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A gramaticalização de verbos em partículas na língua Guajá e sua relação com a omnipredicatividade

The grammaticalization of verbs in particles in the Guajá language and its relation to omnipredicativity

Resumo

Neste artigo, pretendo mostrar que, apesar da grande inconsistência em termos formais e da heterogeneidade em termos funcionais que caracteriza a descrição da classe das partículas em diferentes trabalhos, no caso do Guajá é possível se diferenciar as partículas das demais classes de palavras existentes na língua, assim como também atribuir a origem de algumas delas a diferentes processos de gramaticalização a partir de verbos plenos. Serão aqui enfocadas as partículas direcionais e posicionais e a partícula de aspecto projetivo da língua Guajá, sendo explicitada sua origem e relacionados os fenômenos analisados à perda versus manutenção da tipologia omnipredicativa da língua.

Palavras-chave
Gramaticalização; Partículas; Guajá; Família Tupí-Guaraní; Omnipredicatividade

Abstract

In this article, I intend to show that, despite the great inconsistency in formal terms and heterogeneity in functional terms that characterizes description of particle class by different authors, in Guajá particles can be differentiated from other classes of words in this language, and that the origin of some of these particles can be attributed to different processes of grammaticalization from lexical verbs. Here we focus on the directional and positional particles and the projective aspectual particle in the Guajá language, explaining its origin and relating the analyzed phenomena to the loss/maintenance of the omnipredicative typology of the language.

Keywords
Grammaticalization; Particles; Guajá; Tupí-Guaraní Family; Omnipredicativity

INTRODUÇÃO

Na descrição das mais diversas línguas, comumente a classe das partículas tem se apresentado como extremamente heterogênea, tanto em termos formais quanto funcionais. No que se refere ao Guajá, uma língua do subgrupo VIII da família Tupí-Guaraní, falada por cerca de 468 indivíduos (Brasil, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Relatório de dados populacionais de 2013, por DSEI. Brasília: SIASI: SESAI, 2013. Disponível em: http://www.saude.gov.br/saude-indigena/gestao/siasi. Acesso em: 7 ago. 2019.
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) que habitam quatro aldeias no noroeste do Maranhão, partindo da definição formal de Wackernagel (2009)Wackernagel, Jacob. Lectures on syntax: with special reference to Greek, Latin, and Germanic. Editado por David Langslow. New York: Oxford University Press, 2009. de que as partículas são acentuadas, fonologicamente leves, relativamente livres, invariáveis, de classe fechada e com distribuição sintagmática peculiar, Magalhães (2007, p. 72)MAGALHÃES, Marina Maria Silva. Sobre a morfologia e a sintaxe da língua Guajá: família Tupí-Guaraní. 2007. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2007. define da seguinte maneira as partículas dessa língua:

As partículas formam uma classe fechada de elementos tônicos, não flexionáveis que podem se associar a distintos tipos de constituintes e que, diferentemente das palavras lexicais, operam como palavras funcionais. [...]

As partículas diferenciam-se dos afixos por comportarem-se fonologicamente como palavras independentes. Diferenciam-se também dos clíticos (os proclíticos de negação n(a)=, de modo exortativo t(V)= e os pronomes dependentes), pois estes formam uma unidade fonológica indissolúvel com seu ‘hospedeiro’ que não pode ser interrompida por outros formativos ou palavras (a não ser por outros elementos clíticos). As partículas, por sua vez, permitem a presença de palavras independentes entre elas e o constituinte a que se associam.

Semanticamente, a classe das partículas é muito heterogênea, incluindo operadores aspectuais, dêiticos, de modalidade, de foco, de tempo, de negação, de ênfase e outros.

Acrescento, ainda, que as partículas se distinguem dos advérbios por serem, estes, palavras de ordem mais livre na oração, enquanto aquelas ocupam posições fixas na oração ou com relação a membros da oração.

Entre as diversas partículas do Guajá, destacamos, neste artigo, aquelas cuja origem se deu a partir de processos de gramaticalização de verbos plenos que ocorrem em oração subordinada de finalidade/simultaneidade e construções seriais que permitem não apenas reconstruir o caminho por meio do qual marcadores aspectuais e dêiticos surgem na língua, mas também evidenciar a mudança tipológica pela qual a língua vem passando gradativamente, uma vez que os fenômenos a serem aqui analisados são relacionados à perda versus manutenção da tipologia omnipredicativa da língua.

No que se refere à metodologia, todos os dados do Guajá aqui apresentados foram coletados de narrativas e diálogos registrados ao longo de 18 anos de trabalho de campo com falantes da língua. Os dados já publicados em outros trabalhos encontram-se identificados e os que não são acompanhados de referência bibliográfica são inéditos.

O artigo está organizado da seguinte maneira: na próxima seção, apresento as características da língua que justificam caracterizá-la como descendente de uma língua ancestral de tipologia omnipredicativa; na seção seguinte, descrevo os processos de gramaticalização de verbos que resultaram nas partículas dêiticas direcionais e posicionais do Guajá, além da partícula que expressa aspecto projetivo; posteriormente, apresento evidências de que os processos de gramaticalização mostram dois sentidos de evolução distintos no que se refere à perda versus manutenção das características omnipredicativas da língua; e, por fim, na última seção, são tecidas considerações finais acerca do tema abordado.

O GUAJÁ E A OMNIPREDICATIVIDADE

As línguas da família Tupí-Guaraní apresentam um fenômeno já amplamente difundido em diversos trabalhos desde Lemos Barbosa (1956)Lemos Barbosa, Antônio. Curso de Tupi Antigo. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1956. (sobre o Tupinambá), em que tanto verbos quanto nomes podem funcionar primariamente como predicado: “Nessas línguas, o uso do critério sintático, em que a função básica do nome é a de ser argumento e a do verbo é a de ser predicado, é insuficiente para tratá-los como duas classes lexicais distintas” (Rodrigues, 1996RODRIGUES, Aryon Dall’Igna. Argumento e predicado em Tupinambá. Boletim da ABRALIN, Curitiba, n. 19, p. 57-66, dez. 1996. apud Magalhães; Mattos, 2014MAGALHÃES, Marina Maria Silva; MATTOS, Ana Cristina Rodrigues de. Classes de palavras, tipos de predicados e sua relação com a intransitividade cindida em Guajá. Via Litterae, Anápolis, v. 6, n. 2, p. 251-284, jul./dez. 2014., p. 252).

Em Guajá, conforme explicam Magalhães e Mattos (2014), verifica-se o mesmo fenômeno gramatical: verbos, nomes e também advérbios (ou expressões adverbiais) podem exercer a função sintática de predicado, ou seja, têm função predicativa primária sem precisar de cópula ou qualquer outro recurso morfossintático, não se podendo associar apenas ao verbo uma vocação predicativa, conforme atestam os exemplos abaixo1 1 A função predicativa é indicada nos exemplos pelos símbolos < >, em oposição a [ ], que indica os limites dos sintagmas em funções não predicativas, como as de argumento. :

(1) <a-kere> verbo eventivo com função de predicado   1SG.I-dormir     ‘Eu dormi.’ ((Magalhães; Mattos, 2014, p. 253)
(2) <ha = r-apaj> verbo estativo com função de predicado   1SG.II = ADJ-ter.sono     ‘Eu estou com sono.’
(3) <ha = r-a’yr-a> [nijã] nome com função de predicado   1SG.II = ADJ-filho-RFR você     ‘Você é meu filho.’ 2
(4) [tapi’ir]-a <ka’a-pe> expressão adverbial com função de predicado3   anta-RFR mata-LOC     ‘A anta está no mato.’

É possível observar, assim, o mesmo comportamento morfossintático entre verbos eventivos (1), verbos estativos (2), nomes (3) e expressões adverbiais (4), ou seja, todos eles podem exercer primariamente a função de predicado sem o acréscimo de qualquer morfologia derivacional ou cópula, apesar de nomes serem mais usados como argumentos, verbos como predicados e expressões adverbiais como adjuntos.

Com base nas descrições de diversas línguas da família Tupí-Guaraní, em que é possível se verificar que a função predicativa é, como já dito, comum a verbos e nomes, Couchili et al. (2001-2002)COUCHILI, Ti’Iwan; MAUREL, Didier; QUEIXALÓS, Francesc. Classes de lexèmes em émerillon. Amerindia, Paris, n. 26/27, p. 173-208, 2001-2002. e Queixalós (2001QUEIXALÓS, Francesc. Le Tupí-Guaraní in chantier. In: QUEIXALÓS, Francesc (ed.). Des nomes et des verbes em Tupí-Guaraní: etát de la question. Munique: Lincom Europa, 2001. p. 1-20. (LINCOM Studies in Native American Linguistics, 37)., 2006)QUEIXALÓS, Francesc. The primacy and fate of predicativity en Tupi-Guarani. In: LOIS, Ximena; VAPNARSKY, Valentina (ed.). Lexical categories and root classes in Ameridian Languages. Bern: Peter Lang International Academic Publishers, 2006. p. 249-288. defendem a hipótese de que membros dessa família são descendentes de uma língua na qual todas as entradas lexicais funcionavam como predicados – um padrão denominado de ‘omnipredicatividade’, conceito proposto por Launey (1994) para o Nahuatl4 4 É importante ressaltar que a classificação de uma língua como omnipredicativa não se restringe a essa propriedade. Além disso, o tipo de língua que aqui denominamos de omnipredicativa também é conhecido, na teoria gerativa, sob o rótulo de língua não configuracional – ver Hale (1983) para o warlpiri e Jelinek (1984) para as línguas salish. No entanto, para a compreensão do fenômeno abordado neste artigo, enfocaremos apenas a capacidade predicativa de quase todos os itens lexicais das línguas Tupí-Guaraní. .

Assumindo a hipótese de Queixalós (2006)QUEIXALÓS, Francesc. The primacy and fate of predicativity en Tupi-Guarani. In: LOIS, Ximena; VAPNARSKY, Valentina (ed.). Lexical categories and root classes in Ameridian Languages. Bern: Peter Lang International Academic Publishers, 2006. p. 249-288., Praça et al. (2017)Praça, Walkiria Neiva; Magalhães, Marina Maria Silva; da Cruz, Aline. Indicativo II da família Tupí-Guaraní: uma questão de modo? LIAMES, Campinas, v. 17, n. 1, p. 39-58, jan./jun. 2017. DOI: https://doi.org/10.20396/liames.v17i1.8646480.
https://doi.org/10.20396/liames.v17i1.86...
consideram que as propriedades omnipredicativas dessa língua ancestral foram mantidas em algumas línguas mais conservadoras da família, como o Tupinambá e o Apyãwa, as quais vêm se perdendo gradativamente em outras, como no Guajá, e são praticamente inexistentes em outras, como no Nheengatú, língua que avançou tanto na perda das características omnipredicativas que atualmente é melhor não ser classificada como tal5 5 Para maiores detalhes sobre a perda gradativa de características omnipredicativas nessas quatro línguas, confira Praça et al. (2017). .

Assim, o Guajá ilustraria uma fase intermediária no processo diacrônico de degradação de um hipotético estado Proto-Tupí omnipredicativo, o que pode ser evidenciado, entre outras características que serão aqui apresentadas, pelo fato de já não permitir que verbos funcionem como argumento sem que sejam antes nominalizados6 6 Em línguas mais conservadoras, como o Tupinambá e o Apyãwa, a função argumentativa é exercida primariamente também pelos verbos (Praça et al., 2017). . Isto é, no Guajá, apesar de ambas as classes, verbos e nomes funcionarem primariamente como predicado, como ilustrado nos exemplos (1) a (3), para que a função argumental seja exercida, os verbos devem receber morfologia derivacional nominalizadora, como em (5):

(5) [ha=ø-kere-ha]-Ø <I-muku> verbo com função argumentativa   1SG.II=ADJ-dormir-NMLZ-RFR 3.II-ser.longo     ‘Minha dormida foi longa.’

A análise da gramaticalização de verbos em partículas na língua Guajá, tema enfocado neste artigo, é evidência adicional do estágio intermediário de degradação da omnipredicatividade da língua, como veremos a seguir, uma vez que ele pode ser diagnosticado a partir de inovações que mostram dois sentidos de evolução opostos na língua: um que mantém características omnipredicativas, e outro em que a perda dessas características é evidenciada.

A GRAMATICALIZAÇÃO DE VERBOS EM PARTÍCULAS

Nesta seção, apresentaremos a descrição das partículas direcionais, posicionais e da partícula de aspecto projetivo, explicitando suas origens por meio de dois diferentes processos de gramaticalização a partir de verbos plenos.

PARTÍCULAS DIRECIONAIS

As partículas direcionais são palavras independentes, invariáveis, de conteúdo gramatical e de posição obrigatoriamente posterior ao núcleo do predicado, podendo, no entanto, ser precedidas por outras palavras. Em termos semânticos, todas têm teor dêitico e definem a direção do movimento expresso pelo núcleo do predicado verbal, que é sempre um verbo de deslocamento.

Nesse tipo de construção, a combinação do verbo lexical com a partícula é interpretada, naturalmente, como um só evento, uma vez que a partícula expressa a noção gramatical de direção do evento de deslocamento evidenciado pelo verbo.

São sete as partículas direcionais do Guajá, conforme ilustram os exemplos (6) a (12), a seguir:

aha ‘indo’ – partícula direcional centrífuga:

(6) Ø-wyhy tapi’i aha are = r-ixak-a   3.I-correr anta CTF 1PL.II = ADJ-ver-FIN   ‘A anta foi correndo ao nos ver.’ (Magalhães, 2007, p. 101)

awa ‘vindo’ – partícula direcional centrípeta:

(7) wari-a Ø-wi awa ira r-ia   guariba-RFR 3.I-descer CTP árvore ADJ-de   ‘O guariba veio descendo da árvore.’ (Magalhães, 2007, p. 102)

raha ~ haraha ‘levando’ – partícula direcional centrífuga comitativa:

(8) Ø-ryhy ka’i haraha   3.I-fazer.correr macaco.prego CTF1   ‘Fez (a anta) correr levando (com ela) os macacos.’ (Magalhães, 2007, p. 103)

rawa ~ harawa ‘trazendo’ – partícula direcional centrípeta comitativa:

(9) a-pi harawa ha = Ø-jamete-pe   1SG.I-carregar CTP1 1SG.II = ADJ-costas-LOC   ‘CarregueI-o trazendo-o nas minhas costas.’ (Magalhães, 2007, p. 104)

manã ‘fazendo ir’ – partícula direcional centrífuga causativa simples:

(10) Mair-a kamixa-Ø Ø-japia’ó Ø-mapy manã kwarahy Ø-pa-pe   Maira-RFR jabutI-RFR 3.I-estripar 3.I-colocar CTF2 sol ADJ-brilho-LOC   ‘Maíra estripava o jabuti e colocava-o (fazendo ir) no sol.’ (Magalhães, 2007, p. 105)

‘fazendo vir’ – partícula direcional centrípeta causativa simples:

(11) h-aĩn-a ka’i Ø-ty mõ I-pe   3.II-caroço-RFR macaco.prego 3.I-jogar CTP2 3.II-para   ‘O macaco-prego jogou o caroço dela (da fruta) (fazendo vir) para ele.’ (Magalhães, 2007, p. 105)

kapo ‘saindo de dentro para fora’ – partícula direcional elativa:

(12) kururuhu Ø-memer-er-a Ø-weh? kapo   sapo-boi ADJ-filho-COL-RFR 3.I-sair ELAT   ‘Os filhotes do sapo saíram (para fora da água).’ (Magalhães, 2007, p. 106)

Comparando-se as partículas ora citadas e as formas verbais plenas do Guajá, conforme o Quadro 1, fica clara a relação entre as partículas e determinados verbos que expressam deslocamento na língua.

Quadro 1
Partículas direcionais e verbos que as originaram.

A origem das partículas dêiticas direcionais, segundo Magalhães (2007)MAGALHÃES, Marina Maria Silva. Sobre a morfologia e a sintaxe da língua Guajá: família Tupí-Guaraní. 2007. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2007., são os verbos -aho ‘ir’ e -u ‘vir’, que ocorrem de forma independente na língua. As formas comitativas -raho ‘levar’ e -ru ‘trazer’ e causativas simples -monõ ‘fazer ir’ e -mũ ‘fazer vir’, já lexicalizadas, também ocorrem independentemente na língua, são sincronicamente inanalisáveis8 8 Os prefixos comitativo e causativo lexicalizaram-se nesses itens lexicais. e geraram as partículas raha, rawa, manã e , respectivamente.

Com relação especificamente à partícula aha, que expressa direção centrífuga e tem origem no verbo ‘ir’, podemos afirmar que seu uso direcional se estendeu também para expressar aspecto prospectivo, isto é, uma confluência entre tempo e aspecto que tem a função de indicar, no caso do Guajá, a antecipação de um estado futuro iminente. Seu uso como partícula de aspecto prospectivo pode ser atestado pelos exemplos (13) e (14), quando ocorre associada a verbos que exprimem estado, e não a verbos que exprimem deslocamento:

(13) a-jkura aha kyry’y   1SG.I-curar PROSP agora   ‘Eu estou quase curado agora.’
(14) Ø-wi aha kyry’y   3.I-estar.cozido PROSP agora   ‘(O peixe) está quase cozido agora.’

PARTÍCULAS POSICIONAIS

As partículas posicionais, assim como as direcionais, também são palavras independentes, invariáveis, de conteúdo gramatical e de posição obrigatoriamente posterior ao núcleo do predicado. Em termos semânticos, expressam a posição ou atitude9 9 Nem sempre é a posição (que evoca estatismo) o que essas partículas expressam; podem indicar uma atitude física, como no caso da partícula ika ‘estar em movimento’ ou no caso da partícula kata ‘realizar movimento de pêndulo’. física em que se encontra o participante do evento, sendo a combinação do verbo lexical com a partícula interpretada como apenas um evento.

São sete as partículas posicionais do Guajá, conforme ilustram os exemplos (15) a (21), a seguir:

ika ~ tika ‘em movimento’ – partícula posicional:

(15) a-me’ẽ~me’ẽ tika Ø-pe Ø-wy r-ipi   1SG.I-olhar~RED POS1 INDET-caminho ADJ-beira ADJ-POR   ‘Eu fiquei olhando (em pé, em movimento) à beira do caminho.’ (Magalhães, 2007, p. 107)

ama ~ tama ‘em pé’ – partícula posicional:

(16) a-pa’ỹ tama   1SG.I-levantar POS2   ‘Levantei (ficando em pé).’

ina ~ tina ‘de cócoras / sentado’– partícula posicional:

(17) a-jamaka japy tina   1SG.I-ouvir de.novo POS3   ‘Eu ouvi de novo (sentado).’ (Magalhães, 2007, p. 108)

apo ~ tapo ‘deitado’– partícula posicional:

(18) a-wa’a ta tapo ha=kaha-pe ha=r-awy mehẽ   1SG.I-cair PROJ POS4 1=SG.II=rede-LOC 1.II=ADJ-estar.menstruada quando   ‘Eu vou cair (ficando deitada) na minha rede quando estiver menstruada.’ (Magalhães, 2007, p. 108)

kata ‘em movimento pendular’– partícula posicional:

(19) Ø-wata kata   3.I-andar POS5   ‘Ele anda mancando (realizando movimento de pêndulo)!’

mina ‘fazendo sentar’ – partícula posicional causativa:

(20) Ø-kyty xi karaI-a Amỹxa'ate mina   3.I-furar IMPERF não-índio-RFR Amy˜xa’ate POS6   ‘O não índio dava injeção (furava) na Amy˜xa’ate (fazendo-a sentar).’ (Magalhães, 2007, p. 109)

raka ~ haraka ‘estando com’ - partícula posicional comitativa:

(21) Ø-japipi haraka I-py-pe   3.I-atirar~RED POS7 3.II-pé-LOC   ‘(Ele) chutou (a bola) (estando com ela) várias vezes com o pé.’ (Magalhães, 2007, p. 105)

Assim como as direcionais, as partículas posicionais podem ser claramente associadas a verbos lexicais, conforme apresentado no Quadro 2.

Quadro 2
Partículas posicionais e verbos que as originaram.

As partículas posicionais são provenientes dos verbos -iku ‘estar em movimento’, *-’am ‘estar em pé’, *-ub ‘estar deitado’ e *-in ‘estar sentado’10 10 e acordo com Magalhães (2007, p. 106), “Os temas verbais marcados com asterisco (*) não são encontrados sincronicamente nas suas formas independentes no Guajá. Essas formas são citadas tomando como base outras línguas da família, mais conservadoras, em que há esses verbos posicionais que, além da posição, indicam também um evento em progressão. Atualmente os Guajá usam as formas verbais independentes -pa’ã para ‘levantar’, -japajnõ para ‘deitar’ e -wapý para ‘sentar’”. , respectivamente. A partícula kata ‘em movimento pendular’ possivelmente tem sua origem no verbo kato ‘balançar’, a partícula mina ‘fazendo sentar’ corresponde à versão causativa da partícula ina e a partícula raka11 11 A variante haraka da partícula raka pode ser explicada da mesma maneira que a das partículas raha e rawa (cf. nota 7). é a versão comitativa da partícula ika.

Magalhães (2007) explica que as partículas posicionais têm alomorfes que variam em ika ~ tika, ama ~ tama, ina ~ tina e apo ~ tapo somente quando o sujeito é de primeira pessoa; com as demais pessoas, o alomorfe é sempre sem a inicial t12 12 A consoante t inicial, que sincronicamente se encontra lexicalizada na partícula posicional, possivelmente foi produtiva como prefixo de correferência. No Tembé, por exemplo, uma língua Tupí-Guaraní, há um prefixo te- que indica a correferência em verbos posicionais na primeira pessoa (informação verbal, fornecida por Ana Suelly Cabral, em Brasília, em 2006): izeaa-mae-ute-inieu1SG.I-caça-comer1CORR-estar.sentado ‘Eu estou comendo (sentada).’   izeaa-mae- ute-'ameu1SG.I-caça-comer1CORR-estar.em.pé‘Eu estou comendo (em pé).’ izéaa-ze'ente-koeu1SG.I-conversar1CORR-estar.em.movimento ‘Eu estou falando (em movimento).’ .

No que se refere especificamente à partícula ika, que tem origem no verbo posicional iku e expressa posição em pé e em movimento (isto é, o participante da ação/evento deve estar simultaneamente em pé e em movimento), podemos afirmar que seu uso posicional se estendeu e tem se especializado em expressar aspecto progressivo. O verbo posicional iku ‘estar em pé e em movimento’, que existe plenamente como verbo lexical – ver o exemplo (22) –, gramaticalizou-se, em processo paralelo, em partícula e o resultado semântico da combinação da partícula com os verbos vai depender do tipo de verbo com o qual ela é associada. Com verbos eventivos, pode denotar tanto posição quanto aspecto progressivo, como ilustrado em (23). Associada a verbos estativos, indica um estado em progressão, como pode ser atestado pelo exemplo (24).

(22) tapi’ir-a ø-iku ajpo ka’a-pe   anta-RFR 3.I-estar.em.movimento N.AT mato-LOC   ‘A anta deve estar (em pé, em movimento) no mato.’
(23) tapi’ir-a u-’u ika ka’a-pe   anta-RFR 3.I-comer POS1/PROG mato-LOC   ‘A anta comia em pé, em movimento, no mato.’/ ‘A anta estava comendo no mato.’
(24) jaha a-wata ka’a r-ipi ha = ø -jamyhỹ ika   eu 1SG.I-andar mata ADJ-POR 1SG.II = ADJ-estar.faminto PROG   ‘Eu andava pelo mato. Eu estava faminto.’ (Magalhães, 2007, p. 107)

PARTÍCULA DE ASPECTO PROJETIVO

A partícula ta(r) expressa aspecto projetivo por indicar a projeção de um evento ou estado a ser realizado ou a existência de uma entidade a ser concretizada (Magalhães, 2007, p. 111)13 13 Essa partícula tem cognatos em várias outras línguas da família Tupí-Guaraní e é muitas vezes interpretada como expressando tempo futuro. Aqui, entendemos que sua função como partícula aspectual retrata melhor a estrutura gramatical das línguas da família, uma vez que não há, na maioria dessas línguas, morfemas específicos para marcar tempo. O aspecto, como categoria gramatical que delimita a estrutura interna de uma ação, estado ou evento, nos parece muito mais relevante nas línguas da família do que a categoria tempo que, quando expressa, sempre é associada a noções aspectuais. Agradeço à Marília Facó a oportunidade de refletir sobre esse tema durante evento científico em 2018, em Goiânia, confirmando que sua impressão se alinhava à minha análise desta partícula como aspectual e não temporal. . Ocorre associada a predicados verbais, como em (25), e predicados nominais, como em (26), e tem sua origem, conforme apresentado no Quadro 3, no verbo *mata(r) ‘querer/desejar’, para o qual se encontram cognatos em outras línguas da família, mas que deixou de existir como verbo lexical pleno no Guajá, isto é, não ocorre mais associado a morfemas pessoais, apesar de, a depender do contexto, ainda ocorrer em construções verbais mantendo sua forma mais estendida e semântica desiderativa, como em (27):

(25) a-xa ta   1SG.I-ver PROJ   ‘Vou ver.’
(26) ha = r-ipa ta   1SG.II = ADJ-casa PROJ   ‘Vai existir a minha casa.’ (Magalhães, 2007, p. 111)
(27) a-xa mata   1SG.I-ver PROJ/des   ‘Quero ver.’
Quadro 3
Partícula de aspecto projetivo e verbo que a originou.

A partícula que exprime aspecto projetivo ocorre em posição intrapredicado, conforme descrito em Magalhães (2007)MAGALHÃES, Marina Maria Silva. Sobre a morfologia e a sintaxe da língua Guajá: família Tupí-Guaraní. 2007. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2007.. As partículas intrapredicado, apesar de assemelharem-se aos sufixos por serem afetadas por processos morfofonológicos similares aos que ocorrem nos limites de morfemas dentro da palavra, são palavras independentes, pois têm acento próprio e o núcleo do predicado em que ocorrem mantém seu acento original. Além disso, podem ocorrer em sequência e permutar-se entre si, como pode ser observado comparando-se (28) com (29), em que naquele a partícula intrapredicado projetiva ta ocorre após a partícula intrapredicado imediativa ramõ, enquanto neste ela precede a mesma partícula. Tais especificidades impedem a caracterização das partículas intrapredicado como sufixos. Estas partículas, como ta, diferenciam-se também dos advérbios, por ter posição fixa obrigatória pós-núcleo do predicado, além de formar com ele um predicado único, monooracional, o que fica evidente por meio dos marcadores de negação descontínua (n= ... -i), que têm escopo sobre todo o predicado, como ilustrado em (30), e por meio da nominalização do predicado verbal, cujo sufixo ocorre após a sequência verbo + ta, como ilustrado em (31).

(28) a-jaho ramõ te ta   1SG.I-ir IMED REAL PROJ   ‘Eu irei agorinha mesmo!’
(29) ari-jaho ta ramõ e ikwamehẽ are=r-ipa-pe aria   1PL.I-ir PROJ IMED LUS amanzhã 1.SG.II-ADJ-casa-LOC nós   ‘Nós iremos amanhã para a nossa casa.’ (Magalhães, 2007, p. 112)
(30) n = a-xa tar-i   NEG = 1SG.I-ver PROJ-NEG   ‘Não vou ver.’
(31) a-kije ha=Ø-manũ ta-ha r-ia   1SG.I-temer 1.SG.II- ADJ-morrer PROJ-NMLZ ADJ-de   ‘Eu tive medo de morrer.’ (lit.: ‘Eu temi minha morte futura/projetada.’) (Magalhães, 2007, p. 111)

Explicitadas as origens verbais das partículas direcionais, posicionais e de aspecto projetivo do Guajá, serão detalhados, na seção a seguir, os diferentes processos de gramaticalização que resultaram nessas palavras gramaticais.

OS PROCESSOS DE GRAMATICALIZAÇÃO

A definição clássica de gramaticalização difundida por Kurylowicz (1965, p. 52, tradução nossa)Kurylowicz, Jerzy. The evolution of grammatical categories. Diogenes, Paris, v. 13, n. 51, p. 55-71, Sept. 1965. é a de que esse fenômeno “[...] consiste no aumento da amplitude de um avanço a partir de um morfema lexical para um morfema gramatical ou de um status menos gramatical para um mais gramatical”.

Comparando-se as partículas acima citadas e as formas verbais plenas do Guajá, fica evidente, conforme explicado a seguir, que as partículas dêiticas direcionais e posicionais são resultado de um processo de gramaticalização de determinados verbos que ocorriam como núcleo de orações adverbiais de finalidade/simultaneidade, que acabaram se especializando em expressar posição e direção.

Essas orações subordinadas adverbiais são expressas nas línguas da família por meio da sufixação de cognatos do morfema -áβo ou -a, encontrado no Tupinambá, quando têm seu sujeito correferente ao sujeito da oração principal, expressando finalidade/simultaneidade. Desde as primeiras gramáticas sobre as línguas Tupí-Guaraní, esse tipo de oração subordinada é conhecido como oração de ‘gerúndio’ (Anchieta, 1595Anchieta, José de. Arte de grammatica da lingoa mais usada na costa do Brasil. Coimbra: Antonio Mariz, 1595.; Figueira, 1880FIGUEIRA, Luís. Arte de grammatica da lingua brasilica. Rio de Janeiro: Typographia e Lithographia a Vapor de Lombaerts & C., 1880.; Montoya, 1993Montoya, Antonio Ruiz de. Arte de la lengua guaraní. Transcrição por Antonio Caballos. Introdução por Bartomeu Melià. Asunción: CEPAG, 1993. Edição facsimilar.).

Em diversas línguas, quando verbos de movimento ou de posição ocupam a posição de núcleo de oração subordinada de finalidade/simultaneidade, eles se especializam em expressar direcionalidade e posição da ação ou evento, expressos pelo verbo da oração principal.

Na língua Tapirapé, por exemplo, conforme explicado por Praça (2007, p. 207)PRAÇA, Walkiria Neiva. Morfossintaxe da língua Tapirapé: família Tupí-Guaraní. 2007. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2007., os verbos de movimento yj ‘correr’, xar ‘vir’, a ‘ir’, xewyr ‘voltar’, quando ocorrem após um verbo da oração principal, na posição de verbo subordinado no referido ‘modo gerúndio’, expressam a direcionalidade da ação evidenciada pelo verbo principal, como nos exemplos (32) e (33):

(32) a-waem rãka a-xat-a a-xe-amõ-wo   3.I-chegar PAS.REC 3.III-vir-ger 3.III-ref-molhar-ger   ‘Ele chegou (vindo) molhado.’ (Praça, 2007, p. 207)
(33) ã’ẽ=gã-ø a-xewyr a-a-wo confresa-pe   DEM=SG-RFR 3.I-voltar 3.III-ir-GER Confresa-LOC   ‘Ela voltou (indo) para Confresa.’ (Praça, 2007, p. 207)

Aparentemente, o Tapirapé ilustra o processo anterior à gramaticalização pela qual já passou o Guajá: um verbo lexical de movimento recebe morfema subordinador expressando simultaneidade das ações expressas pelos verbos principal e subordinado. Sendo o verbo subordinado um verbo que expressa direção (ir, vir e voltar), ele passa a indicar a direção do movimento expresso pelo verbo principal. No Guajá, esse verbo no ‘modo gerúndio’ teria se gramaticalizado em partículas direcionais, uma vez que não é mais possível analisar a forma gramaticalizada como uma associação da raiz verbal com o sufixo. O mesmo processo teria ocorrido também com as partículas posicionais, quando a gramaticalização ocorreu a partir de verbos que expressam posição.

O processo de gramaticalização que gerou as partículas direcionais e posicionais a partir de verbos flexionados no ‘modo gerúndio’ provavelmente ocorreu em momento não muito recente, como se pode atestar pelos seguintes motivos:

a) a origem dessas partículas é um verbo associado a um antigo sufixo de gerúndio *-á?o (Cabral; Rodrigues, 2005CABRAL, Ana Suely Arruda Câmara; RODRIGUES, Aryon Dall’Igna. O desenvolvimento do gerúndio e do subjuntivo em Tupí-Guaraní. In: RODRIGUES, Aryon Dall’Igna; CABRAL, Ana Suely Arruda Câmara (org.). Novos estudos sobre línguas indígenas. Brasília: Editora da UnB, 2005. p. 47-58.), reconstruído para o Proto-Awetí-Tupí-Guaraní. Resquícios dessa fase anterior da marca de finalidade/simultaneidade são encontrados no Guajá com as partículas kapo ‘partícula direcional elativa’ e tapo ‘partícula posicional’, as únicas de seus respectivos grupos de domínio semântico que terminam em apo;

b) em diversas línguas Tupí-Guaraní, assim como ocorreu na língua Guajá, a sequência -á?o, por motivos de junção fonética entre constituintes, reduziu-se a um sufixo -a. A grande maioria dessas partículas do Guajá termina com a vogal a, que é a forma mais antiga do sufixo de finalidade ainda hoje existente na língua. Nenhuma termina com a forma pa ~ ma, que é uma variante mais recente desse morfema, a qual chegou ao Guajá provavelmente por meio do contato com falantes do Tenetehara;

c) partículas posicionais como ama ~ tama ‘em pé’, apo ~ tapo ‘deitado’ e ina ~ tina ‘de cócoras/sentado’, provêm do gerúndio dos verbos *-’am ‘estar em pé’, *-ub ‘estar deitado’ e *-in ‘estar sentado’, que não existem mais como verbos plenos na língua, mas são atestados em línguas aparentadas mais antigas, por meio de dados registrados há vários séculos, como os da língua Tupinambá;

d) as partículas posicionais conservam um antigo prefixo t- que indica a correferência para a primeira pessoa. Essa marca gramatical de correferência não é encontrada em verbos plenos da língua, mas pode ser encontrada, plenamente ativa, por exemplo, em verbos posicionais na língua Tembé, como exemplificado na nota de rodapé 9. A gramaticalização das partículas posicionais com o referido prefixo de correferencialidade evidencia que esse processo ocorreu em um período em que o prefixo ainda era ativo em verbos plenos da língua.

Como têm sua origem nos verbos, algumas dessas partículas compartilham com essa classe a propriedade de poder ser reduplicadas14 14 Para verificar um verbo reduplicado, conferir exemplo 21 deste artigo. , como ilustrado em (34) e (35), a seguir:

(34) Ø-wata katakata   3.I-andar POS6~RED   ‘Ele anda mancando.’ (lit.: ‘Ele anda balançando.’)
(35) Ø-wata ikaika   3.I-andar POS1~RED   ‘Ele fica a andar.’
(36) Ø-roho rakaka I-kwa Ø-kytyry   3.I-levar POS7~RED 3.II-buraco ADJ-frente   ‘(O jabuti) levou (a onça) (estando com ela) para frente do seu buraco.’ ((Berto et al., 2019, p. 161)

Já no caso da gramaticalização do verbo *mata ‘querer/desejar’, que sofreu erosão fonética (o verbo dissilábico tornou-se uma partícula monossilábica) e enfraquecimento semântico, resultando na partícula de aspecto projetivo ta, é possível atestar que a origem dessa partícula provém da possibilidade estrutural que a língua apresenta de permitir que determinadas raízes verbais ocorram como segundo verbo de uma sequência verbal, sem marca morfológica de pessoa ou qualquer marca de subordinação, como ilustrado a seguir15 15 Além da partícula ta, a partícula katy ‘bem’ vem do verbo estativo ‘ser/estar bem’, não mais existente no Guajá, mas atestada em outras línguas da família, que se gramaticalizou em partícula de maneira, possivelmente também a partir de construções em que figurava como segundo verbo de uma construção de verbos seriais (Serial Verb Construction - SVC): a-’ukaty1SG.I-andarbem ‘Eu comi bem.’ :

(37) a-wata kwa   1SG.I-andar saber   ‘Eu sei andar.’
(38) a-’u pa   1SG.I-comer terminar   ‘Eu terminei de comer.’
(39) a-’ĩ panahỹ ni = ø-pe   1SG.I-falar estar.certo 2SG.II = ADJ-dat   ‘Eu falei certo pra você.’
(40) a-’ĩ manahỹ ni = ø-pe   1SG.I-falar estar.errado 2SG.II = ADJ-dat   ‘Eu falei errado pra você.’
(41) kamixa-ø ø-wata me   jabutI-RFR 3.I-andar ser.devagar   ‘O jabuti anda devagar.’

Os exemplos (37) e (38) mostram os verbos kwa ‘saber’ e pa ‘terminar’, que também ocorrem como verbos lexicais associados a marcas de pessoas (a-kwa ‘eu sei’; Ø-pa ‘(isto) acabou’), ocorrendo como segundo verbo de uma construção específica que envolve sequências verbais (verbo 1 + verbo 2) em que o primeiro verbo leva a marca de pessoa e é seguido por outro sem índice pessoal ou qualquer marca de subordinação ou coordenação. Os exemplos (39), (40) e (41) mostram os verbos estativos parahỹ ‘estar certo/bonito/bom’, manahỹ ‘estar errado/feio/ruim’ e me ‘estar devagar’, que, da mesma forma que os dois anteriores, ocorrem como verbos lexicais plenos associados a marcas de pessoas (ha=Ø-parahỹ ‘eu sou bonito’; ha=Ø-manahỹ ‘eu sou feio’; Ø-me ‘ele é devagar’), mas figuram também como segundo verbo, em uma sequência verbal (verbo 1 + verbo 2). Os dois verbos da sequência verbal compartilham os mesmos argumentos e formam uma oração cujas propriedades entonacionais são idênticas às de uma oração com apenas um verbo. Até o momento, são esses cinco verbos ora citados os únicos identificados que podem ocorrer nesta posição, sincronicamente. No entanto, essas sequências verbais têm todas as características listadas por Aikhenvald e Dixon (2006, p. 4, tradução nossa) para definir as construções de verbos seriais (SVC):

  • são uma sequência de verbos que agem juntos como um predicado simples, sem qualquer marca de coordenação, subordinação ou dependência sintática de qualquer tipo;

  • descrevem o que é conceitualizado como um evento simples;

  • são monooracionais, isto é, suas propriedades entonacionais são as mesmas daquelas de uma oração monoverbal, e elas têm apenas o mesmo tempo verbal, aspecto e polaridade;

  • compartilham argumentos centrais e outros argumentos;

  • cada componente de uma SVC deve estar apto a ocorrer sozinho;

  • dentro de uma SVC, os verbos individuais podem ter diferentes ou o mesmo valor transitivo16 16 No original: “A serial verb construction (SVC) is a sequence of verbs which act together as a single predicate, without any overt marker of coordination, subordination, or syntactic dependency of any other sort. Serial verb constructions describe what is conceptualized as a single event. They are monoclausal; their intonational properties are the same as those of a monoverbal clause, and they have just one tense, aspect, and polarity value. SVCs may also share core and other arguments. Each component of an SVC must be able to occur on its own. Within an SVC, the individual verbs may have same, or diferent, transitivity values” (Aikhenvald; Dixon, 2006, p. 4). .

Acrescenta-se a essas características a de que a negação dessa sequência verbal, sendo uma negação descontínua, abarca ambos os verbos, conforme se pode observar nos exemplos (42) e (43):

(42) n-a-wata kwa-j   NEG-1SG.I-andar saber-NEG   ‘Eu não sei andar.’
(43) n-a-’u par-i   NEG-1SG.I-comer terminar-NEG   ‘Eu não terminei de comer.’

Essa também é, segundo François (2006, p. 228, tradução nossa), uma característica das SVC: “Elementos de uma SVC não podem ser negados separadamente, mesmo se, semanticamente falando, apenas um dos verbos [...] estiver sob o escopo da negação”17 17 No original: “Elements of an SVC cannot be negated separately, even if, semantically speaking, only one verb […] falls under the scope of the negation” (François, 2006, p. 228). .

Por fim, não há possibilidade de se interpretar a sequência verbo 1 + verbo 2 como uma sequência verbo + auxiliar, porque as marcas flexionais recaem sempre sobre o primeiro verbo, quando deveriam recair sobre o verbo auxiliar, se este fosse o caso.

Assim, interpreto esse tipo de estrutura como uma construção de verbos seriais restrita a esses verbos no Guajá, sendo o motivo dessa restrição uma questão ainda a ser aprofundada.

Considerando-se a possibilidade, ainda que limitada, que a língua tem de apresentar tais construções seriais, é possível analisar que o verbo *mata ‘querer/desejar’ se gramaticalizou como marca de aspecto projetivo a partir de uma estrutura serializada em que ocorria como o segundo verbo, com semântica desiderativa, e, no processo de gramaticalização, perdeu a possibilidade de ocorrer sozinho como núcleo de predicado, adquirindo posição fixa pós-verbal e semântica aspectual projetiva, como nos exemplos (44) e (45):

(44) a-wata ta   1SG.I-andar PROJ   ‘Eu vou andar.’
(45) a-‘u ta   1SG.I-comer PROJ   ‘Eu vou comer.’

A possibilidade de a raiz do verbo lexical ‘querer’ ocorrer em construções similares às SVC é atestada em outras línguas da família Tupí-Guaraní, como em Kamayurá. Segundo Seki (2000), a raiz do verbo lexical potat ‘querer/desejar’, cognata à mata do Guajá, além de ocorrer como núcleo de oração independente – exemplo (46) –, ocorre também associada ao verbo principal de uma oração, como um sufixo – exemplo (47) –, expressando o que ela denomina de “[...] modalidade desiderativa [...]” (Seki, 2000SEKI, Lucy. Gramática do Kamaiurá: língua Tupi-Guarani do Alto Xingu. Campinas: Editora da UNICAMP; São Paulo: Imprensa Oficial, 2000., p. 146), e compondo um “[...] predicado complexo monooracional [...]” (Seki, 2000, p. 146-147), que, com a diferença de ser interpretado pela autora como um sufixo, ocorre na mesma posição que os verbos ‘saber’ e ‘terminar’ do Guajá, isto é, “[...] acrescenta-se imediatamente após o verbo principal, [...] os dois verbos da construção requerem um mesmo sujeito, e a raiz verbal sufixada não tem especificação para pessoa” (Seki, 2000, p. 147), como em (46):

(46) a-potar=ete ij-o-taw-a   1SG-querer=ATUAL 3-ir-NMLZ-N   ‘Quero realmente que ele vá.’ (Seki, 2000, p. 90)
(47) amo-a kwar-er-a rehe we jepe a-ha-potat   outro-N sol-PAS-n LOC RETR FRUST 1SG-ir-querer   ‘No ano passado eu queria ir [mas não fui].’ (Seki, 2000, p. 96)

Da mesma maneira, em Tenetehara, a raiz cognata putar ‘querer/desejar’ ainda é utilizada como verbo lexical, sendo associada às marcas de pessoa, como em (48), mas, paralelamente, também ocorre associada ao verbo lexical, sem marca de pessoa, expressando, segundo a interpretação de (Duarte et al. (2018)DUARTE, Fábio Bonfim; CAMARGOS, Quesler Fagundes; CASTRO, Ricardo Campos; SILVA, Cíntia Maria Santana; GUAJAJARA, Marina da Silva. Coletânea de narrativas Guajajára. Belo Horizonte: FALE: UFMG, 2018. v. 1., tempo futuro, como em (49):

(48) aze pe-putar uru-zuka pe=ø-me nehe   se 2PL-desejar 1PL.EXCL-quebrar 2PL=REL-para INT   ‘Se desejam, nós podemos quebrá-lo (o pote) para vocês.’ ((Duarte et al., 2018, p. 34 apud (Camargos et al., 2019, p. 836)
(49) a-ha-putar ka’a r-upi ihe ri’i   1SG-ir-FUT mata REL-para 1SG CERT   ‘Eu vou para a mata com certeza.’ (futuro IMEDiato e certo) (adaptado de (Camargos et al., 2019, p. 834)

Os exemplos das línguas Kamayurá e Tenetehara ilustram fases anteriores do processo de gramaticalização por que já passou a língua Guajá, em que o verbo de tempo futuro no Tenetehara continua existindo paralelamente como verbo lexical. No Guajá, este verbo deixou de ser usado como verbo lexical pleno e sua raiz tornou-se apenas um elemento com função gramatical, uma partícula. A identificação do verbo lexical pleno em línguas relacionadas permite concluir que tal mudança é relativamente recente na língua.

Em resumo, podemos diferenciar dois processos de gramaticalização diferentes que resultaram nas partículas aqui enfocadas: i) a gramaticalização de verbos de movimento e posição em partículas direcionais e posicionais a partir de estruturas subordinadas, marcadas com sufixo de finalidade/simultaneidade; e ii) a gramaticalização do verbo ‘querer/desejar’ em partícula de aspecto projetivo a partir de uma construção serial verbal.

Com relação ao processo cognitivo responsável pelo desenvolvimento de expressões gramaticais nas línguas do mundo, conforme apresentado por Marina Magalhães (informação verbal)18 18 Apresentação de comunicação oral intitulada “A gramaticalização de verbos em partículas”, no IV Simpósio Mundial de Estudos da Língua Portuguesa (SIMELP), realizado na Universidade Federal de Goiás (UFG), em 2013. , pesquisas (Bybee et al., 1994BYBEE, Joan; PERKINS, Revere; PAGLIUCA, William. The evolution of grammar: tense, aspect, and modality in the languages of the world. Chicago: University of Chicago Press, 1994.; Heine; Kuteva, 2002Heine, Bernd; Kuteva, Tania. World lexicon of grammaticalization. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.) sugerem que tais expressões derivam quase sempre de conceitos concretos, e que a morfologia gramatical tende a se desenvolver a partir de estruturas lexicais, especialmente a partir de categorias como nomes e verbos.

Ao assumir que expressões gramaticais como auxiliares expressam conceitos gramaticais tipicamente relacionados a tempo, aspecto e modalidade (TAM), quase que invariavelmente podemos afirmar que as expressões linguísticas para tais noções são derivadas de conceitos gerais como locação, movimento, atividade, desejo, postura, relação e posse. Tais noções tendem a ser expressas linguisticamente por meio de verbos.

Muitos autores têm tratado da descrição da natureza dos verbos utilizados nas línguas como fonte de conceitos expressos por auxiliares e chegado a conclusões similares, segundo as quais os verbos que normalmente se gramaticalizam são aqueles que codificam conceitos pertencentes aos quatro domínios (Kuteva, 1995KUTEVA, Tania. The auxiliarization constraint and reference. In: GEIGER, Richard A. (ed.). Reference in multidisciplinary perspective: philosophical object, cognitive subject, intersubjective process. Hildesheim: Georg Olms Verlag, 1995. p. 374-386.): físico (por exemplo, ser/estar, ir/vir, ter), temporal (por exemplo, fazer, iniciar/tornar-se, terminar, permanecer), intrassubjetivo (por exemplo, querer) e inter-subjetivo (por exemplo, dever, permitir).

Os dados do Guajá corroboram a hipótese de que a fonte de tais conceitos gramaticais é um número limitado de verbos, pertencentes a domínios específicos, a medida em que as partículas direcionais e posicionais resultam da gramaticalização dos verbos ‘ir’, ‘vir’, ‘estar em movimento’, ‘estar sentado’, ‘estar deitado’, ‘passar’ (domínio físico), e a partícula de aspecto projetivo resulta da gramaticalização do verbo ‘querer’ (domínio intrassubjetivo).

A questão sobre que tipos de verbos tendem a se gramaticalizar em auxiliares parece estar relacionada à generalidade dos conceitos expressos por eles e ao maior escopo de utilização.

O que é importante esclarecer a partir desse estudo é que, apesar da diferente natureza dos auxiliares das línguas estudadas por Kuteva (1995), com relação às partículas direcionais e posicionais e temporal do Guajá, quando observamos seu processo de gramaticalização a partir de verbos, podemos estabelecer um paralelo que nos leva a concluir que os mesmos tipos de verbos que resultam em algumas línguas em auxiliares podem, em outras, resultar em partículas.

No entanto, enquanto os auxiliares são o resultado da gramaticalização de um verbo finito que começa a ocorrer quando este recebe um complemento e a estrutura lexical verbo + complemento nominal ou nominalizado torna-se a estrutura gramatical marca gramatical + verbo lexical (Kuteva, 2001KUTEVA, Tania. Auxiliation: an enquiry into the nature of grammaticalization. Oxford: Oxford University Press, 2001.), sendo os auxiliares os elementos que recebem as marcas verbais, as partículas direcionais e posicionais do Guajá são resultado da gramaticalização do mesmo tipo de verbo, mas a partir de formas subordinadas desses verbos, isto é, menos finitas.

Um processo similar ocorre com a partícula de aspecto projetivo, que resulta da gramaticalização do segundo verbo de uma construção serial, também caracterizada por ser uma forma menos finita. Givón (1995)GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Amsterdam: John Benjamins Publishing Company, 1995. refere-se ao surgimento de marcadores auxiliares de TAM a partir de construções seriais como um fenômeno atestado em várias línguas, como Tok Pisin e Supyire, uma língua Senufu falada no Mali.

Assim, teríamos, nos dois processos de gramaticalização aqui descritos: verbo + complemento não finito tornando-se verbo + partícula, no caso das partículas direcionais e posicionais, e, no caso da partícula de aspecto projetivo, teríamos a estrutura verbo 1 + verbo 2 de uma SVC, tornando-se verbo + partícula. A diferença formal entre a gramaticalização de verbos em partículas, e não em auxiliares, está no fato de que as partículas são invariáveis e seu conteúdo gramatical complementa a noção lexical do verbo pleno com o qual ocorrem, sendo este o que recebe as marcas flexionais.

Assim, a análise comparativa das partículas direcionais, posicionais e de aspecto projetivo da língua Guajá com verbos plenos desta mesma língua e de línguas geneticamente relacionadas permite estabelecer o processo dinâmico que as originou.

A RELAÇÃO DA GRAMATICALIZAÇÃO COM A OMNIPREDICATIVIDADE

Apresentados os diferentes percursos da gramaticalização de verbos em partículas no Guajá, nesta seção pretendemos discutir a ideia de que tais processos de inovação mostram dois sentidos de evolução opostos no que se refere à perda versus manutenção das características omnipredicativas da língua Guajá.

PERDA DE CARACTERÍSTICAS OMNIPREDICATIVAS

Em uma língua plenamente ominipredicativa, é de se esperar que as partículas que expressam noções gramaticais associadas ao predicado sejam usadas com todos os itens lexicais predicáveis. A partícula ika, descrita na subseção “Partículas posicionais”, que expressa posição em pé e em movimento, estendeu seu uso posicional, conforme explicado anteriormente, e tem se especializado em expressar aspecto progressivo. No entanto, o uso desta partícula foi apenas registrado em orações que têm verbos como núcleo do predicado, como mostram os exemplos (22) e (24), repetidos aqui como (50) e (51), mas nunca com nomes ou expressões adverbiais em função de predicado. As tentativas de construção de sentenças com núcleos de predicado nominais e adverbiais associados a essa partícula, conforme os exemplos (52) e (53), foram consideradas agramaticais pelos falantes:

(50) tapi’ir-a u-’u ika ka’a-pe   anta-RFR 3.I-comer PROG mato-LOC   ‘A anta estava comendo no mato.’
(51) jaha a-wata ka’a r-ipi ha = Ø-jamyhỹ ika   eu 1SG.I-andar mata ADJ-por 1SG.II = ADJ-estar.faminto PROG   ‘Eu andava pelo mato. Eu estava faminto.’ (Magalhães, 2007, p. 107)
(52) *Manãxika-Ø tamỹ-a ika   Manãxika-RFR chefe-RFR PROG   ‘Manãxika está sendo chefe.’
(53) *tapi’ir-a ka’a-pe ika   anta-RFR mato-LOC PROG   ‘A anta está ficando no mato.’

Além disso, no que se refere aos predicados adverbiais, é importante apresentar as duas diferentes estruturas utilizadas na língua para expressar o mesmo significado: a construção com predicado adverbial em (54), e a sentença em (55), em que o núcleo do predicado é um verbo (iku ‘estar em pé, em movimento’) e o advérbio funciona como adjunto.

As diferentes estruturas foram extraídas de uma narrativa, uma na sequência da outra, como resposta à pergunta: ‘Onde será que está o porcão?’. Interpreto que o fato de elas terem sido usadas como resposta alternativa à mesma pergunta mostra que expressam o mesmo sentido semântico (considerando-se que pode haver uma diferença pragmática), apesar das diferentes estruturas. Além disso, minha hipótese é a de que o exemplo (55) é uma possibilidade estrutural mais nova da língua, que surge como tendência à perda da capacidade predicativa dos advérbios.

(54) xahu-a kwatete wỹ   porcão-RFR perto PLU   ‘Os porcões estão perto.’
(55) xahu-a Ø-iku kwatete wỹ   porcão-RFR 3.I-estar.em.movimento perto PLU   ‘Os porcões estão (em movimento) perto.’

Assim, interpreto o surgimento de uma partícula de aspecto progressivo associada apenas a predicados verbais – exemplos (50) e (51) – como um indício da tendência da língua em perder características omnipredicativas. Da mesma maneira, o surgimento de uma construção verbal – exemplo (55) – também pode ser associado a uma possível perda de características omnipredicativas, relacionada à necessidade de que apenas um verbo, e não um advérbio, ocorra como núcleo do predicado.

MANUTENÇÃO DE CARACTERÍSTICAS OMNIPREDICATIVAS

Diferentemente da tendência atestada pelo uso da partícula ika, a gramaticalização relativamente recente do verbo ‘querer/desejar’ em partícula de aspecto projetivo advém simultaneamente para verbos (56) e nomes (57) em posição predicativa, o que interpreto como um índice de manutenção da omnipredicatividade.

(56) a-xa ta   1SG.I-ver PROJ   ‘Eu vou ver.’
(57) ha = r-ipa ta   1SG.II = ADJ-casa PROJ   ‘Vai existir a minha casa.’

No entanto, vale ressaltar que não foi verificado nenhum dado em que a partícula de aspecto projetivo ocorresse com predicados adverbiais. Para se atribuir a semântica projetiva associada a noções adverbiais, é necessário que um verbo seja o núcleo do predicado, como em (58), o que reforça que, mesmo quando a gramaticalização ocorre na língua no sentido de manter características omnipredicativas, ela não atinge os predicados adverbiais, que aparentemente estão perdendo sua capacidade predicativa.

(58) I-mymyr-a Ø-ikwẽ ta ha-ipa-pe   3.II-filho-RFR 3.I-ficar PROJ 3.II-casa-LOC   ‘O filho dela vai ficar em casa.’

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O propósito deste artigo foi mostrar que, apesar de a classe das partículas ser apresentada, de maneira geral nas línguas documentadas, como uma classe inconsistente em termos formais e heterogênea em termos funcionais, é possível, no caso do Guajá, delimitar de maneira consistente a existência dessa classe e explicitar a origem verbal de algumas delas. Assim, enfocamos a análise das partículas direcionais, posicionais e da partícula de aspecto projetivo da língua Guajá, atribuindo sua origem a diferentes processos de gramaticalização a partir de verbos plenos, a saber: i) a gramaticalização de verbos de movimento e posição em partículas direcionais e posicionais a partir de estruturas subordinadas, marcadas com sufixo de finalidade/simultaneidade; e ii) a gramaticalização do verbo ‘querer/desejar’ em partícula de aspecto projetivo a partir de uma construção serial verbal.

Tais processos foram também relacionados à perda versus manutenção da omnipredicatividade na língua, característica tipológica apresentada por Launey (1994)LAUNEY, Michel. Une grammaire omniprédicative: essai sur la syntaxe du nahuatl classique. Paris: CNRS, 1994. e atribuída por Queixalós (2006)QUEIXALÓS, Francesc. The primacy and fate of predicativity en Tupi-Guarani. In: LOIS, Ximena; VAPNARSKY, Valentina (ed.). Lexical categories and root classes in Ameridian Languages. Bern: Peter Lang International Academic Publishers, 2006. p. 249-288. às línguas Tupí-Guaraní, por analisar que as línguas dessa família representam, sincronicamente, diferentes fases de mudança de um padrão mais prototipicamente omnipredicativo para padrões menos prototipicamete omnipredicativos.

Vale acrescentar que, no que se refere à mudança linguística, é sabido que uma língua pode mudar de um perfil tipológico para outro por meio de uma combinação de mudanças específicas. No entanto, neste nível de mudança linguística (morfossintático), nada há de unidirecionalidade. A mudança de um padrão omnipredicativo para um menos omnipredicativo envolve uma série de características gramaticais, que se perdem completamente. Porém, algumas inovações que surgem contribuem para reforçar este padrão. Como afirma Dixon (1994, p. 182, tradução nossa)DIXON, Robert M. W. Ergativity. Cambridge: Cambridge University Press, 1994. (Cambridge Studies in Linguistics, 69)., “[...] qualquer tipo de língua – em termos de qualquer parâmetro tipológico – pode mudar para outro tipo, e depois voltar”. Assim, a mudança de um padrão para outro, seja de uma tipologia omnipredicativa para uma não omnipredicativa, ou de uma língua ergativa para acusativa, ocorre gradativamente, permitindo, inclusive, que estruturas mais conservadoras se mantenham por mais tempo ou até reapareçam, enquanto outras passam por processos mais rápidos de mudança. A análise do surgimento de partículas que têm origem em verbos no Guajá é evidência dessa mudança gradativa das evoluções diacrônicas, uma vez que as partículas posicionais que passam a expressar aspecto progressivo apenas em predicados verbais representam indício de perda da omnipredicatividade na língua, enquanto o surgimento de uma marca de aspecto projetivo que ocorre indiferentemente com nomes e verbos, mas não com advérbios, em posição de predicado, por outro lado, atesta a possibilidade de manutenção de traços omnipredicativos em processo de mudança relativamente recente nessa língua.

  • 1
    A função predicativa é indicada nos exemplos pelos símbolos < >, em oposição a [ ], que indica os limites dos sintagmas em funções não predicativas, como as de argumento.
  • 2
    Informação obtida das notas de campo da autora, em estudo realizado nas aldeias Awá e Tiracambu (Maranhão), em julho de 2012.
  • 3
    Neste exemplo, a expressão adverbial ka’a-pe ‘no mato’ exerce a função de predicado e exige o sintagma nominal tapi’ir-a ‘a anta’, como seu argumento externo. Essa oração contrasta com a seguinte, em que a mesma expressão funciona como adjunto adverbial do predicado nominal existencial tapi’i ‘há anta’, que ocorre sem o morfema referenciante:
    <tapi’i>(ka’a-pe)antamata-LOC ‘Há anta (no mato).’
  • 4
    É importante ressaltar que a classificação de uma língua como omnipredicativa não se restringe a essa propriedade. Além disso, o tipo de língua que aqui denominamos de omnipredicativa também é conhecido, na teoria gerativa, sob o rótulo de língua não configuracional – ver Hale (1983)Hale, Ken. Warlpiri and the grammar of non-configurational languages. Natural Language and Linguistic Theory, Berlin, v. 1, n. 1, p. 5-47, Mar. 1983. para o warlpiri e Jelinek (1984)Jelinek, Eloise. Empty categories, case, and configurationality. Natural Language and Linguistic Theory, Berlin, v. 2, n. 1, p. 39-76, June 1984. para as línguas salish. No entanto, para a compreensão do fenômeno abordado neste artigo, enfocaremos apenas a capacidade predicativa de quase todos os itens lexicais das línguas Tupí-Guaraní.
  • 5
    Para maiores detalhes sobre a perda gradativa de características omnipredicativas nessas quatro línguas, confira Praça et al. (2017)Praça, Walkiria Neiva; Magalhães, Marina Maria Silva; da Cruz, Aline. Indicativo II da família Tupí-Guaraní: uma questão de modo? LIAMES, Campinas, v. 17, n. 1, p. 39-58, jan./jun. 2017. DOI: https://doi.org/10.20396/liames.v17i1.8646480.
    https://doi.org/10.20396/liames.v17i1.86...
    .
  • 6
    Em línguas mais conservadoras, como o Tupinambá e o Apyãwa, a função argumentativa é exercida primariamente também pelos verbos (Praça et al., 2017Praça, Walkiria Neiva; Magalhães, Marina Maria Silva; da Cruz, Aline. Indicativo II da família Tupí-Guaraní: uma questão de modo? LIAMES, Campinas, v. 17, n. 1, p. 39-58, jan./jun. 2017. DOI: https://doi.org/10.20396/liames.v17i1.8646480.
    https://doi.org/10.20396/liames.v17i1.86...
    ).
  • 7
    As variantes haraha e harawa das partículas raha e rawa ocorrem em variação livre e podem ser explicadas pelo fato de o h inicial ser um antigo prefixo de terceira pessoa da série não ativa de marcadores pessoais que ficou cristalizado quando o verbo se gramaticalizou em partícula. Em línguas como o Guajajara, o verbo ‘levar’ da oração subordinada ocorre com o referido prefixo:
    u-munykt-azyri-petymh-erahai-zupea’e 3-acender3-filha3-tabaco3-levar3-para3  ‘A filha dele acendeu o cigarro dele e levou para ele.’ ((Harrison, 1983, p. 74)
  • 8
    Os prefixos comitativo e causativo lexicalizaram-se nesses itens lexicais.
  • 9
    Nem sempre é a posição (que evoca estatismo) o que essas partículas expressam; podem indicar uma atitude física, como no caso da partícula ika ‘estar em movimento’ ou no caso da partícula kata ‘realizar movimento de pêndulo’.
  • 10
    e acordo com Magalhães (2007, p. 106)MAGALHÃES, Marina Maria Silva. Sobre a morfologia e a sintaxe da língua Guajá: família Tupí-Guaraní. 2007. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2007., “Os temas verbais marcados com asterisco (*) não são encontrados sincronicamente nas suas formas independentes no Guajá. Essas formas são citadas tomando como base outras línguas da família, mais conservadoras, em que há esses verbos posicionais que, além da posição, indicam também um evento em progressão. Atualmente os Guajá usam as formas verbais independentes -pa’ã para ‘levantar’, -japajnõ para ‘deitar’ e -wapý para ‘sentar’”.
  • 11
    A variante haraka da partícula raka pode ser explicada da mesma maneira que a das partículas raha e rawa (cf. nota 7).
  • 12
    A consoante t inicial, que sincronicamente se encontra lexicalizada na partícula posicional, possivelmente foi produtiva como prefixo de correferência. No Tembé, por exemplo, uma língua Tupí-Guaraní, há um prefixo te- que indica a correferência em verbos posicionais na primeira pessoa (informação verbal, fornecida por Ana Suelly Cabral, em Brasília, em 2006)CABRAL, Ana Suely Arruda Câmara; RODRIGUES, Aryon Dall’Igna. O desenvolvimento do gerúndio e do subjuntivo em Tupí-Guaraní. In: RODRIGUES, Aryon Dall’Igna; CABRAL, Ana Suely Arruda Câmara (org.). Novos estudos sobre línguas indígenas. Brasília: Editora da UnB, 2005. p. 47-58.:
    izeaa-mae-ute-inieu1SG.I-caça-comer1CORR-estar.sentado ‘Eu estou comendo (sentada).’   izeaa-mae- ute-'ameu1SG.I-caça-comer1CORR-estar.em.pé‘Eu estou comendo (em pé).’ izéaa-ze'ente-koeu1SG.I-conversar1CORR-estar.em.movimento ‘Eu estou falando (em movimento).’
  • 13
    Essa partícula tem cognatos em várias outras línguas da família Tupí-Guaraní e é muitas vezes interpretada como expressando tempo futuro. Aqui, entendemos que sua função como partícula aspectual retrata melhor a estrutura gramatical das línguas da família, uma vez que não há, na maioria dessas línguas, morfemas específicos para marcar tempo. O aspecto, como categoria gramatical que delimita a estrutura interna de uma ação, estado ou evento, nos parece muito mais relevante nas línguas da família do que a categoria tempo que, quando expressa, sempre é associada a noções aspectuais. Agradeço à Marília Facó a oportunidade de refletir sobre esse tema durante evento científico em 2018, em Goiânia, confirmando que sua impressão se alinhava à minha análise desta partícula como aspectual e não temporal.
  • 14
    Para verificar um verbo reduplicado, conferir exemplo 21 deste artigo.
  • 15
    Além da partícula ta, a partícula katy ‘bem’ vem do verbo estativo ‘ser/estar bem’, não mais existente no Guajá, mas atestada em outras línguas da família, que se gramaticalizou em partícula de maneira, possivelmente também a partir de construções em que figurava como segundo verbo de uma construção de verbos seriais (Serial Verb Construction - SVC):
    a-’ukaty1SG.I-andarbem ‘Eu comi bem.’
  • 16
    No original: “A serial verb construction (SVC) is a sequence of verbs which act together as a single predicate, without any overt marker of coordination, subordination, or syntactic dependency of any other sort. Serial verb constructions describe what is conceptualized as a single event. They are monoclausal; their intonational properties are the same as those of a monoverbal clause, and they have just one tense, aspect, and polarity value. SVCs may also share core and other arguments. Each component of an SVC must be able to occur on its own. Within an SVC, the individual verbs may have same, or diferent, transitivity values” (Aikhenvald; Dixon, 2006Aikhenvald, Alexandra Y.; Dixon, Robert M. W. (ed.). Serial verb constructions: a cross-linguistic typology. Oxford: Oxford University Press, 2006., p. 4).
  • 17
    No original: “Elements of an SVC cannot be negated separately, even if, semantically speaking, only one verb […] falls under the scope of the negation” (François, 2006FRANÇOIS, Alexandre. Serial verb constructions in Mwotlap. In: AIKHENVALD, Alexandra Y.; DIXON, Robert M. W. (ed.). Serial verb constructions: a cross-linguistic typology. Oxford: Oxford University Press, 2006. p. 223-238., p. 228).
  • 18
    Apresentação de comunicação oral intitulada “A gramaticalização de verbos em partículas”, no IV Simpósio Mundial de Estudos da Língua Portuguesa (SIMELP), realizado na Universidade Federal de Goiás (UFG), em 2013.

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos pareceristas e editores, pelas observações que permitiram o aprimoramento deste artigo; e à Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF), instituição financiadora do meu pós-doutorado durante o período de elaboração deste trabalho.

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    » https://doi.org/10.1590/1981.81222019000300011

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2019

Histórico

  • Recebido
    25 Jan 2019
  • Aceito
    21 Ago 2019
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