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IRRESPONSABILIDADES ORGANIZACIONAIS OU AUSÊNCIA DE GOVERNANÇA TERRITORIAL? REFLEXÕES SOBRE GESTÃO AMBIENTAL NO PROJETO MINAS-RIO1 1 . Nossos agradecimentos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG pelo apoio na elaboração deste artigo.

Resumo

Este trabalho teve por objetivo sistematizar e analisar dimensões sociais e organizacionais do processo de licenciamento ambiental e implantação do projeto minerário Minas-Rio, discutindo fragilidades metodológicas e gerenciais evidenciadas pelo acúmulo de denúncias de irregularidades, conflitos socioambientais e falhas de planejamento do empreendimento. Tal situação traduz gestão empresarial e governança territorial autoritários, incapazes de sustentar o desenvolvimento local, submetendo famílias a condições desestruturantes dos modos de vida. Em 10 anos (2007-2017) de acompanhamento do caso, adotaram-se métodos qualitativos - técnicas participativas - para obtenção de dados, permitindo a compreensão dos processos de licenciamento ambiental, negociações e enfrentamentos conflituosos entre atores públicos e privados. Constatou-se que instrumentos de planejamento empresarial públicos não se mostraram capazes de garantir a gestão dos impactos da mineração sobre recursos hídricos: cursos d’água tiveram nascentes e trechos soterrados e comunidades se declaram prejudicadas pela diminuição e poluição da água, sendo atendidas por precárias soluções de fornecimento.

Palavras-chave:
mineração; comunidades atingidas; recursos hídricos; governança territorial

Abstract

The aim of this paper is to analyse social and organizational dimensions of the environmental licensing and implementation process of the mining project Minas-Rio, discussing methodological and managerial frailties highlighted by the accumulation of reports regarding irregularities, socioenvironmental conflicts, and flaws in the venture’s masterplan. This situation reveals authoritarian systems of business management and territorial governance, which fail to sustain local development, subjecting families to the disruption of their traditional livelihood. In 10 years (2007-2017) following the case, qualitative methods - participative techniques - were used to collect data, allowing the comprehension of the environmental licensing processes, negotiations and conflicting clashes between actors. It was observed that tools for public corporate planning did not prove to be able to guarantee the management of the impacts on water resources: watercourses had springs and stretches trapped and communities declared themselves affected by the water drying and pollution, being assisted only with precarious supply solutions.

Resumen

Este trabajo tuvo por objetivo analizar dimensiones sociales y organizativas del proceso de licenciamiento ambiental e implantación del proyecto minero Minas-Rio, discutiendo fragilidades metodológicas y gerenciales evidenciadas por denuncias de irregularidades, conflictos socioambientales y fallas de planificación del emprendimiento. Tal situación traduce gestión empresarial y gobernanza territorial autoritarios, incapaces de sostener el desarrollo local, sometiendo a familias a condiciones desestructurantes de sus modos de vida. En 10 años (2007-2017) de seguimiento del caso, se adopta métodos cualitativos - técnicas participativas - para la obtención de datos, permitiendo la comprensión de los procesos de licenciamiento ambiental, negociaciones y enfrentamientos conflictivos entre actores. Se constató que instrumentos de planificación pública no se mostraron capaces de garantizar la gestión de los impactos de la minería sobre recursos hídricos: cursos de agua tuvieron nacientes sepultados, y comunidades se declaran perjudicadas por la disminución y contaminación del agua, siendo atendidas por precarias soluciones de suministro.

Palabras clave:
minería; comunidades afectadas; recursos hídricos; gobernanza territorial

1 Introdução

Este artigo teve o objetivo de sistematizar e analisar dimensões sociais e organizacionais do processo de licenciamento ambiental e implantação do Projeto Minerário Minas-Rio, em Conceição do Mato Dentro - MG, discutindo fragilidades metodológicas e gerenciais evidenciadas pelo acúmulo de denúncias de irregularidades, conflitos sociais duradouros, violação de direitos humanos e ambientais, falhas de planejamento com etapas e projetos não cumpridos. Apresentam-se aqui reflexões sobre as dinâmicas de tratamento das questões associadas à não garantia da disponibilidade e da qualidade das águas para as comunidades a jusante do território apropriado pela empresa de mineração para instalar a mina, equipamentos, barragem de rejeitos e pilhas de estéril. Destaca-se como objeto de estudo a situação de acesso à água pelas comunidades atingidas e não reconhecidas pela empresa e por órgãos públicos, no caso da implantação da mineração de ferro a céu aberto na Região do Médio Espinhaço, precisamente nas serras do Sapo e Ferrugem, nas cidades de Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas.

O não reconhecimento formal de núcleos comunitários atingidos nos remete à constatação de irresponsabilidade empresarial e inexistência de um sistema público e participativo de governança territorial, com objetivo de promoção do desenvolvimento local tendo a sustentabilidade como perspectiva. Um sistema de governança com a participação dos setores público, empresarial e da sociedade civil, que contemple diferentes e divergentes atores no território poderia proporcionar assertividade nas políticas e estratégias de condução das dinâmicas de transformações socioambientais forçadas pela implementação de empreendimento de tão grande porte.

O empreendimento minerário em questão acumula denúncias de irregularidades, violação de direitos humanos e ambientais - especificamente o direito humano à água (COLETIVO MARGARIDA ALVES, 2017), falhas de planejamento com medidas condicionantes, etapas de procedimentos e projetos não cumpridos, como atestam centenas de documentos protocolados em órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental, como, por exemplo, no Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM), na Unidade Regional Colegiada do COPAM, a URC-Jequitinhonha, no Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH), nos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBH) do Santo Antônio e Doce, na Fundação Estadual de Meio Ambiente (FEAM), na Agência Nacional das Águas (ANA), além dos Ministérios Públicos Estadual, Federal e da Defensoria Pública. Essas denúncias de irregularidade, violações e conflitos, se analisados em suas imbricações técnicas e políticas, têm significado fragilidades ou inoperâncias de um sistema de governança territorial incapaz de sustentar o desenvolvimento local num contexto de contradições geradas pela atividade minerária de grande monta.

Na cidade de Conceição do Mato Dentro, propagandas anunciaram a instalação da mineração com o slogan “Dá licença, a MMX está chegando”, antes, portanto, da compra do projeto minerário pela empresa Anglo American e do início do processo de licenciamento (ESTADO DE MINAS, 2007). O processo para obtenção de licença prévia, de instalação e de operação durou de 2007 a 2014, foi conturbado pelo excesso de situações geradoras de conflitos, de recursos interpostos, de confrontações e complementações de dados. As implicações legais levaram à mobilização social dos atingidos pelo reconhecimento de seus direitos.

A Licença Prévia foi concedida em 2008, com mais de 100 condicionantes, ou seja, medidas para regular, complementar e instruir o plano de execução do empreendimento. A Licença de Instalação foi fragmentada em LI Fase 1 (2009) e LI Fase 2 (2010), em função de condicionantes total ou parcialmente não cumpridas e a Licença de Operação ocorreu em 29/09/2014 (SISTEMA ESTADUAL DE MEIO-AMBIENTE, 2014). No total, o processo conta com mais de 360 medidas condicionantes, muitas delas revisadas, suprimidas e/ou substituídas para adequação técnica ou devido a discordâncias entre atores e contradições do próprio licenciamento (PEREIRA; PEREIRA, 2012PEREIRA, D. de C.; PEREIRA, L. F. Mining and social and environmental scenarios: conversion of territories, complexities and possibilities. In: COLLOQUE INTERNATIONAL MINEURS DU MONDE, 2012, Lens/França. Anais... Lille/França: Université Lille 3, 2012.; ZHOURI, 2014ZHOURI, A. Mapeando desigualdades ambientais: mineração e desregulação ambiental. In: ZHOURI, A.; VALENCIO, N. (Org.). Formas de matar, de morrer e de resistir: limites da resolução negociada de conflitos ambientais. Belo Horizonte: UFMG, p. 111-142, 2014.).

O que se considera aqui como fragilidades no processo de gerenciamento ambiental do projeto Minas-Rio, se expressa desde o planejamento do empreendimento minerário que, por tradição empresarial, se fez sem qualquer espécie de consideração sobre vetores de desenvolvimento local e, pontualmente, apresentou o Estudo de Impacto Ambiental - Relatório de Impactos Ambientais (EIA-RIMA) sem incorporar o conjunto das comunidades e famílias atingidas ou moradoras das Áreas Diretamente Afetadas (ADA) e de Influência Direta (AID). Tal situação tornou-se significativa da perpetuação dos conflitos com os atingidos não reconhecidos. Um segundo aspecto diz respeito ao Plano de Controle Ambiental apresentado pela empresa, composto por coleções de programas relativos ao Meio Físico, ao Meio Biótico e ao Meio Socioeconômico. O cumprimento de seus programas ocorre sem instrumentos de efetivo acompanhamento pelos órgãos públicos licenciadores e de fiscalização, bem como sem controle pela sociedade civil, pois essa não é uma pauta aberta. Um terceiro aspecto diz respeito aos reiterados embates entre os atingidos e as organizações envolvidas com o não cumprimento de condicionantes que são, na prática, regulações legais, que funcionam como planos a serem cumpridos.

Para demonstrar a sistematização e a análise dos efeitos da instalação e operação do empreendimento minerário Minas-Rio, prioritariamente, no que se refere à disputa pela apropriação e usos de recursos hídricos no território, o trabalho foi organizado em quatro seções. Após essa Introdução, o item 2 apresenta discussão sobre a relação entre extrativismo mineral, água e insegurança hídrica e resgata elementos históricos das dimensões legais e tecnológicas a respeito da mineração e dos usos de recursos hídricos, o que incide sobre a lógica de gestão ambiental por ela dominada. No item 3, sintetizamos a metodologia adotada no percurso da pesquisa. O quarto item concentra informações sobre o território, as comunidades, o empreendimento e as principais questões que impactam os usos das águas e, por fim, as considerações finais trazem à tona críticas sobre práticas empresariais e de gerenciamento público que, no caso da mineração, são produtoras de desestruturação socioeconômica e conflitos, sobretudo impondo deterioração do macrossistema hídrico que serve à vida no planeta e atinge diretamente as condições de sobrevivência da população em seu território de origem.

2 Água, (in)segurança hídrica e extrativismo mineral

A discussão dos impactos da mineração sobre a gestão de recursos hídricos tem mobilizado debates nos meios acadêmicos, bem como em diversas instâncias reguladoras do Estado e no âmbito dos movimentos sociais. Em grande parte, tais discussões dialogam com o modelo de desenvolvimento predominante, com a expansão dos grandes empreendimentos e suas decorrências como processos de apropriação de territórios, de interferência e desconstrução de ecossistemas, de redes hídricas, de comunidades rurais e tradicionais, ao mesmo tempo em que ocorre a construção de outros fluxos produtivos e de espaços urbanos (ACOSTA, 2016ACOSTA, A. Extrativismo e neoextrativismo - duas faces da mesma maldição. In: DILGER, G.; LANG, M.; PEREIRA FILHO, J. (Orgs.) Descolonizar o imaginário.Debates sobre o pós-extrativismo e alternativas ao desenvolvimento.São Paulo: Fundação Rosa Luxemburgo, 2016.; RODRIGUES; COSTA, 2016RODRIGUES, F. O.; COSTA, W. B. “A chegada do estranho”: mineração e conflitos por água nas comunidades camponesas de Caetité e Pindaí- Bahia, Brasil. Revista Pegada, vol. 17, n.1, julho, 2016.; ARAOZ, 2010ARAOZ, H. M. Minería transnacional, conflitos socioterritorialese nuevas dinâmicas expropriatórias. El caso de Minera Alumbrera. In: SVAMPA, M. e ANTONELLI, Mirta A. Minería transnacional, narrativas del desarrollo y resistências sociales. Buenos Aires: Biblos, 2010.; ADLER et al., 2007ADLER, R. A; CLAASSEN, M.; GODFREY, L. e TURTON, A. R. Water, mining, and waste: an historical and economic perspective on conflict management in South Africa. The Economics of Peace and Security Journal, ISSN 1749-852X © www.epsjournal.org.uk - Vol. 2, No. 2, 2007.). Intrínseca a essas questões, a água, considerada como um bem da humanidade, foi transformada “em item mercantil” (RODRIGUES; COSTA, 2016, p. 68) o que amplia o potencial de conflitos e disputas entre empreendimentos e comunidades em cada território submetido à lógica do desenvolvimento econômico que privilegia a produção e a mercantilização de commodities minerais e agrícolas.

Nos países periféricos, componentes do chamado Sul Global, as tendências à urbanização extensiva desencadeada com a expansão de processos industriais globais e, em particular, com a intensificação do extrativismo mineral associado à produção de energia hidrelétrica em grande escala (MELO; CARDOSO, 2016MELO, A. C. C; CARDOSO, A. C. D. O papel da grande mineração e sua interação com a dinâmica urbana em uma região de fronteira na Amazônia. Nova Economia, v.26, n. Especial, p.1211-1243, 2016.), compõem uma matriz de consumo hídrico sem precedentes na história. As múltiplas formas de usos da água, os volumes consumidos nas operações produtivas e nas cidades suscitam questionamentos sobre a sustentabilidade das fontes de abastecimento, mas, antes disso, sobre a garantia dos ecossistemas produtores da água. Nesse sentido, as pesquisas sobre a escassez e a segurança hídrica ganham espaço na cena mundial, sobretudo quando se trata da interferência das tecnologias e práticas extrativas minerais sobre as águas superficiais e subterrâneas (RODRIGUES, 2015RODRIGUES, P. Mineração e o jogo dos sete erros. Entrevista especial com Paulo Rodrigues. Revista IUH On line, 2015. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/549486-mineracao-e-o-jogo-dos-sete-erros-entrevista-especial-com-paulo-rodrigues
http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/5...
). Como reafirmam Domingues, Boson e Alípaz (2016) “Em numerosas minas se extrai muito mais água que minério. É o caso, bem frequente, de lavras que se localizam abaixo do nível piezométrico, de aquíferos livres ou confinados, dos quais deve ser bombeada a água subterrânea enquanto durar a explotação da mina.” (p. 20).

No Brasil, em processos em que o capital global financeiro opera livremente, como no caso de grandes empreendimentos e regiões com mineração, os sistemas de governança ambiental que prevalecem, com todas as suas leis, normas técnicas e falhas, reproduzem conceitos e dinâmicas decorrentes de modelos e de organismos internacionais, formulados no bojo de orientações derivadas do sistema financeiro internacional com participação do Banco Mundial e de empresas transnacionais (KLEMENS, 2014). A governança territorial nesse campo, por sua vez, se caracteriza por fragilidades também no que diz respeito à composição dos fóruns de atores que decidem sobre planos e processos de intervenção com vistas ao desenvolvimento sem que, de modo geral, possam ir além da questão econômica e contemplar as dimensões histórico-culturais, que respeitem as identidades locais e os modos de vida das populações. É nesse diapasão que, ao tratarem as correlações entre mineração e desenvolvimento, Melo e Cardoso (2016MELO, A. C. C; CARDOSO, A. C. D. O papel da grande mineração e sua interação com a dinâmica urbana em uma região de fronteira na Amazônia. Nova Economia, v.26, n. Especial, p.1211-1243, 2016.) demonstram como o “volume de recursos e o ritmo de transformações associadas a projetos de investimentos conectados ao mercado globalizado, ao invés de reduzir, tem acentuado o contraste entre espaços de riqueza, crescimento e privilégio, e espaços de pobreza, declínio e exclusão” (p. 1216) resgatando a problemática da questão urbana internacional contemporânea (BRENNER; SCHMID, 2015) que, por sua vez, traduz desigualdades no acesso e na apropriação de territórios e recursos.

A água, dentre outras dimensões socioambientais, não tem sido devidamente contemplada nas políticas e práticas de governança territorial a ponto de evitar conflitos e ameaças à segurança hídrica das regiões. Ao contrário, a escassez hídrica tem se configurado como resultado de projetos desenvolvimentistas que privilegiam a “realização do lucro do modo de produção capitalista” (RODRIGUES; COSTA, 2016RODRIGUES, F. O.; COSTA, W. B. “A chegada do estranho”: mineração e conflitos por água nas comunidades camponesas de Caetité e Pindaí- Bahia, Brasil. Revista Pegada, vol. 17, n.1, julho, 2016., p. 68). Vários são os casos em que a extração minerária decreta a escassez hídrica, seja por destruição das reservas ambientais com desmatamentos que comprometem as nascentes e os lençóis freáticos, seja pela contaminação por efluentes ou mesmo por desastres socioambientais como rupturas de barragens ou vazamentos de rejeitos. A título de exemplo, a Comissão Pastoral da Terra - CPT - em seu relatório de 2017, relacionou 197 casos no campo e destacou o número de ocorrências de conflitos por água desde 2005, como mostra a Tabela 1.

Tabela 1
Progressão dos conflitos por água no Brasil

Segundo esse mesmo relatório,

124 dos 197 conflitos aconteceram em áreas de atuação das mineradoras, 63%. 91 deles onde estão estabelecidas mineradoras internacionais, 33 onde estão mineradoras nacionais. A exploração do minério de ferro é responsável por 84 destes conflitos, 43%, a de urânio por 25 conflitos, 13%, a de alumínio por 8 conflitos, 4%, e a de ouro por 4 conflitos, 2%. 33 conflitos, 17%, aconteceram no contexto das hidrelétricas. Outros 26 conflitos, 13%, em áreas dominadas por fazendeiros. (CPT, 2017, p. 131).

A gravidade das situações de conflitos por água, a tendência ao aumento e diversificação da demanda pelos recursos hídricos e a ausência de sistemas de governança territorial fundados em valores de justiça social nos remetem à concepção expressa no Programa Hidrológico Internacional das Nações Unidas, que define a segurança hídrica como a capacidade de uma população de salvaguardar o acesso sustentável a quantidades adequadas de água de qualidade para garantir meios de sobrevivência, o bem estar humano, o desenvolvimento socioeconômico; para assegurar proteção contra poluição e desastres relacionados à água, e para preservação de ecossistemas em um clima de paz e estabilidade política. (UN WATER, 2013, tradução de MELO; JOHNSSON, 2017MELO, M. C.; JOHNSSON, R. M. F. O conceito emergente de segurança hídrica. Sustentare, Três Corações, v. 1, n. 1, p.72-92, ago./dez. 2017. Disponível em: http://periodicos.unincor.br/index.php/sustentare/article/view/4325/pdf_5 . Acesso em 20 jan. 2019.
http://periodicos.unincor.br/index.php/s...
).

Essa formulação não demonstra, no entanto, uma condição inerente ao extrativismo minerário, que produz ou acarreta a desestruturação dos geossistemas em que ocorrem a concomitância entre aquíferos e formações minerais, especialmente, exemplificados pela mineração de ferro a céu aberto (RODRIGUES, 2015RODRIGUES, P. Mineração e o jogo dos sete erros. Entrevista especial com Paulo Rodrigues. Revista IUH On line, 2015. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/549486-mineracao-e-o-jogo-dos-sete-erros-entrevista-especial-com-paulo-rodrigues
http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/5...
).

Considerando que a mineração faz uso intensivo de água em seus processos e que ainda se apresenta como fonte de poluição, contaminação e degradação ambiental pode-se concluir que se trata de uma atividade promotora da escassez e da insegurança hídricas. Nesse sentido, as necessidades básicas por água de populações afetadas pelas transformações territoriais e ambientais, assim como a segurança coletiva e macrossistêmica, deveriam ser norteadoras de estratégias de governança do território em que se instalam os empreendimentos. Nessas estratégias, até mesmo para se tomar as decisões sobre empreendimentos que levarão a se desestruturar aquíferos e redes hídricas, podem ser incluídas fórmulas que mobilizem e efetivem a participação social, combatendo as tradicionais assimetrias de poder entre representantes setoriais em processos decisórios, considerando desde o planejamento, o licenciamento ambiental - e social, com o direito à não concessão de licenças - e a gestão de riscos, ameaças e consequências perversas das atividades. Ou, como defendem Galizoni e Ribeiro (2013GALIZONI, F. M.; RIBEIRO, E. M. Água, terra e família: uma etnografia dos recursos hídricos nas comunidades camponesas da Mantiqueira mineira. Rev. UFMG, Belo Horizonte, v. 20, n.2, p. 68-93, jul./dez., 2013.), pode-se aprender a traçar caminhos para a segurança hídrica com populações cujos saberes, normas e tradições sobre gestão de mananciais contribuirão para “criar inovações na governança, [e] formas de incluir populações marginalizadas nas decisões sobre os cuidados e partilhas das águas” (p. 70).

Essa condição, a propósito, se apresenta radicalmente oposta ao que ocorre no caso apresentado neste estudo: as comunidades no entorno da grande mina de ferro a céu aberto e a jusante da barragem de rejeitos foram excluídas dos processos de planejamento empresarial e público bem como foram alijadas no processo de discussão e decisão no licenciamento ambiental, permanecendo em situação de vulnerabilidade socioeconômica, de escassez e insegurança hídrica como demonstra o Boletim Informativo Cartografia da Cartografia Social: Atingidos pelo Projeto Minas-Rio: Comunidades a jusante da barragem de rejeitos (SANTOS, 2018).

2.1 Gestão de recursos hídricos, mineração e conflitos: a história e o contexto no século XXI

A gestão de recursos hídricos pode ser definida como “as práticas de coordenação e tomada de decisão contemplando diferentes atores envolvidos em formas contestadas de distribuição da água” (ZWARTEVEEN, 2015ZWARTEVEEN, M. Regulating water, ordering society. Practices and politics of water governance. (Conferência inaugural). Institute for Water Education, UNESCO/University of Amsterdam, Amsterdam, 2015., p. 18). Essa perspectiva implica que a resolução de conflitos relativos à água nunca pode se resumir à um exercício exclusivamente tecnocrático, mas precede sempre da necessidade de se considerar questões de poder e arranjos políticos (SOSA; ZWARTEVEEN, 2016SOSA, M.; ZWARTEVEEN, M. Questioning the effectiveness of planned conflict resolution strategies in water disputes between rural communities and mining companies in Peru. Water International, Londres/Inglaterra, v. 41, n. 3, p. 1-18, 2016.).

Os conflitos socioambientais, por sua vez, surgem a partir de desavenças e contestações entre diferentes grupos da sociedade e centrados na distribuição de recursos naturais, ou na alocação de riscos, e não podem ser resolvidos de maneira consensual entre todas as partes envolvidas (EDMUNDS; WOLLENBERG, 2001EDMUNDS, D.; WOLLENBERG, E. A strategic approach to multistakeholder negotiations. Development and Change, Den Haag/Holanda, v. 32, n. 2, p. 231-253, 2001.). Tais conflitos são representativos de processos políticos inadequados, mas também são sinais de problemas de ordem técnica envolvendo os atores responsáveis pela exploração dos recursos naturais (SOSA; ZWARTEVEEN, 2016SOSA, M.; ZWARTEVEEN, M. Questioning the effectiveness of planned conflict resolution strategies in water disputes between rural communities and mining companies in Peru. Water International, Londres/Inglaterra, v. 41, n. 3, p. 1-18, 2016.).

Jiménez, Molina e Le Deunff (2015JIMÉNEZ, A.; MOLINA, M. F.; LE DEUNFF, H. Indigenous Peoples and Industry Water Users: Mapping the Conflicts Worldwide. Aquatic Procedia, Estocolmo/Suécia, v. 5, p. 69-80, 2015.) fizeram um levantamento dos conflitos socioambientais ao redor do mundo no ano de 2014, constatando 384 ocorrências. Dentre elas, 185 (48%) foram categorizadas como tendo a água como motivo central da contenda. Destes conflitos relativos à água, 119 (31%) foram motivados por atividades mineradoras, sendo que 77 deles ocorreram na América Latina. Ou seja, dentre o total de 384 conflitos ambientais mapeados no mundo em 2014, 77 deles eram relativos à problemas hídricos decorrentes da mineração e ocorreram na América Latina (JIMÉNEZ et al., 2015JIMÉNEZ, A.; MOLINA, M. F.; LE DEUNFF, H. Indigenous Peoples and Industry Water Users: Mapping the Conflicts Worldwide. Aquatic Procedia, Estocolmo/Suécia, v. 5, p. 69-80, 2015.).

A partir da década de 1980, com a crescente representatividade dos movimentos ambientalistas, o sistema de gerenciamento dos recursos hídricos no Brasil passou por avanços, representados, em última instância, pela criação de dois dispositivos legislativos: a Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9.433, de 8 de janeiro de 1997) e a Agência Nacional de Águas - ANA (Lei 9.984, de 17 de julho de 2000) (TUNDISI, 2003TUNDISI, J. G. Água no Século XXI: Enfrentando a Escassez. São Carlos: RiMa, iiE, 2003., 2006).

Até estes derradeiros anos do Século XX, a gestão das águas no Brasil ainda era baseada no Código de Águas de 1934 que, à revelia de ser considerado um importante marco jurídico, acabava por privilegiar o aproveitamento hidrelétrico das águas, não sendo eficaz para mediar os crescentes conflitos em torno dos recursos hídricos que passaram a se intensificar a partir de meados do século passado. A intensificação dos processos de industrialização e urbanização representou um aumento de pressão sobre os corpos d’água que, frente à falta de estruturas (canalização de esgoto, universalidade da distribuição de água potável) e a lacunas na legislação pertinente, resultou na poluição e assoreamento de mananciais, secas, aumento no número de enchentes e conflitos de usos.

No entanto, Fonseca e Prado Filho (2006FONSECA, A. de F.; PRADO FILHO, J. F. Um importante episódio na história da gestão dos recursos hídricos no Brasil: O controle da Coroa portuguesa sobre o uso da água nas minas de ouro coloniais. RBRH - Revista Brasileira de Recursos Hídricos, Porto Alegre, v. 11, n. 3, p. 5-14, 2006.) mostram que a dinâmica descrita acima - qual seja: a de aumento da pressão por recursos hídricos -, de um lado, contrastando com dispositivos insuficientes de gestão das águas, de outro, antecedeu, e muito, os anos de 1950. De acordo com os autores, o conflito pela água no Brasil e a criação de legislações dedicadas ao tema está direta e umbilicalmente ligada às atividades de exploração mineral: a descoberta do ouro no Século XVII nos rios do que então viria a se tornar, em 1720, a Capitania de Minas Gerais significou um “(...) literal divisor de águas na história da relação dos colonos com as águas” (FONSECA; PRADO FILHO, 2006FONSECA, A. de F.; PRADO FILHO, J. F. Um importante episódio na história da gestão dos recursos hídricos no Brasil: O controle da Coroa portuguesa sobre o uso da água nas minas de ouro coloniais. RBRH - Revista Brasileira de Recursos Hídricos, Porto Alegre, v. 11, n. 3, p. 5-14, 2006., p. 6).

A dependência dos recursos hídricos era tamanha que, à época, era comum a percepção de que “sem água, de nada vale uma serra de ouro” (FERRAND, 1998FERRAND, P. O ouro em Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro/Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1998., p. 109). A partir da mineração, o valor dos rios cresceu, na medida em que estes passaram a indicar potencialmente a presença e a exploração do ouro e, portanto, se intensificou também o interesse e, logo, o conflito por suas águas (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1999).

Como maneira de solucionar tais conflitos, em 13 de maio de 1736, a Coroa Portuguesa buscou aumentar seus poderes sobre o controle do uso da água na Capitania de Minas Gerais. Uma legislação foi alinhavada no sentido de estabelecer os serviços das minas como tendo prioridade frente aos demais usos da água e “(...) só se permitiria o divertimento da água para os engenhos ou para as ‘hortas’ caso não houvesse demanda entre os mineiros” (FONSECA; PRADO FILHO, 2006FONSECA, A. de F.; PRADO FILHO, J. F. Um importante episódio na história da gestão dos recursos hídricos no Brasil: O controle da Coroa portuguesa sobre o uso da água nas minas de ouro coloniais. RBRH - Revista Brasileira de Recursos Hídricos, Porto Alegre, v. 11, n. 3, p. 5-14, 2006., p. 11).

Nessa seção do artigo, a ideia não é fazer uma reconstrução histórica exaustiva dos conflitos por água em decorrência da mineração e das respectivas legislações criadas como forma de mediar tais conflitos. Buscamos, apenas, apontar como a questão hídrica é fonte de uma verdadeira guerra de interesses há, pelo menos, quatro séculos no Brasil, tendo como uma de suas origens mais claras justamente a mineração e suas contendas pelas preferências do uso da água. Também é possível perceber como as legislações, além de estarem sempre atrasadas na busca por regulamentação dos usos, nem sempre mostram um interesse claro em garantir o acesso e uso da água à população em geral, como são os casos das leis de 1736 e 1934; não raramente pendiam para a proteção das atividades que garantiriam um maior “desenvolvimento” ao Brasil - mineração e hidrelétricas, por exemplo - em detrimento de outras, como o próprio consumo humano.

No Brasil, a criação da Política Nacional de Recursos Hídricos (1997) e a fundação da Agência Nacional de Águas - ANA (2000), uma autarquia federal vinculada ao Ministério do Meio-Ambiente, foram as duas principais medidas institucionais desde o Código de Águas de 1934, na direção de uma definição dos parâmetros de uso e regulamentação dos mananciais do país.

Foi com a Política Nacional de Recursos Hídricos que se reconheceu, pela primeira vez, que “em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação de animais” (BRASIL, 1997, Art. 1º), representando uma mudança de foco do usuário preferencial da água. Além disso, foi estabelecido que a água é um bem de domínio público e a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e participativa (BRASIL, 1997).

Outra mudança primordial foi a introdução da bacia hidrográfica como unidade central das legislações, uma concepção que permite passar o gerenciamento dos recursos hídricos de um sistema setorial, local e de resposta a crises e conflitos para um sistema integrado e preditivo, que busca antecipar potenciais demandas e, com isso, evitar impactos de maior monta (TUNDISI, 2003TUNDISI, J. G. Água no Século XXI: Enfrentando a Escassez. São Carlos: RiMa, iiE, 2003.). Devido à delimitação das bacias hidrográficas não coincidirem necessariamente com limites políticos municipais, estaduais ou mesmo nacionais, uma nova configuração institucional passou a ser necessária em termos de gestão: a gestão centrada em bacias hidrográficas demanda uma governança articulada entre os diversos níveis de poder (HUFSCHMIDT; MCCAULEY, 1986HUFSCHMIDT, M.; MCCAULEY, D. Strategies for Integrated Water Resources Management in a River/Lake Basin Context. Otsu/Nagoya: UNEP, UNCRD, ILEC, 1986.).

Em linhas gerais, a Política Nacional de Recursos Hídricos, por ter a bacia hidrográfica como unidade de gerenciamento (TUNDISI, 2006TUNDISI, J. G. Novas perspectivas para a gestão de recursos hídricos. Revista USP, São Paulo, v. 70, p. 24-35, 2006.) ofereceria a oportunidade para o desenvolvimento de parcerias e a resolução de conflitos; permitiria que a população local participasse dos processos de decisão e promoveria a integração institucional necessária para o gerenciamento do desenvolvimento sustentável.

Porém, os persistentes conflitos socioambientais em torno da água mostram que, mesmo após 20 anos de seu estabelecimento, nem sempre as diretrizes estipuladas pelo Plano Nacional de Recursos Hídricos têm a implementação garantida de modo completo e correto pela Agência Nacional de Águas (ANA). Esses conflitos socioambientais são aqui entendidos como a “(...) competição desigual por bens naturais, opondo práticas socioeconômicas e culturais tradicionais e, de outro, a indústria extrativa mineral” (SANTOS, 2012SANTOS, Rodrigo Salles Pereira dos. O projeto neoextrativista e a disputa por bens naturais no território: mineração, direitos e contestação social em torno da terra e da água. Conflitos no Campo/Comissão Pastoral da Terra, Goiânia, p. 75-87, 2012., p. 75).

Ao questionar a excessiva do governo brasileiro, bem como seu quase paternalismo para com a mineração (PIMENTEL; MESQUITA, 2015PIMENTEL, K. D. de A.; MESQUITA, L. I. S. O Plano Nacional de Mineração 2030 e a atividade mineradora em terras indígenas. In: InSURgência, Brasília, v. 1, n. 2, p. 379-398, 2015.), destaca-se que várias políticas voltadas para o setor, inclusive o Plano Nacional de Mineração 2030, formulado pelo Ministério de Minas e Energia - MME, têm natureza extremamente produtivista e estratégias autoritárias que se escondem sob o argumento do “interesse nacional” e representam crescente ameaça aos trabalhadores e sindicatos da área, bem como para movimentos sociais e ONGs, comunidades e famílias atingidas, populações indígenas e tradicionais.

Essa é uma tendência que só se acirrou nos últimos anos, mais especificamente, a partir de 2010, quando foi publicado o Plano Nacional de Mineração 2030. O objetivo do PMN - 2030 é “(...) nortear as políticas de médio e longo prazos que possam contribuir para que o setor mineral seja um alicerce para o desenvolvimento sustentável do País nos próximos 20 anos” (BRASIL, 2010, p. xiii), com isso lançando os alicerces para a elaboração de um novo Código de Mineração (PIMENTEL; MESQUITA, 2015PIMENTEL, K. D. de A.; MESQUITA, L. I. S. O Plano Nacional de Mineração 2030 e a atividade mineradora em terras indígenas. In: InSURgência, Brasília, v. 1, n. 2, p. 379-398, 2015.). A disputa por apropriação e uso dos recursos naturais, reconhecidos como comuns e coletivos, tais como terra e água, que já era acirrada no Brasil, vem - desde então - se intensificando e se estendendo em direção a territórios vulneráveis:

Uma questão preocupante é a necessidade apontada pelo MME [Ministério de Minas e Energia] do estabelecimento de diretrizes para a mineração em áreas com restrição legal, entre elas terras indígenas e quilombolas, áreas para a reforma agrária, sítios arqueológicos e fossíferos e reservas ambientais (PIMENTEL; MESQUITA, 2015PIMENTEL, K. D. de A.; MESQUITA, L. I. S. O Plano Nacional de Mineração 2030 e a atividade mineradora em terras indígenas. In: InSURgência, Brasília, v. 1, n. 2, p. 379-398, 2015., p. 381).

Em consonância com essa posição demarcada por Pimentel e Mesquita (2015PIMENTEL, K. D. de A.; MESQUITA, L. I. S. O Plano Nacional de Mineração 2030 e a atividade mineradora em terras indígenas. In: InSURgência, Brasília, v. 1, n. 2, p. 379-398, 2015.), Santos (2012SANTOS, Rodrigo Salles Pereira dos. O projeto neoextrativista e a disputa por bens naturais no território: mineração, direitos e contestação social em torno da terra e da água. Conflitos no Campo/Comissão Pastoral da Terra, Goiânia, p. 75-87, 2012.) alega que populações urbanas e rurais, tradicionais e indígenas, têm tido seus direitos tradicionais desrespeitados recorrentemente. Entre esses direitos fundamentais está o de acesso à água, uma vez que a indústria extrativa mineral incide diretamente sobre as fontes existentes de água nos territórios. Graves rupturas em comunidades, restrição de outras atividades econômicas potenciais e problemas relacionados ao meio-ambiente são fatores intrínsecos à mineração (BAKHEIT, 2005BAKHEIT, T. Mining & land access issues in South African mineral laws. In: CENTRE FOR ENERGY, PETROLEUM AND MINERAL LAW POLICY ANNUAL REVIEW, 9, 2005, Dundee/Escócia. Anais… Dundee: University of Dundee, 2005. p. 1-18.) e, portanto, consequências inevitáveis de todo esse processo de expansão das atividades extrativistas.

O cenário aqui exposto se desenrola, no entanto, sob a proteção de um Estado cujas bases econômicas estão amplamente ancoradas no projeto de extração mineral em grande escala. Tal contexto gera uma relação dúbia, para dizer o mínimo, entre poder público e as empresas mineradoras, na qual, o primeiro frequentemente se posiciona ao lado das segundas em detrimento da participação cidadã e da observância dos princípios constitucionais mais básicos (PIMENTEL; MESQUITA, 2015PIMENTEL, K. D. de A.; MESQUITA, L. I. S. O Plano Nacional de Mineração 2030 e a atividade mineradora em terras indígenas. In: InSURgência, Brasília, v. 1, n. 2, p. 379-398, 2015.). Nesse contexto, desrespeita-se também o desejado equilíbrio entre desenvolvimento, que deve estar além do mero crescimento econômico, e o planejamento ecológico7 7 . Destaca-se dentre as ferramentas de gestão territorial o processo, também institucionalizado, de planejamento por meio do Zoneamento Ecológico-econômico (ZEE), “instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente regulamentado pelo decreto nº 4.297/2002” (Brasil, 2017, http://www.mma.gov.br/gestao-territorial/zoneamento-territorial). , colocando sob ameaça o futuro sustentável do território brasileiro.

Uma das maiores fontes de recursos ambientais e riqueza social objeto dessa ameaça é, justamente, a dos recursos hídricos, uma vez que as indústrias de extração mineral extraem os aquíferos, rebaixam e contaminam os lençóis freáticos e dependem, em grande medida, da alteração de cursos d’água em áreas imediatas aos complexos minerários, o que também tende a acarretar fortes impactos aos níveis freáticos - primordiais para a sobrevivência das bacias hidrográficas. Além disso, a água também participa com importância central dos processos de explotação8 8 . “Explotação” é um termo técnico usado para referir-se à retirada, extração ou obtenção de recursos naturais, geralmente não renováveis. e, especialmente, do beneficiamento de minerais. Em alguns casos, como em processos de separação magnética a úmido, a água é requerida não só em quantidade elevada, mas também em alta qualidade, buscando-se, muitas vezes, cursos d’água próximos a nascentes. Quando dispostas ou eliminadas de volta à natureza apresentam, em significativa parte concentrações residuais superiores àquelas recomendadas para o uso corriqueiro do ser humano ou mesmo ameaças de contaminação do meio ambiente (SANTOS, 2012SANTOS, Rodrigo Salles Pereira dos. O projeto neoextrativista e a disputa por bens naturais no território: mineração, direitos e contestação social em torno da terra e da água. Conflitos no Campo/Comissão Pastoral da Terra, Goiânia, p. 75-87, 2012.).

A configuração da articulação entre poder público e iniciativa privada contribui para a cristalização da crença antiga de que a mineração tem prioridade sobre as demais atividades econômicas. Esse “preceito da prioridade da mineração” se assenta no vínculo entre os supostos benefícios econômicos da mineração e os interesses da Nação e da sociedade, definidos como “públicos” - exclusiva e arbitrariamente pelo próprio Estado (MILANEZ, 2012MILANEZ, B. O novo marco legal da mineração: contexto, mitos e riscos. In: MALERBA, J.; MILANEZ, B.; WANDERLEY, L. J. (Org.). Novo Marco Legal da Mineração no Brasil: Para quê? Para quem?. Rio de Janeiro: FASE., Cap. 1, p. 19-91, 2012.) e consiste no cerne dos conflitos envolvendo recursos hídricos, mineração e território.

3 Metodologia

Este artigo representa um fragmento da realidade multidimensional que caracteriza o contexto em que se implanta um empreendimento minerário em determinado território. Nesse sentido, o aqui apresentado se constitui como um recorte de pesquisa mais ampla realizada pelo Grupo de Pesquisa Multidisciplinar sobre Mineração e Governança Territorial.

A pesquisa participativa geradora do estudo de caso (YIN, 2005YIN, R. K. Estudos de casos: planejamento e métodos. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.; NUMAGAMI, 1998NUMAGAMI, T. The infeasibility of invariant laws in management studies: a reflective dialogue in defense of Case Studies. Organization Science, Catonsville/EUA, v. 9, n. 1, 1-15, 1998.; DRESCH; LACERDA; MIGUEL, 2015DRESCH, A.; LACERDA, D. P.; MIGUEL, P. A. C. Uma Análise Distintiva entre o Estudo de Caso, a Pesquisa-Ação e a Design Science Research. RBGN - Revista Brasileira de Gestão de Negócios, São Paulo, v. 17, n. 56, p. 1116-1133, Abr./Jun. 2015.) aqui apresentado se desenvolveu na perspectiva qualitativa, baseada em análise documental, entrevistas e, principalmente, acompanhamento de processos em reuniões públicas no sistema de licenciamento ambiental do estado de Minas Gerais. Conforme mencionado anteriormente, este trabalho faz parte de uma pesquisa ampla, desenvolvida desde 2010, quando foram aplicadas as técnicas de diagnóstico rápido participativo (DRP) para o mapeamento preliminar das comunidades (BROSE, 2001BROSE, M. Metodologia Participativa: uma introdução a 29 instrumentos. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2001.; GOMES, SOUZA; CARVALHO, 2001GOMES, M. A. O. Diagnóstico Rápido Participativo (DRP) como mitigador de impactos socioeconômicos negativos em empreendimentos agropecuários. In: BROSE, M. (Org.). Metodologia Participativa - uma introdução a 29 instrumentos. Porto Alegre: Tomo Editorial, Cap. 6, p. 63-78, 2001.; FARIA; FERREIRA NETO, 2006FARIA, A. A. da C.; FERREIRA NETO, P. S. Ferramentas do diálogo - qualificando o uso das técnicas do DRP: diagnóstico rural participativo. Brasília: Ministério do Meio Ambiente/Instituto Internacional de Educação do Brasil, 2006.; VERDEJO, 2010VERDEJO, M. E. Diagnóstico rural participativo: guia prático DRP. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário/Secretaria da Agricultura Familiar, 2010.; FREITAS; FREITAS; DIAS, 2012FREITAS, A. F. de; FREITAS, A. F.de; DIAS, M. M. O uso do diagnóstico rápido participativo (DRP) como metodologia de projetos de extensão universitária. Em Extensão, Uberlândia v. 11, n. 2, 69-81, 2012.). O que distingue o DRP é a possibilidade de promover o autoconhecimento, a reelaboração da história e das trajetórias familiares das pessoas do lugar. A adoção de técnicas para realizar o DRP como, por exemplo, mapa mental, linha do tempo, caminhada transversal, diagrama de Venn, oportuniza a verbalização e a representação das relações de poder estabelecidas, a identificação dos sujeitos com a história coletiva, a problematização de conflitos vivenciados pelo grupo participante e, por conseguinte, o conhecimento, a conscientização e a valorização das escolhas de interesse da comunidade.

Em outras palavras, as técnicas de pesquisa-ação para diagnósticos e problematização sobre impactos e conflitos ambientais com a participação direta dos atingidos, demonstraram potencial para gerar conhecimentos e mobilizar o coletivo para formular proposições e encaminhamentos de suas demandas. Ao longo da pesquisa, ampliou-se o escopo das ferramentas de diagnóstico socioambiental devido à polarização de interesses e atores. Nesse sentido, as críticas clássicas à noção de sustentabilidade (FREY, 2001FREY, K. A dimensão político-democrática nas teorias de desenvolvimento sustentável e suas implicações para a gestão local. Ambiente & Sociedade, Campinas, v. 4, n. 9, 115-148, 2001.) e os impactos de empreendimentos mineradores (FERNANDES; ENRIQUEZ; ALAMINO, 2011) de grande porte, estimularam a tentativa de combinar técnicas de diagnóstico com perfil estratégico, como apresentados por especialistas em cenários prospectivos como Godet (2000GODET, M. A “caixa de ferramentas” da prospectiva estratégica: problemas e métodos. Lisboa: CEPES, 2000.).

Ao se identificar a preponderância dos interesses técnico-econômicos do empreendimento minerário sobre demandas de comunidades atingidas e não reconhecidas pelos atores institucionais envolvidos no licenciamento ambiental, o objetivo de investigar sobre a participação popular para a construção dos cenários deixou de ser coerente, posto que os conflitos ambientais tomaram a centralidade do processo. A equipe de pesquisa pautou-se, então, pelo estudo documental com o acompanhamento dos movimentos dos atingidos em seus enfrentamentos com a empresa e com órgãos do Estado nos processos administrativos quando manifestavam-se conflitos decorrentes de decisões tomadas sobre o empreendimento.

As diversas fases da pesquisa de campo envolveram, além das dinâmicas participativas com os núcleos habitacionais dos distritos atingidos pelo empreendimento - nas comunidades de São Sebastião do Bom Sucesso, ou Sapo, como Água Santa, Mumbuca e Ferrugem; Turco, Cabeceira do Turco, Beco, Água Quente composta pelas famílias dos Faustinos, Gramixá, Cachoeira, Teodoros, e do Gondó -, o acompanhamento das reuniões e audiências públicas (mais de uma dezena) e, em específico, das 12 reuniões da Rede de Acompanhamento Socioambiental do Projeto Minas-Rio - REASA9 9 . Em maio de 2012, a Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais do Ministério Público de Minas Gerais criou, após audiências conjuntas das demandas das comunidades atingidas, a REASA - Rede de Acompanhamento Socioambiental do Projeto Minas-Rio. O objetivo principal era realizar reuniões mensais itinerantes naquelas comunidades para que se pudesse registrar denúncias e, supostamente, tomar decisões de impetrar medidas judiciais em defesa da população vulnerável que ali se encontrava em conflito contínuo. Mas, após reconhecer a inação do MPMG, os atingidos optaram por se declararem independentes da tutela e recriaram seu movimento com o nome de REAJA - Rede de Articulação e Justiça Ambiental dos Atingidos pelo Projeto Minas-Rio. , instituída pelo Ministério Público de Minas Gerais (PRATES, 2014PRATES, C. G. Mineração em Conceição do Mato Dentro: uma análise da REASA como instância de ‘resolução’ de conflito. 2014. 80 f. Monografia (Graduação) - Departamento de Ciências Socioambientais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014.) e, a partir de 2014, o acompanhamento do movimento social dos atingidos, REAJA - Rede de Articulação e Justiça dos Atingidos pelo Projeto Minas-Rio. Vale ressaltar que o movimento REAJA abrange as questões relativas à apropriação do território, ao licenciamento ambiental, à reestruturação fundiária, ao reassentamento dos atingidos reconhecidos e à luta por reconhecimento dos demais, bem como à questão da disponibilidade e acesso à água de qualidade como já estabelecido em medidas condicionantes legais.

Este artigo representa um fragmento da realidade multidimensional que caracteriza o contexto em que se implanta um empreendimento minerário em determinado território. A discussão contempla a relação entre as comunidades em seu território e as formas de acesso e uso da água a partir da implantação do projeto Minas-Rio, de exploração mineral de ferro a céu aberto, o qual instalou a pilha de estéril e a barragem de rejeitos sobre nascentes nos cursos d’água que abastecem as populações a jusante.

4 O empreendimento Minas-Rio e os impactos sobre as comunidades a jusante

O Projeto Minas-Rio foi concebido como um mega sistema que envolve três estruturas: a mina, com mais de 12 km de extensão nas Serras do Sapo e Ferrugem, nas fronteiras dos municípios de Conceição do Mato Dentro, Alvorada de Minas e Dom Joaquim, na região do Médio Espinhaço; um mineroduto de 529 km, passando por 25 municípios mineiros e sete no Rio de Janeiro; e o Porto do Açu, em São João da Barra/RJ. O discurso empresarial revela um marco na integração logística entre mina e porto-exportação. Para as populações atingidas, o empreendimento traz deslocamentos, reassentamentos, escassez de água, degradação ambiental, problemas decorrentes das escolhas tecnológicas de extração, beneficiamento a úmido e transporte por mineroduto que impactam os ciclos de produção e uso das águas e das terras produtivas.

Os processos de concessão de licenças ambientais do grande empreendimento foram fragmentados e recheados de problemas de ordens legais e operacionais, sem análise estratégica e integrada de impactos ambientais. Como demonstram vários estudos (BECKER; PEREIRA, 2011BECKER, L. C.; PEREIRA, D. de C. O projeto Minas-Rio e o desafio do desenvolvimento territorial integrado e sustentável: a grande mina em Conceição do Mato Dentro. In: FERNANDES, F. R. C.; ENRIQUEZ, M. A. R. da S.; ALAMINO, R. de C. J. (Ed.). Recursos Minerais & Sustentabilidade Territorial: Grandes Minas, Vol. 1. Rio de Janeiro: CETEM/MCTI, 2011. Cap. 10, p. 229-258.; PEREIRA; PEREIRA, 2012; PEREIRA et al., 2013a, 2013b; PEREIRA et al., 2015; ZHOURI, 2014ZHOURI, A. Mapeando desigualdades ambientais: mineração e desregulação ambiental. In: ZHOURI, A.; VALENCIO, N. (Org.). Formas de matar, de morrer e de resistir: limites da resolução negociada de conflitos ambientais. Belo Horizonte: UFMG, p. 111-142, 2014.; SANTOS, 2014SANTOS, A. F. M. Não se pode proibir comprar e vender terras: Terras de ocupação tradicional em contexto de grandes empreendimentos. In: ZHOURI, A.; VALENCIO, N. (Org.). Formas de matar, de morrer e de resistir: limites da resolução negociada de conflitos ambientais. Belo Horizonte: UFMG, Cap. 6, p. 143-166, 2014.), o que gera conflitos envolve: as questões fundiárias, com deslocamentos e reassentamentos de parte das comunidades atingidas, mas com distintos critérios e formas de negociação, com contratos parcialmente (des)cumpridos e geradores de insegurança e instabilidade das famílias; as condições hídricas, com extinção de cursos d’água, rebaixamento de lençol freático, poluição, contaminação de córregos na malha hídrica local; a violação de direitos humanos como registrado via Defensoria e Ministério Público Estadual; a fragilização e rupturas de laços familiares e comunitários, decorrentes das fórmulas de intervenção e relacionamento da empresa com os atingidos. As comunidades do Passa Sete e da Água Quente, que abrangem vários núcleos familiares como os Faustinos, localizam-se entre os dois córregos Pereira/Vargem Grande e Passa Sete (em azul na Figura 1).

Figura 1
Estruturas do Minas-Rio, comunidades e cursos d’água afetados

A imprensa porta-voz da empresa e de seus interesses realça o lado econômico de geração de empregos diretos e indiretos e da circulação de capital com o aquecimento do comércio local naquelas cidades. Sobre os problemas locais, as notícias são basicamente as de acusação, responsabilização dos atingidos que demandam rigor e legalidade no cumprimento das ações de implementação do empreendimento e da gestão dos seus impactos.

Ao longo dos anos em que se enfrentava o processo de licenciamento ambiental, duas questões significativas marcam a repetição das denúncias de não conformidade de situações supostamente reguladas: a reestruturação e as negociações fundiárias (ZHOURI, 2014ZHOURI, A. Mapeando desigualdades ambientais: mineração e desregulação ambiental. In: ZHOURI, A.; VALENCIO, N. (Org.). Formas de matar, de morrer e de resistir: limites da resolução negociada de conflitos ambientais. Belo Horizonte: UFMG, p. 111-142, 2014.; SANTOS, 2014SANTOS, A. F. M. Não se pode proibir comprar e vender terras: Terras de ocupação tradicional em contexto de grandes empreendimentos. In: ZHOURI, A.; VALENCIO, N. (Org.). Formas de matar, de morrer e de resistir: limites da resolução negociada de conflitos ambientais. Belo Horizonte: UFMG, Cap. 6, p. 143-166, 2014.) e a gestão das águas que servem às comunidades nas microbacias dos Córregos Passa Sete e Pereira (PRATES, 2014PRATES, C. G. Mineração em Conceição do Mato Dentro: uma análise da REASA como instância de ‘resolução’ de conflito. 2014. 80 f. Monografia (Graduação) - Departamento de Ciências Socioambientais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014.). A REASA - Rede de Acompanhamento Socioambiental do Projeto Minas-Rio, criada numa ação conjunta dos Ministérios Públicos Estadual, Federal e Defensoria Pública de MG, foi a mais cruel das testemunhas mensais das condições subumanas a que os moradores locais foram submetidos. Repetidamente, mês a mês, os atingidos expunham seus problemas na expectativa de que as oitivas públicas fossem capazes de reverter o quadro de conflitos com as soluções dos problemas de reconhecimento das condições das famílias atingidas e as proposições para reassentamento e indenizações conforme as exigências de reestruturação fundiária impostas pela entrada da mineração em seus territórios.

Conforme estudos de Zhouri (2014ZHOURI, A. Mapeando desigualdades ambientais: mineração e desregulação ambiental. In: ZHOURI, A.; VALENCIO, N. (Org.). Formas de matar, de morrer e de resistir: limites da resolução negociada de conflitos ambientais. Belo Horizonte: UFMG, p. 111-142, 2014.) e Pereira et al. (2015PEREIRA, D. de C.; SANTOS, E. K. dos; GUERRA, P. G. Desenvolvimento, mineração e comunidades atingidas: a face visível dos conflitos socioambientais. In: II SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE DIREITOS HUMANOS, 2015, Juiz de Fora. Anais... Juiz de Fora: UFJF, 2015.), nenhuma ação efetiva, por parte das autoridades, foi deflagrada para combater as injustiças e reparar os danos vivenciados nas comunidades. Após um ano de denúncias repetidas, registravam-se: o não reconhecimento da condição de atingido, impossibilidade de continuação de plantios e de criação de animais por falta de água, assoreamento, contaminação e redução de volume de água no córrego, secamento de nascentes, poeira, barulho, negociações fraudulentas, fragmentação de procedimentos, descumprimento de normas técnicas e leis etc. Da parte da empresa, ouviu-se o mesmo discurso que acompanha a maioria dos pareceres e laudos favoráveis ao empreendimento e aos seus procedimentos técnico-gerenciais. O argumento central era de tom burocrático, chamando à cena as noções lineares e normativas da racionalidade técnico-econômica. Representantes da empresa e os conselheiros corroboravam os argumentos de que se o Estudo de Impacto Ambiental aprovado com a Licença Prévia não indicava a localização de famílias naqueles determinados territórios, sequer reconhecia existência da comunidade da Água Quente; se não foram identificados impactos sobre cursos d’água em torno dos quais não se identificavam moradores; se a barragem localizada a montante da comunidade era projetada para ter segurança, as comunidades a jusante não precisavam temer. Bastaria acreditar que o “medo de ruptura era psicológico”, conforme repetido por gerente da empresa em reuniões com atingidos (MINAS GERAIS, 2012). Aprofundava-se então, a concepção e a condição de deslocamento in situ, quando em seu lugar o sujeito não é mais capaz de garantir a sustentação de seu modo de vida, de sua produção. O depoimento a seguir ilustra o descaso da empresa com a população nativa e os recursos hídricos do território.

Até hoje a Anglo não sabe, para vir na frente do povo e falar nada. Eu quero saber quando que a água do córrego Pereira e do Passa Sete vão ser limpas, porque aquela resposta que foi dada a recomendação da promotoria pública é outra maquiagem. Ah tá sendo feito projeto, ah tá sendo feito implantação, é que dia que a água vai ser limpa, que desde 2009 tá suja, que até hoje não deu para fazer um estudo, que até hoje não consegue falar uma data para a gente. E a Anglo falou o que para o povo? O que? (...). (Atingida, 64, transcrição áudio 3ª REASA, em agosto/2012, Itapanhoaganga-MG, arquivo GESTA) (PRATES, 2014PRATES, C. G. Mineração em Conceição do Mato Dentro: uma análise da REASA como instância de ‘resolução’ de conflito. 2014. 80 f. Monografia (Graduação) - Departamento de Ciências Socioambientais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014.).

Em registro realizado no dia 24/maio/2017, durante visita de campo à comunidade de Água Quente, foi possível observar a permanência das características da água no córrego Passa Sete, no entorno das casas, que sugerem a impropriedade para uso humano e para animais, conforme mostra a figura 2 a seguir.

Figura 2
Águas do Córrego Passa Sete e fossa no quintal da Água Quente

A instalação de fossas sépticas nos quintais das casas, bem como a instalação de duas caixas d’água, abastecidas por caminhões pipas da empresa, para satisfazer a demanda de todos os moradores da comunidade, gerou polêmicas intermináveis. A água da caixa deveria ser distribuída por mangueiras em redes colocadas pelas próprias famílias. Banheiros e as fossas sépticas foram construídos sem a aceitação plena dos moradores, especialmente, pela imposição de padrões não reconhecidos. Ademais, duas ocorrências de mortandade de peixes também marcam essas comunidades:

A constatação da morte dos peixes aconteceu no dia 15 de junho e de acordo com moradores da região, já havia poucas espécies de peixes no trecho mencionado. “Agora o rio está morto de vez”, afirma Dona Maria da Consolação, que mora às margens do córrego. Não é a primeira vez que isso acontece. Em 2014, antes mesmo de obter a Licença de Operação do empreendimento foram registrados grande número de peixes, galinhas e até gados mortos por beberem a água do Córrego (FALA CHICO, 20/06/2017).

No núcleo familiar dos Faustinos, próximo à Água Quente, a situação não se mostra muito diferente. A água fornecida pela Prefeitura para suprir as necessidades após a perda da nascente e de seu fluxo também não chega em condições de garantida potabilidade.

Os órgãos públicos, no entanto, apresentam-se condescendentes com a empresa, como oficializado pela Prefeitura de Conceição do Mato Dentro, por meio da Secretaria do Meio Ambiente e Gestão Urbana, no documento Relatório Situacional 001/2017 - Comunidade dos Faustinos, quando apresentam à sociedade a justificativa da Anglo American que “se exime da responsabilidade de adequação de abastecimento da referida comunidade alegando que ela não é diretamente atingida por nenhuma ação da empresa e que a área de drenagem da sub-bacia de abastecimento não sofreu nenhuma interferência direta do empreendimento.” Na argumentação da empresa, “não existem estudos que comprovem que a empresa e os poços perfurados na região, teriam afetado o nível do lençol freático, diminuindo assim a vazão na nascente” (CONCEIÇÃO DO MATO DENTRO, 2017).

As relações entre a interferência da empresa no território e a gestão ambiental se refletem também nos inquéritos civis em andamento, sistematizados pelo Coletivo Margarida Alves (2017) no Dossiê sobre Violação do Direito Humano à água. Dentre os inquéritos analisados, destacaram-se seis, diretamente vinculados à correlação mineração x água, sendo assim resumidos os seus conteúdos:

  • - Outorga - utilização de água subterrânea - Rebaixamento de água - Projeto Minas Rio;

  • - Mortandade de peixes - Córrego Passa Sete - Barragem de Rejeitos;

  • - Comunidade Gondó - explosões na Serra da Ferrugem - assoreamento e poluição dos cursos d’água;

  • - Medidas de segurança - barragem de rejeitos - Minas Rio;

  • - Subsistência - falta de acesso à água - abastecimento irregular e precário - Prefeitura Municipal;

  • - Subsistência - falta de acesso à água - abastecimento irregular e precário - Prefeitura Municipal.

Os dois inquéritos que envolvem a Prefeitura dizem respeito a diferentes consequências das atividades da mineradora. Um denuncia deslizamento de terra sobre cursos d’água; o outro denuncia a escassez de água decorrente da construção das pilhas de estéril e barragens acima das nascentes e também a precariedade no fornecimento de água para uso humano por meio de caminhões pipa a serviço da Prefeitura de Conceição do Mato Dentro.

Apesar dos avanços na legislação brasileira no tocante à gestão dos recursos hídricos, especialmente nas últimas três décadas (TUNDISI, 2003TUNDISI, J. G. Água no Século XXI: Enfrentando a Escassez. São Carlos: RiMa, iiE, 2003.; 2006), problemas ainda persistem quando se fala na resolução de conflitos socioambientais de modo a contemplar os anseios de todos os atores envolvidos (SOSA; ZWARTEVEEN, 2016SOSA, M.; ZWARTEVEEN, M. Questioning the effectiveness of planned conflict resolution strategies in water disputes between rural communities and mining companies in Peru. Water International, Londres/Inglaterra, v. 41, n. 3, p. 1-18, 2016.). Tal relação escancara os conflitos entre empresas mineradoras e comunidades tradicionais envolvendo o acesso à água e corrobora a posição defendida por Pimentel e Mesquita (2015PIMENTEL, K. D. de A.; MESQUITA, L. I. S. O Plano Nacional de Mineração 2030 e a atividade mineradora em terras indígenas. In: InSURgência, Brasília, v. 1, n. 2, p. 379-398, 2015., p. 394-395), a de que “o Estado Brasileiro toma partido a favor das empresas em detrimento da participação cidadã e da observância dos princípios constitucionais mais básicos”. O discurso tecnocrático praticado por parte das empresas mineradoras, e fortemente corroborado pelo poder público, atua como “cortina de fumaça”, que obscurece relações de poder e arranjos políticos que estão no seio dos conflitos ambientais (ACOSTA, 2016ACOSTA, A. Extrativismo e neoextrativismo - duas faces da mesma maldição. In: DILGER, G.; LANG, M.; PEREIRA FILHO, J. (Orgs.) Descolonizar o imaginário.Debates sobre o pós-extrativismo e alternativas ao desenvolvimento.São Paulo: Fundação Rosa Luxemburgo, 2016.; ADLER et al., 2007ADLER, R. A; CLAASSEN, M.; GODFREY, L. e TURTON, A. R. Water, mining, and waste: an historical and economic perspective on conflict management in South Africa. The Economics of Peace and Security Journal, ISSN 1749-852X © www.epsjournal.org.uk - Vol. 2, No. 2, 2007.; JIMÉNEZ et al., 2015JIMÉNEZ, A.; MOLINA, M. F.; LE DEUNFF, H. Indigenous Peoples and Industry Water Users: Mapping the Conflicts Worldwide. Aquatic Procedia, Estocolmo/Suécia, v. 5, p. 69-80, 2015.; PIMENTEL; MESQUITA, 2015PIMENTEL, K. D. de A.; MESQUITA, L. I. S. O Plano Nacional de Mineração 2030 e a atividade mineradora em terras indígenas. In: InSURgência, Brasília, v. 1, n. 2, p. 379-398, 2015.).

Considerações finais

Ao tentar sistematizar elementos sobre as irresponsabilidades nos processos de licenciamento ambiental e implantação do projeto Minas-Rio, identificam-se visões antagônicas dos diferentes atores envolvidos. Os pareceres especializados e os argumentos empresariais e de técnicos do sistema político de licenciamento atuam no sentido de realçar os impactos considerados positivos, como o aquecimento da economia local, e desqualificar as condições de vida e as demandas da população atingida. As situações de vulnerabilidade em que se encontram os moradores das comunidades aqui mencionadas - especialmente por estarem abaixo da barragem de rejeitos e por estarem sem acesso à água adequada ao consumo - levam à recomendação de imediata inserção das famílias nos processos de reestruturação e negociação fundiária, ou seja, de reassentamento coletivo. Essa questão tem sido, literalmente, desconsiderada pela empresa de mineração e pelos representantes do Estado. Ademais, pode-se identificar a continuidade de um modus operandi que demonstra a inequívoca dominação da mineração, ou da economia extrativa mineral, sobre as decisões estratégicas relativas à água, secundarizando as demandas populacionais. A despeito de regulações institucionais, o que se constata é que os interesses empresariais diluem e deformam a legislação reguladora do uso dos recursos hídricos, ao mesmo tempo em que suas ações produzem violações de direitos humanos, à água e ao meio ambiente de qualidade. Registra-se, ainda, o envelhecimento das tecnologias da mineração dependentes de grandes volumes de água, destrutivas de aquíferos, lençóis freáticos e cursos d’água, que predominam no estado de Minas Gerais. A situação continua se agravando com o sistema de transporte por mineroduto que, além de demandar elevados percentuais de outorgas de água para um único empreendimento, deixa seu rastro de destruição nas propriedades rurais recortadas pelas áreas de servidão e pela interferência negativa na geografia e nas paisagens locais.

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  • 1
    . Nossos agradecimentos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG pelo apoio na elaboração deste artigo.
  • 7
    . Destaca-se dentre as ferramentas de gestão territorial o processo, também institucionalizado, de planejamento por meio do Zoneamento Ecológico-econômico (ZEE), “instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente regulamentado pelo decreto nº 4.297/2002” (Brasil, 2017, http://www.mma.gov.br/gestao-territorial/zoneamento-territorial).
  • 8
    . “Explotação” é um termo técnico usado para referir-se à retirada, extração ou obtenção de recursos naturais, geralmente não renováveis.
  • 9
    . Em maio de 2012, a Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais do Ministério Público de Minas Gerais criou, após audiências conjuntas das demandas das comunidades atingidas, a REASA - Rede de Acompanhamento Socioambiental do Projeto Minas-Rio. O objetivo principal era realizar reuniões mensais itinerantes naquelas comunidades para que se pudesse registrar denúncias e, supostamente, tomar decisões de impetrar medidas judiciais em defesa da população vulnerável que ali se encontrava em conflito contínuo. Mas, após reconhecer a inação do MPMG, os atingidos optaram por se declararem independentes da tutela e recriaram seu movimento com o nome de REAJA - Rede de Articulação e Justiça Ambiental dos Atingidos pelo Projeto Minas-Rio.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    23 Jan 2018
  • Aceito
    01 Abr 2019
ANPPAS - Revista Ambiente e Sociedade Anppas / Revista Ambiente e Sociedade - São Paulo - SP - Brazil
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