Open-access Colonialidades e Disputas Cartográficas em Territórios Tradicionais no Litoral Sudeste-Sul do Brasil

Resumo

O campo da cartografia clássica tem sido mobilizado historicamente para produzir mapas que servem como mecanismo de controle e conquista de territórios. Contrapondo essa lógica, o movimento da cartografia crítica sugere a incorporação da diversidade de interpretações e visões de mundo nas representações de territórios. Este artigo discute os processos de elaboração cartográfica no âmbito da pesquisa acadêmica em contextos de territórios ocupados tradicionalmente no litoral do Paraná e São Paulo, sobrepostos por projetos de empreendimentos desenvolvimentistas e Unidades de Conservação. As cartografias enunciadas permitem problematizar sobreposições envolvendo territórios do povo indígena Guarani e de comunidades tradicionais da pesca artesanal, ao considerar a autocartografia desses grupos sociais para produzir contra-informação ao apagamento de subjetividades e territorialidades embutido nos instrumentos associados às políticas ambientais e de ordenamento territorial.

Palavras-chave:
Povos e comunidades tradicionais; cartografia crítica; decolonialidade; zona costeira; Unidades de Conservação; Guarani; grandes empreendimentos

Abstract

The field of classical cartography has historically been mobilised to produce maps that serve as mechanisms for controlling and conquering territories. In opposition to this logic, the critical cartography movement suggests incorporating a diversity of interpretations and worldviews into territory representations. This article discusses the processes of cartographic elaboration within the scope of academic research in the context of traditionally occupied territories on the coast of the Brazilian states of Paraná and São Paulo, which are overlapped by development projects and Conservation Units. These cartographies allow the problematisation of overlaps involving the territories of the Guarani Indigenous people and traditional artisanal fishing communities by considering the autocartography of these social groups to produce counter-information in the face of the erasure of subjectivities and territorialities embedded in the instruments associated with environmental and land-use planning policies.

Keywords:
Traditional peoples and communities; critical cartography; decoloniality; coastal zone; Conservation Units; Guarani; large enterprises

Resumen

El campo de la cartografía clásica se ha movilizado históricamente para producir mapas que sirvan como mecanismo para controlar y conquistar territorios. En oposición a esta lógica, el movimiento de la cartografía crítica sugiere la incorporación de la diversidad de interpretaciones y visiones del mundo en las representaciones de los territorios. Este artículo analiza procesos de elaboración cartográfica en el campo de la investigación académica en el contexto de territorios tradicionalmente ocupados en la costa de Paraná y São Paulo, superpuestos por proyectos de desarrollo y Unidades de Conservación. Las cartografías antes mencionadas permiten problematizar los solapamientos que involucran los territorios del pueblo indígena Guarani y las comunidades pesqueras artesanales tradicionales, al considerar la autocartografía de estos grupos sociales para producir contrainformación a la invisibilización de subjetividades y territorialidades incrustadas en instrumentos asociados con el medio ambiente y las políticas de planificación territorial.

Palabras-clave:
Pueblos y comunidades tradicionales; cartografía crítica; decolonialidad; zona costera; Unidades de conservación; Guarani; grandes emprendimientos

Introdução

A colonização da América Latina pelos europeus foi marcada pela violência e pela empreitada da escravidão. A exploração da mão de obra indígena e africana para trabalho escravo, o estupro de mulheres, e a exploração da natureza foram correntes de um mesmo projeto colonizador que objetivaram a morte simbólica e material dos povos originários. Apesar do fim do período colonial, intelectuais decoloniais e representações contra-colonizadoras afirmam que existe um continuum de colonialidades que se expressam na construção do ser, saber, poder, e na natureza. Nessas tratativas é que se assenta a formação de um sistema-mundo-moderno-colonial produtor de violências, desigualdades e de mercantilização da natureza (ESCOBAR, 2003; QUIJANO, 2005; WALSH, 2008; PORTO-GONÇALVES; QUENTAL, 2012; SANTOS, 2015;MIGNOLO, 2017).

A colonialidade do poder (QUIJANO, 2005; PORTO-GONÇALVES; QUENTAL, 2012) tem como principal eixo estruturante o conceito de raça, pois argumenta-se que existe um “padrão de controle, hierarquização e classificação da população mundial que afeta todas as dimensões da existência social” (PORTO-GONÇALVES; QUENTAL, 2012, p. 7). As estratégias de dominação e manutenção do poder nos termos do padrão moderno-colonial e da colonialidade se fundamentaram e ainda se fundamentam na escrita e na interpretação de tempo (linear) e espaço, tendo como referência o “norte global”, mais precisamente a Europa ocidental (MENESES, 2018).

A ciência moderna, orientada pela racionalidade europeia, cria um sistema de verdade universal e impõe um padrão único de conhecimento que nega aquele produzido por corpos negros e indígenas (QUIJANO, 2005; CASTRO-GOMES, 2007; ROSA; ALVES-BRITO; PINHEIRO, 2020). Essa lógica se estende ao campo da cartografia e, assim, seus resultados na produção de mapas podem ser entendidos como mecanismos centrais para o controle e dominação territorial e para a manutenção do poder. Nesse caso, podem demarcar dentro da colonialidade do poder e do saber uma geopolítica racial que privilegia quem detém o poder sobre os traçados e suas cercas, em detrimento de quem vivencia um apagamento de suas subjetividades e territorialidades.

A ciência moderna da cartografia se baseia numa “monocultura do espaço, espartilhado pelo pensamento ortopédico cartográfico colonial, que produz um espaço de dominação, onde as várias interpretações cognitivas desses espaços não têm lugar” (MENESES, 2018, p. 66). Dessas estratégias se constroem mapas cognitivos formados por linhas imaginárias, as quais são instituídas, por sua vez, pelas fronteiras espaciais tipificadas pelo ideário marcado pelas concepções binárias de superioridade e inferioridade, presenças e ausências, atrasado e moderno, selvagem e civilizado, e natureza e sociedade. A produção de cartografias situadas nesse contexto de espaço-tempo universal globalizou modelos dominantes que têm compartimentalizado dimensões de vida que ultrapassam fronteiras, que legitimam processos hierárquicos de sobreposição, que invalidam e expropriam mundos de vida contra hegemônicos a partir da produção de “não-existências” (MENESES, 2018).

Ao questionar e contrapor essa lógica de poder, o movimento da cartografia crítica sugere a incorporação da diversidade de interpretações e visões de mundo nas representações de territórios. No contexto da América Latina1, o caminho para uma cartografia social se constrói através dos povos e comunidades tradicionais contemplando suas identidades coletivas em um movimento de resistência e contra-cartografia que denuncia e desafia as convenções cartográficas clássicas que os invisibilizam (ACSELRAD, 2009; RIBEIRO, 2020; MESA, 2022; ALMEIDA; MARIN, 2022). Esse movimento, para além de instrumentos tecnicistas e descritivos, compreende um meio de mobilização dos grupos sociais, politização de reivindicações, reconhecimento, e afirmação de direitos (ALMEIDA; MARIN, 2022).

Este artigo discute, à luz das contribuições em torno da decolonialidade e da cartografia crítica, os processos de elaboração cartográfica na pesquisa acadêmica como instrumento para problematizar a sobreposição de territórios ocupados tradicionalmente por empreendimentos desenvolvimentistas e Unidades de Conservação no contexto do litoral do Paraná e São Paulo. Com objetivo de problematizar as produções cartográficas e instrumentos de gestão mobilizados, apresentamos o processo de pesquisas acadêmicas orientadas em reconhecer o conjunto de sobreposições de projetos de desenvolvimento e Unidades de Conservação em territórios ocupados tradicionalmente por comunidades tradicionais e pelo povo Guarani no litoral do Paraná e São Paulo.

O artigo inicia contextualizando o litoral sudeste-sul, a partir da presença do povo indígena Guarani e de comunidades tradicionais e os projetos de desenvolvimento, representados por empreendimentos, e Unidades de Conservação. Na sequência, com base no processo de produção cartográfica em pesquisa acadêmica, reflete-se sobre os limites e potenciais para constituir processos de contra-informação às produções cartográficas no âmbito das políticas ambientais e de ordenamento territorial.

O litoral do Paraná e São Paulo: pertenças étnico-raciais e disputas territoriais

O litoral sudeste-sul brasileiro, no mosaico formado pelos Estados do Paraná e São Paulo, envolve uma diversidade de grupos sociais com pertenças étnico-raciais e territoriais vinculadas aos Biomas da Mata Atlântica e Costeiro. As diferentes etnias do povo indígena Guarani, em especial o povo Guarani Mbya (LADEIRA, 2020), resistem no litoral sudeste-sul, desde a invasão dos colonizadores, mantendo sua forte vinculação à Yvy marãey, a busca da “terra sem males”. Para esse povo, os limites definidos pelo espaço são determinados por princípios éticos e valores que condizem com a sua visão de mundo, o lugar em que nasceram, que tenham seus parentes enterrados, onde possam desenvolver o nhandereko, o “modo de ser Guarani” (MELIÁ, 1990; LADEIRA; TUPÃ, 2004; FARIA; MALINA, 2013; MACHADO, 2015; LADEIRA, 2020). Entretanto, no campo da gestão ambiental, essa compreensão nem sempre é recepcionada.

A diversidade étnico-racial e territorial na região sudeste-sul também envolve inúmeras comunidades tradicionais que, de acordo com suas características identitárias, se autorreconhecem como caiçaras, pescadores artesanais, quilombolas, farinheiras, cipozeiras, entre outras pertenças (DIEGUES, 1995). No litoral paranaense, o Plano de Desenvolvimento Sustentável do Litoral do Paraná identificou2 155 localidades vinculadas como povos e comunidades tradicionais, as quais são representadas por quilombolas, caiçaras, comunidades de pesca artesanal e de agricultura familiar (GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ, 2019). No Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP), relevante berçário da vida marinha e importante pesqueiro para comunidades da pesca artesanal, se atravessa um persistente projeto econômico que privilegia o escoamento da produção ligada ao agronegócio e ao interesse privado, sendo materializado pela expansão do setor portuário-industrial vinculados aos Portos de Paranaguá e Antonina, a novos portos privados e infraestruturas para escoamento terrestre e para extração de pré-sal (PIERRI et al., 2006; ABRAHÃO; CANEPARO, 2014; TIEPOLO, 2015).

O litoral de São Paulo, especialmente na região do litoral norte e da baixada santista, passou por grandes transformações demográficas e territoriais nas últimas décadas em decorrência do investimento em megaprojetos de desenvolvimento, como a instalação do terminal aquaviário de óleo Almirante Barroso (TEBAR), os Portos de Santos e São Sebastião, e os empreendimentos de exploração de gás e petróleo (VIGLIO; CALVIMONTES; FERREIRA, 2017; GONÇALVES et al., 2020). Esses projetos de desenvolvimento de raiz colonial têm sido significativos na apropriação de recursos e/ou espaços, sejam eles terrestres ou aquáticos e de uso comum de muitos povos e comunidades tradicionais (CONSELHO DO TRIBUNAL POPULAR DA ECONOMIA DO MAR, 2022).

Nos dois estados também é expressiva a presença de Unidades de Conservação de Proteção Integral, cuja lógica da vertente ambientalista preservacionista, reafirma o “mito da natureza intocada” (DIEGUES, 2008). Essa lógica, em casos de sobreposição territorial, dificulta o acesso de povos e comunidades tradicionais aos recursos naturais essenciais à sua subsistência, minando as condições de reprodução física, cultural e social dos grupos, associadas às medidas compensatórias falaciosas de grandes empreendimentos (FOPPA et al., 2018), em uma constante busca de expulsão por cansaço (CASTRO, 2017).

De acordo com Sousa e Serafini (2018), no litoral de São Paulo, a criação de Mosaicos de Unidades de Conservação entre 2006 e 2013 totalizou seis dos sete mosaicos do estado, quatro deles criados na esfera estadual, representando 25% dos mosaicos brasileiros. O litoral do Paraná, por sua vez, tem 82,6% de sua extensão coberta por Unidades de Conservação (PAULA; PIGOSSO; WROBLEWSKI; 2018).

Contraditoriamente, na região sudeste-sul há um déficit de Terras Indígenas homologadas, ou mesmo em processo de demarcação, revelando um descompasso significativo entre a institucionalização destes dois tipos de áreas protegidas (JABUR, 2018), ou seja, o não reconhecimento das terras indígenas (ou das comunidades quilombolas) como áreas protegidas, prevalecendo a lógica preservacionista dos parques com a criação/implementação de Unidades de Conservação de Proteção Integral3.

Simultaneamente, o Brasil opta pela dependência econômica fundamentada no modelo de exportador de commodities do hidro-minério-agronegócio e as estruturas político-econômicas locais e regionais têm se movido em articulação a essa escolha. Fernandes e Góes (2022) destacam que a contrapartida ambiental dos projetos de desenvolvimento opera junto à criação de Unidades de Conservação. Para se ter uma ideia, a partir da década de 1970-80, “foram criadas 98% das mais de 2.200 UCs que existem atualmente no Brasil” (FERNANDES; GÓES, 2022, p. 313).

Muitos dos projetos associados à contrapartida ambiental com a criação de UCs também são responsáveis por travar conflitos com territórios indígenas, bem como de comunidades tradicionais. São esses fenômenos de apropriação das zonas costeiras relacionados aos processos e mecanismos de conservação, desenvolvimento e a gestão de pesca, que tem afetado desproporcionalmente as comunidades pesqueiras de pequena escala e populações costeiras historicamente vulnerabilizadas (BENNET; GOVAN; SATTERFIELD, 2015; FOPPA et al., 2018; FERNANDES; GÓES, 2022).

A produção cartográfica como instrumento de gestão ambiental, pesquisa científica e contra-cartografia

Ao avaliar as produções cartográficas no contexto dos Estados do Paraná e São Paulo, observa-se que elas têm sido mobilizadas enquanto instrumento de políticas, planos e programas, como no Zoneamento Ecológico Econômico previsto na Lei n.º 7.661/88, que institui a Política Nacional de Gerenciamento Costeiro (BRASIL, 1988), no Zoneamento dos Planos de Manejo de Unidades de Conservação (BRASIL, 2002), nos Planos Diretores, em contextos urbanos, e na Política Nacional de Meio Ambiente (BRASIL, 1981) com a Avaliação de Impacto Ambiental nos processos de licenciamento ambiental de empreendimentos.

No litoral do Paraná, para identificação do cenário de empreendimentos previstos e as comunidades tradicionais, foi utilizado o mapa temático produzido em pesquisa de mestrado sobre os impactos cumulativos de empreendimentos no CEP (ONOFRE, 2021). A produção do mapa temático foi realizada através do Software livre QGIS 2.18.4 com o Sistema de Referências de Coordenadas (SRC) SIRGAS2000 UTM 22s. Os dados geoespaciais dos empreendimentos foram disponibilizados especialmente pelo Ministério Público do Estado do Paraná e pelo Laboratório de Geoprocessamento e Estudos Ambientais da UFPR (LAGEAMB). Os dados relacionados às localidades dos povos e comunidades tradicionais foram baseados, excepcionalmente, no levantamento do PDS Litoral (2019) e do Plano Local de Desenvolvimento da Maricultura (PLDM, 2010) (ONOFRE, 2021).

No que diz respeito à identificação das sobreposições de territórios indígenas guaranis por Unidades de Conservação, foram utilizados como base os mapas produzidos por Rossato (2021) e atualizados através da consulta e cruzamento de diferentes dados que constam no site das instituições: i) FUNAI - Fundação Nacional dos Povos Indígenas; ii) ISA - Instituto Socioambiental; iii) CPISP - Comissão Pró-índio de São Paulo; iv) SESAI - Secretaria Especial de Saúde Indígena; v) Mapa Guarani Digital; vi) MPF - Ministério Público Federal; vii) CIMI - Conselho Indigenista Missionário; viii) ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; ix) ITCG - Instituto de Terras, Cartografia e Geologia do Paraná.

As operações de dados espaciais e produção de mapas foram realizadas também no software QGIS. Os planos de informação das Unidades de Conservação federais e estaduais, de proteção integral e uso sustentável, foram obtidos no site do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação do Ministério do Meio Ambiente. Os planos de informação das Terras Indígenas e as coordenadas geográficas dos territórios foram obtidos através do site da FUNAI e do Mapa Guarani Digital. Os Planos de Manejo disponíveis foram consultados para o entendimento de como as UCs tratam a questão da sobreposição.

Pressões e sobreposições de grandes projetos de desenvolvimento aos territórios tradicionais no Litoral do Paraná

No Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP) no Paraná, a configuração socioespacial sugere uma tentativa de monoculturização portuária-industrial no entorno imediato das Baías de Paranaguá e Antonina, em localidades onde se fazem presentes o nó portuário-industrial, e que se sobrepõe ao território de pertencimento de comunidades tradicionais que tem como principal atividade a pesca artesanal, mas não são restritas a elas.

O mapeamento contou com 151 dados geoespaciais de localidades de povos e comunidades tradicionais em relação ao exposto pelo PDS Litoral, que menciona a presença de 155 localidades. Além disso, se identificaram áreas relevantes para pesca representadas por pesqueiros, demonstrando expressivamente a importância da pesca artesanal no Litoral do Paraná. São 70 localidades de pertenças dos pescadores artesanais, 25 de cipozeiras(os), 12 de caiçaras, 11 de pequenos produtores agrícolas, 5 territórios indígenas, 2 territórios quilombolas e 26 localidades de comunidades, cujo pertencimento territorial não foi identificado.

No Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP), local de alta pressão portuária-industrial, evidencia-se a presença de 66 localidades de PCTs. Além disso, há um relevante conjunto de pesqueiros nos quais essas mesmas comunidades desenvolvem os seus modos de vida com a pesca artesanal. O levantamento realizado por Onofre (2021) e Pigosso (2022), identificou a existência de 23 empreendimentos em processo de licenciamento ambiental, ou previstos, para o litoral do Paraná, com um investimento bilionário de R$ 27.557.789.189,02, sendo 65% desse montante proveniente dos cofres públicos. Dentre as tipologias e empreendimentos no litoral, identificaram-se (ONOFRE, 2021):

  • a) infraestruturas de transporte rodoviário (9): PR 404 e prolongamento da PR 340, Pavimentação da PR 405 - Estrada de Guaraqueçaba, BR 101 - Trecho Paraná / Antonina, Guaratuba e Morretes, PR 340 - Trecho Antonina - BR 277, Acesso viário ao Porto de Paranaguá, Duplicação da PR 407, Faixa de Infraestrutura em Pontal do Paraná, Propostas de melhorias de PR 412 e a Ponte de Guaratuba;

  • b) empreendimentos hidroviários (8): Ampliação Terminal Portuário Ponta do Félix, Dragagem de aprofundamento e derrocagem emergencial do maciço rochoso das Palanganas - Canais de acesso, Berços e Bacia de Evolução - Porto de Paranaguá e Antonina, Novo Porto Terminais Portuários Multicargas e Logística (Embocuí), Porto Guará Infraestrutura SPE S/A, Porto Organizado de Paranaguá: Ampliação Cais Leste Píer T, L, F, Complexo Náutico, Porto Organizado de Paranaguá (obras de recuperação e proteção do píer de líquidos), Terminal Multifuncional da Melport / Pontal do Paraná, 3P Porto Pontal do Paraná;

  • c) ferroviário (1): Nova Ferrovia de implantação e/ou readequação de ferrovia no trecho compreendido entre Maracaju (MS) e Paranaguá (PR) - FERROESTE;

  • d) praia (1): Engorda da Orla de Matinhos;

  • e) indústria metalúrgica (2): Readequação do cais e obra de dragagem da TENENGE, Base de Soldagem Subsea7 / Pontal do Paraná;

  • f) dutos terrestres (1): Poliduto (Sarandi - Paranaguá);

  • g) aeroviário (1): Novo Aeroporto (realocação do atual aeroporto de Paranaguá).

Onofre (2021), entendendo a importância da produção cartográfica como instrumento para contra informação e análise crítica, espacializou as comunidades/territórios e os empreendimentos identificados (Figura 1).

Figura 1
Sobreposição de grandes projetos de desenvolvimento e localidades dos povos e comunidades tradicionais do Litoral do Paraná

Localizada no município de Morretes, o território indígena (TI) multiétnico Tupã Nhe’e está situado no entorno imediato da Nova Ferrovia e do Poliduto, de forma que parte do trajeto desses empreendimentos aproximam-se também das comunidades pesqueiras Alexandra e Vila Guarani no município de Paranaguá. Há ainda as comunidades de pescadores da Ilha do Teixeira e Ponta da Pita, localizadas próximo de intervenção com a instalação da nova PR 340 que conecta ao projeto de ampliação do Terminal Portuário Ponta do Félix (TPPF).

Na porção norte, a pavimentação da PR 405 tem em seu entorno imediato dois territórios indígenas (TI Cerco Grande e TI Kuaray Haxa), duas comunidades de pescadores artesanais (Cerquinho e Costão), nove comunidades sem identificação (Utinga, Morato, S/N, Pedra Chata, Rio Bananal, Serra Negra, Açungui, Capivari, Bromado, Lajeado e Limoeiro), três comunidades caiçaras (Tagaçaba, Tagaçaba de cima e Potinga) e uma de cipozeiros(as) (Sem Nome).

O Território Indígena Sambaqui (TI Sambaqui, na Figura 1 ver 122) é composto por dois tekoa4, Karaguata e Guaviraty (GÓES et al., 2020), que estão sobrepostas pelo projeto da empresa SubSea7 e próximas ao projeto da Nova Faixa de Infraestrutura, que se trata de uma condicionante do IBAMA para instalação do empreendimento 3P Porto Pontal, atualmente denominado Maralto. Neste caso, a situação se agrava quando se constata a omissão da presença do TI nos instrumentos de ordenamento territorial estruturados pelo Estado, os Estudos de Impacto Ambiental (EIAs) e o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE LITORAL) (INSTITUTO DE TERRAS, CARTOGRAFIA E GEOLOGIA DO PARANÁ 2016; GÓES et al., 2020), acarretando cartografias de ordenamento tecnicistas constituídas por produzir “não-existências” e conceder a entrada de grandes empreendimentos.

Na porção sul do CEP, a comunidade Ponta do Poço (54) foi sobreposta diretamente pelo 3P Porto Pontal, o que já acarretou sua expropriação territorial anteriormente ao início do licenciamento ambiental e articulada pelo empresário mediante judicialização. A comunidade foi removida em dois momentos (2003 e 2007) para as proximidades do canal do Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS) que faz parte da vila dos pescadores, atual Área de Influência Direta do empreendimento 3P Porto Pontal (atual Maralto)(ONOFRE; SILVA; QUADROS, 2019).

A comunidade de pescadores de Barrancos (51) tem o seu território atravessado pelo projeto da Nova Faixa de Infraestrutura, localizado no município de Pontal do Paraná. Quatro empreendimentos ligados ao complexo industrial portuário de Pontal do Paraná estão situados no entorno imediato do território da comunidade de pescadores artesanais do Maciel (53). Ambas comunidades possuem histórico de violações de direitos humanos relacionados ao direito ao território em função da disputa judicial de titulação das terras, que envolvem concessão de terras ditas ‘públicas’ do Estado para entidades privadas do mercado imobiliário - situação representada pela Empresa Balneária Pontal do Sul, cujo empresário é também o idealizador e ex-empresário do Porto Pontal (PORTES, 2019; ONOFRE; SILVA; BUFF, 2020).

No caso do Maciel, além da ausência de titulação do território nos moldes do ‘papel’, o cenário é agravado pela tentativa de apagamento de sua existência nos instrumentos de ordenamento territorial Zoneamento Ecológico Econômico do Litoral (2016) e Plano Diretor de Pontal do Paraná (2014; 2017), o que implica legitimação da Zona de Desenvolvimento Diferenciado e da Zona Especial Portuária (ZEP), criadas em detrimento da legitimidade do território tradicional da comunidade pesqueira sobreposta estrategicamente (MINARI, 2016; ONOFRE; SILVA; BUFF, 2020). Essa produção de “não existências” trata-se, portanto, de uma estratégia colonizadora enunciada pelo poder dos mapas tratados como oficiais (MENESES, 2018) em detrimento de territórios tradicionais subjugados historicamente como entraves ao “desenvolvimento”.

O quadro de expansão portuária-industrial e rodoviária no entorno imediato do Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP) levanta preocupações, pois dos 23 grandes projetos de desenvolvimento, dezessete (17) estão concentrados no CEP e “envolvem ampliações e novas infraestruturas de terminais portuários, novas indústrias, estradas, ferrovia, poliduto, aeroporto e dragagem” (ONOFRE, 2021, p. 70).

Em síntese, aferiu-se que três territórios pesqueiros artesanais (Maciel, Ponta do Poço - já expropriada e Barrancos) e o Território Indígena Sambaqui estão sobrepostos diretamente. Novas áreas de pressão e tensão são evidenciadas com a sobreposição de quatro novos empreendimentos portuários em pleito (3P Porto Pontal - atual Maralto, Melport, Embocuí e Guará) sobre os pesqueiros do CEP no Litoral Paranaense.

As sobreposições de territórios indígenas guaranis por Unidades de Conservação

No litoral do Paraná e de São Paulo existem 26 territórios indígenas do povo Guarani sobrepostos por 18 Unidades de Conservação, de Proteção Integral e Uso Sustentável, Federais e Estaduais. São 13 UCs no litoral de SP, sobrepondo um total de 21 TIG (Tabela 1) (Figura 2) e 5 UCs no litoral de PR, sobrepondo 4 TIG (Tabela 2) (Figura 3).

Das UCs sobrepostas, 8 possuem Plano de Manejo, 7 localizadas no litoral de SP e 1 no litoral do PR. Rossato (2021), ao analisar os Planos de Manejo do Parque Estadual da Serra do Mar, Parque Estadual Xixová Japuí, Parque Estadual Carlos Botelho, Parque Estadual Intervales, Parque Estadual da Ilha do Cardoso e APA Federal de Cananéia-Iguape-Peruíbe, identificou formas de tratar a questão dos territórios: i) citados como não objetos de zoneamento por serem reconhecidos por legislação específica; ii) considerados como “ocupação” ou “invasão” envolvendo processo judicial para a expulsão; iii) não reconhecimento da existência do território indígena, por omitir a presença dos povos indígenas no documento.

Para Ladeira (2004), as práticas de gestão territorial definidas pelas políticas públicas envolvendo territórios de povos indígenas resultam, de modo geral, na submissão de concepções espaciais, normas de organização, ocupação e sociabilidade próprias desses grupos às convenções e aos padrões políticos e econômicos dominantes.

Para os povos indígenas Guarani, a noção de território está associada à noção de mundo, vinculada ao espaço geográfico onde se desenvolvem relações que definem seu modo de vida, e esse não pode ser delimitado. A noção de terra está inserida no conceito de território, que para esses povos é infinito (LADEIRA; TUPÃ, 2004; FARIA; MALINA, 2013; MACHADO, 2015; LADEIRA, 2020).

O planejamento das Unidades de Conservação, com base nos Planos de Manejo analisados, não considera as formas de manejo já existentes como referência inicial para a realização do zoneamento. Aos povos indígenas são impostas adequações ao modelo preservacionista, de forma binária, que reafirma as dicotomias ser-humano-natureza, ao desconsiderar os modos de vida tradicionais.

Tabela 1
Sobreposições de Unidades de Conservação Federal e Estadual em Territórios Indígenas Guarani no litoral de São Paulo.

Figura 2
Sobreposição de Territórios Indígenas Guarani por Unidades de Conservação no Litoral de São Paulo

Tabela 2
Sobreposições de Unidades de Conservação Federal e Estadual em Territórios Indígenas Guarani no litoral do Paraná

Figura 3
Sobreposição de Territórios Indígenas Guarani por Unidades de Conservação no Litoral do Paraná

Cuidados, desafios e potenciais nas produções cartográficas enunciadas

A cartografia clássica tem sido mobilizada como instrumento na implementação de diferentes políticas públicas no contexto do litoral de São Paulo e Paraná. São recortes espaciais mobilizados com diferentes objetivos e seus resultados estão em disputa e envolvem diferentes grupos e instituições. Os povos indígenas e comunidades tradicionais são historicamente invisibilizados em seus próprios territórios, por meio da reprodução de uma narrativa hegemônica que considera a existência indígena e de outras pertenças categorizadas como “tradicionais” como coisa do passado, para atender projetos e interesses coloniais que alimentam o racismo, o genocídio e o etnocídio (MILANEZ et al., 2019; NÚÑEZ, 2021). A invisibilização como parte da metodologia utilizada pela cartografia clássica é um tratamento conferido aos que estão na “zona do não-ser” (FANON, 2008) pelo projeto moderno colonial.

Os avanços no debate em torno de uma cartografia social que considere a contra-informação e a autocartografia nos atentam para a existência de uma complexidade institucional e política por trás dos arranjos que permitem a realização de cartografias “participativas” (HOFFMANN, 2010). Entretanto, é importante evidenciar que a noção de mapeamentos participativos surge como requisito de agências multinacionais para atender as condições dos manuais de implementação de projetos, resultando em contextos em que a “participação” dos grupos sociais, interpretada por esse mecanismo como um consentimento a implantação dos megaprojetos, é definida pelo órgão implementador ou empreendedor com um “propósito de ilusão democrática que conspira contra a consulta prévia e a noção de participação” (ALMEIDA; MARIN, 2022, p. 149).

Esse mecanismo nada mais é do que a manutenção das colonialidades, a partir da construção superficial e utilitarista envolvendo os povos e comunidades tradicionais. Em muitos casos, a autonomia coletiva dos povos e “o direito de dizer não” são desrespeitados sistematicamente (MILANEZ et al., 2021). Para a realidade dos Estados do Paraná e São Paulo, as produções cartográficas se diluem em estudos fragmentados nas Avaliações de Impacto Ambiental de grandes projetos de desenvolvimento, associadas de forma clientelista a inúmeros planos e programas governamentais em diferentes esferas (municipais, estaduais e federais), como visto nas manobras de alterações de zoneamentos municipais e estaduais, com o fim de respaldar e legitimar esses empreendimentos no nível local.

Essas manobras, quando aliadas à ausência de reconhecimento e demarcação dos territórios tradicionais, acabam por produzir violações de direitos humanos, visto que constitucionalmente a demarcação de territórios indígenas e quilombolas é um direito. Como visto no contexto sudeste-sul, no que se refere a grande diversidade fundiária que se integra com a presença de diversas comunidades tradicionais, há uma lacuna perante ao Estado referente ao direito à demarcação de territórios tradicionais de outras pertenças, como, por exemplo, comunidades da pesca artesanal, ribeirinhas e/ou caiçaras. Nesse último ponto, Little (2003), já chamava atenção sobre a diversidade fundiária e sociocultural e a ausência de reconhecimento e demarcação efetiva dos múltiplos territórios tradicionais no Brasil.

Como somatória, a presença de Unidades de Conservação de Proteção Integral, quando associadas aos licenciamentos ambientais, se atrelam medidas compensatórias, que além de falaciosas do ponto de vista ambiental, reafirmam ações de gestão que fortalecem a lógica preservacionista persecutória às populações tradicionais, afetadas historicamente pela sobreposição das UCs em seus territórios de pertencimento. As definições arbitrárias deste processo se configuram em processos de tomada de decisão legitimada por conselhos consultivos, cuja participação social é frágil. Além disso, tampouco se reconhece que os territórios tradicionais são tipologias de áreas protegidas que atuam na proteção da sociobiodiversidade.

As experiências de produção cartográfica no âmbito acadêmico, ainda que sem a participação direta dos grupos sociais, mas em consonância aos direitos territoriais das populações tradicionais para produzir contra-informação e uma ciência decolonial (SOUZA; ROMAGNOLI, 2022), permite reconhecer alguns cuidados, desafios e potenciais.

  1. Produções cartográficas auto-organizadas. A existência do Mapa Guarani Digital5, produzido pelo povo Guarani no âmbito da Comissão Yvyrupa - CGY, em parceria com o Centro de Trabalho Indigenista - CTI e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, com apoio da Embaixada Real da Noruega, constitui uma base de dados potente a ser reconhecida nos processos de pesquisa científica. Sua existência pode ser considerada uma produção de contra-informação e contra-mapeamento às demais produções que não consideram a presença desses territórios ao longo do litoral. Valorizar e retroalimentar essas bases pode aprofundar interpretações, como o pretendido com a espacialização dos inúmeros territórios indígenas do Povo Guarani sobrepostos por UCs, notadamente daquelas de proteção integral e suas lógicas preservacionistas. O Projeto Nova Cartografia Social também evidencia outras produções autocartográficas na região que garantem a visibilização dos grupos sociais às margens dos processos de tomada de decisão, seja para implantação de empreendimentos ou da gestão de UCs.

  2. Construção intercultural, fragmentação dos dados, escalas e temporalidades para produção cartográfica. A complexidade das territorialidades e diversidade de grupos ao longo do litoral impõe desafios à pesquisa acadêmica. A limitação de recursos financeiros para realização de campos sistemáticos é um desafio estruturante. As temporalidades das comunidades e do tempo das pesquisas (iniciação científica, mestrado e doutorado) são fatores a serem considerados na construção dialógica e nem sempre são conciliáveis. O exponencial de empreendimentos ao longo do litoral e o volume de produções tecnicistas das Avaliações de Impacto Ambiental (EIA/RIMAs) e instrumentos de Zoneamentos impõe outros desafios. A pouca transparência no acesso aos documentos e, consequentemente, às produções cartográficas, para resposta dos grupos de pesquisa ao conjunto excessivo de EIA/RIMAs e outros instrumentos de gestão ambiental exige equipes multidisciplinares com grande fôlego para produzir contra-informação. A fragmentação destes estudos, com inúmeros projetos e planos governamentais, com diferentes escalas e recortes espaciais, exige tradução e problematização cuidadosa no processo de contra-informação. As bases de dados secundárias, seja dos movimentos sociais ou de outras produções acadêmicas, é estratégia a ser adotada com conduta ética. A compreensão das territorialidades das comunidades tradicionais com diferentes pertencimentos se mostram limitadas sem uma base de dados adequada ou trabalho de campo mais sistemático. Entretanto, a ausência de enunciação prévia que possa contrapor as ausências dessas comunidades nos processos de tomada de decisão é ainda mais deletéria. Na presença anunciam-se histórias, pertencimentos, representações e identidades detentoras de direitos em seus lugares de enunciação.

  3. Estudos complementares e parcerias com movimentos sociais. Os pontos expostos anteriormente apontam a necessidade de complementar a espacialização dos diferentes empreendimentos que afetam os territórios/territorialidades do povo Guarani no contexto do litoral e sua associação com outras comunidades tradicionais. Os dados oficiais do PDS Litoral podem ser confrontados, ao valorizar os processos de autocartografia e a contra informação, construídas com protagonismo e/ou processos de pesquisa-ação-participativa com os grupos diretamente afetados. Esses princípios de participação tem sido afastados na mobilização de instrumentos de gestão ambiental, como nos Estudos de Impacto Ambiental (EIA/RIMAS) associados ao licenciamento ambiental de empreendimentos ou nos Planos de Manejo de Unidades de Conservação, orientados por uma lógica excludente das populações tradicionais para pensar o bem viver dos territórios marinho-costeiros.

Conclusões

Para além de uma cartografia descritiva e tecnicista, os dados aqui apresentados enunciam a presença de territórios tradicionais no Litoral do Paraná e São Paulo sobrepostos por empreendimentos e Unidades de Conservação. De forma crítica se reconhece a lógica limitante dos mapas ‘cartesianos’, mobilizados nas Avaliações de Impacto Ambiental (Licenciamento ambiental) ou na gestão ambiental (Unidades de Conservação), pois não retratam as territorialidades dos povos e comunidades tradicionais que habitam os Biomas da Zona Costeira e Mata Atlântica.

Esses fatores rígidos e tecnocráticos, os quais fazem parte da própria lógica da ciência cartográfica moderno-colonial, não permitem um olhar interseccional sobre pertenças e aspectos socioculturais, autorreconhecimento, afirmação de direitos e construção de políticas voltadas para combater as opressões de raça, classe, gênero. Menos ainda, permitem processos de mobilização e engajamento dos grupos sociais e, quando muito, operam no sentido contrário, configurando processos de desmobilização.

Em contraponto, a realização do mapeamento, mesmo que realizado por meio de dados secundários, permitiu visualizar situações de sobreposições e pressões ocasionados pela relação entre grandes empreendimentos, em licenciamento e propostas, Unidades de Conservação e os locais de vida dos povos indígenas Guarani e comunidades tradicionais. Considerar a presença desses grupos sociais nesses processos é condição sine qua non para enfrentar as ameaças e os danos crônicos aos Biomas Mata Atlântica e Zona Costeira dos últimos cinco séculos.

O resultado desses mapeamentos pode e deve ser produto de contra-informação, especialmente em casos de disputas e violações, seja pela tentativa de apagamento dos territórios em mapas oficiais, pela sobreposição direta de empreendimentos e Unidades de Conservação nesses territórios ou pela distorção das espacialidades e temporalidades que são pluridiversas de acordo com cada pertença étnico-racial e territorial do contexto sudeste-sul do Brasil.

Agradecimentos

Agradecimentos à Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (Capes) pelas bolsas concedidas às duas primeiras autoras e ao Centro de Assessoria de Publicação Acadêmica (CAPA - http://www.capa.ufpr.br) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) pelo auxílio na tradução e edição da língua inglesa.

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  • 1
    - No Brasil, o movimento se destaca no contexto amazônico, a exemplo do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA) que atua no debate e na construção de uma autocartografia dos povos e comunidades tradicionais da Amazônia. Para saber mais: http://novacartografiasocial.com.br/.
  • 2
    - Utilizamos o termo “identificação”, em detrimento a “autoidentificação”, pois se refere a dados secundários e não houve aferição junto aos grupos sociais para compreensão dos processos de autorreconhecimento identitário.
  • 3
    - Decreto n.º 5.758/2006 institui o Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas (PNAP) e Lei n° 9985/2000 institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC).
  • 4
    - O termo tekoa é considerado pelos Guarani Mbya “o lugar de expressão do modo verdadeiro de ser” (MACHADO, 2015, p. 21). Em algumas traduções simplificadas remete-se ao que se compreende por aldeia pela sociedade não indígena.
  • 5
    - Disponível em: https://guarani.map.as/#!/

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Maio 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2024
  • Aceito
    28 Ago 2024
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