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Usando Tecnologia da Informação e Mobilização Social para Combater Doenças

Assim como o Ebola, a Síndrome Respiratória do Oriente Médio, o enterovírus D68 e outras epidemias ameaçam a saúde das nações, as tecnologias de informação e comunicação (TIC) combinadas com intervenções de mobilização social estão se tornando armas na guerra contra a doença. Nos países onde os profissionais da saúde são escassos, mas a telefonia celular é abundante, é possível “passar a mensagem adiante” para o público em geral através de TIC, mHealth e rede social. A expressão “difusão viral”, um termo geralmente usado para descrever um conteúdo da internet, que se espalhou rápida e amplamente, agora pode e deve ser aplicado à batalha contra as doenças transmissíveis e não-transmissíveis. Além da utilização das TIC para situações de emergência, tecnologias de informação na área da saúde são vitais para o monitoramento, vigilância de doenças e gestão da cadeia de abastecimento, aspectos que também são importantes para a saúde global. Cuidadores de linha de frente e os pacientes que eles atendem podem ter mais a ganhar com a adaptação e adoção das técnicas de TIC na prática.

Na falta de serviços de saúde formalizados, as TIC (particularmente, usando abordagens sanitárias volantes com telefones celulares & mídias sociais ou mHealth) podem ser usadas para mobilizar os habitantes para ajudar a prevenir a disseminação, cuidar dos doentes, e ter uma compreensão mais profunda da própria doença. No exemplo de áreas com baixos recursos como a Libéria, Serra Leoa e Guiné, a ferramenta mais poderosa para retardar a disseminação de doenças pode ser este tipo de intervenção baseada em TIC, juntamente com a mobilização social das comunidades. Quando se considera que a população da Libéria, com mais de 4 milhões de pessoas, é atendida por menos de 200 médicos, é óbvio que lá as abordagens ocidentais baseadas em cuidados intensivos para controlar a propagação de doenças são insustentáveis. O uso de intervenções de TIC mostrou ser uma ferramenta vital na luta contra doenças infecciosas, particularmente em áreas onde uma intervenção rápida pode significar a diferença entre a contenção e a disseminação, a vida e a morte.

A combinação da ação comunitária com as TIC, particularmente o uso do telefone celular, é uma ferramenta primordial usada principalmente para retardar a disseminação do Ebola na Libéria e Serra Leoa. Nestes dois países, o acesso à Internet para a população geral é inferior a 1.7%. Em Serra Leoa, a guerra civil resultou na devastação do sistema educacional, com um nível de analfabetismo em torno de 50%. No entanto, nos dois países mais de 65% da população possui e usa telefone celular, dependendo muito de rádio para ter informações. Nessas nações do Oeste Africano, após esforços organizados, as pessoas logo começaram a usar essas “avenidas” para disseminar informação vital de prevenção, mobilizar grupos comunitários, e criar um método rudimentar para a comunicação telefônica de casos suspeitos. Aqui, a lição importante é que as soluções com uso de TIC não devem ser pensadas ou concebidas como sendo de tecnologia extremamente elevada ou intervenções dispendiosas. Em vez disso, o oposto pode ser verdade. É fundamental adequar o mecanismo de entrega de TIC ao contexto e à capacidade de uso. Material escrito sobre controle de infecção é inútil nas mãos de analfabetos.

O uso das TIC na saúde tem muitas facetas, desde as metodologias altamente complexas e avançadas, usados para produzir uma “medicina personalizada”, até transmissões de rádio de baixa tecnologia. Ao discutir a medicina personalizada, análises avançadas e metodologias estatísticas complexas estão sendo aplicadas a grandes coleções de dados genômicos, operacionais, populacionais e de mídia social, onde os desafios de tamanho e qualidade dos dados são consideráveis. Entretanto, novas abordagens interessantes estão compensando alguns dos desafios inerentes a grande quantidade de dados. O GOOGLE Tendências da Gripe é um exemplo frequentemente usado, em que as compras dos medicamentos sem prescrição nos bancos de dados de farmácias estão sendo adicionados a registros de atendimentos de emergência, relatórios de faltas em escolas locais, e contagem do número de buscas na internet sobre um tema de saúde específico são combinadas e analisadas quanto aos padrões. Embora esses tipos de análises não sejam conclusivos, as tendências que surgem são frequentemente muito próximas da realidade. Por exemplo, aumento nas vendas de loperamida (Immodium) em farmácias locais, um pico no número de buscas sobre doenças diarreicas na internet, e aumentos significativos no absentismo escolar podem indicar um surto de gastroenterite. Um exemplo aparentemente simples, mas como já foi mostrado no Google Tendências da Gripe, usando esses tipos de abordagem como mecanismo de vigilância das doenças pode superar esforços de vigilância maiores, como aqueles do Centro de Controle de Doenças (CDC).

Um outro exemplo de como a mídia social pode ser usada para identificar focos e controlar doenças é a ferramenta HealthMap (http://www.healthmap.org) que usa fontes online informais como sites do governo, redes sociais e informes da imprensa local para mapear potenciais surtos de doenças e monitorar as tendências de saúde pública. Este software foi capaz de detectar o surto de Ebola nove dias antes do seu anúncio pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Modelagem epidemiológica, usada recentemente na África Ocidental para o Ebola, depende do acesso a vários dados e de sua manipulação, e muitos deles estão relacionados com o comportamento humano, técnicas de sepultamento e resposta da comunidade, em vez de resultados de laboratório e dados de estabelecimentos de saúde. Estes exemplos indicam o valor de dados que surgem da vida quotidiana, que por sua vez nos encorajam tanto a pensar mais profundamente sobre as variáveis da saúde da comunidade a direcionar as nossas intervenções para abordá-las. Por exemplo, na Libéria, onde os rituais de sepultamento incluem a “imposição das mãos”, uma grande intervenção foi direcionada para encontrar outras práticas para enterros dignos e culturalmente apropriados, pois o corpo de um doente de Ebola é mais infeccioso por várias horas após a morte. Estudos de modelagem epidemiológica indicaram que as práticas de sepultamento foram um grande impulsionador na disseminação do Ebola. O uso de mensagens de rádio e texto para divulgar informações para as famílias não enterrarem seus próprios familiares resultou na formação de grupos de trabalho de alcance comunitário para educar os habitantes e lidar com os cuidados pós-morte. Novamente, as TIC serviram como ferramenta importante na batalha contra o Ebola.

Sistemas de informação geográfica (SIG), que são usados para capturar, armazenar, manipular e apresentar informações geográficas, também desempenham um papel importante na vigilância de doenças. GIS tem a capacidade de manipular dados espaciais (como os mapas) e relacioná-los com dados de interesse que existem em outros bancos de dados. Esta funcionalidade faz com que seja possível rastrear surtos e fontes e identificar áreas onde os recursos podem ser encontrados (ou são necessários). Estes exemplos do uso de GIS na resposta do Ebola ilustram a sua utilidade. Os Médicos Sem Fronteiras estimularam uma equipe de GIS na Guiné e começaram a gerar e melhorar os mapas da região, os quais eram muito pobres e imprecisos antes deste esforço. Em parte, isso foi feito usando técnicas de “trabalho coletivo”, em que os habitantes locais se envolveram em desenhar e identificar mapas de suas vizinhanças em um esforço voluntário. Quando os mapas surgiram, eles foram reproduzidos com software de mapeamento formal, resultando em 109 novos mapas com grande detalhe e alta precisão. Estes mapas foram então usados para os esforços de localização e visualização. Os esforços de localização permitiram que funcionários de saúde pública identificassem a localização exata de aldeias e diferenciassem aldeias e cidades com grafia [e/ou] pronúncia semelhantes. Isto permitiu que as equipes de profissionais da saúde e funcionários da saúde pública reagissem mais rapidamente às notificações de suspeita do Ebola e distribuíssem recursos com mais eficácia e eficiência. A capacidade de visualizar relatos de surtos e a localização de equipes e suprimentos em um mapa digital ajudou funcionários a ver os padrões de disseminação de doenças, visualizar o número de novos casos, mortes e sobrevivências, e gerenciar melhor os suprimentos e recursos por localidade (http://bit.ly/1J3iJOI).

Definição, valor, propriedade e utilidade das TIC estão indo rapidamente para as mãos daqueles que mais precisam delas. As pessoas estão se tornando mais capacitadas pelo acesso à informação vital que pode salvar a vida de suas famílias e comunidades. Agora as próprias comunidades estão sendo capazes de assumir uma maior liderança de seus destinos pois a informação está fluindo para áreas que não tinham esse acesso no passado. Cuidadores de linha de frente podem usar as TIC para ter uma linha direta com as redes de referência, a educação continuada, e os seus pacientes. Provedores e autoridades de saúde pública podem usar as informações liberadas para melhor planejar e proporcionar respostas rápidas e específicas. É claro que TIC não é uma panaceia. É simplesmente uma ferramenta que pode ajudar de forma notável quando colocada nas mãos de quem cuida.

Patricia A. Abbott PhD, RN, FAAN &
Sayonara F.F. Barbosa, PhD, RN
School of Nursing, University of Michigan, Ann Arbor, MI, USA

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2015
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