Open-access Produtividade e características tecnológicas de cultivares de feijão em resposta à calagem superficial em plantio direto

Effects of liming on common bean yield and technological characteristics under no-tillage system

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da aplicação superficial de calcário em plantio direto, na produtividade e nas características tecnológicas dos grãos de cultivares de feijão. O trabalho foi desenvolvido durante dois anos agrícolas, em Latossolo Vermelho distrófico, em condições de sequeiro. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos casualizados em esquema de parcelas subdivididas, com quatro repetições. As parcelas foram representadas por cultivares de feijão (Carioca, IAC Carioca Eté, Pérola, IAPAR 81 e Campeão 2) e as subparcelas formadas pelas doses de calcário dolomítico (sem aplicação de calcário; 1,8; 3,6 e 5,4 t ha-1). As cultivares de feijão tiveram desenvolvimento produtivo distinto em função das doses de calcário aplicadas superficialmente no sistema plantio direto. A cultivar Campeão 2 foi mais produtiva nos dois anos de experimentação e a cultivar IAPAR 81 respondeu linearmente ao aumento das doses de calcário no segundo ano agrícola. Houve efeito da interação dos fatores cultivares x doses de calcário para o tempo de cozimento, nos dois anos de experimentação, com aumento dessa característica na cultivar IAPAR 81, em função do incremento das doses de calcário. Comportamento semelhante foi obtido pela cultivar Pérola, porém apenas no segundo ano agrícola. O teor de proteína bruta variou de 210 a 230 g kg-1 e a relação de hidratação ficou próxima de 2,0 não sendo influenciados pelas doses de calcário e pelas cultivares de feijão.

Phaseolus vulgaris; acidez do solo; produtividade; proteína bruta; tempo de cozimento; hidratação dos grãos


The objective of this study was to evaluate the effect of liming on yield and technological characteristics common bean cultivars under no-tillage system. The study was carried out during two crop seasons, on a dystrophic Red Latosol, under rainfed conditions. Responses were assessed using a split-plot design with four replications. The main plots were represented by the common bean cultivars (Carioca, IAC Carioca Eté, Pérola, IAPAR 81 and Campeão 2) and the split plots were represented by the rates of dolomitic limestone (0; 1.8; 3.6 and 5.4 t ha-1). The cultivars differed in yield performance according to lime rates under no-tillage system. Campeão 2 had the best performance over the two years and IAPAR 81 responded linearly to the increasing lime rate on the second crop season. The interaction common bean cultivar x lime rates had an effect on the cooking time of the beans. IAPAR 81 presented an increase in cooking time as the rate of lime was increased along the two crop seasons. Pérola had the same effect, but only on the second crop season. Crude protein ranged between 210 and 230 g kg-1 and hydration ratio was close to 2. Neither protein nor hydration ratio were influenced by lime rates or cultivars.

Phaseolus vulgaris; soil acidity; yield; crude protein; cooking time; grain hydration


SOLOS E NUTRIÇÃO DE PLANTAS

ARTIGO

Produtividade e características tecnológicas de cultivares de feijão em resposta à calagem superficial em plantio direto

Effects of liming on common bean yield and technological characteristics under no-tillage system

Tiago Roque Benetoli da SilvaI; Leandro Borges LemosII,*; Carlos Alexandre Costa CrusciolIII

IUniversidade Estadual de Maringá, Campus Regional de Umuarama, Estrada da Paca s/n (UEM - Fazenda), São Cristóvão, Caixa Postal 65, 87501-970 Umuarama (PR), Brasil. E-mail: trbsilva@uem.br

IIUniversidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Departamento de Produção Vegetal, 14884-900 Jaboticabal (SP). Bolsista do CNPq. E-mail: leandrobl@fcav.unesp.br

IIIUniversidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Agronômicas, Departamento de Produção Vegetal, Caixa Postal 237, 18603-970 Botucatu (SP). Bolsista do CNPq. E-mail: crusciol@fca.unesp.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da aplicação superficial de calcário em plantio direto, na produtividade e nas características tecnológicas dos grãos de cultivares de feijão. O trabalho foi desenvolvido durante dois anos agrícolas, em Latossolo Vermelho distrófico, em condições de sequeiro. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos casualizados em esquema de parcelas subdivididas, com quatro repetições. As parcelas foram representadas por cultivares de feijão (Carioca, IAC Carioca Eté, Pérola, IAPAR 81 e Campeão 2) e as subparcelas formadas pelas doses de calcário dolomítico (sem aplicação de calcário; 1,8; 3,6 e 5,4 t ha-1). As cultivares de feijão tiveram desenvolvimento produtivo distinto em função das doses de calcário aplicadas superficialmente no sistema plantio direto. A cultivar Campeão 2 foi mais produtiva nos dois anos de experimentação e a cultivar IAPAR 81 respondeu linearmente ao aumento das doses de calcário no segundo ano agrícola. Houve efeito da interação dos fatores cultivares x doses de calcário para o tempo de cozimento, nos dois anos de experimentação, com aumento dessa característica na cultivar IAPAR 81, em função do incremento das doses de calcário. Comportamento semelhante foi obtido pela cultivar Pérola, porém apenas no segundo ano agrícola. O teor de proteína bruta variou de 210 a 230 g kg-1 e a relação de hidratação ficou próxima de 2,0 não sendo influenciados pelas doses de calcário e pelas cultivares de feijão.

Palavras-chave:Phaseolus vulgaris, acidez do solo, produtividade, proteína bruta, tempo de cozimento, hidratação dos grãos.

ABSTRACT

The objective of this study was to evaluate the effect of liming on yield and technological characteristics common bean cultivars under no-tillage system. The study was carried out during two crop seasons, on a dystrophic Red Latosol, under rainfed conditions. Responses were assessed using a split-plot design with four replications. The main plots were represented by the common bean cultivars (Carioca, IAC Carioca Eté, Pérola, IAPAR 81 and Campeão 2) and the split plots were represented by the rates of dolomitic limestone (0; 1.8; 3.6 and 5.4 t ha-1). The cultivars differed in yield performance according to lime rates under no-tillage system. Campeão 2 had the best performance over the two years and IAPAR 81 responded linearly to the increasing lime rate on the second crop season. The interaction common bean cultivar x lime rates had an effect on the cooking time of the beans. IAPAR 81 presented an increase in cooking time as the rate of lime was increased along the two crop seasons. Pérola had the same effect, but only on the second crop season. Crude protein ranged between 210 and 230 g kg-1 and hydration ratio was close to 2. Neither protein nor hydration ratio were influenced by lime rates or cultivars.

Key words:Phaseolus vulgaris, soil acidity, yield, crude protein, cooking time, grain hydration.

1. INTRODUÇÃO

No Brasil, o feijoeiro comum (Phaseolus vulgaris L.) possui baixa produtividade média de grãos, em torno de 850 kg ha-1, porém, em lavouras sob alta tecnologia e irrigadas, pode-se alcançar rendimentos superiores a 3.000 kg ha-1, principalmente em sistemas de produção conservacionistas e sustentável como o plantio direto (SPD) e com cultivares adaptadas aos diversos agroecossistemas.

Dentre as causas para a baixa produtividade destaca-se a exploração da cultura em áreas de sequeiro e marginal em termos de fertilidade natural do solo, associada ao pouco investimento em insumos agrícolas, como o uso de corretivos e fertilizantes (Barbosa Filho et al., 2005).

Devido à grande sensibilidade do feijoeiro à toxidez por alumínio e manganês, o uso de calcário está entre as práticas mais econômicas e fundamentais para a obtenção de altas produtividades, fornecendo Ca e Mg como nutrientes, aumentando o pH do solo, bem como a disponibilidade de macronutrientes em função da neutralização da acidez, além de promover maior crescimento no sistema radicular pela melhoria das condições químicas do solo (Rosolem, 1996; Barbosa Filho et al., 2005).

Silva et al. (2004) avaliaram o sistema radicular de cultivares de feijão em resposta à calagem e verificaram que a cultivar Pérola foi mais tolerante à baixa saturação por bases do que as cultivares Campeão 1, Carioca e FT-Bonito; o máximo crescimento radicular das cultivares Campeão 1, Carioca e Pérola ocorreu com saturação por bases ao redor de 43%. Observaram também que, em condições de elevada acidez, o diâmetro radicular das cultivares foi reduzido e houve incremento em comprimento, além de a calagem ter promovido aumento do sistema radicular e da parte aérea das cultivares.

Segundo Thung e Oliveira (1998), na cultura do feijoeiro, o conceito de utilização de plantas mais tolerantes à toxicidade de alumínio ou responsivos a melhoria do ambiente solo em termos de seus atributos químicos, bem como os mecanismos que conferem essa característica à cultivar não está bem caracterizado ou elucidado.

Trabalho desenvolvido por Silva et al. (2007), objetivando avaliar a eficiência de utilização de nutrientes em cultivares de feijão (Campeão 1, Carioca, FT-Bonito e Pérola,) em razão da calagem, verificaram que em solo ácido e na ausência de calcário, a cultivar Carioca destacou-se na eficiência de utilização de P e Ca, sendo a Campeão 1 mais eficiente na utilização de N e K. Também verificaram que com o aumento dos níveis de calcário, a cultivar Pérola foi mais eficiente na utilização de N, seguido por FT-Bonito e Carioca. A cultivar FT-Bonito destacou-se quanto à utilização eficiente de P e todas as cultivares de feijão foram eficientes na utilização de Zn, com o aumento dos níveis de calcário.

A crescente adoção do SPD vem promovendo a elevação da produtividade de grãos de feijão, pois ao longo dos anos, o feijoeiro tornou-se uma das principais culturas de entressafra principalmente na Região Central e Sudeste do Brasil (Fageria e Stone, 2004).

No SPD existe grande interesse na busca de formas alternativas para o estabelecimento do sistema sem incorporação prévia do calcário, realizando-se a calagem superficial desde o início de sua implantação, tendo como vantagens a manutenção dos atributos químicos e da estrutura do solo, maior controle da erosão e economia de energia com a eliminação das operações de incorporação de calcário e preparo do solo, bem como o aumento da capacidade de exploração de água e de nutrientes do subsolo pelo sistema radicular das plantas (Mello et al., 2003; Barbosa Filho et al., 2005).

A aplicação de corretivos de acidez de solo tem apresentado resultados positivos ao longo dos anos nos atributos químicos do solo, desenvolvimento do sistema radicular, da parte aérea, bem como na produtividade do feijoeiro (Barbosa Filho et al., 2005; Silva et al., 2007).

No Brasil e na cultura do feijoeiro, pouco se sabe sobre a influência da calagem no comportamento das cultivares e de possíveis modificações nas características nutricionais e tecnológicas, como o teor de proteína bruta, tempo de cocção e capacidade de hidratação dos grãos. O único trabalho que trata o assunto foi desenvolvido por Moraes et al. (1998) no qual avaliaram o efeito de doses de calcário (0; 1,4 e 2,8 t ha-1) e gesso (0; 130; 260 e 390 kg ha-1) na produtividade de grãos, no tempo de cozimento e na relação de hidratação do feijão, cultivar Carioca 80. Esses autores verificaram que as doses de calcário e gesso não afetaram a produtividade e a relação de hidratação dos grãos. No entanto, o tempo de cozimento aumentou com o acréscimo das doses de calcário e gesso.

O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência da aplicação superficial de calcário no sistema plantio direto e o comportamento de cultivares de feijão quanto à produtividade e características tecnológicas dos grãos.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Foi desenvolvido um experimento no município de Botucatu (SP), a 22º51' Sul, 48º26' Oeste, com altitude de 740 m. De acordo com os critérios da classificação de Köppen, o clima da região é Cfa, temperado (mesotérmico), constantemente úmido, tendo quatro ou mais meses com temperaturas médias superiores a 10 ºC, sendo a temperatura do mês mais quente igual ou superior a 22 ºC.

O solo do local foi classificado de acordo com Embrapa (2006), como Latossolo Vermelho Distrófico, textura franco-argilosa, com saturação por bases de 41% e capacidade de troca catiônica (CTC) de 98 mmolc dm-3. O solo ficou dois anos em pousio e, em fevereiro de 2001 foi preparado com uma aração e duas gradagens. Posteriormente, realizou-se a semeadura de soja (safrinha). Em agosto de 2001, a área experimental foi subsolada, e em 3 de novembro de 2001, semeou-se guandu, manejado com triton e herbicida, permanecendo em pousio até setembro de 2002, quando se realizou o controle químico de plantas daninhas. Em outubro de 2002, realizou-se aplicação de calcário superficialmente e em novembro, a semeadura de milheto, iniciando-se o experimento.

Ao longo de 2003 e 2004, utilizou-se a seguinte sucessão de culturas: milheto (primavera) - feijão (verão) - aveia preta (outono-inverno), em condições de sequeiro, e no SPD.

O delineamento experimental utilizado foi o de blocos casualizados disposto em um esquema de parcelas subdivididas. As parcelas foram constituídas por cinco cultivares de feijão (Carioca, IAC Carioca Eté, Pérola, IAPAR 81 e Campeão 2) e as subparcelas formadas por quatro doses de calcário dolomítico (0; 1,8; 3,6 e 5,4 t ha-1 , ou seja, sem aplicação de calcário, quantidade de calcário para elevar a saturação por bases a 54%, 68% e 80% respectivamente), totalizando 20 tratamentos, com quatro repetições. As subparcelas foram constituídas por 10 linhas de seis metros de comprimento, considerando como área útil as oito linhas centrais, desprezando-se 0,5 m em cada extremidade, nos dois anos de experimentação.

O calcário, aplicado manualmente em 15/10/2002, tinha 72% de poder relativo de neutralização total (PRNT), 84,3% de poder de neutralização (PN), 84,5% de reatividade (RE), 23,3% de CaO e 17,5% de MgO. Em seguida, realizou-se a semeadura do milheto (cv. BN-2), no espaçamento de 0,22 metros, com 35 kg de sementes ha-1, utilizando-se 100 kg ha-1 do fertilizante formulado 4-20-10.

A semeadura das cultivares de feijão foi realizada em 19/12/2002 e 17/12/2003, e seu desenvolvimento ocorrido durante o período de verão, em condições de sequeiro. As sementes foram tratadas com thiamethoxam (140 g de i.a./100 kg de sementes) e com anilida+ditiocarbamato (40+40 g do i.a./100 kg de sementes). A semeadura foi realizada com auxílio de semeadora, regulada para 15 sementes por metro de sulco, em espaçamento entrelinhas de 0,45 m, obtendo-se uma densidade de 240.000 plantas ha-1. A emergência das plântulas ocorreu em 25/12/2002 e 23/12/2003 respectivamente.

A adubação mineral de base utilizada foi 300 kg ha-1 da fórmula 4-20-10 no primeiro ano e 280 kg ha-1 da fórmula 4-14-8 no segundo ano agrícola. A adubação de cobertura, nos dois anos agrícolas, foi realizada no início do estádio fenológico V4, caracterizado pela presença da terceira folha trifoliolada, completamente aberta em 50% das plantas, na dose de 70 kg ha-1 de N, utilizando como fonte a uréia (Ambrosano et al., 1997).

Com relação aos tratos fitossanitários, aplicaram-se inseticida (deltramethrina) e fungicidas (azoxystrobin e tebuconazole), nas doses de 0,15 L ha-1, 25 g ha-1 e 0,1 L ha-1 de i.a. respectivamente. Para o controle de plantas daninhas, utilizou-se herbicida em pós-emergência (bentazon e fenoxaprop-p-ethyl) nas doses de 200 e 250 mL de i.a. ha-1 respectivamente. O florescimento pleno (R6) e a colheita ocorreram, nos dois anos agrícolas, aos 36 e 83 dias após a emergência das plântulas respectivamente.

A produtividade de grãos foi estimada em kg ha-1, após a colheita de todas as plantas contidas na área útil de cada subparcela, padronizando o teor de água nos grãos para 13%.

O teor de proteína bruta (PB%) foi determinado pela fórmula: PB = Ntotal 6,25, em que Ntotal é o teor de N nos grãos, obtido pelo método de Kjedahl, seguindo a metodologia de Sarruge e Haag (1974).

O tempo de cozimento (minutos) dos grãos foi determinado com o auxílio do cozedor de Mattson, com água mantida em nível constante e temperatura de 96 ºC (Lemos et al., 2004 e Silva et al., 2006). De posse dos dados, adotou-se a escala de Proctor e Watts (1987) para verificar o nível de resistência ao cozimento.

A capacidade de hidratação foi determinada em amostras de 50 gramas colocadas em água destilada durante 12 horas, segundo metodologia descrita por Lemos et al. (2004) e Silva et al. (2006). Nas primeiras 4 horas, o volume de água absorvida foi determinado a cada 30 minutos e nas 8 horas restantes, a cada hora. No fim do tempo para a hidratação, a água foi totalmente drenada e os grãos pesados. Os grãos não hidratados, denominados de "casca dura" (hardshell) foram separados e pesados, com o valor expresso em porcentagem. A relação de hidratação foi determinada como a razão entre a massa após o término da avaliação e a massa inicial dos grãos. Realizou-se a análise de regressão polinomial entre o tempo (horas) e a capacidade de hidratação pelo volume de água absorvido (mL) para se determinar o tempo necessário para a máxima hidratação dos grãos, segundo metodologia de Lemos et al. (2004) e Silva et al. (2006). Durante a condução do teste, a temperatura média da água foi de 24 ºC.

Os atributos químicos do solo como acidez ativa (pH), teor de cálcio (Ca), magnésio (Mg), saturação por bases (V), acidez potencial (H+Al) e teor de alumínio (Al), foram determinados seguindo a metodologia de Raij e Quaggio (1983), nas profundidades de 0-5, 5-10, 10-20 e 20-40 cm, sendo as amostras de solo retiradas com o auxílio de trado, em seis pontos por parcela, antes e após seis e 18 meses da aplicação de calcário superficialmente.

Os dados foram submetidos à análise de variância, utilizando-se o teste F e a análise de regressão para avaliar as doses de calcário. Os dados provenientes das cultivares foram comparados pelo teste de Tukey. Realizou-se também, o estudo de regressão polinomial para os atributos químicos do solo, após seis e 18 meses da aplicação de calcário superficialmente.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com relação à produtividade de grãos, verificou-se que, no primeiro ano agrícola, somente houve diferença significativa entre cultivares, destacando-se a cultivar Campeão 2 com 1.630 kg ha-1 (Tabela 1). A cultivar IAC Carioca Eté proporcionou menor produtividade de grãos (960 kg ha-1), ou seja, com apenas 59% do que produziu a cultivar Campeão 2.

De forma geral, após seis meses da aplicação de calcário, houve melhoria nos atributos químicos do solo com o aumento do pH, teores de cálcio e magnésio e saturação por bases, bem como a redução da acidez potencial e do teor de alumínio, porém apenas em valores médios, o que não foi constatado pelo estudo de regressão polinomial (Tabela 2). Essa situação não foi suficiente para ocasionar efeito positivo na produtividade das cultivares (Tabela 1). A capacidade produtiva das cultivares pode ter sido influenciada pelas condições climáticas, pois de 1.º a 12/2/2003 não houve precipitação pluvial e as temperaturas ultrapassaram 32 ºC, coincidindo com o período de florescimento pleno (R6), como pode ser observado nas figuras 1 e 2. De acordo com Didonet (2002), existe variabilidade genotípica quanto ao efeito do estresse hídrico e altas temperaturas no florescimento e enchimento de vagens do feijoeiro, fazendo com que as cultivares se desenvolvam de maneira diferenciada. O estresse hídrico aliado à temperatura elevada nesse estádio fenológico da cultura pode proporcionar redução no número de vagens por planta, por causa do abortamento floral, acarretando diminuição na produtividade.



A produtividade de grãos no segundo ano foi maior que a do primeiro ano, para todos os tratamentos (Tabela 1). A cultivar Campeão 2 destacou-se mais uma vez quanto à produtividade, obtendo-se 2.709 kg ha-1. A cultivar IAC Carioca Eté, apesar da melhoria no desempenho produtivo, comparativamente ao primeiro ano, também obteve o menor rendimento, porém sem diferir estatisticamente da cultivar Carioca, Pérola e IAPAR 81. A melhoria na produtividade, no segundo ano agrícola deve-se as condições climáticas, com temperatura e precipitação pluvial adequadas, tanto na fase vegetativa quanto na reprodutiva, principalmente nos estádios fenológicos de florescimento pleno (R6) até o enchimento das vagens (R8) (Figuras 1 e 2). Além disso, a aplicação de doses crescentes de calcário resultou em aumento linear na produtividade da cultivar IAPAR 81 (Tabela 3), evidenciando os efeitos benéficos que a prática da calagem exerce no feijoeiro (Barbosa Filho et al., 2005; Silva et al., 2004). Esse fato pode ser comprovado em função da melhoria dos atributos químicos do solo, por meio da elevação nos teores de pH, Ca e V na profundidade de 0-5 e 5-10 cm, acréscimos nos teores de Mg na profundidade de 0-5, 5-10, 10-20 e 20-40 cm, além da redução nos teores de H+Al, na profundidade de 0-5 cm, após 18 meses da aplicação superficial das doses de calcário (Tabela 2). Resultados semelhantes foram obtidos por Mello et al. (2003), em Latossolo Vermelho distrófico, onde a aplicação de calcário superficial no SPD, alterou positivamente os atributos químicos do solo, na profundidade de 0-5 e 5-10 cm, 12 meses após a calagem.

Destaca-se também, o ganho em produtividade de um ano para o outro, quando não foi utilizado calcário obtendo-se 1.390 kg ha-1 em 2003 e, valores variando de 2.015 a 2.491 kg ha-1 em 2004 (Tabelas 1 e 3 respectivamente). Esses valores podem estar relacionados ao fato de no segundo ano agrícola da sucessão de culturas (aveia-preta/milheto/feijão) ter aumentado a disponibilidade de nutrientes, com melhoria nas condições do solo, aliado ao clima favorável e às práticas culturais adequadas.

Ainda no segundo ano agrícola verificaram-se diferenças na interação cultivares x doses de calcário (Tabela 3), em que somente a produtividade da cultivar IAPAR 81 se ajustou em uma regressão linear, ou seja, não atingiu o máximo rendimento de grãos com a aplicação das doses de calcário. Assim, sugere-se que essa cultivar pode ser recomendada para cultivos em solos altamente corrigidos quanto à acidez, decorrente da responsividade do material, em relação às práticas culturais utilizadas.

Quanto ao teor de proteína bruta, verificou-se que não houve influência dos tratamentos, com variação de 210 a 230 g kg-1 (Tabela 1). No entanto, Vale e Nakagawa (1996) observaram que a aplicação de calcário quando incorporado ao solo, proporcionou aumento no teor de proteína bruta nas cultivares Carioca e Emgopa 201 - Ouro. Deve-se destacar que não foram constatados outros trabalhos que correlacionassem o teor de proteína bruta com a aplicação superficial de calcário, o que mostra a necessidade da realização de outras pesquisas, visto que essa característica é influenciada por outros fatores, como o local de cultivo, de condições ambientais, da cultivar e do manejo da adubação nitrogenada (Silva et al., 2006).

Quanto ao tempo de cozimento, observou-se efeito significativo de cultivares e da interação cultivares x doses de calcário, nos dois anos de experimentação (Tabela 1). Esses resultados corroboram com os de Lemos et al. (2004), quando verificaram que o tempo de cozimento do feijão foi influenciado pela interação genótipos x ambiente.

Os dados do tempo de cozimento da cultivar IAPAR 81 no primeiro ano se ajustaram à regressão linear, o mesmo ocorrendo no segundo ano, juntamente com a cultivar Pérola (Tabela 4), ou seja, à medida que aumentou as doses de calcário aplicado superficialmente, maior foi o tempo de cocção. Resultados semelhantes foram obtidos por Moraes et al. (1998). Esses autores verificaram que com o aumento das doses de calcário e de gesso, o tempo de cozimento da cultivar Carioca 80 elevou-se de forma quadrática e linear respectivamente.

O tempo de cozimento da cultivar IAPAR 81variou de 28 a 35 minutos e de 32 a 43 minutos nos dois anos de experimentação (Tabela 4). Comparando-se os resultados do tempo para cozimento com os níveis de resistência à cocção sugeridos por Proctor e Watts (1987), esses valores enquadram-se como resistência normal e resistente a cocção no primeiro ano e resistência média a muito resistente à cocção no segundo ano. A cultivar Pérola obteve tempo de cozimento variando de 38 a 43 minutos no segundo ano (Tabela 4), e de acordo com Proctor e Watts (1987), esses valores expressam muita resistência à cocção.

Segundo Sartori (1996), o amolecimento das sementes de leguminosas durante o cozimento envolve a dissolução ou a desintegração da lamela média, com consequente separação das células e a reação dos fitatos, de sódio ou de potássio, do citoplasma intercelular com pectatos de cálcio ou de magnésio presentes nas paredes celulares e na lamela média. Esta reação resulta na conversão dos pectatos insolúveis de cálcio ou de magnésio em pectatos solúveis de sódio ou de potássio. Portanto, a aplicação das doses de calcário pode ter promovido aumento no teor de Ca nos grãos, interferindo na rigidez da membrana e nas paredes celulares.

De forma geral, no tegumento dos grãos são observadas as maiores quantidades de pectatos de cálcio, que intervém na divisão e alongamento celular, pois quanto mais espesso for o tegumento, maior a dificuldade na absorção de água (Marschner, 1995). Na cultura do feijoeiro não foram verificados trabalhos com esse nível de detalhamento, porém em razão dos resultados, verifica-se a necessidade de maior investigação científica, nessa linha de pesquisa, visto que períodos longos de cocção podem causar mudanças estruturais nas células, promovendo a perda de nutrientes e maior gasto no preparo de alimento e energia.

Com relação aos grãos de casca dura, houve diferença estatística entre as cultivares (Tabela 5). No primeiro ano, os valores variaram de 4,34% a 0,75%, obtidas pelas cultivares Pérola e Carioca respectivamente. No segundo ano, os valores variaram de 1,85% a 0,18%, obtidas pelas cultivares IAC Carioca Eté e Campeão 2 respectivamente. O percentual de grãos de casca dura foi expresso com menor intensidade pela cultivar Carioca no primeiro ano e, pela cultivar Campeão 2 no segundo ano. No entanto, tais valores são considerados baixos ou de reduzida intensidade, revelando que esta característica é influenciada pela interação genótipos x ambiente (Lemos et al., 2004).

De forma geral, para a relação de hidratação, observou-se que após 12 horas de embebição, os grãos absorveram massa em água aproximadamente igual à sua massa inicial, ou seja, valores muito próximos de 2,0 (Tabela 5), concordando com os resultados obtidos por Moraes et al. (1998). Esses autores verificaram que a relação de hidratação também ficou próxima de 2,0, não havendo interferência das doses de calcário e gesso testadas. Segundo Lam-Sanches et al. (1990), a variabilidade em feijão quanto à presença de grãos impermeáveis é devido ao processo de defesa da própria planta diante de alguma situação desfavorável ao seu desenvolvimento, citando que, em condições de excesso de precipitação pluvial por ocasião da semeadura, as sementes normais apodrecem, enquanto as impermeáveis suportam esse período e posteriormente germinam. Esses autores também relataram que esse tipo de comportamento da planta pode ser responsável pelas diferenças que ocorrem com a qualidade dos grãos de ano para ano e entre distintos cultivos durante o mesmo ano.

As equações de regressão entre o tempo de hidratação e a quantidade de água absorvida pelos grãos de feijão, em 2003, evidenciaram que o período de máxima hidratação variou de 10h14min a 15h27min, tendo diferença de 5h13min (Tabela 6). Esses resultados foram obtidos pelas cultivares IAPAR 81 e Pérola, na dose de 3,6 t ha-1 de calcário.

Verificou-se, em 2004, que o tempo de máxima hidratação variou de 10h52min a 13h37min, obtidos pelas cultivares Carioca e Pérola, nas doses de 3,6 e 5,4 t ha-1 de calcário, respectivamente (Tabela 7). No segundo ano a diferença foi de 2h45min, tendo redução de aproximadamente 50% na variação do tempo para atingir a máxima hidratação dos grãos de um ano para o outro. Portanto, pode-se inferir que a capacidade de hidratação dos grãos de feijão é uma característica influenciada pela interação genótipos x ambiente.

O tempo médio para a máxima hidratação das cultivares de feijão, não ultrapassou a 12 horas, com exceção da cultivar Pérola que obteve 14h07min e 13h13min, em 2003 e 2004 respectivamente (Tabela 7). Assim, pode-se inferir que, na média, com a cultivar Pérola não houve desempenho satisfatório quanto ao tempo para a máxima hidratação dos grãos, visto que, geralmente, os grãos de feijão são deixados em embebição, da noite anterior ao preparo até a manhã do dia seguinte, por período de aproximadamente 12 horas, conforme informações contidas em Lemos et al. (2004) e Silva et al. (2006).

4. CONCLUSÕES

1. As cultivares de feijão têm desempenho produtivo distinto em função das doses de calcário aplicadas superficialmente, no sistema plantio direto, destacando-se a cultivar Campeão 2 como a mais produtiva.

2. Nota-se a influência da interação dos fatores cultivares e das doses de calcário para o tempo de cozimento, havendo na cultivar IAPAR 81 aumento dessa característica, em função do incremento das doses de calcário.

3. Os valores do teor de proteína bruta e da relação de hidratação dos grãos não variam em função das doses de calcário e das cultivares de feijão.

Recebido: 16/mar./2009; Aceito: 17/jul./2010

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    Autor correspondente.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Maio 2011
    • Data do Fascículo
      2011

    Histórico

    • Aceito
      17 Jul 2010
    • Recebido
      16 Mar 2009
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