RESUMO
Introdução: As infecções em pacientes cirróticos têm um impacto significativo na morbimortalidade, porém pouco se sabe sobre as infecções dermo-hipodérmicas agudas não necrosantes (erisipela e celulite infecciosa) nessa população. A alta mortalidade nesse grupo também representa uma perda de oportunidade para o transplante hepático, que poderia ser uma solução potencial para esses pacientes.
Objetivos: Este estudo tem como objetivo descrever as características clínicas, a evolução e os desfechos de pacientes cirróticos com infecções dermo-hipodérmicas agudas em avaliação para transplante hepático.
Métodos: Foi realizado um estudo retrospectivo com pacientes hospitalizados com cirrose e infecções dermo-hipodérmicas no período de 2010 a 2012.
Resultados: Entre 983 pacientes com cirrose hepática que resultaram em 2.046 atendimentos por descompensação da doença, infecções dermo-hipodérmicas foram identificadas em 65 casos (7%). A média de idade foi de 58 anos (± 10), com predominância do sexo masculino (82%). A celulite afetou predominantemente os membros inferiores (70%), seguida do tronco (21%) e dos membros superiores (9%). A etiologia mais comum da cirrose foi a doença hepática alcoólica (56%), seguida da associação entre álcool e hepatite C (17%), hepatite C isolada (13%), esteato-hepatite não alcoólica (9%) e hepatite B (3%). Quanto à classificação de Child-Pugh, 8% dos pacientes eram classe A, 46% classe B e 46% classe C. A pontuação média no Model for End-Stage Liver Disease (MELD) foi de 20 (± 8). As infecções associadas mais comuns foram infecção do trato urinário (54%), pneumonia (25%) e peritonite bacteriana espontânea (21%). Os antibióticos prescritos incluíram clindamicina (71%), cefalosporinas (40%), oxacilina (18%), penicilina (11%), vancomicina (11%), quinolonas (4,5%) e outros (15,3%). Sepse ocorreu em 14% dos casos, e a taxa de mortalidade foi de 18,5% (n = 12). Entre os pacientes que evoluíram para óbito, 67% (n = 8) apresentavam infecções concomitantes à celulite. Os fatores significativamente associados à mortalidade foram infecções concomitantes (69 vs. 31%, p = 0,02) e níveis elevados de proteína C-reativa (6 vs. 3 mg/dL, p = 0,03).
Conclusão: Este estudo destaca a elevada taxa de mortalidade hospitalar entre pacientes cirróticos com infecções dermo-hipodérmicas agudas, especialmente na presença de infecções concomitantes. A alta mortalidade reflete não apenas a gravidade da condição, mas também a perda de oportunidade para intervenções potencialmente salvadoras, como o transplante hepático. São necessários mais estudos para aprimorar o manejo desses pacientes.
Descritores
Infecções Bacterianas; Tecido Mole; Cirrose; Imunodeficiência; Mortalidade
ABSTRACT
Introduction: Infections in cirrhotic patients have a significant impact on morbidity and mortality, but little is known about acute non-necrotizing dermohypodermal infections (erysipelas and infectious cellulitis) in this population. The high mortality in this group also represents a loss of opportunity for liver transplantation, which could be a potential solution for these patients.
Objectives: This study aims to describe the clinical characteristics, evolution, and outcomes of cirrhotic patients with acute non-necrotizing dermohypodermal infections under evaluation for liver transplant.
Methods: A retrospective study was conducted on patients hospitalized with cirrhosis and dermohypodermal infections from 2010 to 2012.
Results: Among 983 patients with liver cirrhosis, leading to 2,046 consultations for decompensated cirrhosis, dermohypodermal infections were identified in 65 (7%) cases. The mean age was 58 years (± 10), with 82% male. Cellulitis predominantly affected the lower limbs (70%), followed by the trunk (21%) and upper limbs (9%). Alcoholic liver disease was the primary etiology (56%), followed by alcohol and hepatitis C (17%), isolated hepatitis C (13%), non-alcoholic steatohepatitis (9%), and hepatitis B (3%). Based on the Child-Pugh score, 8% were classified as class A, 46% as class B, and 46% as class C. The average model for end-stage liver disease (MELD) score was 20 (± 8). Commonly associated infections included urinary tract infection (54%), pneumonia (25%), and spontaneous bacterial peritonitis (21%). Prescribed antibiotics were clindamycin (71%), cephalosporins (40%), oxacillin (18%), penicillin (11%), vancomycin (11%), quinolones (4.5%), and other antibiotics (15.3%). Sepsis occurred in 14% of cases, and the mortality rate was 18.5% (n=12). Among the deceased patients, 67% (n=8) had concomitant infections with cellulitis. Factors significantly associated with mortality were concomitant infections (69 vs. 31%, p = 0.02) and elevated C-reactive protein levels (6 vs. 3 mg/dL, p = 0.03).
Conclusion: This study highlights the high hospital mortality rate among cirrhotic patients with acute non-necrotizing dermohypodermal infections, especially when concomitant infections are present. The high mortality not only reflects the severity of the condition but also represents a loss of opportunity for potentially life-saving interventions, such as liver transplantation. Further research is needed to improve the management of cirrhotic patients with dermohypodermal infections.
Descriptors
Bacterial Infections; Soft Tissue; Cirrhosis; Immunodeficiency; Mortality
INTRODUÇÃO
A cirrose é o estágio final da fibrose hepática progressiva na doença hepática crônica. Esse estágio é caracterizado pela distorção da arquitetura hepática e pela formação de nódulos regenerativos que causam a desorganização lobular e vascular do fígado.1 Esse caminho final da doença hepática crônica não depende de seu agente etiológico, seja ele alcoólico, viral, autoimune, biliar, medicamentoso, obstrução do fluxo venoso ou criptogênico.1 De fato, o estágio avançado da doença é irreversível, tornando o transplante hepático seu tratamento definitivo.
Os pacientes cirróticos são vulneráveis a muitas complicações que reduzem significativamente sua expectativa de vida. Essas complicações incluem sangramento gastrointestinal superior, ascite, síndrome hepatorrenal, icterícia, carcinoma hepatocelular, encefalopatia e infecções associadas a altas taxas de mortalidade.2-6 As infecções mais frequentes relatadas na literatura médica são peritonite bacteriana espontânea (PBE) (25-31%), infecção urinária (20-25%) e pneumonia (PNM) (15-21%).4-7
As infecções de pele também arriscam se desenvolver; entretanto, há poucos relatos, especialmente sobre infecções dermo-hipodérmicas agudas não necrotizantes (DHBANN).4,8,9
A DHBANN em pacientes cirróticos, que inclui erisipela e celulite infecciosa, surge devido à entrada de bactérias por meio de aberturas na barreira protetora da pele. Essa doença é uma forma aguda de infecção que afeta a pele e os vasos linfáticos superficiais. Diversos estudos etiológicos demonstraram que, em ambas as condições, o estreptococo do grupo A (Streptococcus pyogenes) é o agente etiológico mais comum, enquanto o Staphylococcus aureus é responsável por aproximadamente 15% dos casos.10-17,18
A apresentação típica da dermo-hipodermatite é exemplificada pela erisipela, caracterizada por um início abrupto com febre e calafrios, seguido pelo desenvolvimento de uma placa eritematosa, edematosa, quente e dolorosa com bordas bem definidas, geralmente localizada nas extremidades inferiores (em aproximadamente 80% dos casos), embora também possa ocorrer na face, nas extremidades superiores e no tronco.
Por outro lado, a dermo-hipodermatite atípica se apresenta como celulite infecciosa, normalmente associada a um quadro clínico mais inespecífico, com ou sem febre. Nesse caso, a placa eritematosa é quente, com bordas menos definidas e dor variável.
A diferenciação clínica entre essas duas condições nem sempre é viável, e é preferível usar um termo que englobe ambas, a saber, “Dermo-hipodermatite aguda não necrotizante”.18 Embora complicações graves, como abscessos ou sepse, sejam incomuns, a recorrência da infecção é uma preocupação significativa.19
Este estudo retrospectivo avalia a celulite em pacientes cirróticos admitidos para avaliação de transplante de fígado em um hospital universitário terciário e descreve suas características clínicas, evolução e resultado.
MÉTODOS
Essa análise foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP), Brasil. A pesquisa foi realizada por meio de prontuários eletrônicos de pacientes com um episódio de celulite em sua admissão na Unidade de Transplante de Fígado e no Serviço de Gastro-hepatologia do Hospital de Base (FUNFARME/FAMERP), resultando em uma revisão retrospectiva dos prontuários.
Este estudo incluiu todos os pacientes cirróticos que apresentaram celulite na admissão hospitalar no período de 1º de julho de 2010 a 31 de dezembro de 2012. Os critérios de diagnóstico da DHBANN incluíram os seguintes achados clínicos: uma área da pele com vermelhidão (bem definida na erisipela e menos bem definida na celulite infecciosa); edema (inchaço) que pode se espalhar além da área vermelha; pele quente ao toque; dor ou sensibilidade; e, possivelmente, febre.
O critério de exclusão primário descartou pacientes com dados insuficientes no relatório médico, e o segundo critério de exclusão descartou aqueles cujo diagnóstico inicial de erisipela ou celulite não foi confirmado durante a hospitalização.
Os parâmetros avaliados incluíram a identificação do paciente, a etiologia da cirrose, a classificação de Child-Pugh, a pontuação do modelo para doença hepática terminal (MELD), comorbidades associadas, infecções associadas, níveis de proteína C-reativa (PCR), antibióticos prescritos e os resultados do paciente.
A análise estatística foi realizada usando o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS®). Cada categoria foi explorada por meio da avaliação descritiva dos dados, combinada com a interpretação de variáveis quantitativas usando suas medianas, desvios padrão e porcentagens. A análise comparativa foi realizada com o teste do qui-quadrado, o teste exato de Fisher, o teste t de Student e o teste de Mann-Whitney.
RESULTADOS
De 1º de julho de 2010 a 31 de dezembro de 2012, foram realizadas 2.864 consultas ambulatoriais na Unidade de Transplante de Fígado e no Serviço de Gastro-hepatologia. Desses, 2.046 foram motivados por cirrose descompensada, identificando o atendimento de 983 pacientes cirróticos diferentes durante esse período. Entre eles, 7% (65) dos pacientes apresentaram celulite e formaram o grupo estudado na pesquisa (Fig. 1).
A análise epidemiológica revelou uma idade média de 58 anos (± 10), com predominância de pacientes do sexo masculino (82%). A etiologia mais comum da cirrose foi a doença hepática alcoólica isolada, seguida por outras causas, conforme detalhado na Tabela 1. Sessenta e três pacientes tinham dados suficientes para a avaliação da disfunção hepática usando os escores de Child-Pugh e MELD, com distribuição nas classes A, B e C e um escore MELD médio de 20 (± 8). O nível mediano de PCR foi de 4 mg/dL (0,2-25). O local mais frequente de infecção foram os membros inferiores, seguidos do tronco e dos membros superiores (Tabela 1).
As comorbidades foram observadas em 29 (45%) pacientes e foram causadas por doenças metabólicas adquiridas em 28 pacientes. A síndrome metabólica (que inclui obesidade abdominal, resistência à insulina, pressão alta, dislipidemia e níveis elevados de açúcar no sangue em jejum) foi observada em 11 casos (17%). A celulite e outras infecções ocorreram simultaneamente nas seguintes proporções: infecção do trato urinário (ITU) em 15 casos (54%), PNM em sete (25%) e PBE em seis (21%) (Fig. 2). Os antibióticos mais prescritos foram clindamicina (71%), cefalosporinas (40%), oxacilina (18%), penicilina (11%), vancomicina (11%), quinolonas (4,5%) e outros em 15,3% (Fig. 3). Nove pacientes (14%) desenvolveram sepse. O resultado total de óbitos foi 12 (18,5%), representado por quatro mortes (33%) de pacientes que tiveram apenas celulite e oito (67%) naqueles que tiveram celulite e outras infecções concomitantes (Fig. 4). É importante observar que os pacientes cirróticos que morreram com erisipela não tiveram a oportunidade de fazer um transplante de fígado.
Entre os 12 pacientes que morreram, os escores MELD e Child-Pugh não puderam ser calculados para um paciente devido à insuficiência de dados laboratoriais. Dos pacientes restantes, quatro (33,3%) foram classificados como Child-Pugh B e sete (58,3%) foram classificados como Child-Pugh C. Os escores MELD variaram de um mínimo de 14 a um máximo de 37, com uma mediana de 20. As mortes foram notadamente agudas: seis pacientes (50%) morreram dentro de 7 dias do início dos sintomas, cinco pacientes (41,6%) morreram entre 8 e 21 dias após o início dos sintomas e apenas um paciente (8,3%) sobreviveu até o 38º dia antes de falecer.
Ao cruzar as taxas de mortalidade com a classificação de Child-Pugh, a Classe A não apresentou tais resultados; entretanto, as Classes B e C foram responsáveis por 40 e 60% das mortes, aproximadamente (Fig. 5). O escore MELD médio dos pacientes que receberam alta hospitalar foi de 19 (± 7) e, para aqueles que evoluíram para óbito, foi de 23 (± 9), não representando significância estatística (p > 0,05). O grupo com óbito como desfecho comparado ao grupo com alta hospitalar como desfecho tem seus parâmetros relativos à idade, sexo masculino, MELD, infecções associadas e PCR representados na Tabela 2.
DISCUSSÃO
A infecção bacteriana é uma complicação frequente em pacientes cirróticos, com uma incidência que varia de 25 a 57%, sendo responsável por aproximadamente 30 a 50% das mortes por cirrose hepática.4,6,7,20 A frequência de infecções cutâneas foi estimada em 2 a 11%, causadas principalmente por áreas de solução de continuidade na pele e no tecido subcutâneo, levando à penetração bacteriana associada à retenção de líquidos (edema).4,6,7
Este estudo demonstrou uma prevalência de 65 (7%) pacientes com DHBANN associada ou não a outras infecções entre 983 pacientes cirróticos internados em um hospital universitário terciário. A frequência de outras infecções em pacientes cirróticos não foi analisada.
Encontramos 37 (57%) pacientes que apresentavam apenas DHBANN e 28 (43%) que apresentavam erisipela ou celulite com outra infecção associada nesses 65 pacientes. Verificou-se que 15 (23%) pacientes apresentavam DHBANN associada a ITU, sete (11%) associada a PNM e seis (9%) associada a PBE.
Em geral, as causas dessa maior vulnerabilidade a infecções bacterianas em pacientes cirróticos são multifatoriais e concomitantes. O shunt portuário sistêmico existente leva a uma menor depuração hepática de endotoxinas e bactérias provenientes da circulação portal. Além disso, a cirrose está associada a uma diminuição da atividade do sistema de retículo endotelial e a uma diminuição da atividade bactericida das células fagocíticas. Há também comprometimento do processo de opsonização e redução dos fatores do sistema de complemento e dos níveis de proteína C.6,7 De acordo com Bunchorntavakul et al.,7 alguns fatores estão mais especificamente relacionados à DHBANN, como translocação bacteriana, pele frágil, fina e emaciada, falta de higiene, desnutrição, internações hospitalares frequentes, hipoalbuminemia, alto escore MELD e encefalopatia hepática.
Vários estudos afirmam que a prevalência de infecções aumenta ainda mais com o agravamento da disfunção hepática, causada principalmente pela disfunção do sistema imunológico. Comparando com a classificação de Child-Pugh, este estudo resultou em 92% dos pacientes cirróticos classificados nas classes B e C, responsáveis por 100% dos óbitos no grupo, não ocorrendo nenhum óbito na classe A. De fato, este estudo está conforme os índices da literatura.3,4,6
A taxa de mortalidade encontrada foi de 12 (18,5%). Quatro pacientes (33%) apresentavam apenas DHBANN, enquanto oito óbitos (67%) apresentavam erisipela/celulite e outra infecção concomitante. Assim, cruzar a taxa de DHBANN concomitante com outras infecções e o desfecho do paciente levou a um resultado significativo: 69% evoluíram para óbito, enquanto 31% receberam alta hospitalar (p = 0,02). De fato, Pleguezuelo et al.21 relataram que a mortalidade associada a infecções é vinte vezes maior em pacientes cirróticos em comparação com a população em geral. Outros estudos afirmam que as infecções são responsáveis por 25% das mortes na população cirrótica.4,6
Strauss22 observou que a taxa de fatalidade entre pacientes cirróticos com infecções é significativamente maior do que a registrada em pacientes com descompensação hepática grave que não têm infecções. Atualmente, as infecções bacterianas são reconhecidas como a principal causa de morte em pacientes com cirrose descompensada. Nesse contexto, infecções como erisipela e celulite, embora muitas vezes tratáveis com sucesso, têm apresentado taxas de mortalidade particularmente altas. Um recente estudo retrospectivo de caso-controle corroborou essa preocupação ao revelar que os pacientes com essas infecções tiveram uma taxa de mortalidade de 3 meses muito maior em comparação com aqueles sem infecções (23 vs. 4%). Além disso, a análise da coorte deste estudo, composta por pacientes que morreram de erisipela ou celulite, revelou um padrão de mortalidade aguda, consistente com os achados de Strauss. Entre os 12 casos de morte analisados, seis pacientes (50%) morreram em uma semana após o início dos sintomas, enquanto outros cinco pacientes (41,6%) sucumbiram entre 8 e 21 dias após a manifestação inicial dos sintomas. Notavelmente, apenas um paciente (8,3%) sobreviveu até o 38º dia após o início dos sintomas antes de falecer.
Em casos de DHBANN, qualquer exame revelaria evidências de uma infecção bacteriana, caracterizada por um aumento de neutrófilos e níveis elevados de PCR.19 Com relação a isso, apenas a comparação entre os níveis de PCR e os resultados dos pacientes revelou uma associação significativa com relação à avaliação dos dados laboratoriais. O grupo com óbito como desfecho teve um nível mediano de PCR de 6 mg/dL, enquanto no grupo com desfecho de alta hospitalar foi de 3 mg/dL (p = 0,03). Esses dados mostram que os pacientes cirróticos com celulite e PCR superior a 6 mg/dL devem ser tratados com um esquema antibiótico da forma mais agressiva possível.
Estudos demonstram que a DHBANN é causada principalmente por estreptococos. Outras bactérias, como S. aureus, Pseudomonas aeruginosa e enterobactérias, podem estar presentes, mas seu papel no desenvolvimento da erisipela/celulite não está claro.19 Conforme sugerido na literatura, o tratamento da erisipela/celulite deve ser feito com antibióticos com boa cobertura contra estreptococos e estafilococos, como cefalosporinas de primeira geração, amoxicilina com clavulanato ou clindamicina. Se o paciente fez uso recente de antibióticos, o tratamento recomendado é com cefalosporinas de terceira geração associadas à vancomicina. Os antibióticos mais utilizados relatados neste estudo estão alinhados com as recomendações da literatura médica e a prescrição teve as seguintes frequências: clindamicina (71%); cefalosporinas de terceira e quarta geração (ceftriaxona 34% e cefepima 6%); oxacilina (18%); penicilina (11%); vancomicina (11%); quinolonas (4,5%) e outros em 15,3%.4,6,7,17,20
Há estudos que confirmam que não foi possível chegar a uma conclusão definitiva sobre o tratamento antibiótico mais eficaz para infecções dermo-hipodérmicas agudas com base nos dados apresentados. Não houve superioridade de um antibiótico sobre outro, incluindo cefalosporina em relação à penicilina. O glicopeptídeo, a oxazolidinona e a daptomicina também não demonstraram superioridade. A terapia combinada não apresentou melhores resultados no estudo. Dados limitados e estudos anteriores apoiam o uso da terapia oral para erisipela/celulite, pois ela parece ser mais eficaz do que o tratamento intravenoso (IV). Não foi possível determinar a duração ideal da antibioticoterapia, pois apenas um estudo examinou especificamente a duração e não há evidências que apoiem a antibioticoterapia por mais de 5 dias. Os estudos que investigaram um antibiótico direcionado ao S. aureus resistente à meticilina (MRSA) na celulite não mostraram nenhuma vantagem, apoiando ainda mais a noção de que a celulite é causada principalmente por infecção estreptocócica.23
Dos 65 pacientes estudados, dois casos não tinham registro de uso de antibiótico no relatório eletrônico; nesse grupo, um paciente evoluiu para óbito logo após a admissão hospitalar. No total, 47 pacientes foram tratados com um antibiótico isolado, 11 foram tratados com uma associação de dois antibióticos e cinco pacientes foram tratados com uma associação de três antibióticos. Nove (19%) mortes relatadas ocorreram entre aqueles que usaram uma monoterapia com antibiótico. Desses, seis pacientes tinham erisipela/celulite e outra infecção. No entanto, o desenho de nosso estudo não pode atribuir a falha terapêutica à monoterapia com antibiótico ou culpar a associação entre infecções por esse resultado.
CONCLUSÃO
Em conclusão, a mortalidade hospitalar de pacientes cirróticos com DHBANN que foram avaliados para transplante de fígado foi alta, e a presença de outra infecção concomitante aumentou o risco de morte. Por fim, a abordagem de pacientes cirróticos com erisipela ou celulite requer investigação adicional, já que a alta taxa de mortalidade nesses casos pode impedir que indivíduos elegíveis para transplante de fígado recebam o órgão.
AGRADECIMENTOS
Não aplicável.
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FINANCIAMENTO
Não aplicável.
DISPONIBILIDADE DE DADOS DE PESQUISA
Todos os dados foram gerados ou analisados neste estudo.
REFERÊNCIAS
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Editado por
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Editora de Seção
Ilka de Fátima Santana F. Boin https://orcid.org/0000-0002-1165-2149
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
17 Mar 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
25 Nov 2024 -
Aceito
05 Dez 2024