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Gentrificação e resistência popular nas feiras e portos públicos da Estrada Nova em Belém (PA)

Gentrification and popular resistance in the open markets and public harbors of the Estrada Nova of Belém (PA)

Resumo

Este artigo considera a resistência popular nas feiras e portos públicos da Estrada Nova, atual av. Bernardo Sayão. Interpreta a ocupação da parte sul da orla de Belém, analisada em termos da produção social do espaço urbano. A resistência popular busca manter os portos públicos da Palha e do Açaí como lugar de trocas econômicas e culturais múltiplas, contra a intenção do poder público municipal de ‘gentrificar’ ou enobrecer essa margem urbana da cidade, removendo os atuais usuários, mediante o projeto denominado Portal da Amazônia. A resistência de feirantes, trabalhadores e moradores contrapõe a metáfora ‘janelas para o rio’, que funciona como uma espécie de pensamento único na cidade, com outra metáfora, a de ‘portas para o rio’, que diz respeito à necessidade de ir e vir dos ribeirinhos, que reivindicam seu direito à cidade. O movimento de pessoas e mercadorias nos portos e redondezas configura um espaço de economia e vida popular em Belém. Esse movimento proporciona identidade aos bairros do Jurunas, Condor e Guamá e condiz com preceitos urbanísticos recomendados por autores como Jane Jacobs e Marshall Berman, que valorizam a vida cotidiana da rua. O projeto avança de forma obscura, sem qualquer critério de diálogo e transparência.

Resistência popular; Gentrificação; Portal da Amazônia; Portos públicos

Abstract

This article considers the popular resistance on the street markets and public harbors in the Estrada Nova of Belém. It interprets the occupation of the southern waterfront of Belém, analyzed in terms of the social production of urban space. The popular resistance strives to keep the public harbors, Porto da Palha and Porto do Açai, as places of multiple economic and cultural exchanges, against the municipality’s intention of gentrifying the waterfront and removing its current users through the project called Portal da Amazônia. The resistance of small traders, workers, and residents opposes the metaphor ‘windows on the river,’ which represents a one-sided exclusive approach, with another metaphor, that of ‘gateways to the river,’ which has to do with the necessity of coming and going of riverine people, who demand their right to the city. The movement of people and goods at the harbors and the surroundings creates a setting of popular economy and life in Belém. This movement gives identity to the neighborhoods of Jurunas, Condor, and Guamá and agrees with the urbanistic requirements of Jane Jacobs and Marshall Berman, who value everyday life in the streets. In spite of grassroots resistance, the project goes ahead in an obscure way, without any consideration for dialogue or transparency.

Popular resistance; Gentrification; Public harbors

INTRODUÇÃO

Do inglês gentrification, o neologismo gentrificação, cujo sinônimo poderia ser enobrecimento urbano excludente, no sentido utilizado nesse artigo, designa um caso particular em curso na orla de Belém, capital do Pará. Trata-se de modelo de urbanização mundialmente disseminado, que, mediante intervenções da administração pública em favor de investimentos de capital, expulsa moradores e trabalhadores de lugares por eles historicamente ocupados. A ação política de resistência dos atingidos por esse processo de requalificação do espaço se dá em condições de evidente desvantagem e, salvo casos excepcionais, entre os quais vale a pena citar o de Soho, em Manhattan (Berman, 2007BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 396-397), os antigos usuários acabam sendo forçados a abandonar o espaço valorizado. O termo, cunhado em 1964 por Ruth Glass, então pesquisadora no University College London, foi posteriormente explorado como conceito por Smith (2007)SMITH, N. Gentrificação, a Fronteira e a Reestruturação do Espaço Urbano. GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, n. 21, p. 15-31, 2007. Tradução: Daniel de Mello Sanfelici., entre outros autores, que atribui o preço do solo urbano e interesses especulativos como principais motivadores da gentrificação.

Processos nesse padrão, em virtude da expansão da “economia-mundo capitalista”, também chamada globalização (Ferreira, 2003FERREIRA, J. S. W. São Paulo: O mito da cidade global. 2003. 336 f. Tese (Doutorado em Estruturas Ambientais Urbanas)–Universidade de São Paulo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, 2003.), alcançam hoje todas as metrópoles do mundo, que, a fim de se tornarem globais e competitivas, emulam a lógica de valorizar economicamente os espaços urbanos, criando water fronts, por exemplo. Em Belém, o water front da hora é o Portal da Amazônia, na Estrada Nova (ou Avenida Bernardo Sayão), projeto que veio para riscar do mapa os portos públicos da Palha e do Açaí, não fosse a resistência popular. A prefeitura, que executa o projeto por meio da empreiteira Andrade Gutierrez, com recursos do Banco Mundial e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, agenciados pela Caixa Econômica Federal, ignora a realidade social dessa margem fluvial de Belém, implantando um projeto qualificado como de ‘primeiro mundo’. Apropria-se, assim, da paisagem amazônica, que empresta um apelo identitário ao empreendimento, dando-lhe uma ‘dimensão cultural’, de acordo com o que Arantes (2000ARANTES, O. B. F. Uma estratégia fatal: A cultura nas novas gestões urbanas. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 11-74., p. 16) chama de “culturalismo de mercado”. Ao longo das largas avenidas que se abrem nessa ‘nova janela para o rio’, novos terrenos são oferecidos a investidores, uma vez que os moradores que lá estavam foram removidos. Portanto, um caso particular na lógica geral de segregação territorial pelas “forças do mercado”, que reservam os espaços mais distintos da cidade para a rentabilidade imobiliária (Maricato, 2000MARICATO, E. As idéias fora do lugar e o lugar fora das idéias: Planejamento Urbano no Brasil. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 121-192.). Como diz Vainer (2000)VAINER, C. B. Pátria, empresa e mercadoria: Notas sobre a estratégia discursiva do Planejamento Estratégico Urbano. In: ARANTES, Otília; VAINER, Carlos; MARICATO, Ermínia. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 75-103., a venda da cidade, como uma operação de marketing, é a venda dos seus atributos específicos.

Duas coisas chamam a atenção na Estrada Nova. Uma diz respeito ao desprezo por espaços populares por parte da administração municipal, outra é a resistência que os populares opõem às intenções do poder de varrê-los do mapa da cidade. De cima para baixo, o projeto Portal da Amazônia avança seguindo a lógica de abrir ‘janelas para o rio’ e de tornar nobres as margens fluviais de Belém, o que supõe a desqualificação e a remoção dos ocupantes tradicionais. As informações são escassas e os trabalhadores e usuários dos portos da Estrada Nova estão preocupados. Nos desenhos do projeto, mostrados na web, eles não aparecem. Parece que os caboclos – categoria relacional que classifica negativamente o tipo humano característico da Amazônia (Lima, 1999LIMA, D. de M. A construção histórica do termo caboclo: Sobre estruturas e representações sociais no meio rural amazônico. Novos Cadernos NAEA, v. 2, n. 2, p. 5-32, 1999. Disponível em: <periodicos.ufpa.br/index.php/ncn/article/viewFile/107/365>. Acesso em: 02 fev. 2012.
periodicos.ufpa.br/index.php/ncn/article...
) – não são considerados dignos de frequentar essa ‘nova janela’ que se abrirá para o rio Guamá. A ‘nova janela’ segue o disseminado padrão de abrir espaços para o turista convencional e cidadãos locais com poder de consumo. No Portal, a bonita paisagem natural, com o sol se pondo sobre a floresta, do outro lado do rio, é contemplada a partir de lugares de consumo, livres da presença constrangedora dos tipos populares que frequentavam essa margem antes do saneamento. Na sua particularidade, a chamada ‘revitalização’ da Estrada Nova repete a transformação de lugares em não-lugares, conforme o significado dessa oposição dado por Augé (2012)AUGÉ, M. Não lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade. Campinas, SP: Papirus, 2012., para expressar a perda de traços identitários, históricos e relacionais dos espaços urbanos.

Vistos pela prefeitura como lugares desordenados, sem a modernidade exigida para colocar Belém no circuito internacional do turismo, os portos da Palha e do Açaí são feiras populares onde caboclos ribeirinhos vendem açaí e palha, mas também carvão, farinha, verduras e frutas regionais. Também fazem nas imediações seu consumo básico de gêneros alimentícios, roupas e gás de cozinha, entre outros gêneros, uma vez que nesses lugares se encontra de tudo um pouco, inclusive em termos de serviços populares. Portos públicos, os trapiches são portas abertas para quem vem navegando de ilhas e interiores e desembarca na capital para comprar e vender mercadorias, frequentar colégios, encontrar familiares e trocar conversas. Portanto, não é apenas para comprar e vender que eles vêm ao continente, como diria Ítalo Calvino sobre as cidades e as trocas1 1 “Não é apenas para comprar e vender que se vem a Eufêmia, mas também porque à noite, ao redor das fogueiras em torno do mercado [...] para cada palavra que se diz [...] os outros contam uma história [...]” (Calvino, 1990, p. 38). . Os ribeirinhos vêm aos portos também porque, nos trapiches, nas barracas e nas imediações, desdobra-se toda uma vida cultural própria a eles.

Os portos da Palha e do Açaí cumprem funções essenciais na vida dessa gente. Segundo Le Goff (1998LE GOFF, J. Por amor às cidades: conversações com Jean Lebrun. Tradução Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes. São Paulo: UNESP, 1998. Título Original: Pour l’amour des villes: entretiens avec Jean Lebrun., p. 29), “as funções essenciais de uma cidade são a troca, a informação, a vida cultural e o poder”. Entretanto, aqui, o poder municipal pretende substituir funções essenciais por uma estética urbana que exclui frequentadores tradicionais que têm raízes naquele espaço. Contra essa exclusão, é preciso defender a diversidade urbana que as chamadas ‘revitalizações’ propõem destruir. Na esteira de Jacobs (2000JACOBS, J. Morte e Vida de grandes cidades. São Paulo: M. Fontes, 2000., p. 484), que argumenta em favor da vida cotidiana pulsante e da “complexidade desorganizada”, Berman (2007BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 373) propõe uma atitude militante em defesa do diálogo e da interação humana nas cidades:

Devemos, pois, nos empenhar para manter vivo esse ‘velho’ ambiente, por sua capacidade peculiar de alimentar as experiências e os valores modernos: a liberdade da cidade, uma ordem que existe em estado de perpétuo movimento e mudança, a comunhão e a comunicação face a face [...]

Quem usa os portos públicos, que são mercados populares onde se materializam experiências vividas, na acepção totalizante de Marcel Mauss, e que tem afetos para com esse lugar, não quer sair. A prefeitura insiste na requalificação, na aniquilação da existência dessas formas populares, na alienação das pessoas que combinam trabalho com parentesco, vizinhança, cultura e liberdade (Polanyi, 2000POLANYI, K. A grande transformação: As origens da nossa época. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.). Aí está o conflito. Vivendo e trabalhando anos a fio nas condições precárias do lugar, feirantes, ribeirinhos, quilombolas, apanhadores e batedores de açaí, marreteiros, carregadores, pequenos comerciantes, moradores, entre outros usuários, querem finalmente usufruir da urbanização que agora o poder público anuncia: “quem roeu o osso tem que comer o filé”, é um mote que vigora na Estrada Nova.

“O PORTO VAI ACABAR? ESSE É O MEDO DE TODOS QUE TRABALHAM AQUI”

Para esses lugares de relações e usos, os habitantes das ilhas vêm desde as primeiras horas da madrugada para extrair dentes, realizar exames médicos e cumprir uma série de outras necessidades. No Porto da Palha, uma sociedade beneficente oferece, mediante plano de saúde popular, serviços odontológicos, além de clínico geral, ginecologista e pediatra. O porto recebe também alunos que vêm do interior para estudar em Belém. Igualmente movimentado, o Porto do Açaí funciona 24 horas e é uma das principais portas de entrada do açaí e da farinha em Belém. Vindos das ilhas, diariamente desembarcam nesses trapiches – que “apresentam precária condição de estrutura” (Tobias et al., 2010TOBIAS, M. S. G. et al. D-Fluvial. Relatório técnico final. Demanda potencial e formação de rede rodofluvial na Região Metropolitana de Belém – D-Fluvial. Belém: Ponto Press, 2010., p. 75) – cerca de mil passageiros (Tobias et al., 2010TOBIAS, M. S. G. et al. D-Fluvial. Relatório técnico final. Demanda potencial e formação de rede rodofluvial na Região Metropolitana de Belém – D-Fluvial. Belém: Ponto Press, 2010.), que dali embarcam de volta para suas casas. O direito de ir e vir, consagrado na Constituição como direito fundamental, que o Estado deve garantir mediante políticas públicas (Fonseca; Cichovski, 2010FONSECA, L.; CICHOVSKI, P. O direito de ir e vir: A integração de políticas públicas na gestão Urbana. In: TOBIAS, M. S. G.; COUTINHO NETO, B. (Org.). Grande Belém: Faces e desafios de uma metrópole insular. Belém: Ponto Press, 2010. p. 49-63., p. 50), o projeto portal nega a toda essa multidão. Esse é o problema que enfrentam os ribeirinhos das ilhas de Maracujá, Patos, Jussara, Papagaios e Combu, da parte sul da cidade de Belém.

Por tudo que oferecem, ainda que o município não ofereça nada – “apesar de ser responsabilidade do município, na maioria das vezes, a manutenção é feita pelos usuários, donos de embarcação e comerciantes” (Tobias et al., 2010TOBIAS, M. S. G. et al. D-Fluvial. Relatório técnico final. Demanda potencial e formação de rede rodofluvial na Região Metropolitana de Belém – D-Fluvial. Belém: Ponto Press, 2010., p. 75), os portos representam um bem para a vida cotidiana de toda uma população ribeirinha, com quem a prefeitura de Belém não dialoga. Em vez disso, feirantes e usuários são ignorados: “nunca veio ninguém da prefeitura aqui”, denuncia o Sr. Sarmento, fundador da sociedade beneficente. Situados justo no caminho do vistoso projeto, os portos estão ameaçados de remoção. Dizem que os feirantes podem ser transferidos para a periférica área das Centrais de Abastecimento do Pará (CEASA), mas ninguém sabe ao certo. “O porto vai acabar? Esse é o medo de todos que trabalham aqui”, diz uma feirante. Temor mais do que justificado, já que nas maquetes do projeto os trapiches não aparecem.

Um texto encontrado no site da prefeitura, intitulado “Portal da Amazônia muda cara de Belém”, explica que:

O Portal da Amazônia é uma iniciativa da Prefeitura de Belém que envolve duas grandes obras: a Macrodrenagem da Estrada Nova e a Orla de Belém. Ambos empreendimentos têm o objetivo principal de recuperar a grande área da Bacia da Estrada Nova, que se tornará o novo ponto turístico da capital paraense. (...) Para a execução da Macrodrenagem, a Prefeitura de Belém conta com financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no valor de U$ 135 milhões. Sob a coordenação do Programa de Saneamento da Bacia da Estrada Nova (Promabem), a Construtora Andrade Gutierrez é responsável pelas obras previstas para o trecho entre a RuaVeiga Cabral e a Av. Fernando Guilhon e adjacências, com contrato no valor de R$ 149.533.106,38. Já a Orla de Belém vem para complementar o projeto da Macrodrenagem, ampliando os benefícios para os moradores da área e de toda a capital paraense. Serão 6 km de orla entre o Mangal das Garças e a Universidade Federal do Pará: uma verdadeira janela voltada para o Rio Guamá, equipada com infraestrutura adequada para a prática de esportes ao ar livre, realização de eventos, turismo e lazer. A Andrade Gutierrez também é responsável pelas obras da Orla de Belém, sob a coordenação da Secretaria Municipal de Urbanismo (Prefeitura Municipal de Belém, c2015PREFEITURA MUNICIPAL DE BELEM. Portal da Amazônia muda a cara de Belém. Belém: CINBESA, c2015. Disponível em: <http://www.belem.pa.gov.br/app/c2ms/v/index.php?id=25&conteudo=2747>. Acesso em: 10 jul. 2010.
http://www.belem.pa.gov.br/app/c2ms/v/in...
).

Nenhuma menção sobre os portos da Palha e do Açaí. A obra avança e a cidade não reconhece esses espaços de vivências e enraizamentos, “verdadeiras ‘portas para o rio’” (Trindade Júnior; Tavares, 2008TRINDADE JUNIOR, S-C C. da.; TAVARES, M. G. da C. Cidades ribeirinhas na Amazônia: Mudanças e permanências. Belém: EDUFPA, 2008., p. 46). O debate se restringe a blogs, esferas acadêmicas e ao movimento de resistência. O discurso das ‘janelas para o rio’ conquistou uma adesão na cidade que beira o consenso, uma espécie de pensamento único.

Já os ribeirinhos, meio invisíveis na cidade, preferem a metáfora de ‘portas para o rio’: “todos os portos representam isso mesmo, são portas de acesso, é o acesso que a pessoa tem, pra vir estudar, pra vir trabalhar, pra vir procurar atendimento médico”, fala Félix dos Santos, da Associação dos Trabalhadores do Porto do Açaí. Integrando o Movimento em Defesa dos Portos Públicos da Cidade de Belém está o Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia, que produziu fascículos, vídeos e debates procurando mostrar que a cidade real não é a representação que o Portal da Amazônia faz dela. Tem muita vida popular nesses portos públicos, que a Prefeitura nega. “É como se pegasse uma borracha e apagasse toda a economia local”, constata Félix sobre o Portal.

O principal obstáculo do projeto do Portal é, de fato, as pessoas, os caboclos ribeirinhos de carne e osso, que a prefeitura quer remover para implantar ali uma bela paisagem ribeirinha artificial, ao gosto dos turistas convencionais e da elite local, além, evidentemente, dos empresários dos ramos imobiliário e do lazer, que já começam a investir no novo espaço. De modo que o projeto Portal da Amazônia é um caso típico do que se chama destruição criativa, de substituição de uma vida social por outra, própria da lógica especulativa do capital (Harvey, 1994HARVEY, D. The condition of postmodernity. Cambridge, USA: Blackwell Publishers, 1994.). O que se quer, ali, é artificializar uma geografia conveniente ao lucro e isso empobrecerá vínculos culturais e afetivos. A gentrificação da Estrada Nova é também um caso que ilustra as possibilidades e os limites de resistência popular a uma arbitrariedade do poder público.

A GENTRIFICAÇÃO NA ESTRADA NOVA PELO PORTAL DA AMAZÔNIA

Anunciando que o Portal da Amazônia vai fazer surgir uma nova cidade e valorizar a alma ribeirinha de Belém, a prefeitura avança com o projeto de abrir mais uma ‘janela para o rio’. O projeto segue a lógica de tornar nobres as margens fluviais de Belém, o que supõe a desqualificação e a remoção dos seus ocupantes tradicionais. O Portal da Amazônia é uma intervenção urbana atravessada pela ideologia que vê os trapiches, as feiras e a vida cotidiana do popular bairro do Jurunas como algo desorganizado e feio, a ser destruído para dar lugar a espaços modernos e vistosos, adequados à visitação de classes sociais mais elevadas. Não é pensado para os moradores locais, que não merecem a valorizada paisagem natural vista da orla, que deve ser requalificada para se tornar um novo cartão postal da cidade. Implica, pois, em remoção de tudo que não condiz com essa estética. Esse viés pode ser ilustrado pelas propostas de substituir o popular Porto do Açaí por um shopping do açaí, e os trapiches, onde atracam barcos e cascos de madeira carregados de gente, paneiros de açaí e sacos de farinha, por piers, que demarcam um estacionamento de lanchas numa marina (Figuras 1 e 2).

Figuras 1 e 2
Contraste entre o Porto do Açaí como é hoje e a marina que se propõe. Foto: Rodrigo Peixoto e Jakson Silva. Desenho: Website da Prefeitura Municipal de Belém.

O espaço enobrecido foi planejado para ser frequentado por pessoas de classe, bem enroupados consumidores, e não mais pelo produtor de açaí que vem do interior e das ilhas do município para vender seu produto. O típico usuário do Porto do Açaí, o ribeirinho em trajes simples e sandálias de dedo, foi excluído do valorizado espaço, que sofreu uma espécie de assepsia social. Esse é o viés ideológico do Portal da Amazônia, cuja maquete eletrônica contrasta fortemente com o uso popular que o espaço tem hoje. Esse é o sentido da gentrificação (Figuras 3 e 4).

Figuras 3 e 4
Contraste entre o atual uso popular do Porto da Palha e o water front que se propõe. Desenho: Website da Prefeitura Municipal de Belém. Foto: Rodrigo Peixoto e Jakson Silva.

A vida popular na orla é negada pelo poder público. A maquete do projeto Portal da Amazônia idealiza um lugar rarefeito de gente. Automóveis circulando em amplas pistas, arquitetura arrojada e poucas pessoas, quiçá turistas contemplando a paisagem. Essa representação modernista da orla exclui o torvelinho2 2 E, no entanto, conforme Berman (2007, p. 407): “ser moderno (...) é experimentar a existência pessoal e social como um torvelinho (...) é sentir-se de alguma forma em casa em meio ao redemoinho, fazer seu o ritmo dele, movimentar-se entre suas correntes em busca de novas formas de realidade, beleza, liberdade, justiça, permitidas pelo seu fluxo ardoroso e arriscado”. dos portos públicos e estetiza uma imagem ribeirinha da chamada Metrópole da Amazônia na forma de um cartão postal. Do ponto de vista elitista do projeto, os caboclos e seus lugares são feios e tudo que esse urbanismo quer é removê-los para longe. Justamente para dar lugar a empreendimentos empresariais, já que a valorização patrimonial que o projeto vai proporcionar àquele espaço não condiz com o atual uso popular. De fato, a requalificação alimenta o atual boom imobiliário que vai configurando o perfil da cidade com torres de alto padrão construtivo:

Desde o início do século existia, perto do Arsenal, a estância São Bernardo. Com o anúncio da obra do Portal da Amazônia, esse terreno de 37.000 m2 foi transacionado para a Zappi Construções da Incorporadora INPAR, que promove a venda do “Portal do Mangal”, empreendimento que prevê a construção de 11 torres com 286 apartamentos de três e quatro suítes, com 202 m2 e 230 m2 (Almeida (Coord.), 2009ACSELRAD, H. Mapeamento, identidades e territórios. In: ACSELRAD, H. (Org.). Cartografia social e dinâmicas territoriais: marcos para o debate. Rio de Janeiro: IPPUR, UFRJ, 2010. p. 9-46.).

Assim, o que orienta o Portal da Amazônia não é apenas a abertura de uma ‘janela para o rio’. Com suas seis pistas de setenta metros de largura – além de área de passeio, estacionamento, ciclovia, quadras de esporte, equipamentos de ginástica, restaurantes “e quiosques nos moldes das orlas construídas nos grandes centros, como Recife e Rio de Janeiro” (Diário do Pará, 2010DIÁRIO DO PARÁ. Ministro visita grandes obras em Belém. 16 de abril, 2010. Disponível em: <http://diariodopara.diarioonline.com.br/N-86194-ministro+visita+grandes+obras+em+belem.html>. Acesso em: 23 dec. 2015.
http://diariodopara.diarioonline.com.br/...
)3 3 Diário do Pará. Ministro visita grandes obras em Belém. 16/04/2010. Disponível em: <http://diariodopara.diarioonline.com.br/N-86194-ministro+visita+grandes+obras+em+belem.html>. Acesso em: 23 dec. 2015. –, trata-se de uma requalificação urbana voltada para a produção de riqueza. Uma gentrificação, portanto:

Na verdade é a valorização das propriedades fundiárias ou imobiliárias o motor que move e orienta a localização dos investimentos públicos, especialmente na circulação viária. Há uma simbiose entre a abertura de grandes vias e a criação de oportunidades para o investimento imobiliário. Trata-se de obras que são mais imobiliárias que viárias, no dizer do urbanista Candido Malta Campos Filho, já que a lógica do seu traçado não está apenas, e às vezes, nem principalmente, na necessidade de melhorar os transportes, mas na dinâmica de abrir novas frentes (localizações) para o mercado imobiliário de alta renda. Talvez mais do que a lógica da circulação baseada no veículo individual, o que orienta esse tipo de investimento seja a lógica da rentabilidade imobiliária (Maricato, 2000MARICATO, E. As idéias fora do lugar e o lugar fora das idéias: Planejamento Urbano no Brasil. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 121-192., p. 158).

Nesse sentido, o Portal é uma intervenção urbana atravessada por ideologias e interesses, entre os quais o de abrir um novo espaço para o mercado imobiliário. Esse viés do planejamento urbano, o de criar oportunidades para o investimento imobiliário, e um aspecto central da gentrificação. Associado a esse interesse de abrir espaços ao investimento imobiliário, outra feição a ser ressaltada nesse modelo de planejamento urbano é o “culturalismo de mercado” (Arantes, 2000ARANTES, O. B. F. Uma estratégia fatal: A cultura nas novas gestões urbanas. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 11-74.). A cultura – no caso de Belém, temos a paisagem cultural, dada pela vista da floresta amazônica do outro lado do rio – é transformada em mercadoria e posta à venda, somando como um elemento a mais na competição entre cidades.

O OUTRO NEGADO: O CABOCLO É REMOVIDO PARA DAR LUGAR AO CULTURALISMO DE MERCADO

As orlas de Belém são alvo de apropriações modernizadoras que pretendem deslocar os que lá estão, substituindo uma cultura local, uma “substância viva”, como diz Honneth (2009HONNETH, A. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos. São Paulo: Editora 34, 2009., p. 64), por uma paisagem cultural, a gosto do mercado de consumo. Seguindo o argumento de Arantes (2000)ARANTES, O. B. F. Uma estratégia fatal: A cultura nas novas gestões urbanas. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 11-74., esse tipo de intervenção urbanística se enquadra na lógica de tornar a cidade competitiva, frente a outras cidades que igualmente modernizam seus water fronts. Esse pensamento hegemônico, ao ponto de ser tomado como único, leva a uma varredura de tudo o que parece atrasado, “primitivo”. Tendência culturalista, a qual, de acordo com a autora, abre toda uma concepção de cidade excludente do Outro. Na ótica de Paul Ricoeur, isso significa a morte do Outro, o contrário de uma presença da alteridade (Rossatto, 2004). Ou seja, o projeto Portal da Amazônia nega o Outro, na sua substância cultural, para remove-lo, transformá-lo em mais pobre, sem moradia agora, para então finalmente incluí-lo na lógica de programas para enfrentamento da pobreza, bem ao gosto do Banco Mundial, que aliás financia o projeto. Essa é a matriz.

O “tudo é cultura” da era que parece ter se inaugurado nos idos de 1960 teria pois se transformado de vez naquilo que venho chamando de culturalismo de mercado. De tal forma que a cultura [...] ao tornar-se imagem, quer dizer, representação e sua respectiva interpretação (como sabe qualquer gerente de marketing numa sociedade do espetáculo), acabou moldando Dai a ancora identitária da nova urbanistica. (Arantes, 2000ARANTES, O. B. F. Uma estratégia fatal: A cultura nas novas gestões urbanas. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 11-74., p 16).

Para continuar com uma visada filosófica sobre a questão da alteridade, vamos considerar um pouco Emmanuel Lévinas, para quem a fundação da ética consiste na obrigação em responder ao Outro. Lévinas percebe o quanto é necessário a revalorização do sentido ético do humano e do respeito às diferenças; refletindo sobre a importância do reconhecimento do Outro e convida a todos a assumir uma sociedade plural, fraterna e pacífica. O filósofo, em O humanismo do outro homem (1993), propõe a ética como filosofia primeira, abordando o conceito de Alteridade como princípio da relação humana (Lévinas, 1993LEVINAS, E. Humanismo do outro homem. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993.). A Alteridade não é apenas uma qualidade do outro, é sua realidade, sua instância, a verdade do seu ser. Significa co-habitar com a diferença, é viver o eu-tu profundamente. No entanto, a sociedade capitalista não conduz o ser humano a co-habitar com a diferença. O que é alteridade? Alteridade é o relacionar-se concretamente com o que está além de mim, aquilo que é exterior a mim, fora do meu controle, da minha posse, aquilo sobre o que eu não tenho domínio algum.

No entanto, a intervenção na orla de Belém procura totalizar as pessoas e os objetos na lógica das “janelas para o rio”. Isso se aplica à cidade, mas também a metáfora se aplica a uma visão de mundo. A resistência contra isso se dá na medida em que os seres humanos, os caboclos que tem um pé na cidade e outro nas ilhas em torno de Belém, lutam para defender a sua alteridade como algo respeitável. A resistência é o não aceitar o desrespeito a essa alteridade. Ser ético é dar a possibilidade de o outro ser ele mesmo. Coisa que o projeto não contempla. Para Lévinas existe uma questão ética central que é a valorização da vida, inclusive a vida na orla com toda sua substância cultural. A preservação dos portos públicos da Palha e do Açaí, assim como todo o entorno que caracteriza uma pujante economia popular naquela área, é tema de grande importância para a cidade de Belém.

JANELAS VERSUS PORTAS: UM CONFLITO EM METÁFORAS

O desejo local de ‘janelas’ fez-se como um discurso hegemônico. O interesse em produzir lucros, evidentemente no interesse de poucos, gerou uma vontade coletiva, na forma de uma ideologia dominadora, conforme argumenta Harvey (1994HARVEY, D. The condition of postmodernity. Cambridge, USA: Blackwell Publishers, 1994., p. 343) “Capital [...] achieves growth through creative destruction, creates new wants and needs, exploits the capacity for human labour and desire, transforms spaces [...]”. O capital imobiliário, ligado aos ramos do turismo, lazer e residencial, está muito interessado na estruturação da Estrada Nova e interage com o poder público, que, por sua vez, está interessado na captação de investimentos. A ‘nova janela’ é trabalhada, no discurso oficial, como algo que ‘eleva a autoestima da população’, aparecendo para a grande maioria como uma necessidade da cidade.

Interessante notar que a vigência do difundido desejo de ‘janelas para o rio’, que se firmou como um discurso dominante em Belém, tem um percurso. Progrediu do sentimento de decadência, instalado desde a débâcle da borracha e expresso na imagem presente de uma orla atravancada por massas falidas, para a exaltação de um futuro a ser construído com base em valores culturais e identitários. Emulou, assim, uma trajetória discursiva verificada em outras cidades. O percurso do apelo de ‘janelas para o rio’, em Belém, acompanhou uma tendência internacional, referenciada, principalmente, na experiência de Barcelona e na intenção de, a partir de uma situação de crise, promover uma imagem atraente da urbe em um contexto competitivo.

A receita inclui a promoção de consenso social em relação às prioridades da administração pública e o efeito impactante de obras monumentais de grande visibilidade, conforme extrai Vainer (2000VAINER, C. B. Pátria, empresa e mercadoria: Notas sobre a estratégia discursiva do Planejamento Estratégico Urbano. In: ARANTES, Otília; VAINER, Carlos; MARICATO, Ermínia. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 75-103.apudCastells; Borja, 1996CASTELLS, M.; BORJA, J. As cidades como atores políticos. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, n. 45, p. 152-166, jul. 1996. Quadrimestral. Disponível em: <http://novosestudos.org.br/v1/files/uploads/contents/79/20080626_as_cidades_como_atores.pdf>. Acesso em: 20 out. 2014.
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, p. ). No caso de Belém, o consenso social são as ‘janelas para o rio’, e o efeito impactante são obras tais como a Estação das Docas, o Mangal das Garças e o projetado Portal da Amazônia. Nessa linha, a gentrificação da orla sul de Belém, pelo Portal da Amazônia, é um “embelezamento estratégico” (Leite, 2002LEITE, R. P. Contra uso e espaço público: notas sobre a construção social dos lugares na Manguentown. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 17, n. 49, p. 115-134, jun. 2002. Quadrimestral.), que escolhe certos espaços centrais para serem urbanizados a fim de inserir a cidade no cenário mundial de urbes que disputam investimentos privados.

Enquanto o modelo busca favorecer o turismo e a especulação imobiliária, engendra a resistência ribeirinha, que propõe, alternativamente, a metáfora das ‘portas para o rio’. No debate sobre a orla, as metáforas de ‘janelas’ e ‘portas’ encerram sentidos muito distintos. O movimento de resistência busca lugar no imaginário da população, a fim de quebrar o consenso que concebe o litoral de Belém apenas como espaço de consumo e lazer. Há outras possibilidades de uso das beiras de água, além da exclusiva dimensão contemplativa das ‘janelas’. Como ‘portas’, as beiras não se restringem à contemplação, ventilação e ao direito à paisagem, elementos importantes. As beiras são reivindicadas também como “espaços de vivências, de contatos e de existências, que proclamam mais do que o direito à paisagem, o direito ao espaço e à cidade, como proclamou Lefebvre” (Trindade Júnior; Tavares, 2008TRINDADE JUNIOR, S-C C. da.; TAVARES, M. G. da C. Cidades ribeirinhas na Amazônia: Mudanças e permanências. Belém: EDUFPA, 2008., p. 46).

O movimento em favor dos portos busca dar visibilidade a isso e reclama infraestrutura para melhorar os espaços ribeirinhos na cidade, que o urbanismo municipal não leva em conta. Félix dos Santos, presidente da Associação dos Trabalhadores do Porto do Açaí, questiona a prefeitura, que removeu famílias da Estrada Nova em função do projeto Portal da Amazônia. Félix decifra a essência do projeto, por trás da metáfora das ‘janelas’: “se foi a prefeitura que desapropriou, por que apareceu uma empresa lá pra tomar conta de tudo, pra ser um condomínio de luxo, onde ia ser a entrada do Portal? São questionamentos que a gente não tem resposta”.

AS VÁRIAS ORLAS DE BELÉM

O Portal da Amazônia é composto por dois grandes projetos: o projeto Orla de Belém, o próprio Portal da Amazônia, e o projeto de Macrodrenagem da Bacia da Estrada Nova (PROMABEM). O Portal da Amazônia inicia no Complexo Ecológico Mangal das Garças, na Cidade Velha, e vai até a Universidade Federal do Pará (UFPA), no bairro do Guamá. Desde quando foi lançado, em 2005, tem enfrentado várias divergências técnicas e contradições econômicas, apresentando hoje uma configuração muito diferente da sua concepção original. Em audiência pública realizada no Ministério Público, em 2012, um representante da prefeitura falou das modificações feitas no projeto, no decorrer de sua implantação. Foram duas: uma técnica e outra social. Sobre esta última, ele disse:

O problema mais grave que acontecia era o social. Dentro da área de intervenção tinham em torno de 300 e 350 pra ser removidas. Isso gerou um movimento muito forte na população de negativa à implantação desse projeto. A população se revoltou. Então a alternativa foi fazer outro estudo hidrológico da cidade para mudar a concepção da macrodrenagem. A gente tiraria o piscinão para implantar galerias. Ia funcionar tanto como dispositivo de encadeamento da água, quanto de volume de elevação (informação verbal, 2012)4 4 Técnico da PMB. Audiência pública sobre o projeto Portal da Amazônia. Ministério Público Estadual. 10 ago. 2010. Gravada por Jakson Silva; Rodrigo Peixoto. .

Na parte já inaugurada da obra, as sub-bacias 1 e 2, observa-se apenas um pequeno prédio para os poucos moradores que permaneceram na área. Esses moradores vêm se tornando vendedores ambulantes de água, pipoca, cerveja, algodão-doce e refrigerante. O Portal não elaborou um projeto social adequado para os moradores que podiam se tornar trabalhadores nos quiosques construídos pela prefeitura. Não há nenhum diálogo sobre remanejamento das pessoas: “as comunidades só sabem do projeto quando as obras chegam” (Malheiro, 2009MALHEIRO, B. C. P. Portos, Portas e Postais: experiências, discursos e imagens produzindo a orla fluvial de Belém (PA). 2009. 189 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)-Universidade Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Belém, 2009., p. 125). O projeto avança de forma obscura, sem qualquer critério de transparência pública. Os principais atingidos não têm acesso às informações sobre a execução da obra. A pesquisa de campo revelou que as divergências políticas e contradições técnicas que caracterizam a obra refletem o estado de desarticulação entre as secretarias e os órgãos da prefeitura. Quando realizávamos pesquisa na área, em virtude do Estudo de Impacto de Vizinhança das sub-bacias III e IV, não conseguimos ter acesso a informações sobre o projeto original. É evidente a intenção de ‘limpar’ a orla sul de seus ocupantes tradicionais.

Na península que dá forma à cidade, são poucos os locais onde a população tem livre acesso às águas, os portos do Açaí e da Palha entre esses. As beiras vão se tornando seletivas na medida em que se abrem ‘janelas para o rio’, anseio que tomou conta do imaginário da população. As beiras de Belém e a maneira como elas vêm sendo apropriadas – na dimensão de paisagem cultural apropriada como local de consumo – dizem muito sobre a morfologia e a dinâmica socioespacial dessa metrópole insular. Dizem respeito, especialmente, ao mercado imobiliário e à correspondente remoção de moradores antigos e ao direito de ir e vir.

Na história da cidade, suas margens foram conquistadas mediante intervenções públicas, como foi o caso do Dique de Belém, obra do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), inaugurada em 1944 e realizada com financiamento americano no bojo dos Acordos de Washington, de 1942, como “contrapartida” pelo uso do aeroporto de Val-de-Cans como base militar norte-americana durante a Segunda Guerra Mundial. Construído ao longo do rio Guamá, o dique deu origem à Estrada Nova (Santos, 2002SANTOS, E. R. C. À Beira do rio e às margens da cidade: diretrizes e práticas de planejamento e gestão para a orla de Belém (PA). 2002. 154 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)-Universidade Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Belém, 2002.), alvo atual da intervenção da prefeitura com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Banco Mundial.

Ao lado dessa e de outras vistosas ‘janelas’, subsistem realidades populares como ‘espaços opacos’, que é como Milton Santos se refere aos lugares marginalizados na cidade. Portanto, para qualificar Belém com respeito às suas águas e beiras, é preciso dizer que a cidade tem muitas orlas, umas mais prestigiadas que outras. Além do rio Guamá e da baía do Guajará, os dois mais importantes corpos d’água, cuja confluência dá a forma peninsular da cidade, seu território é cortado por várias bacias hidrográficas, onde desaguam uma infinidade de pequenos igarapés, como o Tucunduba, que resiste a duras penas como rio urbano, enquanto tudo mais se transformou em canal malcheiroso.

Nessas orlas desprestigiadas de Belém, insistem em existir caboclos ribeirinhos que migraram para a capital, tangidos pelo desenvolvimento regional promovido pela Superintência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). Aqui residem conflitos permanentes: o Tucunduba, como outras ‘baixadas’ da cidade, são anti-cartões postais, favelas que as administrações ignoram, enquanto moradores e movimentos populares lutam por atenção pública básica, como água nas torneiras e coleta de lixo: “mas não é só de lama que é feito esses lugares, o lixo também se mistura ao cotidiano de cada um ali e tudo parece vil aos olhos” (Malheiro, 2009MALHEIRO, B. C. P. Portos, Portas e Postais: experiências, discursos e imagens produzindo a orla fluvial de Belém (PA). 2009. 189 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)-Universidade Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Belém, 2009., p. 149). A SUDAM, cuja atuação, mediante a concessão de gordas facilidades e incentivos fiscais, é patrocinadora da ocupação privada da orla da Estrada Nova, que gera a justa indignação de muitos que moram perto do rio, mas não vêem suas águas, como nos informa Santos (2002SANTOS, E. R. C. À Beira do rio e às margens da cidade: diretrizes e práticas de planejamento e gestão para a orla de Belém (PA). 2002. 154 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)-Universidade Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Belém, 2002., p. 46-47):

A ocupação da orla, geralmente, é feita por grupos políticos e econômicos favorecidos, que representam os diversos estabelecimentos comerciais, portuários, industriais e de lazer que sempre, de alguma forma, estão ligados ao transporte fluvial. [...] Boa parte da orla de Belém passou a ser apropriada por particulares. Se hoje o poder público ‘quebra a cabeça’ para recuperar e planejar novos usos para as áreas de orla da cidade, há trinta anos atrás ele ofereceu vantagens e incentivos diversos que contribuíram para que ela tivesse a forma como tem na atualidade.

A informação, passada no vídeo de propaganda do projeto, de que “são quase sete quilômetros de orla, grande parte tomada pelos imóveis que fecham as janelas e ofuscam a beleza da metrópole” (Portal da Amazonia, video), é, pois, evidente e com ela concorda grande parte da população. Contudo, a informação não distingue entre imóveis que realmente obstruem o espaço público – postos de gasolina, vários portos privados, hotéis, estâncias e prédios diversos – e os portos públicos, onde pulsa a vida ribeirinha. É, pois, por esse discernimento e reconhecimento social que se bate o Movimento em Defesa dos Portos Públicos da Cidade de Belém.

Com a retirada dos portos, não são apenas relações duráveis e solidárias entre pessoas que se romperão, embora isso seja muito importante, como afirma Raimundo Oliveira, presidente da Associação das Feiras e Mercados do Município de Belém (ASFEMBEL): “É importante na nossa vida a questão da solidariedade, de uns estarem ajudando os outros. O remanejamento quebra isso. Eu percebi que na Vila da Barca quebrou a corrente de solidariedade, separando os vizinhos no processo de remanejamento” (Informação verbal, 2012)5 5 Raimundo Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 10 out. 2012. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto. . Nos portos, há um grande número de trabalhadores – produtores de açaí, farinha e outros produtos, marreteiros, carregadores, maquineiros, feirantes – que fazem do trabalho ali uma espécie de “fato social total”, conforme entende Mauss (2008MAUSS, M. Ensaio sobre a dádiva. Lisboa, Portugal: Edições 70, 2008., p. 90). “No fundo, são misturas. Misturam-se as almas nas coisas; misturam-se as coisas nas almas. Misturam-se as vidas e eis como as pessoas e as coisas misturadas saem, cada uma, das suas esferas e se misturam” – e conforme descreve com propriedade Malheiro (2009MALHEIRO, B. C. P. Portos, Portas e Postais: experiências, discursos e imagens produzindo a orla fluvial de Belém (PA). 2009. 189 f. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento)-Universidade Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Belém, 2009., p. 156):

No limite da troca está o encontro, os homens que se aglomeram ao redor dos paneiros geralmente conhecem quem comercializa esses paneiros, sendo que o reconhecimento é mútuo, o que permite observar relações criadas a partir do ato da troca. Nessas relações estão latentes as necessidades, a sobrevivência, os atos repetitivos nos dão a noção dessa necessidade: são várias rodas formadas, a todo o momento, no trapiche, as interações marcam o espaço de cultura. Mas essas interações não se encerram após a negociação, as conversas, o reconhecimento, são as suas extensões.

ECONOMIA E VIDA POPULAR NA ESTRADA NOVA

O movimento desses portos, que funcionam 24 horas também como feiras populares, é intenso e é grande a quantidade de gente que os frequenta:

Porque no Porto do Açaí se você conferir os boxes são 35, só que a maioria dos trabalhadores são pessoas que ficam no meio, são as pessoas que não têm boxes, são os ribeirinhos, são os carregadores. É pessoas que vem trazendo outras mercadorias pra vender no porto. [...] chega a mais de duas mil pessoas, no final de semana atinge mais de duas mil pessoas (Informação verbal, 2012)6 6 Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto. .

Estes portos públicos recebem do interior grande parte da farinha e do açaí consumidos em Belém, conforme mostram os dados da Secretaria Municipal de Economia, embora tais dados oficiais registrem apenas uma parcela do total de produtos populares movimentados ali (ver Tabelas 1 e 2). Em função desse movimento, nas suas imediações funcionam comércios e serviços completamente vinculados à vida ribeirinha, relatou Félix dos Santos:

Tabela 1
Porto do Açaí. Procedência dos produtos regionais comercializados em 2010 (toneladas). Fonte: DCT/DFMP/SECON/Prefeitura Municipal de Belém.

Tabela 2
Porto da Palha. Procedência dos produtos regionais comercializados em 2010 (toneladas). Fonte: DCT/DFMP/SECON/Prefeitura Municipal de Belém.

Na Estrada Nova você encontra um comércio diferenciado que são lojas, oficinas de motores marítimos. Em outro canto da cidade você não vê isso, e lá você vê uma do lado da outra. É oficina de motores. Venda e conserto de motores. Onde você recarrega bateria também. [...] O movimento deles é o ribeirinho [...]. Eles têm créditos, no caderninho e tudo, tem toda essa confiança (Informação verbal, 2012)7 7 Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto. .

A importância do Porto da Palha e do Porto do Açaí vai além da Estrada Nova, sua influência alarga-se para outras ‘zonas pobres’ de Belém, bairros onde se concentram os imigrantes, como Guamá, Condor e Jurunas: “todo mundo que mora na Estrada Nova, Guamá, Cidade Velha, você pode reparar que todo mundo tem parente no interior: Abaetetuba, Acará, Muaná. Devido ao ligamento que sempre existiu, então sempre houve essa aproximação” (Félix dos Santos). Assim, por todo o significado que os portos têm para os ribeirinhos e para os muitos que, migrados para a cidade, continuam a cultivar o ambiente caboclo desses lugares, e a frequentar as festas de padroeiros ali mesmo ou nos seus interiores de origem, e que, embora na cidade, mantêm “múltiplas identidades de ribeirinhos e citadinos” (Rodrigues, 2008RODRIGUES, C. I. Vem do bairro do Jurunas: sociabilidade e construção de identidades em espaço urbano. NAEA: Belém, 2008., p. 65), os portos são lugares de sociabilidade, assim como o próprio bairro do Jurunas, povoado de migrantes, a que Rodrigues (2008RODRIGUES, C. I. Vem do bairro do Jurunas: sociabilidade e construção de identidades em espaço urbano. NAEA: Belém, 2008., p. 63) se refere nessa passagem:

O conceito de sociabilidade, como forma lúdica, igualitária e afetiva de associação, é um conceito extremamente útil para entender, no contexto da cidade, as redes e relações estabelecidas pelos migrantes, assim como os processos de construção de identidades em espaço urbano, com base na localidade do bairro.

Conforme questiona Trindade Júnior (1999TRINDADE JÚNIOR, S-C. C. da. Assentamentos urbanos e metropolização na Amazônia brasileira: o caso de Belém. In: ENCUENTRO DOS GEOGRAFOS DA AMERICA LATINA, 7., 1999, Santiago. Annales... Santiago: Universidad de Chile, 1999. p. 35-45. Disponível em: <http://docslide.com.br/documents/assentamentos-urbanos-e-metropolizacao-na-amazonia.html>. Acesso em: 18 dez. 2015.
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, p. 13), como resistir a essas subtrações? – “das identidades criadas como moradores das baixadas, das representações que fazem do seu espaço e de sua cultura, de sua organização política e também de sua sociabilidade conquistada nas práticas cotidianas de seu espaço vivido”. Como resistir à lógica segregacionista da forma urbana, cuja prática, de acordo com Lefebvre (1998)LEFEBVRE, H. A revolução urbana. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1998., é a “expulsão dos elementos populares”? Enfim, remetendo à resistência que os trabalhadores e usuários dos portos opõem ao espúrio projeto da prefeitura, que propõe evocar a cultura ribeirinha numa orla estetizada, se é para usar metáforas, eles preferem a de ‘portas’ em vez da de ‘janelas’.

De fato, os portos públicos significam ‘portas’ de entrada de Belém para os ribeirinhos das ilhas e dos municípios do interior, que desembarcam ali para vender produtos, fazer exames de saúde na cidade, trazer seus filhos para estudar e encontrar parentes. Para os ribeirinhos e para os migrantes que têm parentes no interior, interessa mais essas ‘portas’ de acesso que as meras ‘janelas’ para o rio.

RESISTÊNCIA RIBEIRINHA NA ORLA FLUVIAL DE BELÉM

A resistência ribeirinha na orla fluvial de Belém reúne movimentos sociais de moradores, feirantes e usuários em geral dos portos públicos e arredores, como por exemplo, a Associação dos Trabalhadores do Porto do Açaí, a Associação do Complexo de Abastecimento do Jurunas e a Associação das Feiras e Mercados do Município de Belém. A prefeitura ameaça retirar portos, trapiches, feiras e vilas, e a resistência vem dos usuários desses espaços populares e dos moradores que reivindicam a permanência e a melhoria infraestrutural desses lugares. Iluminação, segurança, ampliação dos trapiches, ampliação da oferta de embarcações para o transporte de estudantes: a luta do movimento é pela gestão democrática da cidade. Mas o debate com a prefeitura é difícil. As audiências públicas para discutir o Portal da Amazônia com a população atingida não foram democráticas, como atesta Félix dos Santos:

Mesmo difícil, a gente foi atendido umas duas vezes. Só que é aquele negócio. Ele falou que ia fazer e não fez. Mas a gente nunca fecha o diálogo, porque a gente acredita no diálogo. A gente não interdita a rua. A gente não faz greve. A gente tenta através da conversa. A gente não procura se unir a um partido, porque isso atrapalha muito, quem é de movimento social não tem que carregar bandeira de nenhum partido. Tem que carregar a bandeira da sua associação. Dependendo de qual for o gestor. Ele foi eleito, então, ele é o nosso prefeito. A gente tem que cobrar isso dele. Tem muita gente que confunde as coisas. Entra no movimento social, mas através do partido e muitas das associações são atendidas porque é ligada a tal vereador, deputado. A gente tem essa dificuldade porque não é ligado a ninguém, só aos movimentos sociais (Informação verbal, 2010)8 8 Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista conceidida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto. .

A remoção dos portos afeta, inclusive, os seus arredores, os bairros do Jurunas e Guamá e toda a economia popular existente ao longo da Avenida Bernardo Sayão. A professora de História e moradora da área desde 1980, Fábia Cruz, explica que:

Ninguém quer sair da área! Porque existe uma questão de afinidade. Existe também uma questão de praticidade – [porque] nós somos uma periferia mais perto do centro da cidade centro. Essa questão de afinidade que eu me refiro é a questão das relações que a gente tece, por exemplo, a minha família está há três décadas ali. Tem outras famílias que estão mais. Eu esperei tanto vir uma reforma pra Bernardo Sayão, quando vem eu tenho que sair. Ninguém quer sair! Não é apenas o fato de você querer uma indenização justa, mas, na verdade, mexe com toda a tua vida. Você está acostumado a viver aqui. Você vai pra outro lugar. Pra onde? Reestrutura de novo isso.Criar laços também naquele local. [Enfim] eu não quero sair do Jurunas. Quero morrer jurunense. Porque o Jurunas faz parte da minha história de vida. As feiras e portos fazem parte da minha história de vida. Os portos da Palha e do Açaí, o Complexo do Jurunas faz parte da minha história de vida. São pontos históricos. Querem expulsar a gente! (Informação verbal, 2012)9 9 Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista conceidida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto. .

As famílias que serão atingidas pelo projeto “não desejam sair do local onde construíram suas habitações, sentem-se ameaçados de expulsão e ainda desconhecem o destino reservado àqueles que serão removidos” (Araújo, 2010ARAÚJO, F. de S. A conquista dos territórios do rio Guamá – Novos conflitos, Velhos discursos: o caso do Portal da Amazônia em Belém do Pará. In: SEMANA DE PLANEJAMENTO URBANO E RURAL, 16., 2010, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: IPPUR, 2010. 1-20. Disponível em: <http://www.ippur.ufrj.br/download/semana_pur_2010/completos/Artigo%20SEMANAPUR%20%28Fl%C3%A1via%20Ara%C3%BAjo%29.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2013.
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, p. 13). Essas pessoas querem manter seus vínculos e continuar suas atividades produtivas. Como diz Berman (2007BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 195), “as ruas pertencem ao povo”, assim como as feiras e os portos. A cidade real não é a representação que o Portal da Amazônia faz dela. Esse também é o ponto de vista do projeto Nova Cartografia Social da Amazônia, que organizou fascículos, vídeos e debates com as lideranças dos movimentos populares. Esses movimentos querem manter a cidade com sua vida ribeirinha, com sua diversidade, com o trajeto de ilhéus para a cidade e toda a economia popular que pulsa nos portos da Palha e do Açaí. O debate se expandiu um pouco, envolvendo alguns professores e políticos, mas ainda é relativamente restrito.

O movimento social em defesa dos portos públicos busca direitos à participação política, inclusive quanto ao planejamento da ocupação da orla, que, na realidade, não pertence à prefeitura, mas à União. De acordo com a Comissão de Macrodrenagem da Estrada Nova, “a prefeitura está agindo sobre algo que não pertence a ela. O SPU (Serviço de Patrimônio da União) é dona dessas áreas de marinha. A intenção não é inviabilizar a macrodrenagem da bacia da Estrada Nova, porque pode ser uma obra importante, mas é preciso haver justiça” (Informação verbal, 2012)10 10 Fábia Cruz. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém, Belém: Universidade Federal do Pará, 01 fev. 2012. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto. .

O que está em jogo é a vida dos usuários dos portos e dos moradores da Estrada Nova, e eles procuram ser propositivos, encaminhando reivindicações e demandas à prefeitura. Enviaram, inclusive, uma proposta de “Política de Desapropriação”, que pode ser sintetizada nos seguintes termos:

1º Que a Prefeitura de Belém, através de seu maior representante, o atual Prefeito Duciomar Costa, abra um espaço para o diálogo com os moradores e entidades locais para adaptar os Projetos à realidade e às necessidades dos moradores da Estrada Nova (Av. Bernardo Sayão).

2º Que caso seja de extrema necessidade a desapropriação de algum morador das áreas atingidas pelos projetos, que as indenizações sejam justas e de acordo com o mercado imobiliário, dado que a Prefeitura desapropria pelo valor venal do imóvel, valor bem menor do que o de mercado; assim como a avaliação do imóvel não seja com base na “depreciação do imóvel”. E principalmente que os desapropriados permaneçam no bairro de origem.

3º Que seja facultado ao morador, no caso de desapropriação, a sua permanência no “resíduo” do seu terreno desapropriado. (Política..., 2011)11 11 POLÍTICA de Desapropriação: Pauta de Reivindicações dos Movimentos sociais da Estrada Nova, 2012. .

CONSIDERAÇÕES FINAIS: NA ESTRADA NOVA DE BELÉM, ‘QUEM ROEU O OSSO TEM QUE COMER O FILÉ’?

O debate que este artigo levanta pode ser compreendido através da luta entre as metáforas de ‘portas’ e ‘janelas’ para o rio, as quais trazem visões distintas da cidade, ou pelo menos da parte da cidade que o projeto Portal da Amazônia quer ‘revitalizar’, abrindo uma larga avenida e tornando rarefeito de gente o lugar. Enquanto duram, os portos e seus arredores funcionam como um grande mercado popular que fervilha de gente em diferentes afazeres. De modo que, aqui, ‘revitalizar’ é claramente uma palavra fora de lugar. Nessa margem de Belém, a vida se desdobra em sua totalidade, a compra e a venda imersas em relações sociais de diversos tipos, dando sentido prático ao argumento do econômico absorvido pelo social, central em Karl Polanyi, autor que discorre sobre a liberdade humana nos mercados.

Outro verbo de frequente emprego por parte dos poderes públicos comprometidos com interesses privados é ‘modernizar’. A ação ‘modernizadora’ é empreendida não só em obras, mas também mediante o uso de termos como pier, que substitui o típico trapiche, e shopping, para o lugar onde funciona a feira. Já despontam torres residenciais com ‘janelas’ para o rio, que o marketing imobiliário batizará com glamorosos nomes estrangeiros ao gosto dos requintados clientes, onde, antes da ‘baixada’ ser saneada, estavam barracos sobre uma vala fétida, cujo odor os pardos, negros e caboclos moradores aturavam. Circunstância que cabe na expressão ‘roer o osso’. A gentrificação vai tomando forma na medida em que se valorizam os terrenos na ‘baixada’ saneada, que se tornou um ‘filé’ e o que fará improvável a permanência daqueles que ainda ficaram depois das remoções forçadas, não obstante a reivindicação expressa no mote ‘quem roeu o osso tem que comer o filé’.

Na cidade injusta, a resistência é contra a transformação do lugar em algo completamente estranho ao que historicamente se construiu como identidade. Na Estrada Nova, a prefeitura vê como teimosia o fato de antigos moradores que amam os bairros do Jurunas, Guamá e Condor quererem permanecer nem que seja no ‘resíduo’ do seu terreno desapropriado. A resistência propõe alternativas ao inevitável projeto, propondo uma ‘política de desapropriação’, que, entre outros direitos, mantenha os desapropriados nos bairros de origem.

A prefeitura não lida com a categoria ‘zonas de especial interesse social para edificações residenciais’ (ZEIS), prevista no Plano Diretor da cidade. Entre os objetivos das ZEIS estão o de reconhecer a diversidade local no processo de desenvolvimento e a produção de habitações de interesse social, bem como mercados populares. Os atingidos pelo projeto Portal da Amazônia vão ao Ministério Público, cujo papel é defender o povo, o patrimônio público e social, os direitos e interesses da coletividade. E também ao Serviço de Patrimônio da União (SPU), já que os portos se situam em área de marinha e sob a jurisdição desse órgão. Mas as obras avançam no ritmo imposto pela empreiteira. As ZEIS são letra morta no Plano Diretor.

Os feirantes buscam visibilidade para o seu lugar, seu espaço vivido na iminência de se transformar em seu inverso, um espaço semelhante a muitos outros mundo afora, que será familiar, não a eles, mas aos turistas que o reconhecerão na sua uniformidade, acostumados que estão aos water fronts, que podem ser definidos como não-lugares, conforme o conceito criado por Augé (2012)AUGÉ, M. Não lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade. Campinas, SP: Papirus, 2012.. As ‘janelas’ repetem a fórmula de belas arquiteturas que constituem o espaço em espetáculo (Sá, 2006SÁ, T. Lugares e Não-Lugares em Marc Augé. Revista Artitextos, Lisboa, v. 3, p. 179-188, dez. 2006. Disponível em: <www.repository.utl.pt/bitstream/10400.5/.../FAUTL_13_B_TeresaSa.pdf>. Acesso em: 20 set. 2013.
www.repository.utl.pt/bitstream/10400.5/...
, p. 183). Uma vez que os portos públicos não aparecem nas maquetes eletrônicas do projeto, feirantes, organizados em associações, e aliados, a partir da academia engajada, elaboraram uma cartografia social. E, por meio dela, uma linguagem de contestação à indiferença, à atitude blasé (Simmel, 2013SIMMEL, G. O conflito da cultura moderna e outros escritos. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2013.) da população que ignora o outro, pretendendo revelar os portos, seus trapiches e suas existências humanas no mapa da cidade. Para que seus habitantes vejam, além das ‘janelas’, também a possibilidade das ‘portas’ e do vivo cotidiano que elas permitem.

Assim como a metáfora, a cartografia é instrumento político. É preciso mapear-se para não ser riscado do mapa. Como diz Acselrad (2010ACSELRAD, H. Mapeamento, identidades e territórios. In: ACSELRAD, H. (Org.). Cartografia social e dinâmicas territoriais: marcos para o debate. Rio de Janeiro: IPPUR, UFRJ, 2010. p. 9-46., p. 27), a cartografia crítica constrói “signos identitários de pertencimento de maneira relacional e contrastiva embasando demandas por reconhecimento territorial”. As metáforas, como se sabe (Lakoff; Johnson 2003LAKOFF, G.; JOHNSON, M. Metaphors we live by. Chicago: The University of Chicago press, 2003.), estruturam conceitos complexos a partir de conceitos simples, produzindo percepções de mundo. ‘Portas’ e ‘janelas’ significam, em Belém, apropriações diversas das margens fluviais e representam, metaforicamente, diferentes concepções de cidade. A metáfora das ‘portas’ supõe o uso das águas e das margens para pessoas que vêm e vão entre ilhas e o continente, para comprar e vender, mas não apenas, já que as pessoas compram e vendem envolvidas em laços sociais que dão sentido humano à existência. Ela pretende levar os habitantes e a administração da cidade a perceberem a possibilidade de lugares diversos dos propostos pela metáfora dominante das ‘janelas’, tão dominante que se tornou uma espécie de pensamento único. Cartografia e metáfora são representações que buscam visibilidade aos portos da Palha e do Açaí, compondo assim o movimento de resistência pela permanência desses lugares ignorados na leitura dominante da cidade.

As ‘janelas’ são espaços estetizados pelo urbanismo, que abrem a orla para a contemplação, o consumo e o investimento de capital. Às ‘janelas’ importa o visitante, no papel de cliente. Algumas orlas da cidade, na condição de ‘janelas’, gozam o privilégio de receber subvenções públicas para continuarem a existir em toda sua beleza. Desses espaços, o mais notável é o complexo turístico Estação das Docas, o qual, aproveitando galpões de uma parte do então quase ocioso Porto de Belém, construído como Port of Pará no início do século XX para embarcar borracha, segue o padrão internacional de revitalizações urbanas pautadas em apelos culturais, que, no caso de Belém, busca estetizar a imagem ribeirinha da cidade. É bem verdade que a sofisticada ‘janela’ é, a rigor, acessível apenas para quem dispõe de meios para desfrutar do lazer e do consumo nesse espaço de cultura ribeirinha estilizada. É um típico exemplo de bem sucedida requalificação urbana produzindo identidade, nos moldes das políticas de image-making descritas por Arantes (2000)ARANTES, O. B. F. Uma estratégia fatal: A cultura nas novas gestões urbanas. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. p. 11-74.. Em Belém, a tradução de water front é ‘janela’. E elas fazem a imagem da cidade para os visitantes.

Nas ‘janelas’, a importância maior está na paisagem, convertida em valor econômico. Nos portos, importa mais os fluxos, as relações, os vínculos pessoais e as reciprocidades. Embarcações chegam desde a madrugada, trazendo pessoas, milhares delas fazem diariamente esse percurso, e produtos – em 2010, cerca de 20 mil toneladas de açaí entraram por essas ‘portas’. Aqui, a economia imerge em típica socialidade popular. Toda essa pujante forma de beleza acontece em lugares abandonados. Os usuários reivindicam o melhoramento da infraestrutura e dos serviços urbanos, mas a prefeitura decidiu que esses lugares devem se tornar feios o bastante para justificar sua remoção.

Empresários, de mãos dadas com o poder público, querem varrer tudo o que eles consideram feio e que atrapalha a estética enobrecida que se pretende para a orla. O enobrecimento passa por uma higienização urbana em moldes semelhantes ao que acontece em outras cidades do Brasil e do mundo. O paradigma histórico dessa ideologia pode ser buscado na modernização parisiense encetada pelo barão Haussmann, na segunda metade do século XIX. Em nome da ‘modernidade’ e da melhoria da mobilidade urbana, já que o projeto prevê largas pistas de rodagem, essa higienização vai varrendo para bem distante várias formas de expressão popular. O eufemismo que se usa é de que o lugar deve ser livre da ‘ocupação antrópica desordenada’. E, no entanto, na linha contestatória desse tipo de ‘modernidade’, conforme Berman (2007BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 379), a “rua ideal está cheia de estranhos que passam, de pessoas de muitas classes diferentes, de idades, grupos étnicos, crenças e estilos diversos”. De fato, o que parece atrapalhar o projeto são os pardos pobres que ocupam o lugar – e que dão ao projeto um sentido de ‘faxina étnica’.

Cartografia e metáfora são instrumentos de luta contra representações da cidade que excluem outras possibilidades de existência fora do que é considerado ‘moderno’ e ‘estético’, dado que, na mentalidade subalterna da periferia, o ‘moderno’ deve repetir padrões do ‘primeiro mundo’. Mas o ‘moderno’, de outro ponto de vista, pode ser o sentir-se em casa no seu próprio lugar. Cartografia e metáfora combatem a ideologia do pensamento único, que não concebe alternativas na cidade. Como diz Berman (2007BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 367) ao criticar, no contexto americano dos anos 1960, os fomentadores do mundo da via expressa, que a tinham como o único mundo possível: “opor-se a eles e suas obras era opor-se á própria modernidade, fugir à história e ao progresso”. Desde então, em todos os quadrantes da Terra, com poucas exceções de resistência bem-sucedida, que, aliás, merecem ser estudadas, essa concepção única de ‘modernidade’ tem subjugado as realidades sociais que encontra pelo caminho. Na Estrada Nova de Belém, os portos ainda estão lá, mas parece improvável que, ao fim e ao cabo, vá vigorar o mote ‘quem roeu o osso tem que comer o filé’. Na cidade segregada, os pardos pobres não têm direito à vida urbana. Orla saneada é ‘filé’ só para as elites.

REFERÊNCIAS

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  • 1
    “Não é apenas para comprar e vender que se vem a Eufêmia, mas também porque à noite, ao redor das fogueiras em torno do mercado [...] para cada palavra que se diz [...] os outros contam uma história [...]” (Calvino, 1990CALVINO, I. As cidades invisíveis. São Paulo: Companhia das Letras, 1990., p. 38).
  • 2
    E, no entanto, conforme Berman (2007BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 407): “ser moderno (...) é experimentar a existência pessoal e social como um torvelinho (...) é sentir-se de alguma forma em casa em meio ao redemoinho, fazer seu o ritmo dele, movimentar-se entre suas correntes em busca de novas formas de realidade, beleza, liberdade, justiça, permitidas pelo seu fluxo ardoroso e arriscado”.
  • 3
    Diário do Pará. Ministro visita grandes obras em Belém. 16/04/2010. Disponível em: <http://diariodopara.diarioonline.com.br/N-86194-ministro+visita+grandes+obras+em+belem.html>. Acesso em: 23 dec. 2015.
  • 4
    Técnico da PMB. Audiência pública sobre o projeto Portal da Amazônia. Ministério Público Estadual. 10 ago. 2010. Gravada por Jakson Silva; Rodrigo Peixoto.
  • 5
    Raimundo Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 10 out. 2012. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto.
  • 6
    Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto.
  • 7
    Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto.
  • 8
    Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista conceidida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto.
  • 9
    Félix Oliveira. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém. Belém: Porto do Açaí na Estrada Nova, 07 set. 2010. Entrevista conceidida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto.
  • 10
    Fábia Cruz. Projeto Portal da Amazônia: seus efeitos na vida popular nas margens urbanas de Belém, Belém: Universidade Federal do Pará, 01 fev. 2012. Entrevista concedida à Jakson Silva e Rodrigo Peixoto.
  • 11
    POLÍTICA de Desapropriação: Pauta de Reivindicações dos Movimentos sociais da Estrada Nova, 2012.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    26 Set 2013
  • Aceito
    16 Dez 2015
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