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Editorial

Se na dimensão individual é inegável a importância da saúde para o bem-estar das pessoas, tanto que os votos de “boa saúde” fazem parte das tradicionais congratulações de aniversário e ano-novo, mais ainda se pode admitir em relação à área como elemento de construção das políticas públicas inerentes à cidadania.

Por isso, qualquer ameaça à manutenção desse direito causa extrema preocupação, dado ser um dos marcos da consolidação da democracia brasileira, firmado pela Constituição de 1988 11. Brasil. Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília; 1988. Seção II, Da Saúde, arts. 196-200. e implementado dois anos depois por intermédio da Lei Orgânica da Saúde 22. Brasil. Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1UVpr2U
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, que estabeleceu os princípios reguladores e a forma de organização do Sistema Único de Saúde (SUS). Assim, a ideia de que não podemos perder direitos constitucionalmente adquiridos, como o acesso universal a saúde e educação, compõe a pauta atual de reivindicações da sociedade brasileira 33. Reis V, Scheffer M, Pinho L. Nenhum direito a menos! Fórum da Reforma Sanitária delibera ações. [Internet]. Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco); 6 jun 2016. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1ttK102
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4. G1 São Paulo. Escolas técnicas seguem ocupadas por estudantes em São Paulo. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://glo.bo/1q8Xf08
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-55. Lucchese B. Estudantes reivindicam melhorias na educação e ocupam 70 escolas no RJ. [Internet]. G1, Hora 1; 20 abr 2016 [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://glo.bo/26f24pY
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No que diz respeito à bioética, tal reivindicação torna-se ainda mais contundente porque a construção teórica e aplicada da bioética brasileira criou um corpus de conhecimento autóctone, voltado às questões de saúde pública e coletiva. O foco da bioética brasileira é no contexto social, sanitário e epidemiológico do país, o que propiciou que, ao longo das últimas décadas, esse campo de estudos transcendesse a teoria principialista e acompanhasse o ideário do SUS, estabelecendo a dimensão social como âmbito legítimo de reflexões.

Assim, é possível afirmar que no Brasil a teoria ética e a ética aplicada deram-se as mãos para produzir o diálogo bioético, promovendo comunicação profícua, voltada a orientar as políticas públicas e as práticas em saúde da sociedade. Foi esse consórcio instrumental entre teoria e prática, tanto quanto a luta política ou ideológica, que “politizou” a bioética, permitindo que ensino e pesquisa pudessem responder aos conflitos em saúde da população brasileira. Em nossa sociedade a “ponte” foi estabelecida na luta pela democracia e pela consolidação da cidadania, sob o amparo dos direitos humanos.

O acerto da perspectiva adotada pela bioética brasileira foi endossado pela Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos 66. Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura. Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. [Internet]. Unesco; 2005. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1TRJFa9
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, que reafirma o caráter universal dos marcos de cidadania, especialmente os relacionados a vida, saúde e educação. Nesse sentido, cabe sublinhar que o ensino de bioética na graduação e na pós-graduação também precisa expandir seu foco para além do principialismo, estimulando a disseminação da bioética social. Tanto para agregar profissionais e estudantes de outras áreas quanto para ampliar o conhecimento dos profissionais da saúde com outras ferramentas teórico-metodológicas, a bioética de cunho social concorre para a produção interdisciplinar de saberes que de fato respondam aos anseios da sociedade.

Esse processo voltado a promover interlocução relaciona-se diretamente com a essência desse campo do conhecimento. A reflexão bioética, que é o “método” que fundamenta a ética aplicada, pode ser considerada como ato ou efeito de refletir-se 77. Instituto Antônio Houaiss. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Objetiva; 2001. [verbete reflexão]. p. 2412., identificando ao menos duas posições – o eu e o outro – em relação às quais se pondera em busca da solução de conflitos, ou como virtude que consiste em evitar a precipitação nos juízos, a imprudência, a impulsividade na conduta 88. Brasil. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde. Resolução CNS nº 510, de 7 de abril de 2016. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1XYDUy0
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. Qualquer dessas acepções só poderá ser alcançada quando não tiver sido rompida a ligação entre interlocutores, quando houver comunicação efetiva e o diálogo for o meio para elucidar os sentidos que cada um atribui à ação.

E é justamente para comemorar mais uma ponte entre as áreas biomédicas e social que publicamos ao final deste número a Resolução 510/16 99. Associação Brasileira de Antropologia. Comitê de Ética em Pesquisa nas Ciências Humanas. [Internet]. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/266gzvd
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do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Reconhecendo as características próprias da pesquisa nas ciências humanas e sociais, o CNS aprovou norma voltada a garantir a avaliação da ética nos procedimentos de pesquisa dessa área de saber 99. Associação Brasileira de Antropologia. Comitê de Ética em Pesquisa nas Ciências Humanas. [Internet]. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/266gzvd
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Note-se que a negociação da norma decorreu de longo e árduo processo de aproximação entre as áreas, intensificado a partir da revisão da Resolução CNS 196/96 1010. Brasil. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde. Resolução CNS nº 196, de 10 de outubro de 1996. Normas para pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília: Ministério da Saúde; jul 2000. (Série Cadernos Técnicos).. A Resolução CNS 466/12 1111. Brasil. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde. Resolução CNS nº 466, de 12 de dezembro de 2012. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/20ZpTyq
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admitiu a necessidade da norma específica, ensejando a criação de grupo de trabalho encarregado de elaborar a resolução específica para a ética em pesquisa nas ciências humanas e sociais no âmbito da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa/Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde 99. Associação Brasileira de Antropologia. Comitê de Ética em Pesquisa nas Ciências Humanas. [Internet]. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/266gzvd
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A publicação da norma para avaliação da ética em pesquisa para as ciências humanas e sociais demonstra cabalmente a necessidade de se manter o diálogo e estimular a comunicação, mesmo (ou principalmente) diante de dificuldades. A regulamentação do processo de pesquisa das ciências humanas e sociais trará tranquilidade ao pesquisador e segurança ao participante, reforçando as garantias de acesso aos direitos humanos.

Os editores

Referências

  • 1
    Brasil. Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília; 1988. Seção II, Da Saúde, arts. 196-200.
  • 2
    Brasil. Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1UVpr2U
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  • 3
    Reis V, Scheffer M, Pinho L. Nenhum direito a menos! Fórum da Reforma Sanitária delibera ações. [Internet]. Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco); 6 jun 2016. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1ttK102
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  • 4
    G1 São Paulo. Escolas técnicas seguem ocupadas por estudantes em São Paulo. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://glo.bo/1q8Xf08
    » http://glo.bo/1q8Xf08
  • 5
    Lucchese B. Estudantes reivindicam melhorias na educação e ocupam 70 escolas no RJ. [Internet]. G1, Hora 1; 20 abr 2016 [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://glo.bo/26f24pY
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  • 6
    Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura. Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. [Internet]. Unesco; 2005. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1TRJFa9
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  • 7
    Instituto Antônio Houaiss. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Objetiva; 2001. [verbete reflexão]. p. 2412.
  • 8
    Brasil. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde. Resolução CNS nº 510, de 7 de abril de 2016. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/1XYDUy0
    » http://bit.ly/1XYDUy0
  • 9
    Associação Brasileira de Antropologia. Comitê de Ética em Pesquisa nas Ciências Humanas. [Internet]. [acesso 10 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/266gzvd
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  • 10
    Brasil. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde. Resolução CNS nº 196, de 10 de outubro de 1996. Normas para pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília: Ministério da Saúde; jul 2000. (Série Cadernos Técnicos).
  • 11
    Brasil. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde. Resolução CNS nº 466, de 12 de dezembro de 2012. [Internet]. [acesso 16 jun 2016]. Disponível: http://bit.ly/20ZpTyq
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2016
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