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Hibridização e gêneros do discurso em Recife frio, de Kleber Mendonça Filho

RESUMO

Neste trabalho, proponho uma leitura de aspectos discursivos do curta-metragem de ficção Recife frio (2009), de Kleber Mendonça Filho, com o objetivo de refletir sobre como a hibridização de gêneros na obra, decorrente da presença de gêneros intercalados no filme, cria sentidos e provoca determinada postura na interlocução com os espectadores. Para tanto, discuto alguns conceitos-chave da teoria bakhtiniana, descrevo momentos específicos do curta-metragem e proponho análises pontuais de determinadas cenas ou sequências. A forma de diálogo com o corpus segue os pressupostos da poética sociológica que perpassa as discussões empreendidas por Bakhtin e pelos demais pesquisadores do(s) Círculo(s). As reflexões apresentadas apontam para um jogo de cena entre ficção e realidade, que, no curta, são acionados pela presença de elementos que podem ser associados ao gênero documentário.

PALAVRAS-CHAVE:
Recife frio; Hibridização; Gêneros intercalados

ABSTRACT

This paper proposes a reading of discursive aspects in Recife Frio (2009), a short film by Kleber Mendonça Filho. It aims at reflecting on how genre hybridization, which results from the presence of incorporated genres, creates meanings and provokes certain attitudes in the interaction between film and spectators. To do so, I discuss some key concepts of Bakhtinian theory, describe specific moments of the short film, and finally conduct a pointed analysis of specific scenes or sequences. This form of dialogue with the corpus follows the assumptions of the sociological poetics that traverse the discussions done by Bakhtin and the other researchers of the Circle(s). These reflections point to a play between fiction and reality, which in the film is triggered by the presence of elements that may be associated to the documentary genre.

KEYWORDS:
Recife Frio; Hybridization; Incorporated genres

Sequência de abertura

A obra de Kleber Mendonça Filho tem sido objeto de atenção de público e da crítica no Brasil e no exterior. Em 2019, seu longa-metragem Bacurau, dirigido em parceria com Juliano Dornelles, ganhou o prêmio do júri em Cannes e de melhor filme no festival de Munique. Antes disso, a carreira desse diretor pernambucano já se consolidara com longas-metragens como Aquarius (2016) e O som ao redor (2013), e com premiados curtas-metragens como Vinil verde (2014), Eletrodoméstica (2005) e Recife frio (2009)1 1 Fonte:[http://www.adorocinema.com/personalidades/personalidade-146744/]. Acesso em: 02 jul. 2019 .

Neste trabalho, de diretriz teórica amparada nos estudos bakhtinianos, o objetivo é refletir sobre uma possível hibridização de gêneros no curta-metragem2 2 A definição de curta-metragem não é estável. Opto por essa designação e não pela classificação da obra como média-metragem, o que seria mais adequado pela regulamentação da ANCINE, disponível em [https://www.ancine.gov.br/media/passoapasso/RegistroObraCPB.pdf]. Acesso em 10 jul. 2019. Minha opção segue a cadeia discursiva sobre a obra, que foi premiada como curta-metragem em diversos festivais. Recife frio, de modo a ressaltar como esse recurso discursivo contribui para a construção do sentido dessa obra, um importante elo na cadeia discursiva de Kleber Mendonça Filho, em que a ficção dialoga com embates sociais, históricos e ideológicos de uma existência que “não apenas é refletida no signo, mas também é refratada nele” (VOLÓCHINOV, 2017VOLÓCHINOV, V. (Círculo de Bakhtin). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução, notas e glossário Sheila Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Ensaio introdutório Sheila Grillo. São Paulo: Editora 34, 2017., p.112). As referências a esse curta disponíveis na internet trazem uma variedade de classificações quanto ao seu gênero fílmico (ficção científica, comédia, documentário, entre outros) que pode ser resultante dessa hibridização.

O percurso apresentado será o seguinte: a) discussão de conceitos teóricos fundamentais para a proposta de leitura dessa obra como um enunciado concreto que compõe a cadeia discursiva das produções de Mendonça Filho; b) breve sinopse do curta-metragem, com destaque para sua classificação quanto ao gênero fílmico nas esferas em que circula, intercalada pela descrição detalhada de momentos-chave para as análises e c) análise de algumas cenas-chave e dos momentos em que há aparente transição de um gênero do discurso para outro, já que apresento a proposta de que a hibridização de gêneros em Recife frio é um fator-chave para a construção de seus sentidos. Essas etapas do percurso não são completamente estanques e se interpenetram, dialogicamente.

Destaco que a indicação de minutagem das cenas que serão citadas segue a versão disponível no site Porta Curtas ([http://portacurtas.org.br/]. Acesso em: 10 jul. 2019). O padrão utilizado (00min0s) segue as especificações do Inmetro ([http://www.inmetro.gov.br/consumidor/unidLegaisMed.asp#tempo]. Acesso em 16 jul. 2019).

1 Gêneros do discurso, gêneros intercalados, hibridização

Entre a explicitação de bases teóricas para uma análise dialógica de qualquer enunciado concreto e o próprio enunciado concreto que se pretende analisar não pode haver um abismo, como se a teoria fosse externa ao imbricamento entre o olhar do pesquisador e seu outro. Por isso, nesta seção explicito, dentro dos limites de um artigo, alguns conceitos teóricos em diálogo com a contextualização dos dados que serão analisados.

Assim como acontece com obras na literatura, a classificação de filmes em gêneros confunde-se com a própria história do campo. Nesse sentido, o crítico cinematográfico inglês Edward Buscombe (2005)BUSCOMBE, E. A ideia de gênero no cinema americano. Tradução de Tomás Rosa Bueno. In: RAMOS, F. (Org.). Teoria contemporânea do cinema II: documentário e narratividade ficcional. São Paulo: Editora SENAC, 2005. p.303-318. traça um paralelo entre o uso do termo gêneros na literatura e no cinema, concluindo que este deve pensar sua classificação de acordo com seus próprios critérios. O autor afirma, de fato, que ao lidarmos com “um meio visual, temos que buscar critérios de definição no que efetivamente vemos na tela” (BUSCOMBE, 2005BUSCOMBE, E. A ideia de gênero no cinema americano. Tradução de Tomás Rosa Bueno. In: RAMOS, F. (Org.). Teoria contemporânea do cinema II: documentário e narratividade ficcional. São Paulo: Editora SENAC, 2005. p.303-318. , p.306), mas conclui seu ensaio, após refletir sobre o que caracteriza um filme como western, com a seguinte pergunta: “é possível desenvolver uma teoria que abrigue todos os gêneros?” (BUSCOMBE, 2005BUSCOMBE, E. A ideia de gênero no cinema americano. Tradução de Tomás Rosa Bueno. In: RAMOS, F. (Org.). Teoria contemporânea do cinema II: documentário e narratividade ficcional. São Paulo: Editora SENAC, 2005. p.303-318. , p.301).

Já para Stam (2017)STAM, R. Introdução à teoria do cinema. 4. ed. Trad. Fernando Mascarello. Campinas, SP: Papirus, 2017., a noção de estruturalismo autoral na história do cinema atrela-se a determinada noção de gêneros, que acaba, inclusive, por direcionar escolhas autorais no campo:

A análise genérica enfrenta uma série de problemas. Em primeiro lugar, há a questão da extensão. Alguns rótulos genéricos, como a comédia, são por demais amplos para serem utilizados, ao passo que outros, como, por exemplo, “filmes biográficos sobre Sigmund Freud” ou “filmes catástrofe de terremotos” são excessivamente restritos. Em segundo lugar, está o risco de normativismo, de ter-se uma ideia pré-concebida do que um filme de determinado gênero deveria fazer, em lugar de perceber o gênero simplesmente como um trampolim para a criatividade e a inovação. Em terceiro lugar, imagina-se por vezes que o gênero seja monolítico, como se os filmes pertencessem exclusivamente a um único gênero. A “lei do gênero” supostamente proíbe a miscigenação, mas até mesmo os filmes hollywoodianos clássicos promoviam a hibridização de diversas tendências genéricas [...] (STAM, 2017STAM, R. Introdução à teoria do cinema. 4. ed. Trad. Fernando Mascarello. Campinas, SP: Papirus, 2017., p.149; grifos do autor).

Se, por um lado, fica evidente que esse renomado professor e crítico não se refere a uma concepção bakhtiniana de gêneros, por outro, os caminhos que ele aponta para a crítica genérica do cinema não são incompatíveis com os postulados bakhtinianos:

Talvez a forma mais proveitosa de utilizar o gênero seja entendê-lo como um conjunto de recursos discursivos, uma ponte para a criatividade, através da qual um diretor pode elevar um gênero “baixo”, vulgarizar um gênero “nobre”, revigorar um gênero exaurido, instilar um novo conteúdo progressista em um gênero conservador ou parodiar um gênero que mereça ser ridicularizado. Deslocamo-nos, desse modo, do campo da taxonomia para o das operações ativas e transformadoras (STAM, 2017STAM, R. Introdução à teoria do cinema. 4. ed. Trad. Fernando Mascarello. Campinas, SP: Papirus, 2017., p.151).

Assim, refletir sobre uma obra fílmica do ponto de vista de uma “teoria e/ou análise do discurso” (BRAIT, 2006BRAIT, B. Análise e teoria do discurso. In: BRAIT, B. (Org.). Bakhtin: outros conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2006. p.9-31., p.9) é colocar em diálogo campos epistêmicos distintos e assumir um horizonte espacial específico, que se coaduna com o de uma poética sociológica (VOLOCHÍNOV, 2013VOLOCHÍNOV, V. (Círculo de Bakhtin). Palavra na vida e palavra na poesia: introdução ao problema da poética sociológica. In: VOLOCHÍNOV, V. N. A construção da enunciação e outros ensaios. Organização, tradução e notas de João Wanderley Geraldi. São Carlos: Pedro & João Editores, 2013. p.71-100.), ou seja, que considera como constitutivos desse enunciado não apenas os aspectos de sua materialidade, mas também questões sociais, históricas e ideológicas relativas à sua criação e à sua circulação.

Do ponto de vista da teoria/análise dialógica do discurso, que emerge da obra de Bakhtin e dos demais pensadores do(s) Círculo(s), um curta-metragem de ficção apresenta relativa estabilidade em relação às características do gênero do discurso a que pertence, sem, contudo, estar fechado para “operações ativas e transformadoras” (STAM, 2017STAM, R. Introdução à teoria do cinema. 4. ed. Trad. Fernando Mascarello. Campinas, SP: Papirus, 2017., p.151) nas suas esferas de produção, circulação e recepção. Afirma Bakhtin:

A riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas porque são inesgotáveis as possibilidades da multifacetada atividade humana e porque em cada campo dessa atividade vem sendo elaborado todo um repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à medida que tal campo se desenvolve e ganha complexidade (2016, p.12; grifos meus).

A afirmação de Bakhtin poderia ser uma resposta - formulada mais de uma década antes da própria pergunta3 3 O texto de Buscombe (2005) que cito foi publicado pela primeira vez em 1970. - à questão posta por Buscombe: os gêneros são infinitos e instáveis, mas a análise/teoria dialógica do discurso, prevendo essas características, indica uma postura para o estudo de gêneros em qualquer campo da atividade humana.

Nesse sentido, proponho dialogar com o curta-metragem de Kleber Mendonça Filho tomado como enunciado concreto, o que significa “tomar os elementos dialógicos como fonte de uma compreensão ativa e científica” (SOUZA, 2002SOUZA, G. Introdução à teoria do enunciado concreto do círculo Bakhtin/ Volochinov/Medveded. 2. ed. São Paulo: Humanitas, 2002. , p.73). Nesse diálogo, cabe ressaltar que cada gênero implica formas de acabamento e que é impossível

Dar consciência e compreender a realidade com a ajuda da língua e de suas formas em um sentido estritamente linguístico. São as formas do enunciado, e não da língua, que desempenham o papel essencial na tomada de consciência e na compreensão da realidade (MEDVIÉDEV, 2012MEDVIÉDEV, P. N. (Círculo de Bakhtin). O método formal nos estudos literários: introdução crítica a uma poética sociológica. Tradução, a partir do russo, e Nota das tradutoras Sheila Camargo Grillo e Ekaterina Vólkova Américo. Apresentação Beth Brait. Prefácio Sheila Camargo Grillo. São Paulo: Contexto, 2012., p.198)

Assim como as formulações de Bakhtin sobre os gêneros do discurso, as reflexões de Medviédev sobre a relação gênero-realidade podem ser transpostas também para enunciados compostos por materialidade que implique não apenas o verbal, como um enunciado fílmico. Machado (2005MACHADO, I. Gêneros discursivos. In: BRAIT, B. (Org.). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2005. p.151-166.), em ensaio sobre os gêneros do discurso como conceito-chave do arcabouço teórico da obra bakhtiniana, alerta para o fato de que, sob a ótica do dialogismo

[...] é possível considerar formações discursivas do amplo campo da comunicação mediada, seja aquela processada pelos meios de comunicação de massas ou das modernas mídias digitais, sobre o qual, evidentemente, Bakhtin nada disse mas para o qual suas formulações convergem (MACHADO, 2005MACHADO, I. Gêneros discursivos. In: BRAIT, B. (Org.). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2005. p.151-166., p.152).

Nas esferas em que circula, a classificação do curta-metragem Recife frio, como explicitarei adiante, indica uma diversidade de gêneros fílmicos. Há características na obra que provocam esse efeito, que parece contradizer a própria definição de Bakhtin para gêneros do discurso, já que, segundo o pensador russo:

Os gêneros do discurso organizam nosso discurso quase da mesma forma que organizam as formas gramaticais (sintáticas). Nós aprendemos a moldar o nosso discurso em formas de gênero e, quando ouvimos o discurso alheio, já adivinhamos o seu gênero pelas primeiras palavras, adivinhamos certo volume (isto é, uma extensão aproximada do conjunto do discurso), uma determinada construção composicional, prevemos o fim, isto é, desde o início temos a sensação do conjunto do discurso que, em seguida, apenas se diferencia no processo da fala. Se os gêneros do discurso não existissem e nós não os dominássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo do discurso, de construir livremente cada enunciado e pela primeira vez, a comunicação discursiva seria quase impossível (BAKHTIN, 2016BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In. BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra ; notas da edição russa de Serguei Botcharov. São Paulo: Editora 34. 2016, p.11-69., p.39).

Por que, então, não é consenso a classificação de Recife frio? O equívoco, como veremos adiante, de apresentar essa obra como documentário, dá-se pelo fato de o filme conter, em sua forma composicional, elementos que remetem a esse gênero pela via da hibridização.

A relação entre os gêneros representados dentro do curta-metragem, de um ponto de vista dialógico, pode ser lida à luz dos gêneros intercalados e/ou da hibridização, ambas formas de inserção do plurilinguismo/heterodiscurso4 4 Na mais recente tradução de Paulo Bezerra do ensaio O discurso no romance (BAKHTIN, M. Teoria do romance I. A estilística. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2015), opta-se pela forma heterodiscurso que, a meu ver, na contemporaneidade, está carregada de sentidos pela oposição dos prefixos homo x hetero x trans x pan etc. Por isso, opto por trazer os dois termos, heterodiscurso e plurilinguismo, mesmo usando a tradução mais recente da obra. num enunciado.

Se nos gêneros intercalados reconhecemos os limites entre, por exemplo, um romance onde é representada uma carta de uma personagem qualquer e o início e o final dessa carta (que passa a compor o romance), a hibridização de gêneros, como é proposta neste trabalho, é um recuso discursivo que promove a presença simultânea de características arquitetônicas de dois gêneros num único enunciado, ainda que se possa determinar, no todo desse enunciado, a qual gênero ele pertence. Por isso, proponho análises que destaquem, por um lado, que Recife frio não é um documentário, nem um telejornal, nem qualquer outro gênero que esteja nele intercalado, mas que, por outro, mostrem como, na relação arquitetônica com o autor-contemplador, o filme assume características composicionais, estilísticas e temáticas de outros gêneros.

A construção híbrida, para Bakhtin, acontece num enunciado que

[...] por seus traços gramaticais (sintáticos) e composicionais, pertence a um falante, mas no qual estão de fato mesclados dois enunciados, duas maneiras discursivas, dois estilos, duas “linguagens”, dois universos semânticos e axiológicos. Entre esses enunciados, estilos, linguagens e horizontes, repetimos, não há nenhum limite formal - composicional e sintático [...] (2015, p.84).

O conceito de hibridização, no conjunto da obra do pensador russo, remete ao fenômeno da bivocalidade: um mesmo enunciado carrega em si diferentes vozes, com entonações apreciativas nem sempre concordantes. A hibridização tem a ver com “a mistura de acentos, o apagamento de limites entre o discurso do autor e o discurso do outro [...]” (BAKHTIN, 2015BAKHTIN, M. Teoria do romance I: o romance como gênero literário. Tradução, posfácio e notas Paulo Bezerra. Organização da edição russa de Serguei Botcharov e Vadim Kójinov. São Paulo: Editora 34, 2015. p.19-242., p.107). Ao propor o termo, portanto, Bakhtin não se refere especificamente à hibridização de gêneros, mas podemos inferir que o fenômeno implique também a presença, num único enunciado, de características de mais de um gênero sem que as fronteiras entre eles sejam claramente perceptíveis, como nos gêneros intercalados.

Lembramos que o discurso bivocal, para Bakhtin, surge “inevitavelmente sob as condições da vida autêntica da palavra” (2010, p.211)BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. 5. ed. Tradução, notas e prefácio Paulo Bezerra. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.. O pensador russo examina o discurso bivocal em minúcias nas análises que faz da obra de Dostoievski, tomando como pilar o conceito de relações dialógicas, que podem surgir entre enunciados como um todo ou entre partes de enunciados, ou, ainda, “entre os estilos de linguagem, os dialetos sociais etc.” (BAKHTIN, 2010BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. 5. ed. Tradução, notas e prefácio Paulo Bezerra. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010., p.211). O que interessa para Bakhtin, mais do que identificar as vozes presentes num discurso, é entender sob quais ângulos elas dialogam.

Quanto aos gêneros intercalados, nas suas reflexões sobre o romance, Bakhtin analisa o fenômeno como uma das formas de plurilinguismo ou heterodiscurso, uma das “mais basilares e substanciais de introdução e organização do heterodiscurso no romance” (2015, p.108). O autor russo pondera que são infinitas as possibilidades de inserção de gêneros num romance, trazendo como exemplos peças líricas, poemas, cenas dramáticas. Aponta, ainda, para um “grupo especial de gêneros que desempenham no romance o mais importante papel construtivo” (BAKHTN, 2015, p.108), citando, para este grupo, entre outros, a confissão, o diário e a carta. O conceito dialoga com o de hibridização, mas não pressupõe, como aquela noção, que as fronteiras entre os discursos, e, portanto, entre os gêneros, se esfacelem.

Proponho, assim, que as relações dialógicas se dão também entre gêneros do discurso e suas tradições, e que a presença da hibridização e de gêneros intercalados em Recife frio, como levantarei nas análises, é fundamental para a criação dos sentidos da obra.

Recife frio não é um romance, é um curta-metragem de ficção. No entanto, as considerações de Bakhtin sobre aquele gênero literário são passíveis de transposição (e ressignificação) para um gênero fílmico, já que o próprio autor, como já vimos, afirma que as relações dialógicas existem não apenas no discurso cotidiano ou literário, mas em qualquer construção feita numa “matéria sígnica” (BAKHTIN, 2010BAKHTIN, M. Problemas da poética de Dostoiévski. 5. ed. Tradução, notas e prefácio Paulo Bezerra. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010., p.211; grifo do autor).

Apresento, nas próximas seções, a descrição e a análise das cenas-chave para que se ponderem os efeitos de sentido criados pela hibridização e pela presença de gêneros intercalados em Recife frio. Para tanto, acionarei também a noção teórica de cronotopo, entendido como “interligação essencial das relações de espaço e tempo como foram artisticamente assimiladas pela literatura” (BAKHTIN, 2018BAKHTIN, M. As formas do tempo e do cronotopo no romance. In: BAKHTIN, M. Teoria do romance II: as formas do tempo e do cronotopo. Tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra ; organização da edição russa de Serguei Botcharov e Vadim Kójinov. São Paulo: Editora 34, 2018. p.11-216., p.11).

Como Bakhtin, que se apropria do termo conforme era empregado nas ciências exatas e na teoria da relatividade, trago para a reflexão sobre um enunciado fílmico a categoria mobilizada pelo pensador russo para análises sobretudo literárias5 5 O próprio Bakhtin aponta para o “cronotopo do real” (2018, p.30) e para a pertinência da categoria nas esferas de produção e de recepção, quando menciona “os cronotopos do autor e do ouvinte-leitor (p.229). Para uma reflexão sobre a abrangência dessa categoria, indico a leitura de BRAIT, Beth et al. O pesquisador do discurso aqui e agora. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, [S.l.], v. 14, n. 2, p. port. 2-5 / ing. 2-6, mar. 2019. ISSN 2176-4573. Disponível em: [https://revistas.pucsp.br/bakhtiniana/article/view/42002/28003]. Acesso em: 26 jul. 2019. . O cronotopo não se confunde com o gênero, mas, conforme explica Bakhtin (2018), relaciona-se de maneira nodal com esse conceito, sendo que o “gênero e as modalidades de gênero são determinados justamente pelo cronotopo” (BAKHTIN, 2018BAKHTIN, M. As formas do tempo e do cronotopo no romance. In: BAKHTIN, M. Teoria do romance II: as formas do tempo e do cronotopo. Tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra ; organização da edição russa de Serguei Botcharov e Vadim Kójinov. São Paulo: Editora 34, 2018. p.11-216., p.12).

2 Ficção, documentário, telejornal e ciranda na Recife de um futuro qualquer

Recife frio (2009) é um curta-metragem de cerca de 25 minutos (contando com os créditos)6 6 A capa do DVD da obra traz o tempo de 24 minutos e parece, portanto, não contabilizar os créditos. que, de certa maneira, apresenta temas que serão aprofundados nas obras posteriores de Kleber Mendonça Filho, como a especulação imobiliária e a deterioração das relações humanas no espaço urbano.

O recente Bacurau (2019), do mesmo diretor, obra que traz características fortes do gênero western, tem como cenário uma fictícia cidade que dá nome à obra, a qual, por artimanhas tecnológicas de um grupo de inimigos (os bandidos, para resgatar um signo desse gênero western), deixa de existir nos mapas. O espaço representado nesse longa-metragem de 2019, ainda que caracterizado indubitavelmente como pertencente à Região Nordeste do Brasil, é um contraponto em relação à marcação explícita da cidade de Recife ao longo da filmografia do diretor. Nos longas-metragens O som ao redor (2013) e Aquarius (2016), por exemplo, temos narrativas que, em termos cronotópicos, retratam a cidade de Recife no espaço e tempo contemporâneos ao da esfera de criação da obra. Já em Recife frio, o espaço da capital pernambucana relaciona-se com o aspecto temporal de modo bastante peculiar, pois o curta apresenta hipotéticas situações futuras nesse mesmo espaço (a cidade) para denunciar desigualdades em nada hipotéticas da Recife contemporânea. O tempo futuro é anunciado após os créditos iniciais, logo no início da obra, aos 00min37s, quando lemos, em fonte branca, em itálico, no canto direito inferior da tela, preenchida por um fundo preto, os dizeres “daqui a alguns anos”7 7 O mesmo recurso está presente em Bacurau. .

No site Porta Curtas8 8 [http://portacurtas.org.br/filme/?name=recife_frio] Acesso em: 12 jul. 2019. , temos as seguintes indicações sobre a classificação da obra: “gênero: ficção; subgêneros: comédia, ficção científica”. Já na Wikipédia9 9 Essa não seria uma fonte adequada para a inserção de vozes de autoridade no âmbito acadêmico. No entanto, é uma referência importante para pontuar os discursos sobre a obra que circulam no senso comum. , fonte hodierna da sabedoria popular, lê-se o seguinte verbete para essa obra:

Recife frio é um filme brasileiro escrito e dirigido por Kleber Mendonça Filho. Trata-se de um documentário sobre uma estranha mudança climática na cidade tropical de Recife, na região Nordeste do Brasil, capital de Pernambuco, que, inexplicavelmente, passa a ser fria. Estreou em novembro de 2009 no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Com mais de 50 prêmios no Brasil e exterior, Recife frio se tornou o curta metragem brasileiro mais premiado desde Ilha das Flores (1989), de Jorge Furtado. [https://pt.wikipedia.org/wiki/Recife_Frio]. Acesso em 12 de jul. 2019; grifo meu).

A capa do DVD da obra não apresenta, em seus créditos, uma classificação quanto ao gênero, mas traz a seguinte sinopse:

Estranha mudança climática faz Recife, no Nordeste do Brasil, passar a ser uma cidade fria. O documentário de uma TV estrangeira examina os efeitos da mudança em uma cultura que sempre viveu em clima quente (RECIFE frio. DVD, 2009; grifo meu).

O termo documentário, portanto, aparece na sinopse oficial da obra, mas como um elemento representado na trama. Representa-se, em parte do curta de ficção, um documentário feito por uma rede de televisão, provavelmente argentina (a julgar pela variedade da língua espanhola falada pelo repórter). Nesse documentário, cujo início parece coincidir com o início do curta, temos uma alternância entre as falas de um apresentador e as falas de moradores de Recife que foram afetados pela mudança climática e que são entrevistados por esse apresentador.

Ressalto, contudo, que a palavra documentário não está presente na materialidade verbal da obra. Se ela não estivesse na capa do DVD, talvez o melhor termo para definir a ação da televisão estrangeira na trama seria reportagem. Para as análises, no entanto, acatarei a definição do DVD, já que o termo ganhou a Wikipédia e, a partir daí, inúmeras resenhas online sobre a obra. Em muitos casos, o filme é classificado como falso documentário ou mockumentary ou seu gênero é questionado10 10 Vejam-se, por exemplo, os seguintes sites:[http://www.agendabh.com.br/documentario-recife-frio-de-kleber-mendonca-filho/] Acesso em: 15 jul. 2019 ; [https://www.institutonetclaroembratel.org.br/educacao/para-ensinar/planos-de-aula/cinema-e-educacao-recife-frio/ ]. Acesso em 15 jul. 2019 e [https://www.cinepipocacult.com.br/2013/05/recife-frio.html] Acesso em: 15 jul. 2019. .

Percebe-se, portanto, que, na esfera de recepção, a cadeia discursiva sobre Recife frio está marcada pela presença do termo documentário. Por isso, a reflexão sobre algumas características desse gênero perpassa este artigo.

Apresento, no quadro abaixo (QUADRO 1), a sequência de eventos e a minutagem correspondente em que as cenas iniciais se dão, com o intuito de marcar como o gênero documentário é introduzido no curta:

QUADRO 1
inserção do documentário estrangeiro na trama de Recife frio.

A sequência de imagens sem movimento com a voz em over termina em 01min 22 s, quando, após a exibição imagens de notícias sobre a chegada de pinguins à região, aparece a imagem do repórter a quem corresponde a voz até então ouvida, apresentando o nome do programa (El mundo en movimiento) e explicando que naquela semana a equipe estaria na cidade de Recife para investigar os estranhos acontecimentos no local.

Assim que entra a cena em que se vê o jornalista/apresentador, surge, no canto direito inferior da tela, um logo em marca d'água com as letras MM. Esse logotipo do programa permanece na tela por quase todo o curta, até os 18min47s11 11 No site Porta Curtas, vemos também um logo que representa a cara de um animal e a palavra Tamanduá. Trata-se do instituto que apoia o site, e não de marca original da obra de Kleber Mendonça Filho. . É uma marca na materialidade visual do filme que coincide com o tempo em que o curta mostra o documentário da rede de televisão estrangeira. Estranhamente, porém, a sequência de imagens congeladas que vai de 00min50s até 01min22s não apresenta esse logotipo, mas já traz a voz do repórter/apresentador. Assim como a indicação temporal (Daqui a alguns anos), essa já é uma pista discursiva de que a reportagem (documentário) é construída como elemento de ficção.

O início do documentário, como já afirmei, parece coincidir com o do curta-metragem, mas os momentos sem o logotipo do programa El mundo en movimiento, já com a voz do repórter argentino, provocam, discursivamente, um estranhamento que é inerente a essa obra. Recife frio faz com que o espectador se questione, por vezes, exatamente a qual gênero fílmico está assistindo, o que contraria a já citada afirmação de Bakhtin sobre nossa suposta capacidade de “adivinhar” o gênero do discurso alheio. (BAKHTIN, 2016BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In. BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Organização, tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra ; notas da edição russa de Serguei Botcharov. São Paulo: Editora 34. 2016, p.11-69., p. 39). Esse é um efeito da ausência de fronteiras nítidas entre os gêneros, marca de sua hibridização.

Voltando à trama da obra, a rede de televisão estrangeira mostra como a vida de moradores foi afetada pelo frio, trazendo depoimentos de repentistas, vendedores, de um dono de pousada à beira da falência, de um Papai Noel profissional - o único que parece gostar do frio. Há momentos de grande comicidade intercalados com trechos em que se mostra como a desigualdade teria ficado mais visível com o novo clima, como a sequência filmada no lar de família de classe média alta - a fictícia família Nogueira - que gira em torno da desvalorização de seu imóvel à beira-mar, antes prestigiado pela localização e agora desvalorizado pelo fato de a orla ser o local mais frio da cidade. É emblemática do tema da obra a figura da empregada doméstica que é obrigada a ceder seu quarto, antes um local desagradável pelo forte calor devido à baixa ventilação, para o filho adolescente do casal de patrões, que percebe ser aquele quartinho abafado, nas circunstâncias de então, o melhor cômodo da casa. Muda a temperatura, mas a vulnerabilidade de quem já era vulnerável continua a mesma.

O apresentador do documentário mostra, aos 16 m 20 s, um livro de Armando de Holanda, intitulando Roteiro para construir no Nordeste. Afirma que “a visão de Holanda, de criar construções humanas e generosas, parece hoje uma poesia impossível” (16min29s até 16min33s). Tem-se, então, sempre como o logo do programa El mundo en movimiento no canto direito inferior da tela, uma sequência externa de ruas, calçadas, fachadas de uma cidade que se mostra deserta, enquanto o narrador/repórter reflete sobre como Recife já era um local, antes da mudança climática, marcado pela violência e pela urbanização de “linhas e ângulos retos” (17min05s), que seriam manifestações da desumanidade urbana.

Essas relações dentro/fora e espaço inóspito/espaço de convivência são fundamentais para as análises que serão propostas. Antes de descrever os momentos finais do documentário, que não coincidem com os momentos finais do curta, apresento quadro (Quadro 2) com a descrição das cenas que compõem a nova transição de gêneros:

QUADRO 2
passagem do documentário estrangeiro para o telejornal

O programa da televisão estrangeira tem seu final apoteótico num shopping center. Ouve-se, na voz do apresentador, enquanto se veem imagens das ruas desertas, a pergunta “Onde estão as pessoas?”, aos 17min25s. Então, há um corte, entra como trilha sonora o segundo movimento da Sétima Sinfonia de Beethoven e mostra-se o seguinte: em primeiro plano a placa de um veículo e, em seguida, vários automóveis num estacionamento. Ainda com a mesma trilha sonora, tem início a sequência dentro do shopping: em câmera lenta, pessoas tirando suas roupas de frio e passeando naquele espaço fechado e aquecido, que oferece diversas possibilidades de entretenimento, como patinação e parque aquático com bolhas infláveis gigantes, dentro das quais as crianças se movimentam sobre a água sem se molhar. A câmera, ainda do documentário com o logotipo MM, foca uma loja de eletrônicos, com televisores ligados. Aos 18m 47s, a tela de um desses televisores transforma-se na tela do próprio curta, pois o logotipo desaparece. Estamos, agora, dentro de um telejornal brasileiro. Na parte superior direita da tela, aparecem as inscrições “Canal 7 / Notícias”. A passagem do programa de televisão estrangeira para o telejornal tem marcas que deixam suas fronteiras claras. Saímos, como espectadores, da construção híbrida em que o documentário se sobrepunha ao próprio curta de ficção. E, evidentemente, estamos, ainda, no curta de ficção, mas não mais sob os efeitos de um gênero documental.

O tema da notícia do telejornal é o frio: uma exposição de fotografias do céu nublado, cujos autores são detentos, intitulada Olha pra cima, irmão. Em seguida, passa-se para a previsão do tempo, durante a qual é possível ler chamadas, carregadas de ironia, em letreiros corridos sobre acontecimentos da cidade de Recife, como a declaração de uma socialite sobre como o frio deixa as pessoas pobres mais elegantes.

A inserção dessas chamadas irônicas e o próprio título da exposição noticiada fortalecem o caráter de ficção desse trecho em que se representa um telejornal: se a forma composicional, com elementos como âncora, leitura e imagens de notícias e previsão de tempo, responde às prescrições de um telejornal, o conteúdo permeado de ironia aponta para a narrativa ficcional que é inerente a um curta-metragem de ficção.

No trecho de previsão do tempo, aparece um apresentador com o mapa do Brasil ao fundo, mostrando máximas e mínimas em diversos locais, e reafirmando o frio daquela região metropolitana. Começa, então, a se preparar uma nova transição de gêneros. Passamos da representação de telejornal para uma cena externa, uma ciranda puxada por Lia de Itamaracá, reconhecida cantora e artista popular da região. O quadro 3 traz a sucessão de cenas que constroem essa transição:

QUADRO 3
passagem do telejornal para cena final da ciranda

Quando o apresentador do tempo afirma que a temperatura mínima no dia seguinte será de 5 graus centígrados em Itamaracá, no litoral Norte, começamos outro momento de transição: o telejornal continua por alguns segundos, mas o som desse enunciado vira som de fundo e começamos a ouvir uma canção de ciranda na voz de Lia de Itamaracá. Passa-se, então, a uma cena externa, em que a cantora, toda encapotada, com uma touca dourada, puxa uma ciranda na praia. O tempo, evidentemente, é encoberto, e todas as pessoas usam roupas de frio. Saímos do telejornal e fomos para uma cena externa. Não estamos mais no documentário do programa El mundo en movimiento, não estamos mais no telejornal do Canal 7. Estamos, na verdade, onde sempre estivemos: num filme curta-metragem de ficção, construído engenhosamente com características de outros gêneros, provocando o espectador a transitar entre as esferas ética e estética em sua autoria contemplativa.

3 A vida na ficção e a ficção vivida: sentidos nos gêneros que são representados em Recife frio

O início de Recife frio deixa explícito seu caráter ficcional: há, nos créditos iniciais, uma primeira apresentação do elenco do filme, com 13 itens, que traz a correspondência entre os nomes dos atores/atrizes e suas personagens. As personagens são sempre indicadas pelos seus papéis sociais antecedidos de artigo indefinido, como “um sem teto”, “um papai noel” (em letras minúsculas), “um narrador”. Há uma exceção: quando se apresentam os repentistas que são entrevistados no documentário, Pinto e Patativa, usam-se nos créditos os nomes dos artistas conforme aparecem no curta, na coluna de nomes dos atores, e o substantivo repentistas antecedido pelo numeral dois. Diferenciam-se dos demais atores do elenco na forma de citação nos créditos. Seriam de fato, portanto, repentistas que usam, artisticamente, esses nomes.

Já nos créditos finais, que se mesclam com a cena da ciranda a partir dos 23min09s, temos dados técnicos como direção, roteiro, produção e montagem e, novamente, o elenco, nos mesmos moldes do início do curta, mas ampliado para 23 indicações - adicionam-se, entre outros, os cientistas, a âncora do telejornal, o homem do tempo. A sequência dos créditos finais, no entanto, acrescenta ao elenco, de forma destacada dos demais nomes, o de Lia de Itamaracá, que aparece sozinho na tela.

A apresentação da cirandeira diferencia-se completamente da indicação dos outros nomes do elenco. Não há necessidade de corresponder seu nome a um papel, o que acontece nos filmes de ficção, ou a um papel/lugar social, o que se vê comumente nos documentários: Lia de Itamaracá não se explica, não representa uma personagem, transita entre o cronotopo da obra de ficção e o “cronotopo real” (BAKHTIN, 2018BAKHTIN, M. As formas do tempo e do cronotopo no romance. In: BAKHTIN, M. Teoria do romance II: as formas do tempo e do cronotopo. Tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra ; organização da edição russa de Serguei Botcharov e Vadim Kójinov. São Paulo: Editora 34, 2018. p.11-216., p.30) , da vida, como ela mesma, e à forma destacada de apresentação de seu nome nos créditos corresponde o destaque da sequência de que ela participa no filme, que não pertence nem ao telejornal fictício nem ao documentário fictício, como mostrei no item anterior. A forma dos créditos sinaliza a hibridização, na forma composicional, entre curta de ficção e documentário, e os sentidos criados pelas vozes desses gêneros constroem a interação particular que se estabelece com a obra.

O momento da ciranda marca uma vertiginosa saída do gênero intercalado telejornal para uma cena externa. Cena de ficção, não há dúvida, pois nela continua se representando a mudança climática investigada pelo fictício documentário. A realidade física de Lia de Itamaracá, porém, é um dos elos que constroem o tema dessa obra, que, travestida de ficção, mostra tantas mazelas reais.

Esse jogo de cena entre ficção e não ficção, já tão bem explorado por Eduardo Coutinho em seu documentário (será mesmo documentário?) homônimo de 2007, tem sua construção, em Recife frio, fortemente marcada pela hibridização dos gêneros na obra.

O momento do primeiro gênero representado no curta, o documentário, tem início após fortes indícios (elenco, marcação temporal) de que estamos diante de uma ficção. Trata-se, contudo, de uma ficção que mostra o aqui e o agora da capital pernambucana.

Bakhtin destaca o uso do tempo futuro na história do romance como um recurso que torna possível ao romancista uma análise das contradições sociais de seu próprio tempo: “Todo desvelamento de contradições sociais desloca inevitavelmente o tempo para o futuro” (2018, p.92).

Para filmar as contradições sociais tão bem representadas, por exemplo, pela cena em que se entrevista nos moldes de um documentário a fictícia família Nogueira (início aos 13min15s), Mendonça Filho, inicialmente, convida seu espectador a ocupar uma posição de quem interage com ficção. Antes de chegar à família, a obra passa por momentos cômicos, como os propiciados pela entrevista ao senhor que trabalha como Papai Noel e ao artesão, que afirma que terá que representar os nus masculinos com as “bitocas murchas” (12min48s) pelo frio. Na fictícia entrevista à família, o humor fácil da cena anterior, a do artesão, dá lugar a uma ironia mordaz, bem representada pela fala da patroa sobre a situação da empregada, deslocada para a friíssima suíte antes ocupada pelo filho do casal, e agora ocupando, como vimos, o quartinho de serviço, aposento mais quente da casa. A Sra. Nogueira, em fala intercalada à do marido sobre a situação da empregada, afirma que a funcionária está “passando frio e, de certa forma, se sentindo um peixe fora d’água [...] porque ela não é acostumada, também, nunca morou numa suíte” (início da declaração aos 15min22s).

Uma declaração desse teor, marcada pelos embates sociais que se concretizam na arquitetura brasileira pelos diminutos quartos de serviço nos apartamentos tradicionais, talvez não tivesse lugar e não teria chave irônica num documentário, mas cabe perfeitamente em Recife frio e encapsula o tema desta ficção travestida de documentário.

Cada entrevista feita na obra constrói-se como se fosse uma encenação-locação, na qual a tomada é “realizada na circunstância de mundo onde o sujeito que é filmado vive a vida” (RAMOS, 2008RAMOS, F. Mas afinal... o que é mesmo documentário? São Paulo: SENAC, 2008. , p.42). Esse e outros aspectos composicionais que remetem ao documentário, como a voz em over do narrador em grande parte de sua representação, misturam-se com outros, que evidenciam a ficção, como a indicação de tempo futuro. Nesse jogo, a obra deixa o espectador num espaço entre vida e arte. Subverte-se, portanto, uma lógica de gêneros cinematográficos, segundo a qual

Em geral, a narrativa documentária chega já classificada ao espectador [...]. Não costuma fazer parte de nosso prazer espectatorial ir ao cinema para tentar descobrir se uma narrativa é ficção ou documentário. A intenção documentária do autor/cineasta, ou da produção do filme, é indexada através de mecanismos sociais diversos, direcionando a recepção. [...] Ao recebermos uma narrativa como documentária, estamos supondo que assistimos a uma narrativa que estabelece asserções, postulados, sobre o mundo, dentro de um contexto completamente distinto daquele no qual interpretamos os enunciados de uma narrativa ficcional (RAMOS, 2008RAMOS, F. Mas afinal... o que é mesmo documentário? São Paulo: SENAC, 2008. , p.27).

Essa subversão reflete-se na recepção do curta e na sua já mencionada classificação não homogênea em veículos especializados em cinema. O curta de ficção confunde-se com documentário, a ficção confunde-se com acontecimentos reais.

O outro gênero que trata de acontecimentos reais e é inserido no curta é o telejornal. Recife frio, até o alcance de minha pesquisa, nunca foi catalogado como telejornal. A proximidade entre o curta de ficção e o documentário, por ambos os gêneros serem característicos da esfera cinematográfica, é maior do que a proximidade entre um curta de ficção e um telejornal, já que este último, normalmente, circula na esfera televisivo-jornalística12 12 Há um gênero análogo que costumava circular nas salas de cinema, o cinejornal. O célebre representante do gênero no Brasil é o Canal 100, cinejornal extinto no ano 2000. .

O corte do documentário para o telejornal, já descrito, ocorre na sequência do shopping center, no momento em que um televisor exposto numa loja é flagrado exibindo o telejornal. A tela desse televisor transmuta-se na tela do curta e passamos ao mundo desse novo gênero, que, na esfera televisiva, deveria tratar de acontecimentos reais. As notícias ficcionais veiculadas pelo telejornal representado, como a exposição Olha pra cima, irmão, retomam o humor de parte do documentário representado em Recife frio.

A encenação do telejornal, que se estende dos 18min47s aos 20min11s, parece funcionar como tempo-espaço de transição entre a representação do documentário do programa estrangeiro El mundo en movimiento e a cena externa da ciranda de Lia de Itamaracá. Funciona, portanto, como corredor pelo qual se sai do shopping, espaço fechado onde se vê uma multidão de indivíduos aparentemente isolados uns dos outros, o que se reforça pelas imagens das crianças nas bolhas infláveis, e se acede à praia de Itamaracá, espaço ainda gélido, mas marcado pelo brilho dourado da touca usada pela cirandeira e pela dança circular que requer união das pessoas.

A câmara de Recife frio, assim, faz um percurso em diferentes gêneros e espaços depois que o narrador do documentário, constatando que a cidade é um espaço inóspito de ângulos de linhas retas, como já mencionei, pergunta: “Onde estão as pessoas”? (17min25s). Pessoas são vistas dentro do shopping, ainda sob o olhar mediado pelo narrador do documentário estrangeiro; pessoas são vistas na cena da ciranda, fora do shopping, fora do documentário, fora do telejornal, sob o olhar ainda mediado, mas não mais pelo estrangeiro.

Quando deixamos de ter a mediação da suposta câmera do documentário, olhamos o outro, cada indivíduo, mais de perto: de fato, durante a ciranda, numa alternância de planos (MARTIN, 2013MARTIN, M. A linguagem cinematográfica. 2. ed. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Brasiliense, 2013.) podemos ver o todo geométrico da dança, em planos gerais, mas também, em primeiríssimo plano, intercalados aos destaques para o rosto de Lia de Itamaracá, partes dos corpos dançando e os rostos, quase sempre sorridentes, de vários componentes da roda, as feições de cada participante. O narrador do documentário, aos 16mine57s, menciona a “desumanização das cidades”. Aos 17min13s, afirma que na desordem urbana “o elemento humano se achatou”. Na ciranda esse achatamento se desfaz, e temos pessoas retratadas em sua individualidade, em um movimento em que cada individualidade interage com as demais e, nesse diálogo, é parte de um todo orgânico, exatamente o que falta à cidade.

Ainda que a interação entre o espectador e a cena da ciranda seja mediada por uma câmera, a do diretor do curta, não há mais as camadas de representação de outros orquestradores da narrativa, como o narrador do documentário. Com isso, o autor e o espectador aproximam-se da narrativa da ciranda. Muda, com o cronotopo da ciranda, a relação arquitetônica13 13 Sobre esse conceito, ver Silva (2010). entre os aspectos do objeto estético, entre autor-espectador, autor-criador.

Ressalto que, diferentemente de Paulo Bezerra que afirma que “a antiga arquitetônica dá lugar” (2018, p.253)BEZERRA, P. Posfácio. In. BAKHTIN, M. Teoria do romance II: as formas do tempo e do cronotopo. Tradução, posfácio e notas Paulo Bezerra ; organização da edição russa de Serguei Botcharov e Vadim Kójinov. São Paulo: Editora 34, 2018. p.249-264. à categoria do cronotopo no pensamento bakhtiniano, entendo, respeitosamente, a relação cronotrópica entre os aspectos estéticos de uma obra como constituinte da sua arquitetônica. O jogo de inter-relação autor/espectador em Recife frio altera-se à medida que se alteram, com os gêneros representados, os cronotopos da narrativa. A passagem do interior do shopping, em que circula o sentido do individualismo, para a praia, em que a representação circular da ciranda se dá distante das linhas e ângulos inóspitos da urbanidade recifense, é prenha de sentidos.

O raio de sol que surge após os minutos iniciais da ciranda parece indicar o fim do tempo de sofrimento. Seria uma indicação de que aquela dança teria força para subverter o abismo social e humano criado na cidade? A resposta do diretor/narrador, nada otimista, pode estar nos últimos frames do curta (início aos 24min41s), que contêm uma cena só vista por quem acompanha os créditos finais até sua conclusão. Evito, aqui, a descrição da cena, seria um spoiler desnecessário.

Cenas finais ou considerações em movimento

Recife frio, curta-metragem de ficção, traz gêneros intercalados e apresenta uma hibridização que acaba por determinar não só sua forma composicional, mas, sobretudo, a relação entre seus aspectos arquitetônicos. O jogo de cena ficção-realidade confere à obra a crítica mordaz aos embates sociais e ideológicos que constituem a vida na capital pernambucana.

A obra traz a representação da sociedade mediada pelo olhar do outro-estrangeiro, inicialmente. Do telejornal em diante, esse elemento se dissipa e a representação é feita por um olhar-câmera autoral de um outro muito mais próximo. O espectador dialoga, portanto, com distintas vozes que constroem discursos sobre essa sociedade e a inserção dessas vozes discursivas, características do plurilinguismo/heterodiscurso, é possível pela presença dos gêneros intercalados e pela hibridização do gênero curta-metragem de ficção.

A hibridização dos gêneros afeta a recepção da obra. Não há o álibi de se estar dialogando com uma obra de ficção, nem a ilusão criada por documentários (RAMOS, 2008RAMOS, F. Mas afinal... o que é mesmo documentário? São Paulo: SENAC, 2008. ) de se estar diante de asserções sobre o mundo. Se entendemos, como Medviédev, que “cada gênero possui seus próprios meios de visão e de compreensão da realidade, que são acessíveis somente a ele” (2012, p.198), podemos concluir que a hibridização amplia e torna mais complexos os modos de recepção dos sentidos que circulam em Recife frio.

A cidade tema de Recife frio é um espaço com diversidade e contradições sociais. Analisando O asno de ouro, como etapa de sua grande reflexão sobre o cronotopo no romance, Bakhtin afirma que a obra de Apuleio representa uma sociedade já com diversidade social, mas estática, porque livre de contradições. Acrescenta que, se “essas contradições se revelassem, o mundo entraria em movimento, ganharia um impulso para o futuro, o tempo ganharia plenitude e historicidade” (2018, p.69; grifos meus). E vemos, em Recife frio, sob o pretexto da mudança climática e do documentário estrangeiro, no fictício programa El mundo en movimiento, justamente a representação estética refletindo e refratando contradições sociais.

  • 1
  • 2
    A definição de curta-metragem não é estável. Opto por essa designação e não pela classificação da obra como média-metragem, o que seria mais adequado pela regulamentação da ANCINE, disponível em [https://www.ancine.gov.br/media/passoapasso/RegistroObraCPB.pdf]. Acesso em 10 jul. 2019. Minha opção segue a cadeia discursiva sobre a obra, que foi premiada como curta-metragem em diversos festivais.
  • 3
    O texto de Buscombe (2005)BUSCOMBE, E. A ideia de gênero no cinema americano. Tradução de Tomás Rosa Bueno. In: RAMOS, F. (Org.). Teoria contemporânea do cinema II: documentário e narratividade ficcional. São Paulo: Editora SENAC, 2005. p.303-318. que cito foi publicado pela primeira vez em 1970.
  • 4
    Na mais recente tradução de Paulo Bezerra do ensaio O discurso no romance (BAKHTIN, M. Teoria do romance I. A estilística. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2015), opta-se pela forma heterodiscurso que, a meu ver, na contemporaneidade, está carregada de sentidos pela oposição dos prefixos homo x hetero x trans x pan etc. Por isso, opto por trazer os dois termos, heterodiscurso e plurilinguismo, mesmo usando a tradução mais recente da obra.
  • 5
    O próprio Bakhtin aponta para o “cronotopo do real” (2018, p.30) e para a pertinência da categoria nas esferas de produção e de recepção, quando menciona “os cronotopos do autor e do ouvinte-leitor (p.229). Para uma reflexão sobre a abrangência dessa categoria, indico a leitura de BRAIT, Beth et al. O pesquisador do discurso aqui e agora. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, [S.l.], v. 14, n. 2, p. port. 2-5 / ing. 2-6, mar. 2019. ISSN 2176-4573. Disponível em: [https://revistas.pucsp.br/bakhtiniana/article/view/42002/28003]. Acesso em: 26 jul. 2019.
  • 6
    A capa do DVD da obra traz o tempo de 24 minutos e parece, portanto, não contabilizar os créditos.
  • 7
    O mesmo recurso está presente em Bacurau.
  • 8
  • 9
    Essa não seria uma fonte adequada para a inserção de vozes de autoridade no âmbito acadêmico. No entanto, é uma referência importante para pontuar os discursos sobre a obra que circulam no senso comum.
  • 10
  • 11
    No site Porta Curtas, vemos também um logo que representa a cara de um animal e a palavra Tamanduá. Trata-se do instituto que apoia o site, e não de marca original da obra de Kleber Mendonça Filho.
  • 12
    Há um gênero análogo que costumava circular nas salas de cinema, o cinejornal. O célebre representante do gênero no Brasil é o Canal 100, cinejornal extinto no ano 2000.
  • 13
    Sobre esse conceito, ver Silva (2010)SILVA, A. P. P. F. Retratos dialógicos da clínica: um olhar discursivo sobre relatórios de atendimento psicopedagógico. 197p. Tese (Doutorado em Estudos Pós-Graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010..

REFERÊNCIAS

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    » https://revistas.pucsp.br/bakhtiniana/article/view/42002
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2020

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2019
  • Aceito
    08 Dez 2019
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