsApp® e um termo de consentimento livre e informado para autorizar a teleorientação. Os dados eram armazenados em registros eletrônicos. Os critérios de seleção para compor a equipe de enfermeiras obstétricas foram estar disponível e atuar voluntariamente, residir na região metropolitana de Recife-PE e ter experiência na enfermagem obstétrica. As atividades iniciaram em 19 de março de 2020.

Resultados:

No total, 56 enfermeiras obstétricas atuaram nas teleorientações. Em três meses, 2.300 usuárias receberam teleorientações com tempo médio de 20 minutos, 43% estavam no terceiro trimestre de gestação, 21% no segundo e 13% no primeiro trimestre, 7% eram puérperas. Para apoiar as teleorientações foram construidas mensagens instantaneas de acordo com as necessidades das gestantes e puerperas e um protocolo sobre assistência obstétrica e COVID-19. O projeto foi replicado para 10 cidades do Brasil.

Conclusão:

A criação do “Fale com a Parteira Recife – PE” possibilitou oferecer um serviço de telenfermagem com acolhimento e segurança para promoção da saúde materna em tempos de pandemia da COVID-19.

Descritores
COVID-19; Enfermagem obstétrica; Infecções por coronavirus; Saúde materna; Tecnologia da informação; Telenfermagem

Resumen

Objetivo:

Describir el proceso de creación de “Fale com a Parteira Recife – PE” (Habla con la Partera Recife – PE) como un servicio de teleenfermería utilizando el WhatsApp® como herramienta de apoyo para la promoción de la salud materna durante la pandemia de COVID-19.

Método:

Estudio tipo relato de experiencia. La creación de “Fale com a Parteira Recife – PE” siguió las recomendaciones del Instituto de Medicina y Comité de Calidad de la Atención a la Salud de América con relación a la prestación de cuidados a la salud. Trabajo remoto y virtual, con construcción de un diseño para WhatsApp® y un término de consentimiento libre e informado para autorizar las telerecomendaciones. Los datos fueron almacenados en registros electrónicos. Los criterios de selección para formar parte del equipo de enfermeras obstétricas fueron: estar disponible y participar voluntariamente, residir en la región metropolitana de Recife, estado de Pernambuco y tener experiencia en enfermería obstétrica. Las actividades comenzaron el 19 de marzo de 2020.

Resultados:

En total, 56 enfermeras obstétricas participaron en las telerecomendaciones. En tres meses, 2300 usuarias recibieron telerecomendaciones de un tiempo promedio de 20 minutos, el 43 % estaba en el tercer trimestre de gestación, el 21 % en el segundo y el 13 % en el primer trimestre, el 7 % eran puérperas. Para respaldar las telerecomendaciones, se elaboraron mensajes instantáneos de acuerdo con las necesidades de las mujeres embarazadas y puérperas y un protocolo sobre atención obstétrica y COVID-19. El proyecto fue replicado en diez ciudades de Brasil.

Conclusión:

La creación de “Fale com a Parteira Recife – PE” permitió ofrecer un servicio de teleenfermería de acogida y seguridad para la promoción de la salud materna en tiempos de pandemia de COVID-19.

Descriptores
Covid-19; Infecciones por coronavirus; Salud materna; Tecnología de la información; Teleenfermería

Abstract

Objective:

To describe the process of creating “Talk to the Midwife Recife - PE” as a telenursing service using WhatsApp®as a support tool to promote maternal health in the COVID-19 pandemic.

Method:

This is an experience report type study. The creation of “Talk to the Midwife Recife - PE” followed the recommendations of the Institute of Medicine and the Health Care Quality Committee of America in relation to the provision of health care. Remote and virtual work with construction of a layout for WhatsApp®and an Informed Consent Form were used to authorize teleguidance. The data was stored in electronic records. The selection criteria to compose the team of nurse-midwives were being available and acting voluntarily, living in the metropolitan region of Recife-PE and having experience in nursing-midwifery. Activities began on March 19, 2020.

Results:

In total, 56 nurse-midwives worked in teleguidance. In three months, 2,300 users received teleguidance with an average time of 20 minutes, 43% were in the third trimester of pregnancy, 21% in the second and 13% in the first trimester, 7% were mothers. In order to support teleguidance, instant messages were built according to pregnant women’s and puerperal women’s needs and a protocol on obstetric care and COVID-19. The project was replicated to 10 cities in Brazil.

Conclusion:

The creation of “Talk to the Midwife Recife - PE” made it possible to offer a telenursing service with welcome and security to promote maternal health in times of COVID-19 pandemic.

Keywords
Covid-19; Coronavirus infections; Information technology; Maternal health; Obstetric nursing; Telenursing

Introdução

A COVID–19 é uma infeção causada pelo coronavírus identificado como SARS-CoV-2, observado pela primeira vez em dezembro de 2019 na Província de Hubei na China. Entre 31 de dezembro de 2019 e 3 de janeiro 2020 foram identificados 44 casos. No dia 11 de março de 2020 foi decretada a pandemia da COVID-19 pela Organização Mundial da Saúde. Diante desde novo cenário, surgiram várias incertezas sobre a COVID-19 na gravidez. Medidas de controle da infecção para gestantes foram recomendadas, como a testagem universal, a avaliação da febre, os sinais de infecção respiratória e a triagem via telefone.(11. Rasmussen SA, Smulian JC, Lednicky JA, Wen TS, Jamieson DJ. Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) and pregnancy: what obstetricians need to know. Am J Obstet Gynecol. 2020;222(5):415-26. Review.)

Estudos indicam que gestantes em qualquer idade gestacional e no pós-parto, apresentam condições favoráveis para complicações da COVID-19, possivelmente em função da imunodeficiência relativa associada as adaptações fisiológicas e respostas orgânicas às infecções virais nesse período.(22. Westgren M, Petersson K, Hagberg H, Acharya G. Severe maternal morbidity and mortality associated with COVID-19: the risk should be downplayed [editorial]. Acta Obstet Gynrcol Scand. 2020;99:815-6.) No Brasil, verificou-se elevada taxa de mortalidade materna pela COVID-19 entre 26 de fevereiro a 18 de junho de 2020, foram registrados 978 casos positivos resultando em 124 mortes, destas, 9,8% em gestantes e 22,3% pós-parto.(33. Takemoto ML, Menezes MO, Andreucci CB, Nakamura-Pereira M, Amorim MM, Katz L, Knobel R. The tragedy of COVID-19 in Brazil: 124 maternal deaths and counting. Int J Gynaecol Obstet. 2020;151(1):154-6.)

Os riscos não devem ser subjugados e as gestantes precisam ser aconselhadas a prevenir a infecção na gravidez.(22. Westgren M, Petersson K, Hagberg H, Acharya G. Severe maternal morbidity and mortality associated with COVID-19: the risk should be downplayed [editorial]. Acta Obstet Gynrcol Scand. 2020;99:815-6.) O distanciamento social e o contato remoto para avaliações obstétricas e identificação de sinais da COVID -19 foram recomendados por estudiosos e órgãos de saúde internacionais, como medidas de proteção, evitando o deslocamento desnecessário durante a gestação e puerpério até as unidades de saúde em época de pandemia.(11. Rasmussen SA, Smulian JC, Lednicky JA, Wen TS, Jamieson DJ. Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) and pregnancy: what obstetricians need to know. Am J Obstet Gynecol. 2020;222(5):415-26. Review.,44. Royal College of Obstetricians & Gynaecologists. Coronavirus (COVID-19) infection in pregnancy.Information for Healthcare Professionals. Version II. 2020 July 24 [cited 2021 Feb 21]. Available from: https://www.rcog.org.uk/globalassets/documents/guidelines/2020-07-24-coronavirus-covid-19-infection-in-pregnancy.pdf
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Os desafios impostos diante da complexidade da pandemia, reafirmam a necessidade que todas as mulheres têm o direito de receber atenção qualificada e que seja garantida a integralidade e humanização do cuidado. Enfermeiras obstétricas e demais profissionais de saúde devem reconhecer o impacto da pandemia na saúde das mulheres e contribuir na garantia do atendimento de suas necessidades.(55. Souza KV, Schneck S, Pena ED, Duarte ED, Alves VH. Direitos humanos das mulheres no parto frente à pandemia de COVID-19: o que fazer da enfermagem obstétrica. Cogitare Enferm. 2020;25:e73148.)

O uso das tecnologias vem sendo eficaz no aumento da abrangência da atenção à saúde com ações de gestão, assistência, ensino e pesquisa, sendo recomendada para expandir a oferta de serviços ligados aos cuidados com a saúde. Em sentido amplo, a telemedicina tem sido vista como ferramenta importante para enfrentar os desafios contemporâneos dos sistemas de saúde.(66. Maldonado JM, Marques AB, Cruz A. Telemedicine: challenges to dissemination in Brazil. Cad Saúde Pública. 2016;32(Suppl 2):e00155615.)

A International Council of Nurses aborda a telemedicina em enfermagem usando o termo telenfermagem, apontando bons resultados no acompanhamento e comunicação entre enfermeiro – paciente, considerando suas as necessidades e expectativas. Recomenda-se o uso de tecnologias de melhor adaptação a vida diária dos pacientes e a prática da telenfermagem por meio de ferramentas como o e mail e mensagem de texto e áudio.(77. Johnson B, Quinlan MM, Marsh JS. Telenursing and nurse-patient communication within fertility, Inc. J Holistic Nurs. 2017;36(1):38-53.) A enfermagem é responsável no desenvolvimento de competências no uso de tecnologias e na garantia da prestação segura, eficaz e competente dos cuidados de saúde com abordagens em equipe e centrada na família e no paciente.(88. American Nurses Association (ANA). ANA Core Principles on connected health. United States: ANA; 2019 [cited 2021 Feb 20]. Available from: https://www.nursingworld.org/~4a9307/globalassets/docs/ana/practice/ana-core-principles-on-connected-health.pdf. English.
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Analisando estudos sobre tecnologias digitais, evidenciou-se a eficácia e o potencial do uso do WhatsApp® em diferentes clínicas e contextos.(99. Lima IC, Galvão MT, Pedrosa SC, Cunha GH, Costa AK. Use of the Whatsapp application in health follow-up of people with HIV: a thematic analysis. Esc Anna Nery. 2018;22(3):e20170429.1111. Giordano V, Koch H, Godoy-Santos A, Belangero WD, Pires RE, Labronici P. WhatsApp messenger as an adjunctive tool for telemedicine: an overview. Interact J Med Res. 2017;6(2):e11.) O acompanhamento no cuidado de pessoas com HIV promoveu o acesso ao profissional de saúde fornecendo uma via de comunicação aberta e imediata para superar dificuldades.(99. Lima IC, Galvão MT, Pedrosa SC, Cunha GH, Costa AK. Use of the Whatsapp application in health follow-up of people with HIV: a thematic analysis. Esc Anna Nery. 2018;22(3):e20170429.) No apoio ao aleitamento materno com ações de educação em saúde, colaborou na autonomia e responsabilização dos sujeitos em relação ao autocuidado.(1010. Nóbrega VC, Melo RH, Diniz AL, Vilar RL. Social support networks for Breastfeeding: an action-research. Saúde Debate. 2019;43(121):429-40.) Resultados de revisão sistemática indicam que o WhatsApp® é uma ferramenta de comunicação eficaz da telemedicina e reforçam a necessidade de elaborar estudos com melhores descrições metodológicas e processo de execução. Os autores consideram que as evidências são convincentes para que o aplicativo seja um recurso para o cuidado a saúde a ser utilizado entre os profissionais e usuários.(1111. Giordano V, Koch H, Godoy-Santos A, Belangero WD, Pires RE, Labronici P. WhatsApp messenger as an adjunctive tool for telemedicine: an overview. Interact J Med Res. 2017;6(2):e11.)

Considerando as evidências sobre o uso do WhatsApp® como ferramenta de assistência em diversos cenários, o objetivo do estudo é descrever o processo de criação do “Fale com a Parteira Recife – PE” um serviço de telenfermagem utilizando o WhatsApp® como ferramenta de apoio para promoção da saúde materna na pandemia da COVID-19.

Métodos

Estudo tipo relato de experiência sobre o processo de criação do “Fale com a Parteira Recife – PE”. A trajetória teve início em 19 de março de 2020 quando um grupo de enfermeiras obstétricas se reuniram remotamente para pensar numa estratégia de cuidado as gestantes e puérperas na pandemia da COVID-19. Com o isolamento social imposto a população pelo governo local, despontou-se a iniciativa de um serviço de telenfermagem por WhatsApp®, na modalidade de teleorientações, de forma gratuita, sobre gravidez, parto, puerpério e a COVID-19.

No primeiro momento da criação foram consideradas as recomendações do Instituto de Medicina e Comitê de Qualidade da Assistência à Saúde da América em relação a prestação de cuidados a saúde quanto ao papel central da tecnologia no redesenho do sistema de saúde para alcançar melhores resultados. Seis estratégias fazem parte das recomendações:1) eficácia: garantir que os cuidados sejam baseados em evidências com eficácia comprovada. 2) eficiência: minimizar o desperdício de recurso. 3) segurança: prevenção de danos no cuidado a saúde. 4) oportuno: evitar atrasos nos cuidados. 5) centrado no paciente: atendimento as necessidades. 6) equitativo: Nenhuma variação na qualidade do atendimento.(1212. Fathi JT, Modin HE, Scott JD. Nurses advancing telehealth services in the era of healthcare reform. Online J Issues Nurs. 2017;22(2):10.)

Em seguida, foi desenvolvido um layout para o WhatsApp® e Instagram®. Na biografia do Instagram® fixou-se um link que direcionava para o atendimento no grupo do Whatsapp®. No perfil do Instagram® foram construídos e publicados “posts” sobre gestação, parto, puerpério e COVID- 19. As publicações eram baseadas nas recomendações cientificas nacionais e internacionais. Divulgações na mídia local foram realizadas, a partir dos programas de rádio, televisão e jornais da cidade, no intuito que mais gestantes e puerperas tivessem acesso ao “Fale com a Parteria Recife – PE”.

No segundo momento houve a composição da equipe de teleorientação, a partir do contato telefônico com enfermerias obstetricas com disponibilidades para atuar voluntariamente, residir em Recife/PE e/ou região metropolitana e experiência na enfermagem obstétrica. Todas foram treinadas remotamente para as teleorientações. Uma escala de 24 horas foi planejada de acordo com a disponibilidade de cada profissional.

Para apoiar as teleorientações foi elaborado um protocolo de assistência obstétrica e COVID-19, pautado nas principais evidências científicas, diretrizes do Ministério da Saúde, Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia e Royal College of Obstetricians and Gynaecologists.

No terceiro momento foi organizado um fluxo de teleatendimento, a partir do acesso do link do Whastapp®, oreintando quem desejava atendimento a deixar mensagem “preciso de ajuda”. A enfermeira obstétrica captava o numero de telefone e no contato privado enviava uma mensagem de acolhimento e solicitava a leitura e preenchimento de Termo de Consentimento Livre e Informado. Após o consentimento, outra mensagem era enviada, desta vez, solicitando informações para subsidiar a teleorientação: se gestante ou puérpera, idade gestacional ou tempo de puerpério, classificação sabida do pré-natal de baixo ou alto risco, cidade que residia e sua dúvida.

Para o registro do teleatendimento foi disponibilizado um roteiro digital com o nome da mulher, idade, telefone, data, hora do início e término da teleorientação, situação obstétrica, idade gestacional referida, presença da consulta pré-natal, motivo da teleorientação, orientações realizadas com nome e coren responsável pelo teleatendimento. O termo de Consentimento Livre e Informado era anexado no roteiro digital. A responsabilidade do armazenamento das informações era da equipe responsavel pelo projeto.

No decorrer das teleorientações a equipe percebeu a necessidade de ampliar estratégias para suporte a comunicação. A partir das dúvidas mais frequentes foram construidas mensagens instantaneas de acordo com as boas praticas obstetricas, escritas de maneira clara, linguagem simples e ilustrações com emojis. Os conteudos das mensagens foram avaliados por enfermerias obstetricas do “Fale com a Parteria Recife – PE” até a sua versão final.

Durante a trajetoria do “Fale com a Parteria Recife – PE” e ampliação dos servicos de teleatendimento houve a necessidade de repensar estrategias para garantir a seguranca e a qualidade do cuidado. Assim, a equipe de enfemeiras obstetricas compartilhava, em um grupo virtual, as duvidas e tomadas de decisões. As autoras desse artigo foram também voluntarias do projeto e imprimem a experiencia de um trabalho coletivo com contribuições para a promoção da saúde materna em tempos de pandemia da COVID-19.

A pesquisa foi submetida ao CONEP, segundo resolução 466/12 e 510/16 do Conselho Nacional de Pesquisa e aprovada em 27 de maio de 2020 com parecer consubstanciado n° 30713420.4.0000.5208. Para a coleta de informações desse estudo considerou-se o periodo de 21/03/2020 a 18/06/2020.

Resultados

Durante a implementação do “Fale com a Parteira Recife – PE”, 56 enfermeiras obstétricas contribuíram nos teleatendimentos. A maioria tinha três meses no projeto (78,9%) e idade entre 20 a 30 anos. O tempo de formação na obstetrícia foi de um a 10 anos (68,5%) e 78,9% trabalhavam em instituições do Sistema Único de Saúde. Com relação as gestantes a idade variou de 19 a 29 anos, 43% encontavam-se no terceiro trimestre de gestação, 21% no segundo trimestre, 13% no primeiro trimestre, 7% eram puérperas e 15% informações ignoradas ou não sabiam informar. No período de três meses, 2.300 usuárias acessaram o teleantendimento uma ou mais vezes, a maioria dos acessos era no período diurno.

A figura 1 mostra o layout de criação do nome do grupo. À esquerda a ilustração do perfil do grupo de Whatsapp® e à direita da rede social Instagram®.

Figura 1
Layout de criação do Fale com a Parteira

Para dar suporte logistico, 21 acadêmicas do curso de enfermagem e seis enfermeiras obstétricas ficavam responsáveis pela moderação do grupo de WhatsApp® com envio de mensagens sobre o objetivo do teleatendimento e controle de entrada e saída das pessoas que acessavam o “Fale com a Parteira Recife - PE” ( Figura 2 ).

Figura 2
Teleantendentimento com abordagem da equipe de moderação e da enfermeira obstétrica

Durante as teleorientações, imagens do cartão de pré-natal e resultados de exames eram solicitadas para direcionar a orientação. No término, uma mensagem de encerramento era enviada pela enfermeria obstetrica responsavel pela teleorientação. Caso surgissem outras dúvidas, deveria ser feito novo acesso pelo link do Whatsapp® ( Figura 3 ).

Figura 3
Teleorientação com foto do cartão de pré-natal (esquerda) e mensagem de encerramento (direita)

O tempo médio das teleorientações era de 20 minutos, com uso de mensagem de texto e/ ou voz. 95% das chamadas não eram urgentes. As principais dúvidas eram sobre enjoos e vômitos, contrações uterinas, tempo de gestação, trabalho de parto, tampão mucoso, movimentação fetal, pressão alta, presença do acompanhante devido a pandemia, dúvidas trabalhistas, corrimento vaginal, rompimento da bolsa das águas, medo da pandemia, sinais e sintomas da COVID-19.

No primeiro mês de criação do “Fale com a Parteria Recife-PE” chamou atenção das enfermerias obstétricas o relato de várias mulheres sobre a falta de acesso e/ou descontinuidade das consultas pré-natais por causa da pandemia da COVID-19, fossem no SUS ou no serviço privado. Fato evidenciado nos trechos a seguir: “Eu estou super preocupada por que tenho o VDRL e o pré-natal parou e a médica não pode ver meus exames nem a minha primeira ultrassonografia. O que faço? “Eu não estou com plano de saúde e no posto a agente de saúde ainda não apareceu por causa da pandemia”. “Estou com 11 semanas e consulta foi desmarcada por causa do vírus”. “Minha cidade não tem médico atendendo, nem particular e estou grávida do meu segundo filho, sentindo dor na barriga e um ‘escorrimento’ amarelo”. “Estou 37 semanas e sem atendimentos nos postos daqui e queria saber se é preciso fazer ultrassom”.

Diante dos relatos foi elaborado um dossiê e entregue às Secretaria de saúde do estado de PE com o objetivo de alertar os gestores sobre a falta ou descontinuidade do pré-natal e o impacto na saúde das gestantes. Além disso, foi criado um trabalho em rede com o conselho Regional e Federal de Enfermagem, Universidades Públicas, Sociedade Cível Organizada, Comitê de Mortalidade Materna, Secretarias de Saúde Estadual e Municipal. Contudo, foi feita uma articulação com profissionais da psicologia e odontologia, caso as gestantes e puérperas apresentassem tais demandas

Durante as teleorientações as gestantes e puérperas enviavam mensagens expressando o sentimento de satisfação pelo cuidado recebido, vejamos alguns relatos: “Foi perfeita, pois foi minha primeira gestação então tinha muitas dúvidas”. “Amei, muito bem atendida por duas vezes, excelencia em profissionalismo”. “Foi otima, mesmo sendo a minha segunda gestação tinha duvidas e voces me ajudaram bastante”. “Gostei muito, as duas vezes que fui orientada as pessoas que me atenderam foram bem atenciosas”. “Ajudou já que eu estava no começo da gravidez e sem começar o pré natal”. “Resposta e orientação com rapido retorno e embasamento cintifico. Super competentes”. “Otimo me ajudou em tudo desde a gestação a hora do parto”. “Excelente e muito importante para mim. Até depois que tive minha bebe voces me auxiliarem quando surgiu duvidas”.

O projeto foi encaminhado ao Conselho Federal de Enfermagem, que destacou a relevância social. Na trajetoria de ampliação, o “Fale com a Parteira” foi replicado para Salvador/BA, Feira de Santana/BA e Itabuna/BA; João Pessoa/PB e Campina Grande/PB; Maceió/AL; Manaus/AM; Curitiba/PR; Dourados/MS e Caruaru/PE. Totalizando mais de 2.360 teleatendimentos nessas localidades.

Discussão

O “Fale com a Parteira Recife - PE” utilizou o WhatsApp® como tecnologia de informação e comunicação para gestantes e puérperas durante a pandemia da COVID-19. O WhatsApp® é reconhecido por autores como ferramenta de possibilidades para interação mútua, criativa e aberta. Em estudo que analisou 259 usuários, verificou que 177 faziam uso do WhatsApp®, onde 112 eram mulheres e 87% afirmaram que a mídia social é uma forma de interação.(1313. Souza JL, Araújo DC, Paula DA. Mídia social WhatsApp: uma análise sobre as interações sociais. Rev Alterjor. 2015;1(11):131-65.) No Sul dos Estados Unidos 83% das mulheres grávidas estavam dispostas a participar de intervenções perinatais com suporte da internet via computador. Os autores concluem que desenvolvimento de abordagens baseadas em computador ou telefone celular para o fornecimento de informações clínicas e intervenções educativas podem contribuir para implicações positivas no cuidado pré-natal.(1414. Urrutia RP, Berger AA, Ivins AA, Beckham J, Thorp Jr JM, Nicholson WK. Internet use and access among pregnant women via computer and mobile phone: implications for delivery of perinatal care. JMIR Mhealth Uhealth. 2015;3(1):e25.)

A criação de um serviço de telenfermagem com apoio WhatsApp® em tempos de pandemia, possibilitou promover a saúde de uma população vulnerável às complicações da COVID -19. A partir do acesso remoto foi possível, no período de três meses, realizar de 2.300 teleatendimentos para gestantes e puérperas. O tempo médio era de 20 minutos de duração e 95% das chamadas não eram urgentes. Estudo conduzindo por médicos em Bangladesh, no Sul da Ásia, sobre saúde materna, neonatal e infantil por meio de consultas por telefone móvel identificou que 53% eram grávidas que solicitavam aconselhamento sobre vários aspectos da gravidez, parto e pós-parto, 96% das chamadas não eram urgentes. Os autores relatam a satisfação das mulheres e seus companheiros com o atendimento remoto.(1515. Alam M, Banwell C, Olsem A, Lokuge K. Patients’ and doctors’ perceptions of a mobile phone-based consultation service for maternal, neonatal, and infant health care in bangladesh: a mixed-methods study. JMIR Mhealth Uhealth. 2019;7(4):e11842.)

Nesse estudo, o uso de mensagens instantaneas construídas a partir das principais dúvidas que surgiram no teleatendimento facilitou a comunicação durante as teleorientações. Autores consideram que mensagens telefônicas claras e objetivas são relevantes para promoção da saúde e quando validadas podem ser replicadas em outras pesquisas.(1616. Lima IV, Galvão MT, Pedrosa SC, Silva CA, Pereira ML. Validation of phone messages to promote health in people with HIV. Acta Paul Enferm. 2017;30(3):227-32.)

A criação do “Fale com a Parteira Recife – PE” com a ideia inicial de melhorar a vivência de gestantes e puérperas em tempos de pandemia da COVID -19 teve na atuação de enfermeiras obstétricas o cuidado humanizado e baseado em evidências cientificas. A iniciativa do projeto recebeu a chancela da Comissão Nacional da Saúde da Mulher reconhecendo como boa prática para maior segurança às mulheres na pandemia.(1717. Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). Enfermeiras voluntárias esclarecem dúvidas de gestantes na pandemia [Internet]. Brasília (DF): COFEN; 2020 [citado 2021 Fev 20]. Disponível em: http://www.cofen.gov.br/enfermeiras-voluntarias-esclarecem-duvidas-de-gestantes-na-pandemia_78464.html
http://www.cofen.gov.br/enfermeiras-volu...
)

A estratégia do uso de WhatsApp® pode estender-se às equipes de saúde, comunidades, discentes e professores, promovendo a integração ensino-serviço-comunidade, ampliando as possibilidades de empoderamento, corresponsabilização e autonomia para um cuidado em saúde integral, equânime e acessível. Como pontos positivos, os autores destacam o dinamismo, a facilidade de interação, a fluidez do diálogo e a adesão das pessoas envolvidas.(1818. Paulino DB, Martins CC, Raimondi GA, Hattori WT. WhatsApp®como Recurso para a Educação em Saúde: Contextualizando Teoria e Prática em um Novo Cenário de Ensino-Aprendizagem. Rev Bras Educ Med. 2018;42(1):169-78.)

Na Índia, neurocirurgiões utilizaram a ferramenta para discussões, envio de imagens e encaminhamento de pacientes com consentimento verbal informado. Os autores destacam como vantagens do WhatsApp® a comunicação rápida, opiniões em tempo real e a equipe não precisa estar no hospital para dar as informações. A desvantagem estaria na disponibilidade constante de conexão com a internet.(1919. Joshi SS, Murali-Krishnan S, Patankar P, Choudhari KA. Neurosurgical referral service using smartphone client WhatsApp: preliminary study at a tertiary referral neurosurgical unit. Br J Neurosurg. 2018;32(5):553-7.) Cirurgiões bucomaxilofacial nos Estados Unidos, reafirmam que o uso do WhatsApp® melhora a comunicação, 1.747 mensagens foram acessadas e 64,4% dos casos foram resolvidos apenas pelo aplicativo.(2020. Koparal M, Ünsal HY, Alan H, Üçkardeş F, Gülsün B. WhatsApp messaging improves communication in an oral and maxillofacial surgery team. Int J Med Inform. 2019;132:103987.) Em Israel uma equipe de 88 médicos neonatologias e pediatras utilizaram o aplicativo para melhorar a experiência profissional e reforçam a importância de diretrizes éticas e dos direitos do paciente para uso em ambientes clínicos.(2121. Gross I, Langer Y, Pasternak Y, Abu Ahmad W, Eventov-Friedman S, Koplewitz BZ. Questionnaire-based study showed that neonatal chest radiographs could be reliably interpreted using the WhatsApp messaging application. Acta Paediatr. 2019;108(1):94-100.)

O ponto forte da criação do “Fale com a Parteira Recife – PE” foi a utilização das recomendações de um referencial teórico.(1212. Fathi JT, Modin HE, Scott JD. Nurses advancing telehealth services in the era of healthcare reform. Online J Issues Nurs. 2017;22(2):10.) No sentido da eficácia: garantiu que as teleorientações fossem baseados em evidências cientificas e protocolos nacionais e internacionais; da segurança: quando visou a prevenção de danos à saúde materna a partir de teleorientações para promoção do autocuidado; do serviço oportuno: quando buscou evitar atrasos nos cuidados articulando com a rede de atenção obstétrica, reforçando o encaminhamento da mulher para o serviço de saúde de sua região e buscando o apoio dos serviços de psicologia e odontologia e centrado no paciente: fornecendo teleorientações segundo as necessidades das gestantes e puérperas. Contudo, estudos futuros com uso do WhatsApp® como ferramenta de apoio na promoção da saúde de gestantes e puérperas poderão suscitar em novas adaptações.

Conclusão

O “Fale com a Parteira Recife-PE” foi criado segundo as recomendações internacionais para prestação de cuidados e o uso da tecnologia da informação. Esforços foram desenvolvidos para melhorar a implementação e tomada de decisão; como o treinamento de enfermeiras obstétricas, a construção de protocolo, a criação de mensagens instantâneas para o suporte a comunicação, layout para as redes sociais, fluxo de teleorientações, roteiro digital e termo de consentimento livre e informado. O serviço trouxe contribuições na força de trabalho da enfermagem obstétrica com vistas a segurança da saúde materna, superando barreiras geográficas. Pode-se considerar uma janela de oportunidades na prática avançada da promoção da saúde com o uso de uma estratégia tecnológica utilizada para oferecer suporte, acompanhamento e acolhimento com segurança as gestantes e puérperas em tempos de pandemia da COVID-19. Recomenda-se outros tipos de estudos para avaliar os efeitos de intervenções com o uso do WhatsApp® na obstetrícia.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    02 Out 2020
  • Aceito
    08 Mar 2021
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