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Elevada densidade de semeadura aumenta a produtividade da soja? Respostas da radiação fotossinteticamente ativa

Does high seeding density increase soybean productivity? Photosynthetically active radiation responses

Resumo

Estudos recentes têm abordado o uso da prática da elevada densidade de semeadura na cultura da soja. Entretanto, os resultados práticos dessa técnica são divergentes. Assim, pesquisas nesse campo são importantes para elucidar os efeitos diretos dessa prática de manejo, como, por exemplo, a interferência no uso da radiação fotossinteticamente ativa (RFA). Portanto, objetivou-se com este estudo avaliar a dinâmica da RFA em diferentes densidades de cultivo na cultura da soja. Para tanto, conduziu-se um experimento a campo com delineamento em blocos casualizados com os tratamentos distribuídos em arranjo fatorial 3 × 5: três cultivares de soja RR® (P98Y12, TMG 132 e M-Soy 9056) e cinco densidades de semeadura (20, 30, 40, 50 e 60 plantas∙m–2) com quatro repetições. Foram avaliados massa seca da parte aérea, radiação fotossinteticamente ativa no dossel inferior (RFA-I) e superior (RFA-S), intercepção da RFA, taxa de crescimento da cultura (TCC), taxa de crescimento relativo (TCR), taxa de assimilação líquida (TAL), eficiência de uso da radiação (EUR), coeficiente de extinção luminosa (k), índice de colheita de grãos (ICG), peso de 1.000 grãos e produtividade. Independentemente do cultivar, as densidades de 20 e 30 plantas∙m–2 proporcionaram os maiores valores de TAL, TCR, k, ICG e produtividade. Apenas o uso dos parâmetros EUR, TCC e RFA interceptada não fornece informações sólidas para predizer a eficiência do cultivo adensado na cultura da soja. As densidades de cultivo tradicionalmente utilizadas se sobrepõem às demais quanto à qualidade da RFA no dossel e produtividade da soja.

Palavras-chave
Glycine max (L.) Merrill; coeficiente de extinção luminosa; balanço radiométrico; qualidade da radiação

Abstract

Recent studies have addressed the use of the high sowing density of soybean. However, the field results of this practice are still unclear. Thus, research on this area is important in order to explain the direct effects of this management practice, for example, interference in the use of photosynthetically active radiation (PAR). Therefore, this study aimed to evaluate the dynamics of PAR in different seeding densities in soybean. A field experiment was conducted in randomized blocks with treatments distributed in a 3 × 5 factorial arrangement: three varieties of RR® soybeans (P98Y12, TMG 132 and M-Soy 9056) and five seeding densities (20, 30, 40, 50 and 60 plants∙m–2) with four replications. The dry matter, photosynthetically active radiation in the lower canopy (PAR-L) and in the higher one (PAR-H), interception of PAR, crop growth rate (CGR), relative growth rate (RGR), net assimilation rate (NAR), radiation use efficiency (RUE), light extinction coefficient (k), grain harvest index (GHI), 1,000 grains weight and productivity were evaluated. Regardless of the variety, the densities of 20 and 30 plants∙m–2 provided the highest values of NAR, RGR, k, GHI and productivity. The use of RUE, CGR and intercepted PAR does not provide accurate information to predict the efficiency of soybean density cultivation. Cultivation densities traditionally used overlap the others regarding the quality of PAR in the canopy and soybean productivity.

Key words
Glycine max (L.) Merrill; light extinction coefficient; radiometric balance; quality of radiation

INTRODUÇÃO

A radiação solar incidente na superfície terrestre compõe a principal fonte de energia para o desenvolvimento dos vegetais. Na região dos cerrados, o fluxo quântico de radiação solar é de aproximadamente 1.800 µmol∙m−2∙s−1 (Larcher 2004Larcher, W. (2004). Ecofisiologia vegetal. São Carlos: Rima.), sendo que, de maneira geral, apenas 44% de toda essa energia chega a comprimentos de onda que podem ser aproveitadas pelas plantas (Cunha e Volpe 2010Cunha, A. R. e Volpe, C. A. (2010). Relações radiométricas no terço superior da copa de cafeeiro. Bragantia, 69, 263-271. http://dx.doi.org/10.1590/S0006-87052010000200002.
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) e, destes, apenas uma pequena parte de fato é utilizada para a produção de fitomassa vegetal.

Os comprimentos de ondas eletromagnéticas (380 a 710 nm) capazes de serem aproveitados pelas plantas para fins de conversão dessa energia física em energia química são denominados de radiação fotossinteticamente ativa (RFA). No entanto, a eficiência no uso da radiação solar é variável entre as espécies, pois estas apresentam características fisiológicas e morfológicas distintas, que vão desde mecanismos de fixação do carbono atmosférico até a morfologia/anatomia foliar. Assim, o aproveitamento da RFA pelas plantas é altamente influenciado por suas condições de crescimento e desenvolvimento (Fontana et al. 2012Fontana, D. C., Alves, G. M., Roberti, D., Moraes, O. L. L. e Gerhardt, A. (2012). Estimativa da radiação fotossinteticamente ativa absorvida pela cultura da soja através de dados do sensor Modis. Bragantia, 71, 563-571.), e estas podem ser alteradas pelo manejo cultural, como, por exemplo, a densidade de cultivos das culturas.

Recentemente, na prática, alguns produtores, visando ao aumento de produtividade, têm optado pelo plantio adensado na cultura da soja, utilizando, por exemplo, o plantio cruzado nas áreas de cultivo e espaçamento entre linhas inferior a 45 cm, que é o espaçamento normalmente utilizado, ou o maior número de plantas na linha de cultivo em espaçamentos de 40 cm na entrelinha.

Entretanto, essa prática, aliada às características das plantas de soja, pode influenciar a distribuição da RFA no dossel, uma vez que, de acordo com Monsi e Saeki (1953)Monsi, M. e Saeki, T. (1953). The light factor in plant communities and its significance for dry matter production. Japanese Journal of Botany, 14, 22-52. http://dx.doi.org/10.1093/aob/mci052.
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e Schöffel e Volpe (2001)Schöffel, E. R. e Volpe, C. A. (2001). Eficiência de conversão da radiação fotossinteticamente ativa interceptada pela soja para a produção de fitomassa. Revista Brasileira de Agrometeorologia, 9, 241-249., a quantidade de energia luminosa e a distribuição da RFA ao longo do dossel segue a lei de Lambert-Beer, que é uma função exponencial negativa do produto do índice de área foliar (IAF) pelo coeficiente de extinção luminosa (k), ou seja, a quantidade de luz num determinado nível reduz exponencialmente com o aumento do IAF governado pelo k. Essa característica é perfeitamente compreendida à medida que a distribuição da radiação ao longo do dossel se dá de forma direta, difusa, por reflexão da superfície do solo ou, ainda, como radiação transmitida pelas folhas (Assunção et al. 2008Assunção, H. F., Escobedo, J. F. e Carneiro, M. A. C. (2008). Eficiência de uso da radiação e propriedades óticas da cultura do amendoim. Pesquisa Agropecuária Tropical, 38, 215-222.).

O uso de altas densidades de semeadura pode proporcionar boa interceptação da RFA, todavia com baixa qualidade na distribuição ao longo do dossel. Já baixas densidades comprometem a capacidade de interceptação da RFA e, consequentemente, o aproveitamento no uso da mesma. Portanto, controlando-se a densidade de plantas na área é possível a obtenção de maior qualidade no aproveitamento da RFA. Na última década, alguns trabalhos (Santos et al. 2003Santos, J. B., Silva, A. A., Procópio, S. O. e Costa, L. C. (2003). Captação e aproveitamento da radiação solar pelas culturas da soja e do feijão e por plantas daninhas. Bragantia, 62, 147-153. http://dx.doi.org/10.1590/S0006-87052003000100018.
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; Kiniry et al. 2005Kiniry, J. R., Simpson, C. E., Schubert, A. M. e Reed, J. D. (2005). Peanut leaf area index, light interception, radiation use efficiency, and harvest index at three sites in Texas. Field Crops Research, 91, 297-306. http://dx.doi.org/10.1016/j.fcr.2004.07.021.
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; Assunção et al. 2008Assunção, H. F., Escobedo, J. F. e Carneiro, M. A. C. (2008). Eficiência de uso da radiação e propriedades óticas da cultura do amendoim. Pesquisa Agropecuária Tropical, 38, 215-222.) evidenciaram a eficiência no uso da RFA por diferentes culturas; contudo, são escassos os trabalhos envolvendo a avaliação dessa eficiência na cultura da soja em diferentes arranjos. Já a prática do cultivo adensado e/ou cruzado na cultura da soja tem sido alvo de estudos recentes (Silva et al. 2013Silva, W. B., Petter, F. A., Lima, L. B. e Andrade, F. R. (2013). Desenvolvimento inicial de Urochloa ruziziensis e desempenho agronômico da soja em diferentes arranjos espaciais no cerrado Mato-Grossense. Bragantia, 72, 146-153. http://dx.doi.org/10.1590/S0006-87052013000200006.
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; Procópio et al. 2014Procópio, S. O., Balbinot Junior, A. A., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2014). Semeadura em fileira dupla e espaçamento reduzido na cultura da soja. Revista Agro@mbiente On-line, 8, 212-221. http://dx.doi.org/10.18227/1982-8470ragro.v8i2.1469.
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; Balbinot Junior et al. 2015Balbinot Junior, A. A., Procópio, S. O., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2015). Semeadura cruzada em cultivares de soja com tipo de crescimento determinado. Semina: Ciências Agrárias, 36, 1215-1226. http://dx.doi.org/10.5433/1679-0359.2015v36n3p1215.
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), porém com foco nos componentes de produção e na produtividade.

Assim, é evidente a carência de estudos que explicam o efeito desses sistemas de cultivo apoiado na dinâmica de uso da RFA pela cultura da soja. Estudos dessa natureza podem gerar informações as quais permitem um manejo que proporcione maior qualidade no uso dessa radiação e, consequentemente, maior produtividade, dada a correlação direta dessa característica com a eficiência fotossintética. Diante disso e devido à importância da soja no contexto da produção de grãos — que atualmente representa 46,6% da produção total do Brasil (CONAB 2015Companhia Nacional de Abastecimento (2015). Acompanhamento da safra 2015; [acessado 20 Jul. 2015]. http://www.conab.gov.br/safras.asp
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) — e da recente prática de alguns produtores em realizar plantios adensados, torna-se evidente a necessidade de estudos visando à elucidação do comportamento da cultura em função desse manejo cultural, pois muitos são os resultados divergentes (Lima et al. 2012Lima, S. F., Alvarez, R. C. F., Theodro, G. F., Bavaresco, M. e Silva, K, S. (2012). Efeito da semeadura em linhas cruzadas sobre a produtividade de grãos e a severidade da ferrugem asiática da soja. Bioscience Journal, 28, 954-962.; Procópio et al. 2013Procópio, S. O., Balbinot Junior, A. A., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2013). Plantio cruzado na cultura da soja utilizando uma cultivar de hábito de crescimento indeterminado. Revista de Ciência Agrária, 56, 319-325. http://dx.doi.org/10.4322/rca.2013.048.
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).

Assim, partimos da hipótese de que a qualidade da RFA na cultura da soja pode ser afetada negativamente pelo manejo de cultivos adensados e que esse efeito na RFA pode elucidar o comportamento produtivo da soja nessas condições. Para tanto, conduziu-se um estudo objetivando avaliar a qualidade da RFA através de parâmetros de uso da RFA, análise de crescimento e desempenho agronômico da soja em diferentes densidades de plantio.

MATERIAL E MÉTODOS

Caracterização da área de estudo

O experimento foi realizado na Fazenda União - Serra das Laranjeiras (8°38’12”S, 44°40’11”W; 550 m) localizada no município de Currais, Piauí, onde foi conduzido o experimento de campo na safra 2012/2013.

O solo utilizado para a instalação do experimento foi classificado como Latossolo Amarelo distrófico (Lad), com textura franco-arenosa (argila: 160, silte: 50 e areia: 790 g∙kg–1), cuja composição química encontra-se na Tabela 1. O histórico da área é caracterizado pelo cultivo em monocultura da soja desde o ano de 2004, recebendo aplicações anuais de 500 kg∙ha–1 de fertilizante NPK 00-20-20. De maneira geral e considerando-se a classificação de fertilidade para o cerrado da região Centro-Oeste, esse solo apresenta média fertilidade.

Table 1
Composição química do Latossolo Amarelo distrófico (0 – 0,20 m) antes da instalação do experimento na região do Cerrado piauiense.

O clima da região é do tipo Aw segundo a classificação climática global de Köppen, com duas estações bem definidas, sendo uma seca, que vai de maio a setembro, e outra chuvosa, que vai de outubro a abril. A temperatura média é de 26,5 °C, embora durante o ano seja comum temperatura de 40 °C e precipitação pluviométrica média de 900 a 1.200 mm∙ano−1 (Viana et al. 2002Viana, T. V. A., Vaconcelos, D. V., Azevedo, B. M. e Souza, V. F. (2002). Estudo da aptidão agroclimática do Estado do Piauí para o cultivo da aceroleira. Ciência Agronômica, 33, 5-12.). A precipitação acumulada durante a condução do experimento foi de 400 mm, com radiação solar média de 19,6 MJ∙m−2∙dia−1 (Figura 1).

Figura 1
Temperatura, radiação média e precipitação acumulada no t2 – t1, em Currais, Piauí, durante a condução do experimento na safra 2012/2013.

O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso, em esquema fatorial 3 × 5, sendo três cultivares de soja RR® (P98Y12, TMG 132 e M-Soy 9056) e cinco densidades de plantio (20, 30, 40, 50 e 60 plantas∙m−2), com quatro repetições. Visando a uma melhor distribuição espacial por planta e, ao mesmo tempo, à reprodução do sistema de cultivo na prática, as densidades foram distribuídas em espaçamento na entrelinha de 0,4 m, abaixo do normalmente utilizado, que é de 0,5 m. As parcelas foram constituídas de 5 × 5 m (25 m2), sendo que, para as avaliações, foi descartado 0,5 m de cada lado da parcela, totalizando uma área útil de 16 m2. Apesar do delineamento em esquema fatorial, não se procedeu à análise comparando os cultivares entre si, uma vez que cada cultivar apresenta características morfofisiológicas diferentes.

Tratos culturais

A soja foi cultivada em sistema de plantio convencional, em área já cultivada com a cultura. Antes da semeadura, as sementes foram tratadas com piraclostrobina + tiofanato metílico + fipronil, na dose de 2 mL p.c por kg de semente, e inoculadas com Bradyrhizobium japonicum, na dose de 3 mL p.c por kg de semente. A semeadura das cultivares de soja foi realizada no dia 24 de dezembro de 2012, sendo distribuídas as sementes por metro em cinco densidades populacionais sem alteração do espaçamento na entrelinha. A adubação de base NPK foi constituída da aplicação de 350 kg∙ha−1 da fórmula 2-24-12. A adubação de cobertura foi realizada com a aplicação de 35 kg∙ha−1 de KCl aos 25 dias após a emergência (DAE). A área experimental foi sistematicamente monitorada por meio de visitas rotineiras para a coleta de dados. Durante todo o ciclo da cultura, o controle de plantas daninhas, pragas e doenças foi realizado, mediante incidência, com uso de produtos recomendados para a cultura.

Avaliações

Avaliou-se, na cultura da soja aos 30, 45, 60, 75 e 100 DAE, a radiação fotossinteticamente ativa no dossel inferior (RFA-I) e superior (RFA-S), em três pontos por parcela de forma aleatória, bem como k antes e após o florescimento, interceptação da RFA, massa seca de cinco plantas por parcela, IAF, eficiência de uso da RFA (EUR), taxa de crescimento da cultura (TCC), taxa de crescimento relativo (TCR) e taxa de assimilação líquida (TAL). Na colheita, avaliou-se o índice de colheita de grãos, peso de 1.000 grãos e produtividade em kg∙ha–1 padronizada a 14% de umidade.

Determinação dos parâmetros

A RFA foi determinada com o uso de Ceptometro Accu PAR PAR/LAI Ceptometer model LP-80 (Decagon Devices). As leituras foram realizadas entre 11h e 13h sob céu claro, medindo-se a intensidade luminosa acima do dossel, à altura mediana do dossel e ao nível do solo. Essas medições permitiram os cálculos estratificados de uso da RFA no dossel inferior e superior da cultura da soja. Optou-se por medições nesse horário visando à redução da interferência do ângulo zenital. O aparelho foi colocado perpendicularmente à linha de plantio formando um ângulo de 45° em relação ao zênite.

A determinação da atenuação da RFA ao longo do dossel foi realizada de acordo com a equação de extinção luminosa (Lei de Lambert-Beer), modificada por Monsi e Saeki (1953)Monsi, M. e Saeki, T. (1953). The light factor in plant communities and its significance for dry matter production. Japanese Journal of Botany, 14, 22-52. http://dx.doi.org/10.1093/aob/mci052.
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: Iz = Io ek × IAF ou K = ln (Io /Iz )/IAF, onde: Iz é a intensidade de RFA em uma determinada altura no interior do dossel; Io é a intensidade da RFA no topo do dossel; ln é o logaritmo neperiano.

Os dados da radiação do Ceptometer model LP-80 obtidos em µmol∙m–2∙s–1 foram transformados para mol∙m–2∙dia–1, onde 1 µmol∙m–2∙s–1 = 0,0864 mol∙m–2∙dia–1.

Para mensurar a área foliar, foram utilizadas cinco plantas, sendo as folhas divididas em duas partes: inferior e superior do dossel. Posteriormente, cada parte foi analisada separadamente no medidor de área foliar eletrônico modelo Li-Cor, L1-3100®. Em seguida, foi determinada a massa seca em estufa de circulação forçada de ar a 65 °C até obtenção do peso constante.

Por meio da área das folhas, calculou-se a área total de folhas da amostra e, posteriormente, o IAF correspondente (cm2 de folhas∙cm–2 de solo). A RFA interceptada pela cultura foi calculada pela equação (Varlet-Grancher et al. 1989Varlet-Grancher, C., Gosse, G., Chartier, M., Sinoquet, H., Bonhomme, R. e Allirand, J. M. (1989). Mise au point: rayonnement solaire absorbé ou intercepté par un couvert végétal. Agronomie, 9, 419-439. http://dx.doi.org/10.1051/agro:19890501.
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): RFAint = RFAinc – RFAts, onde: RFAinc é a radiação incidente e RFAts é a radiação transmitida ao solo. A eficiência de intercepção (εint) da RFA pela cultura foi estimada considerando-se a RFAint e a RFAinc pela expressão: εint= RFAint/ RFAinc.

A TCC, em g∙m–2∙dia–1, foi calculada pela equação TCC = (MSt2− MSt1)/A/(t2t1), onde: MSt2 é a massa seca total da parte aérea atual (g∙m–2); MSt1 é a massa seca total da parte aérea inicial (g∙m–2); t2t1 é o intervalo de tempo entre duas coletas, onde A representa a área ocupada pela cultura.

A taxa de TCR, em g∙g–1∙dia–1, foi calculada pela equação TCR = (ln MSt2– ln MSt1)/(t2t1), onde: MSt1 e MSt2 representam a massa seca nos tempos t1 e t2.

A TAL, em g∙dm–2∙dia–1, foi calculada pela fórmula TAL = [(MSt2– MSt1)×(lnIAF2– ln IAF1)] / [(IAF2– IAF1)×(t2t1)], onde IAF2 é o índice de área foliar total atual da parte aérea (cm2); IAF1 é o índice de área foliar total inicial da parte aérea (cm2).

A EUR, em g∙MJ–1, foi obtida relacionando-se o rendimento de MS com a RFA incidente acumulada em cada época.

O índice de colheita de grãos (ICG), em kg∙kg–1, foi calculado como: ICG = MSgrãos/ MStotal, onde MSgrãos é a massa seca da fração econômica produzida (grãos) em kg∙kg–1 e a MStotal é a massa seca total. A produtividade é calculada em kg∙ha–1, padronizados a 14% de umidade de grãos.

Análise estatística

Os dados apresentaram distribuição normal e foram submetidos à análise de variância, sendo as médias das variáveis significativas comparadas pelo teste de Tukey (p < 0,05). Realizou-se análise de regressão para os dados quantitativos (densidade populacional) significativos pelo teste t de Student, associando-se os coeficientes de correlação (p < 0,05) e determinação a cada modelo por meio do programa estatístico Sisvar (Ferreira 2011Ferreira, D. F. (2011). Sisvar: a computer statistical analysis system. Ciência e Agrotecnologia, 35, 1039-1042. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-70542011000600001.
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).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Independentemente dos cultivares, a RFA-I e a RFA-S foram significativamente influenciadas pelas densidades de cultivo, com maiores valores nas menores densidades (Figura 2). As maiores diferenças para a RFA em função das densidades foram verificadas aos 30 DAE. Nesse estádio de desenvolvimento, os valores de RFA-I e RFA-S na densidade de 20 plantas∙m–2 foram aproximadamente 1,5, 1,9 e 2,8 e 1,4, 1,2 e 1,9 vezes superiores comparados à densidade de 60 plantas∙m–2 para os cultivares P98Y12RR, TMG 132RR e M-Soy 9056RR, respectivamente. Esses resultados corroboram os obtidos por Silva et al. (2013)Silva, W. B., Petter, F. A., Lima, L. B. e Andrade, F. R. (2013). Desenvolvimento inicial de Urochloa ruziziensis e desempenho agronômico da soja em diferentes arranjos espaciais no cerrado Mato-Grossense. Bragantia, 72, 146-153. http://dx.doi.org/10.1590/S0006-87052013000200006.
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, que verificaram o mesmo comportamento da RFA abaixo do dossel em diferentes espaçamentos de entrelinhas na cultura da soja. A partir dos 30 DAE, as amplitudes dos valores de RFA em função das densidades de cultivo foram reduzindo até os 75 DAE, quando não mais se detectaram diferença na incidência de RFA para o dossel inferior e superior

Figura 2
Radiação fotossinteticamente ativa no dossel inferior (RFA-I) (a, b, c) e superior (RAF-S) (d, e, f) de cultivares de soja sob diferentes densidades de plantio (plantas∙m-2) com respectivo desvio padrão em Currais, Piauí, safra 2012/2013.

Esse comportamento é explicado pela ausência de autossombreamento no início do desenvolvimento da cultura em função da baixa sobreposição das folhas, aumentando, assim, o fluxo de interceptação por unidade foliar. À medida que há o desenvolvimento, há também o autossombreamento, que acaba por compensar a diferença de área foliar total em função das densidades, resultando, aos 75 DAE, em valores semelhantes de incidência da RFA. A partir desse período, a RFA-I se manteve estável e máxima até 100 DAE. Já no dossel superior, verificou-se comportamento diferenciado, com redução da RFA incidente a partir dos 75 DAE, principalmente nas maiores densidades.

Assim, as maiores interceptações de RFA foram verificadas nas maiores densidades de cultivo; todavia, essa diferença foi significativa apenas até os 45 DAE, sendo que, a partir dessa época, com exceção da densidade de 20 plantas∙m–2, as demais densidades proporcionaram interceptação acima de 90% (Figuras 3a, b, c). Para a massa seca das plantas ao longo do ciclo da cultura, verificou-se comportamento diferenciado, com maior acúmulo nas maiores densidades (Figuras 3d, e, f). Esses resultados corroboram os de Sauer et al. (2007)Sauer, T. J. Singer, J. W., Prueger, J. H., De Sutter, T. M. e Hatfield, J. L. (2007). Radiation balance and evaporation partitioning in a narrow-row soybean canopy. Agricultural and Forest Meteorology, 145, 206-214. http://dx.doi.org/10.1016/j.agrformet.2007.04.015.
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para RFA interceptada e os de Kuss et al. (2008)Kuss, R. C. R., Konig, O., Dutra, L. M. C., Bellé, R. A., Roggia, S. e Sturmer, G. R. (2008). Populações de plantas e estratégias de manejo de irrigação na cultura da soja. Ciência Rural, Santa Maria, 38, 1133-1137. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-84782008000400036.
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e Procópio et al. (2013)Procópio, S. O., Balbinot Junior, A. A., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2013). Plantio cruzado na cultura da soja utilizando uma cultivar de hábito de crescimento indeterminado. Revista de Ciência Agrária, 56, 319-325. http://dx.doi.org/10.4322/rca.2013.048.
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para massa seca dos cultivares de soja em função da maior densidade.

Figura 3
Radiação fotossinteticamente ativa (RFA) interceptada no dossel (a, b, c) e massa seca de plantas (d, e, f) de cultivares de sojasob diferentes densidades de plantio (plantas∙m-2) com respectivo desvio padrão, em Currais, Piauí, safra 2012/2013

A dinâmica de acúmulo de massa seca da soja seguiu padrão característico de culturas anuais, com modelo sigmoidal, onde o acúmulo foi lento aos 30 DAE, rápido após esse período até 75 DAE e, posteriormente, houve um decréscimo acentuado, proporcionado principalmente pela queda das folhas do baixeiro. O maior acúmulo de massa seca nas maiores densidades está associado ao maior número de plantas por área, e não necessariamente à maior produção de fotoassimilados oriundos da maior interceptação da RFA, pois ficou evidente a capacidade das plantas nas densidades intermediárias em compensar a interceptação da RFA.

Nesse sentido, ao analisar os dados de EUR e a TCC, verificou-se em densidades elevadas os maiores valores para esses parâmetros (Figura 4), o que, em um primeiro momento, parece contradizer o reportado anteriormente. Entretanto, os resultados evidenciam claramente que se deve ter cautela ao utilizar apenas a EUR e a TCC como parâmetro de avaliação de eficiência fotossintética, pois a EUR leva em consideração a relação de rendimento de massa seca com a RFA incidente acumulada em cada época. Assim, um maior acúmulo de massa seca oriundo de uma maior população de plantas pode mascarar o efeito real da EUR, ou seja, uma maior EUR pelo método utilizado não necessariamente resulta em maior eficiência líquida no uso da RFA. Tal fato ficou comprovado neste trabalho, onde a TAL foi maior nas menores densidades (Figuras 5a, b, c), efeito este contrário ao verificado para EUR. Os valores de TAL nas densidades de 20 e 30 plantas∙m–2 (5,2 g∙m–2∙dia–1) foram em média 73% superiores em relação à densidade de 60 plantas∙m–2 (3,8 g∙m–2∙dia–1).

Figura 4
Eficiência de uso da radiação (EUR) no perfil do dossel (a, b, c) e taxa de crescimento da cultura (TCC) (d, e, f) de cultivares de sojasob diferentes densidades de plantio (plantas∙m–2) com respectivo desvio padrão, em Currais, Piauí, safra 2012/2013
Figura 5
Taxa de assimilação líquida (TAL) (a, b, c) e taxa de crescimento relativo (TCR) (d, e, f) de cultivares de soja sob diferentes densidades de plantio (plantas∙m–2) com respectivo desvio padrão, em Currais, Piauí, safra 2012/2013.

A TAL expressa o ganho em peso por superfície foliar em um determinado período de tempo, ou seja, representa a fotossíntese líquida e esta é dependente de fatores ambientais, com destaque para a RFA. Em condições de elevada densidade (autossombreamento), ocorre redução da TAL, uma vez que o fluxo de interceptação da RFA é distribuído heterogeneamente na superfície das folhas. Nessas condições, em função da distribuição irregular da RFA incidente, a fotossíntese líquida não é proporcional à área foliar que compõe o dossel.

A TCR foi significativamente influenciada pelas densidades de plantio, apresentando comportamento semelhante ao da TAL; os maiores valores de TCR foram verificados nas menores densidades e com picos máximos aos 45 DAE (Figuras 5d, e, f). Maior TCR da cultura da soja aos 45 DAE com posterior declínio também foi verificada por Peixoto et al. (2012)Peixoto, C. P., Machado, G. S., Borges, V. P., Alves, E. C. e Leal, G. M. F. (2012). Índices fisiológicos de soja hortaliça em duas épocas de semeadura no Recôncavo Sul Baiano. Scientia Agraria Paranaensis, 11, 56-67. http://dx.doi.org/10.18188/1983-1471/sap.v11n2p56-67.
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. Isso se deve à composição dos novos tecidos vegetais na fase inicial de crescimento e desenvolvimento da cultura, onde se eleva a TCR em consequência do maior surgimento e maior expansão foliar. A maior taxa de surgimento de novas folhas e expansão foliar está diretamente relacionada à capacidade fotossintética dos tecidos assimilatórios, que é maior em densidades menores, pois o autossombreamento é menos intenso, assim como a respiração de manutenção.

Diferentemente da TCC, a TCR permite verificar o padrão de crescimento da cultura em um período específico de tempo e, consequentemente, verificar o efeito da população de plantas em um dado instante. Com os dados obtidos no presente trabalho, fica evidente que as plantas em menores populações tendem a formar massa de matéria seca a partir da matéria preexistente, e, com o aumento das densidades estudadas, há uma limitação no incremento da TCR em função principalmente de competição intraespecífica.

Já a acentuada redução da TCR após os 60 DAE pode ser atribuída ao aumento gradual de tecidos não assimilatórios observado no experimento, junto ao abortamento de flores, seguida à fase de senescência (após ~ 85 DAE), principalmente nas maiores densidades. Esse comportamento é explicado pela crescente atividade respiratória e autossombreamento, bem como redução da fotossíntese, principalmente no dossel inferior, nas maiores densidades (Knebel et al. 2006Knebel, J. L., Guimarães, V. F., Andreotti, M. e Stangarlin, J. R. (2006). Influência do espaçamento e população de plantas sobre doenças de final de ciclo e oídio e caracteres agronômicos em soja. Acta Scientiarum Agronomy, 28, 385-392. http://dx.doi.org/10.4025/actasciagron.v28i3.962.
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).

Os resultados do presente estudo permitem inferir que a análise de eficiência no uso da RFA através apenas dos parâmetros RFA interceptada, EUR e TCC, sem a estratificação da RFA incidente no dossel inferior e superior, bem como a análise do coeficiente de extinção luminosa (k), pode levar ao erro nas interpretações sobre o manejo da cultura da soja sob diferentes densidades. Quando se observam apenas os dados de EUR, TCC e RFA interceptada, não é possível verificar a qualidade da interceptação da RFA no dossel, ou seja, como está a distribuição da RFA ao longo do perfil do dossel da cultura (superior e inferior).

Neste estudo, embora tenha se verificado maiores valores de RFA interceptada, EUR, TCC, e nas maiores densidades, houve baixa qualidade da distribuição da RFA ao longo do perfil do dossel. Isso se torna evidente ao analisar a incidência da RFA de maneira estratificada no dossel inferior e superior da cultura da soja aos 45 DAE, quando a média da RFA-I (26 mol∙m–2∙dia–1) foi 150% menor em relação à RFA-S (65 mol∙m–2∙dia–1) quando comparada a menor e a maior densidade, respectivamente. Isso representa interceptação da RFA de aproximadamente 80% no dossel superior e apenas 20% no dossel inferior. Esses percentuais de distribuição da RFA comprometem principalmente a utilização da radiação difusa pelas folhas do dossel inferior, visto que a radiação total incidente fica limitada ao dossel superior, reduzindo, assim, a proporção dessa radiação que atinge o solo e a radiação difusa. Esse fato pode ser agravado em longos períodos com dias nublados e chuvosos, uma vez que, nessas condições, a contribuição da radiação difusa para a fotossíntese é significativa (Souza et al. 2010Souza, P. J. O. P., Rocha, E. J. P., Ribeiro A. e Souza, E. B. (2010). Radiation balance in a soybean ecosystem in the Amazon. Revista Ciência Agronômica, 41, 582-592. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-66902010000400010.
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). Outro aspecto importante é que as folhas do dossel inferior, que recebem a maior parte da radiação difusa, são mais eficientes fotossinteticamente comparadas às folhas expostas à radiação direta (Souza et al. 2009Souza, P. J. O. P., Ribeiro A., Rocha, E. J. P., Farias, J. R. B., Loureiro, R. S., Bispo,C. C. e Sampaio, L. (2009). Solar radiation use efficiency by soybean under field conditions in the Amazon region. Pesquisa Agropecuária Brasileira, 44, 1211-1218. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-204X2009001000001.
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), e isso é importante principalmente no período (45 DAE) que antecede a floração, quando há alta demanda energética.

Portanto, a baixa incidência de radiação no dossel inferior pode comprometer a produção energética da planta, sobretudo em cultivares com morfologia foliar planófila acentuada. Esse fato é agravado ao se considerar a contribuição do dossel inferior na produção de vagens e produtividade, que pode representar 35 a 45% do total produzido em uma planta de soja (Rambo et al. 2004Rambo, L., Costa, J. A., Pires, J. L. F., Parcianello, G. e Ferreira, F. G. (2004). Estimativa do potencial de rendimento por estrato do dossel da soja, em diferentes arranjos de plantas. Ciência Rural, 34, 33-40. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-84782004000100006.
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; Bahry et al. 2014Bahry, C. A., Nandino, M., Venske, E., Fin, S. S., Zimmer, P. D., Souza, V. Q. e Caron, B. O. (2014). Efeito do nitrogênio suplementar sobre os componentes de rendimento da soja em condição de estresse hídrico. Revista Ceres, 61, 155-160. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-737X2014000200019.
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). Adicionalmente, a baixa qualidade na distribuição da RFA ao longo do dossel com o aumento da densidade de plantas também foi comprovada pela redução da TAL, da TCC e principalmente pela redução do k.

Independentemente do cultivar avaliado, as maiores densidades de cultivo proporcionaram redução do k antes e após o florescimento (Figura 6). Como o k revela o grau de redução exponencial dos fótons de luz no perfil do dossel por absorção e/ou espalhamento, a redução desse valor infere também na baixa qualidade de distribuição da RFA, comprovando o efeito da baixa incidência da RFA no dossel inferior em maiores densidades. Os maiores valores de k foram verificados na densidade de 20 e 30 plantas∙m–2 e após o florescimento da cultura, corroborando, assim, os resultados de Schöffel e Volpe (2001)Schöffel, E. R. e Volpe, C. A. (2001). Eficiência de conversão da radiação fotossinteticamente ativa interceptada pela soja para a produção de fitomassa. Revista Brasileira de Agrometeorologia, 9, 241-249. e Procópio et al. (2003)Procópio, S. O., Santos, J. B., Silva, A. A. e Costa, L. C. (2003). Desenvolvimento foliar das culturas da soja e do feijão e de planta daninhas. Ciência Rural, 33, 207-211. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-84782003000200005.
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. O uso do k como parâmetro indicativo de eficiência da RFA interceptada pelas plantas também foi abordado por Procópio et al. (2003)Procópio, S. O., Santos, J. B., Silva, A. A. e Costa, L. C. (2003). Desenvolvimento foliar das culturas da soja e do feijão e de planta daninhas. Ciência Rural, 33, 207-211. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-84782003000200005.
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. Segundo esses autores, é possível ainda estimar a produção de fitomassa seca e produtividade em modelos com a entrada dos dados de k. Portanto, é perceptível a importância do k como parâmetro de avaliação da qualidade de distribuição da RFA no perfil do dossel na cultura da soja.

Figura 6
Coeficiente de extinção luminosa (k) de cultivares de soja sob diferentes densidades de cultivo com respectivo desvio padrão, em Currais, Piauí, safra 2012/2013.

O arranjo de plantas associado a um índice de área foliar que permite a interceptação de pelo menos 90% da RFA é altamente desejável (Silva et al. 2013Silva, W. B., Petter, F. A., Lima, L. B. e Andrade, F. R. (2013). Desenvolvimento inicial de Urochloa ruziziensis e desempenho agronômico da soja em diferentes arranjos espaciais no cerrado Mato-Grossense. Bragantia, 72, 146-153. http://dx.doi.org/10.1590/S0006-87052013000200006.
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). Entretanto, como reportado, não necessariamente a maior interceptação está associada à maior eficiência na utilização da RFA com posterior conversão em fitomassa e, consequentemente, em produtividade, pois esta, em maiores densidades, pode estar restrita ao dossel superior. Isso explica em parte os menores valores de k e índice de colheita de grãos observados nos tratamentos com densidades a partir de 40 plantas∙m–2 em todos os cultivares avaliados (Figura 7a). Esses resultados se assemelham aos verificados por Procópio et al. (2013)Procópio, S. O., Balbinot Junior, A. A., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2013). Plantio cruzado na cultura da soja utilizando uma cultivar de hábito de crescimento indeterminado. Revista de Ciência Agrária, 56, 319-325. http://dx.doi.org/10.4322/rca.2013.048.
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, que observaram redução do ICG em detrimento da maior densidade, conferindo menor alocação de fotoassimilados para o produto de interesse econômico, que são os grãos.

Figura 7
Índice de colheita de grãos (ICG) (a), produtividade e peso de grãos (b) de cultivares de soja sob diferentes densidades de cultivo em Currais, Piauí, safra 2012/2013.

O ICG expressa a eficiência da cultura em converter a fitomassa em produtividade de grãos, com correlação positiva entre ICG e produtividade (Petter et al. 2014Petter, F. A., Alcântara Neto, F., Barros, W. S., Almeida, F. A., Pacheco, L. P., Lima, L. B. e Gravina, G. A. (2014). Phenotypic correlations and path analysis of soybean production components in the Brazilian cerrado of Piauí state. Revista de Ciências Agrárias, 57, 273-279. http://dx.doi.org/10.4322/rca.ao1412.
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). Nesse sentido, o ICG confirmou a mesma tendência para produtividade e peso de 1,000 grãos (Figura 7b), sendo que o máximo acúmulo de fitomassa seca proporcionada por maiores densidades não resultou em máxima produtividade e peso de grãos, corroborando outros estudos (Rambo et al. 2004Rambo, L., Costa, J. A., Pires, J. L. F., Parcianello, G. e Ferreira, F. G. (2004). Estimativa do potencial de rendimento por estrato do dossel da soja, em diferentes arranjos de plantas. Ciência Rural, 34, 33-40. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-84782004000100006.
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; Procópio et al. 2013Procópio, S. O., Balbinot Junior, A. A., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2013). Plantio cruzado na cultura da soja utilizando uma cultivar de hábito de crescimento indeterminado. Revista de Ciência Agrária, 56, 319-325. http://dx.doi.org/10.4322/rca.2013.048.
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). A densidade de 30 plantas∙m–2 conferiu a máxima produtividade calculada de 2,709 kg∙ha–1. Assim como em outros estudos (Procópio et al. 2013Procópio, S. O., Balbinot Junior, A. A., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2013). Plantio cruzado na cultura da soja utilizando uma cultivar de hábito de crescimento indeterminado. Revista de Ciência Agrária, 56, 319-325. http://dx.doi.org/10.4322/rca.2013.048.
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; Silva et al. 2013Silva, W. B., Petter, F. A., Lima, L. B. e Andrade, F. R. (2013). Desenvolvimento inicial de Urochloa ruziziensis e desempenho agronômico da soja em diferentes arranjos espaciais no cerrado Mato-Grossense. Bragantia, 72, 146-153. http://dx.doi.org/10.1590/S0006-87052013000200006.
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; Balbinot Junior et al. 2015Balbinot Junior, A. A., Procópio, S. O., Debiasi, H., Franchini, J. C. e Panison, F. (2015). Semeadura cruzada em cultivares de soja com tipo de crescimento determinado. Semina: Ciências Agrárias, 36, 1215-1226. http://dx.doi.org/10.5433/1679-0359.2015v36n3p1215.
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), o aumento da densidade de plantas não resultou em aumento de produtividade.

Embora se tenha abordado principalmente na prática a possibilidade e os possíveis efeitos positivos de cultivos adensados, os resultados são muito divergentes, pois a avaliação exclusivamente visual por parte de técnicos e produtores não permite conclusões sólidas quanto à eficiência desse sistema de manejo. Não só apoiado em análises de desempenho agronômico, mas sob outro prisma, este trabalho demonstrou, através da dinâmica da RFA no dossel, por que o cultivo adensado da soja, ou seja, acima de 40 plantas∙m–2, não proporciona ganhos em produtividade e, de outro modo, pode onerar demasiadamente os custos de produção (Silva et al. 2015Silva, P. R. A., Tavares, L. A. F., Sousa, S. F. G., Correia, T. P. S. e Riquetti, N. B. (2015). Rentabilidade na semeadura cruzada da cultura da soja. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, 19, 293-297. http://dx.doi.org/10.1590/1807-1929/agriambi.v19n3p293-297.
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) em função do maior gasto de sementes, fertilizantes e defensivos agrícolas. Segundo Petter et al. (2012)Petter, F. A., Pacheco, L. P., Alcântara Neto, F. e Santos, G. G. (2012). Respostas de cultivares de soja à adubação nitrogenada tardia em solos de cerrado. Revista Caatinga, 25, 67-72., tanto o manejo adotado quanto as condições edafoclimáticas interferem na resposta da cultura da soja, as quais se encontram refletidas nos componentes de rendimento e produtividade.

CONCLUSÃO

As densidades de 20 e 30 plantas∙m–2 proporcionam os melhores resultados de eficiência de aproveitamento da radiação fotossinteticamente ativa. Nessas densidades, os valores de k evidenciam melhor qualidade de distribuição dessa radiação no perfil do dossel e, consequentemente, maior produtividade de grãos.

O estudo da dinâmica da radiação fotossinteticamente ativa subsidia informações que permitem inferir o efeito negativo de elevadas densidades de semeadura na cultura da soja.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Abr 2016
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    18 Set 2015
  • Aceito
    21 Nov 2015
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