Open-access Percepção de psicólogos da formação profissional e atendimento a pessoas com dor

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS  A dor é um fenômeno com dimensões biopsicossociais, por isto demanda um conhecimento especializado, sendo uma das demandas do psicólogo que atua na área da saúde. Esta pesquisa visou compreender os aspectos referentes a formação do psicólogo e papel no tratamento da pessoa com dor crônica.

MÉTODOS  Trata-se de uma pesquisa de campo exploratória e descritiva de natureza qualitativa. Para a coleta de dados foi utilizado um questionário aplicado de maneira online através do Google Forms. Participaram da pesquisa 10 psicólogos que atuam na área clínica, que foram selecionados por critério de conveniência. Os dados quantitativos foram analisados mediante estatística descritiva e, já os conteúdos qualitativos foram analisados através da análise de conteúdo.

RESULTADOS  Os psicólogos referem perceber uma carência de componentes curriculares relacionado à dor na graduação. A maioria dos participantes realizou cursos de especialização nesta área de atuação. Os participantes relataram que a motivação para atuar na área envolve a complexidade do fenômeno, a aquisição de conhecimentos de outras áreas e a obtenção de resultados positivos nos atendimentos. No contexto de tratamento, o psicólogo percebe-se com um papel importante na equipe multidisciplinar, contribuindo direta e indiretamente para o tratamento a partir do desenvolvimento de estratégias de enfrentamento e no manejo dos sintomas associados a esta condição. Dentre as intervenções relatadas, foram mencionadas técnicas de relaxamento, que auxilia o paciente a identificar aspectos que contribuam para a dor, reestrutura crenças disfuncionais e contribui para o desenvolvimento de estratégias mais efetivas para reduzir a dor e a incapacidade física, bem como o estresse associado a esta condição.

CONCLUSÃO  Dada a prevalência da dor crônica na população, os resultados sugerem que é necessário pensar formas de inserção deste conteúdo na graduação. Por outro lado, embora tenhamos um número reduzido de profissionais que atuam nesta área, esta prática parece ser efetiva e os profissionais satisfeitos com sua atuação.

Descritores:
Currículo; Dor crônica; Psicologia

DESTAQUES

A grade curricular dos cursos de graduação em psicologia carece de conteúdos específicos sobre dor

O déficit na formação durante a graduação contribui para o desconhecimento dos profissionais sobre as possibilidades de atuação do psicólogo nesta área

Psicólogos que atuam com dor crônica relatam buscar formação complementar sobre este tema em cursos de especialização, com ganhos significativos na efetividade do tratamento e acompanhamento psicológico do paciente

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES  Pain is a phenomenon with biopsychosocial dimensions, therefore it requires specialized knowledge, and represents one of the demands on the Psychologist who works in the health area. This study aims to understand the aspects related to the training and practice of the psychologist in the treatment of people with chronic pain.

METHODS  This is an exploratory and descriptive field of research of a qualitative nature. For data collection, a questionnaire applied online through Google Forms was used. Ten psychologists who work in the clinical area participated in the research. This is a convenience sample. Quantitative data were analyzed using descriptive statistics, while qualitative contents were analyzed through content analysis.

RESULTS  Psychologists reported a lack of curricular components related to pain in undergraduate courses. Most participants had taken specialized courses in this area of ​​activity. Participants reported that the motivation to work in the area involves the complexity of the phenomenon, the acquisition of knowledge from other areas and the achievement of positive results in the care provided. In the context of treatment, the psychologist's main role is to contribute to the patient's understanding of some aspects of pain, assist in the development of coping strategies and in the management of symptoms associated with this condition. Among the interventions offered, the psychologist uses relaxation techniques, which helps the patient to identify aspects that contribute to pain, restructures dysfunctional beliefs and contributes to the development of more effective strategies to reduce pain and physical disability, as well as the stress associated with this condition.

CONCLUSION  Given the prevalence of chronic pain in the population, the results found suggest that it is necessary to think about ways to include this content in undergraduate courses. On the other hand, although we have a small number of professionals working in this area, this practice seems to be effective, and the professionals are satisfied with their performance.

Keywords:
Chronic pain; Curriculum; Psychology

HIGHLIGHTS

The curriculum of undergraduate psychology courses lacks specific content on pain

The deficit during undergraduate studies contributes to the lack of knowledge among professionals about the possibilities for psychologists to work in this area

Psychologists who work with chronic pain report having to seek further training on this subject in specialization courses, with significant gains in the effectiveness of treatment and psychological monitoring of patients

INTRODUÇÃO

A dor é uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a uma lesão real ou potencial, ou descrita em tais termos1. Em 2020, a Associação Internacional para Estudos da Dor (IASP) revisou sua definição de dor para incorporar mais elementos que compõem a experiência singular deste fenômeno, ampliando a importância das dimensões psicossociais da dor2. A dor é um processo multifatorial, cuja sensação e percepção variam significativamente entre indivíduos. Essa variabilidade é influenciada por fatores biológicos, psicológicos e sociais3. Diante disto, o paciente com dor deveria ser tratado considerando estas várias dimensões, numa abordagem multidisciplinar que inclua o psicólogo.

Apesar da dor ser um problema bastante prevalente, muitos profissionais da saúde carecem de conhecimento adequado sobre o tema, o que pode impactar negativamente na oferta e eficácia do tratamento com o psicólogo4. Para ilustrar essa situação, cita-se dois estudos. O primeiro investigou o nível de conhecimento dos profissionais da saúde sobre dor e analgesia, concluindo que este é insuficiente ou reduzido5. O segundo estudo, realizado em uma faculdade privada de medicina no Maranhão, mostrou que 61% dos alunos não sabiam definir cuidados paliativos6. Esses dados são preocupantes, pois refletem a carência de uma formação adequada o que impacta no diagnóstico e tratamento de pessoas vivendo com dor crônica. Diante do déficit na formação sobre dor na área da saúde durante a graduação, muitos profissionais que pretendem atender nesta área buscam esta formação em especializações sobre dor7.

Na graduação em psicologia, o ensino sobre dor é ainda mais limitado, principalmente ao se considerar a necessidade de conteúdos que articulem teoria e prática, e estimule, uma atuação crítica e interdisciplinar, capaz de responder às complexas demandas psicossociais desse campo8. A falta de conteúdo específico na graduação em psicologia pode levar a consequências negativas na qualidade do atendimento aos pacientes com dor crônica, levando a dificuldades em identificar e compreender a dor do paciente comprometendo a qualidade do tratamento. Diversos aspectos contribuem para esse cenário, incluindo a falta de disciplinas específicas sobre o tema nos cursos de graduação e a inadequação das políticas públicas de saúde relacionadas ao manejo da dor9.

Todos os profissionais de saúde inevitavelmente atendem pacientes que são acometidos por dor. No entanto, as grades curriculares frequentemente priorizam determinadas áreas em detrimento de outras como o campo da dor, o que reforça a necessidade de sua inclusão de forma mais abrangente nos cursos de saúde. Assim, a revisão das matrizes curriculares é essencial para garantir uma formação adequada no tocante a compreensão, diagnóstico e tratamento da dor10,11.

Para os profissionais da psicologia é crucial estarem familiarizados com aspectos teóricos e intervenções baseadas em evidências empíricas para proporcionarem um tratamento eficaz aos pacientes com dor. Há uma proposta de diretrizes curriculares sobre dor para acadêmicos de graduação e pós-graduação em psicologia no Brasil11. Segundo este documento, a formação em dor para psicólogos deve abordar minimamente os aspectos a seguir:

  1. Natureza multidimensional da dor;

  2. Avaliação multidimensional da dor;

  3. Intervenções e manejo da dor;

  4. Pesquisa e aspectos éticos.

Estas diretrizes incluem temas como definição e classificação da dor, avaliação das dimensões sensorial, afetiva, cognitiva e social da dor, contemplar intervenções interdisciplinares e adesão, cuidados paliativos e direitos dos pacientes com dor, dentre outros11.

O psicólogo desempenha um papel essencial no atendimento do indivíduo com dor, oferecendo um lugar que além de ser acolhedor também será de validação e expressão das experiências que vão favorecer a criação de estratégia de enfrentamento. Os fatores referentes ao manejo da dor necessitam estar conectados à fala, às vivências e aos aspectos emocionais dos pacientes desde o diagnóstico, o curso e a evolução da dor, contribuindo para uma maior efetividade do tratamento e participação do paciente de forma ativa12,13.

O processo de psicoterapia não tem como objetivo eliminar a dor, mas sim reduzir o desconforto físico e emocional através do desenvolvimento de crenças funcionais e desconstrução de crenças disfuncionais, além de visar reduzir os sintomas de ansiedade, depressão e estresse, contribuindo, em última análise, para a redução da incapacidade física e funcional13.

Neste contexto, uma das possibilidades de atuação do psicólogo é realizar uma avaliação psicológica, que quando realizada adequadamente auxilia a elucidar a presença de diversos aspectos nos fenômenos psicológicos e a fundamentar intervenções14,15. Esse processo de avaliação pode incluir testes, inventários, escalas e entrevistas, aplicados conforme sua necessidade.

Outro aspecto importante a ser trabalhado é a psicoeducação do paciente. Esta intervenção consiste em oferecer informações adequadas ao paciente sobre sua condição clínica, curso da doença, possibilidades de tratamento, estratégias farmacológicas e não farmacológicas de tratamento. Esse tipo de intervenção pode contribuir para a autonomia do paciente, promovendo autoconhecimento da dor, prevenção, conscientização e adesão ao tratamento. Embora os objetivos da intervenção psicológica e técnicas utilizados possam variar bastante entre psicólogos11,13, sua abordagem deve, além das especificidades de cada paciente, estar centrada nas evidências existentes na literatura dos fatores mediadores, e moderadores de dor, incapacidade física e sofrimento psíquico.

Diante das inúmeras possibilidades de formação teórica e epistemológicas, da ampla variedade de técnicas aliado a um déficit de formação e um número reduzido de psicólogos que atuam nesta área, o objetivo desta pesquisa foi compreender a percepção de psicólogos sobre sua formação e a atuação do psicólogo no atendimento da pessoa com dor crônica.

MÉTODOS

O presente estudo adotou uma abordagem de pesquisa exploratória e descritiva de natureza qualitativa visando a compreensão da percepção dos participantes16. A pesquisa exploratória e descritiva tem como propósito explorar um fenômeno ou objeto de estudo sem inferir suas causas ou consequências17,18.

Participaram desta pesquisa 10 psicólogos clínicos que atuam nesta área no Brasil. O critério de inclusão para participação na pesquisa foi estar registrado no Conselho Regional de Psicologia e ter disponibilidade para participar do estudo. Trata-se de uma amostra de conveniência, e conforme a literatura em estudos desta natureza, não é necessário um número muito grande de sujeitos, pois a partir de 10 participantes os dados tendem a saturar19.

Os psicólogos participantes obtiveram informações sobre a pesquisa e foram convidados a participar da mesma através de um convite feito em dois grupos de redes sociais de psicólogos associados a Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor ou que atuam nesta área.

A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário online, utilizando a ferramenta Google Forms. O questionário continha 16 perguntas, sendo 12 abertas e 4 fechadas. As opções de respostas fechadas eram respondidas através de “sim” ou “não”, “insuficiente”, “razoável”, “bom”, “ótimo” ou respondidas numa escala likert de zero a dez. As respostas abertas permitiam descrições detalhadas, sem limite de caracteres definido.

Os dados quantitativos foram categorizados e agrupados de acordo com a frequência das respostas20. Para a análise dos dados qualitativos, foi utilizada a análise de conteúdo de Bardin21, conduzida em três etapas: Pré-Análise, Categorização e Interpretação dos resultados, seguindo uma abordagem lógica que relaciona as proposições analisadas com outras já aceitas como verdadeiras22.

A presente pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (parecer 6.802.625), sendo realizada segundo os preceitos éticos preconizados para pesquisas com seres humanos. Após a submissão do artigo os participantes receberam um e-mail contendo este material.

RESULTADOS

A amostra do estudo foi composta por 10 participantes residentes nas regiões centro-oeste, sudeste e sul. Sete dentre os 10 participantes possuem pós-graduação em dor. A amostra contou com cinco participantes do sexo feminino e cinco do sexo masculino. Estes profissionais atendem em média de 15 pacientes por semana, que possuem dor crônica.

Construção das categorias e subcategorias

A análise dos dados resultou em quatro categorias e nove subcategorias conforme apresentado na Tabela 1.

Tabela 1
Descrição das categorias e subcategorias.

Os conteúdos referentes às falas dos participantes da pesquisa foram representados por “P”, de psicólogo, seguido de um número de 1 a 10, atribuído a cada participante da pesquisa.

Categoria formação do psicólogo

A primeira subcategoria que emergiu diz respeito à Formação durante a graduação e remete à importância do conteúdo sobre dor ainda na graduação. No entanto, confirma-se a ausência deste conteúdo na maior parte dos cursos de graduação. Dentre os participantes, oito não tiveram disciplinas que abordassem o tema dor durante a graduação. Em contrapartida, sete participantes julgam ser importante ter contato com este conteúdo durante a graduação.

A segunda subcategoria, Formação Adicional, reflete a procura pelo conhecimento sobre dor após a graduação. Neste sentido, sete participantes relataram ter realizado uma pós-graduação na área da dor. Dentre esses, cinco avaliaram seus conhecimentos relacionados ao tema dor como sendo bom.

A subcategoria Conteúdos relevantes na Formação para a atuação nesta área abarca os conteúdos relacionados ao tratamento da dor que são considerados relevantes pelos psicólogos e que deveriam estar contemplados na formação do psicólogo. Foi possível perceber que o domínio de conteúdo como os descritos pelo P10 são “rapport, técnicas de entrevista, trabalhos interdisciplinares” são relevantes para muitos profissionais. Pode-se perceber isto na fala de P6 que salienta que o conhecimento do “Modelo biopsicossocial, aspectos mais essenciais da neurofisiologia da dor, psicoeducação em dor, estratégias de intervenção mais básicas da psicologia da dor” são fundamentais para a compreensão da dor. P3 destaca ainda as “estratégias de enfrentamento, técnicas de relaxamento e técnicas cognitivo comportamentais para manejo e ressignificação de pensamentos e atitudes, uso de escalas específicas”.

Na categoria Motivação para atuar na área foi possível perceber diferentes aspectos que motivam os profissionais a atuarem nesta. P1 refere que o que o motiva são “os resultados”, já para P2 é “a complexidade, tendo em vista que não é possível tratar a dor crônica sem um conhecimento amplo de diversas áreas e a possibilidade de trabalhar em equipe”, e para P7, o que motiva um profissional da psicologia a trabalhar com dor crônica é “contribuir para o bem-estar e alívio do sofrimento de outro ser humano.” Portanto, como foi descrito pelos participantes, os fatores motivadores para atuar nessa área são a possibilidade de alcançar bons resultados e a aquisição de conhecimento em diversas áreas.

Categoria intervenções realizadas

Nesta categoria, uma subcategoria identificada diz respeito ao Papel do Psicólogo no tratamento da dor. Na visão de P6 o psicólogo deve “ajudar a pessoa ter uma vida mais ativa, identificar seus principais valores, reconhecer os principais desafios atuais e buscar alternativas viáveis para enfrentar obstáculos da dor”. Para P2 o “conhecimento na área de dor pode ajudar em todas as fases do tratamento, desde auxiliar o paciente a encontrar um médico especialista até nos processos de mudança de comportamento”. Estes relatos evidenciam o papel do psicólogo tanto no apoio direto ao paciente quanto na mediação e encaminhamento a profissionais de saúde de outras áreas. O psicólogo ainda tem como papel auxiliar o paciente a compreender os aspectos que podem contribuir para a dor e incapacidade física, sobre seus valores e crenças, a enfrentar os desafios que a dor proporciona, bem como, promover mudanças de comportamento que são necessárias para uma melhor qualidade de vida3,13,23.

Ainda nessa subcategoria, muitos participantes descreveram alguns aspectos a serem trabalhados ou as principais atividades desenvolvidas por estes profissionais. Para P8, a “Escuta, intervenção” são aspectos fundamentais do processo. E as atividades a serem desenvolvidas são como as que P3 descreveu o “acompanhamento, orientação, psicoeducação em termos de estratégias de enfrentamento; técnicas de relaxamento; ressignificação de pensamentos/atitudes; monitoramento por escalas específicas,” pode-se também buscar “entender a melhor o sofrimento associado” como descreveu P4.

A subcategoria Técnicas e estratégias se refere à importância da avaliação psicológica no tratamento da dor e quais são as técnicas e ferramentas mais utilizadas nesse processo. Quando os participantes foram indagados sobre a importância desta prática, em uma escala de zero a dez sobre a importância, oito participantes atribuíram 10, refletindo o papel essencial desta atividade em intervenções psicológicas em pacientes com dor crônica. Através da avaliação psicológica, prática baseada no método científico, que conta com diferentes recursos, é possível identificar elementos que estão contribuindo, mantendo ou modulando o quadro de dor15-29. Com a avaliação, será possível então determinar o caminho do tratamento e a tomada de decisões durante o percurso da psicoterapia. Isto pode ser percebido na fala de P2 quando este refere que a “Avaliação psicológica, aplicação de escalas e instrumentos, verificação de crenças distorcidas, treino de habilidades, manejo de sintomas...” podem ser utilizadas como técnicas e estratégias psicológicas no tratamento da dor crônica.

Outra estratégia citada pelos participantes foi a psicoeducação. Esta intervenção consiste em oferecer informações ao paciente que permitem a este compreender melhor sua doença, os mecanismos de ativação e a importância de desenvolver estratégias mais ativas no tratamento. Neste sentido, P7 expõe que “uma das técnicas utilizadas é a psicoeducação no tratamento”. A psicoeducação tem despontado nos últimos anos como uma prática efetiva realizada por vários profissionais de saúde com bons resultados na mudança de comportamentos13,30.

Como última subcategoria, os Resultados esperados descrevem os principais resultados esperados pelo psicoterapeuta. Para P10 é “que o enfrentamento seja positivo, que a dor não seja o centro da sua vida, que o paciente minimamente consiga desenvolver suas atividades profissionais e ou de vida diária, os resultados e objetivos são organizadas caso a caso junto com o paciente, respondendo as suas expectativas”, já P1 destaca que é a “melhoria da qualidade de vida”, como também para P2 que descreve que a “dor não deve ser um fator impeditivo para o paciente viver”.

Categoria desafios e barreiras

Esta categoria possui duas subcategorias. Na primeira, Barreiras para o acesso ao tratamento , cinco participantes citaram o alto custo financeiro como obstáculo para o acesso ao tratamento, seguido de falta de conhecimento dos profissionais da psicologia sobre como tratar pacientes que possuem dor crônica, mencionado por alguns psicólogos. Este conteúdo pode ser percebido na fala de P3 “custo do psicólogo; dificuldade de achar um psicólogo que conheça o mínimo de dor crônica”.

A outra subcategoria emergente aborda os Desafios no tratamento e reflete os impasses e desafios que podem ocorrer durante a intervenção psicológica. Destacam-se a falta de apoio, de tratamento interdisciplinar, como referido por P8 e características do paciente como catastrofização da dor, expectativas irreais e baixa adesão, referidos por P2 e P9. P2 acrescenta ainda “baixa qualificação dos profissionais envolvidos”.

DISCUSSÃO

As diretrizes curriculares da psicologia descritas no Art. 10 da Resolução CNE/CES N°1 descrevem as ênfases curriculares para o curso de Psicologia, incorporando um conjunto de processos, a saber, o processo de prevenção, os processos de promoção da saúde e bem-estar, processos clínicos, dentre outros25. Levando isso em consideração, fica evidente que, por mais que o processo saúde-doença seja contemplado em diversas disciplinas, o que se vê na prática é a inexistência de disciplinas e/ou conteúdos relacionados à dor, bem como sobre cuidados paliativos. Se, por um lado, isto é compreensível, uma vez que o tema dor é uma especificidade, o tema deveria pelo menos ser apresentado aos alunos na graduação.

Essa ausência do conhecimento sobre dor na graduação pode ter um resultado negativo no interesse pelo tema. Diversas razões contribuem para esse cenário, incluindo a falta de disciplinas específicas sobre o tema nos cursos de graduação e a inadequação das políticas públicas de saúde relacionadas ao manejo da dor8. Assim, a ausência dessas disciplinas pode comprometer a qualidade e eficácia do atendimento. Portanto, faz-se necessário que os futuros profissionais da psicologia estejam minimamente preparados para lidar com pacientes que possuem dor aguda ou crônica, levando em consideração todos os aspectos descritos anteriormente11.

Diante deste cenário, a Sociedade Brasileira Para Estudo da Dor sugere que a criação de ligas da dor pode suprir esta falta de contato com o conteúdo referente a dor durante a graduação, e estimula a criação destas ligas como um recurso importante para a sensibilização do aluno sobre este tema, podendo ser também um fator motivador para a busca de mais conhecimento e compreensão do tema25.

O déficit percebido na formação durante a graduação é superado através de cursos de especialização. Isto também ocorre em outras áreas como a avaliação psicológica, por exemplo. As diretrizes curriculares preconizam a abordagem de alguns conteúdos, mas, em geral, os currículos são generalistas26 e defende-se a ideia de que cursos de especialização em avaliação psicológica não deveriam suprir tal deficiência, mas aprofundar conhecimentos previamente adquiridos27. Segundo autor de referência10, a grade da graduação em algumas universidades prioriza algumas disciplinas em detrimento de outras, o que sempre gera um déficit em alguma área de formação. Por conta disso, o profissional recém-formado sente a necessidade de buscar especializações suprir déficits específicos. Felizmente, no Brasil, cursos de especialização em dor estão disponíveis há mais de uma década.

Diante da multidimensionalidade da dor, é necessário que o profissional que se disponha a atuar nesta área deva ter um conhecimento vasto, que deve contemplar desde aspectos biológicos, como mecanismos da dor, fisiopatologia, bem como técnicas farmacológicas e não farmacológicas. Associado a estes conhecimentos, a compreensão da teoria e das técnicas da terapia cognitivo-comportamental podem auxiliar no manejo do estresse e desafios impostos pela dor, auxiliar na mudança de pensamentos e atitudes que sustentam a intensidade da dor, capacidade funcional e estresse, dentre outros aspectos13,23.

Quanto a categoria relacionada à motivação para atuar na área, percebe-se que a motivação é influenciada por vários fatores. Quando é por influência interna, faz o indivíduo agir, sendo assim, precisa estar relacionada a situações especificas28, como as falas dos participantes, quando citam que os resultados, o trabalho em equipe e a contribuição do bem-estar dos pacientes são apontados como os principais fatores motivadores.

No que se refere a categoria de intervenções realizadas no tratamento de pessoas que vivem com dor, há evidências de que o processo de terapia não tem como objetivo primário eliminar a dor e sim auxiliar no manejo dos sintomas, podendo até resultar em diminuição do desconforto e uso de fármacos, contribuindo com o desenvolvimento da autoeficácia do paciente, incentivando-o à realização das atividades do dia a dia, visando aumentar sua capacidade funcional13-27. Pode-se perceber que de certa forma a descrição do papel do psicólogo descrita apresentada pelos participantes está em consonância com a literatura especializada.

Ainda nesta categoria, foi possível identificar outras formas de intervenção, como o relaxamento, as técnicas para trabalhar crenças disfuncionais e a compreensão da doença. O relaxamento possui como objetivo a diminuição da ansiedade e da dor, sendo o relaxamento progressivo uma técnica utilizada com frequência no tratamento da dor13,23. Todavia existem diferentes técnicas de relaxamento, cabendo ao profissional identificar a mais adequada as necessidades e estilo do paciente.

Dentre as abordagens psicoterapêuticas para pacientes com dor, destaca-se a terapia cognitivo-comportamental que tem dentre seus objetivos promover a mudança de crenças disfuncionais e de comportamentos, práticas de relaxamento e meditação e ativação de reforçadores30. Estes aspectos podem contribuir para o manejo da dor, redução da intensidade, aumento de capacidade funcional e redução de sofrimento11,13, o que pode explicar a preferência de muitos profissionais por esta abordagem teórica.

Ainda nesta categoria, no tocante aos resultados das intervenções, a psicoterapia ganhou visibilidade como proposta importante quando se pensa no cuidado integral da dor crônica. Como efeito, ao receberem acompanhamento psicológico os participantes passaram a reconhecer os fatores psicológicos, emocionais e familiares que causavam influência na intensidade da dor, bem como as experiências de vida e os traumas que impactam as suas condições, resultando numa melhor qualidade de vida13-27.

No que se refere a categoria barreiras e desafios, considerando que pacientes com dor possuem gastos referentes a fármacos e outros tratamentos, é importante pensar em formas de garantir acesso à psicoterapia, seja tanto através de propostas de valor social, quanto através de intervenções grupais ou pagas por convênios13,30. Embora o alto custo do tratamento do paciente com dor, seja um aspecto a ser considerado, é possível hipotetizar que os resultados ou benefícios deste tratamento ainda não sejam tão claros para o paciente e para outros profissionais de saúde.

Foi possível identificar uma grande gama de fatores que podem contribuir de forma deletéria para uma evolução pobre no tratamento. Embora estes aspectos possam aparecer como desafios no tratamento, é comum o psicólogo trabalhar estes elementos com o paciente durante o processo terapêutico. Oferecer apoio psicológico aos familiares que acompanham o processo de dor dos pacientes também poderia auxiliar nos tratamentos e tem sido um aspecto discutido na literatura que remete a necessidade de ampliar a intervenção sobre as dimensões sociais da dor14. É possível compreender que o tratamento interdisciplinar com apoio da família somados ao tratamento realizado pelo psicólogo é essencial para o manejo mais efetivo da dor e fatores associados a esta.

Limitações do estudo

Embora este estudo apresente limitações por se tratar de uma amostra de conveniência e em função do reduzido número de participantes, características comuns no método qualitativo, trata-se uma pesquisa inédita que investiga esta categoria profissional quanto a formação e atuação do psicólogo no atendimento de pacientes com dor. Seus achados oferecem informações que subsidiam repensar a formação profissional e a atuação do psicólogo diante desta população e demanda e pode motivar a realização de pesquisas futuras com outros profissionais que atuam nesta área.

É necessário aprimorar a formação sobre dor na área da saúde, especialmente na psicologia, na qual há um déficit no ensino desse tema. A especialização tem se destacado como o principal meio de capacitação nessa área. A inclusão do tema dor em disciplinas de Psicologia da Saúde e a criação de ligas interdisciplinares também são estratégias viáveis, embora pouco referidas pelos participantes.

CONCLUSÃO

A maioria dos participantes não teve contato com o conteúdo sobre dor durante a graduação, sendo necessário fazer especializações na área. A importância de uma formação que contemple aspectos biológicos, psicológicos e sociais, além do domínio de teorias e técnicas eficazes na compreensão e intervenção na dor foi descrita como determinante para uma atuação efetiva. Os participantes reconhecem a necessidade da participação ativa no tratamento com foco no acolhimento, validação e manejo dos aspectos psicológicos que influenciam a dor. A motivação do psicólogo para atuar nesta área envolve a percepção de bons resultados, a possibilidade de trabalhar de maneira multidisciplinar. Os psicólogos reconheceram sua importância na equipe multidisciplinar, contribuindo direta e indiretamente para o tratamento. Dentre os obstáculos e desafios, a comunicação entre a equipe parece ser o principal aspecto, bem como o reduzido número de psicólogos que atuam na área.

  • Fontes de fomento:
    não há.
  • Disponibilidade de dados
    Os dados que apoiam as descobertas deste estudo estão disponíveis com o autor correspondente mediante solicitação razoável.

Referências

  • 1 Kanematsu JS, Atanazio B, Cunha BF, Caetano LP, Arada DMY. Impacto da dor na qualidade de vida do paciente com dor crônica. Rev Med. 2022;101(3):e192586. http://doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v101i3e-192586
    » http://doi.org/10.11606/issn.1679-9836.v101i3e-192586
  • 2 DeSantana JM, Perissinotti DMN, Oliveira JO Jr, Correia LMF, Oliveira CM, Fonseca PRB. Definição de dor revisada após quatro décadas. Br J Pain. 2020;3(3):197-8.
  • 3 Almeida FF, Costa AL Jr, Pereira Doca V. Experiência de dor e variáveis psicossociais: o estado da arte no Brasil. Psicol Estud. 2021 [citado 2024 nov 5];18(2):1-15. https://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v18n2/v18n2a11.pdf?form=MG0AV3
    » https://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v18n2/v18n2a11.pdf?form=MG0AV3
  • 4 Guareschi NM, Dhein G, Reis C, Machry DS, Bennemann T. A formação em Psicologia e o profissional da Saúde para o SUS (Sistema Único de Saúde). Arq Bras Psicol. 2009;61(3):35-45.
  • 5 Ribeiro MCO, Costa IN, Ribeiro CJN, Nunes MS, Santos B, DeSantana JM. Conhecimento dos profissionais de saúde sobre dor e analgesia. Rev Dor. 2015;16(3):204-9.
  • 6 Braide CSL, Leal PDC, Souza MHSL. Avaliação do grau de conhecimento sobre cuidados paliativos e dor dos estudantes de medicina em uma faculdade particular de São Luís/MA. Rev Investig Biomed. 2019;10(3):207. http://doi.org/10.24863/rib.v10i3.314
    » http://doi.org/10.24863/rib.v10i3.314
  • 7 Signorini T, Ferretti F, Silva MEK. Práticas em psicologia na saúde pública: aproximando cenários e contextos. Psicologia. 2021;41(2):e194293. http://doi.org/10.1590/1982-3703003194293
    » http://doi.org/10.1590/1982-3703003194293
  • 8 Albanese L. Formação do psicólogo brasileiro: impasses e desafios. Rev INFAD Psicol. 2016;2(1):271. http://doi.org/10.17060/ijodaep.2016.n1.v2.149
    » http://doi.org/10.17060/ijodaep.2016.n1.v2.149
  • 9 Sardá JJ Jr. Desafios na educação em dor no Brasil: para onde vamos? Br J Pain. 2018;1(2):93.
  • 10 Borges-Andrade JE, Bittencourt Bastos AV, Abib Andery MAP, Lobo Guzzo RS, Araujo Trindade Z. Psicologia brasileira: uma análise de seu desenvolvimento. Univ Psicol. 2015;14(3):865-80. http://doi.org/10.11144/Javeriana.upsy14-3.pbua
    » http://doi.org/10.11144/Javeriana.upsy14-3.pbua
  • 11 Sardá JJ Jr, Perissinotti DMN, Ros MA, Siqueira JLD. Diretrizes curriculares de dor para psicólogos no Brasil. Br J Pain. 2019;2(1):61-6.
  • 12 Graner KM, Costa AL Jr, Rolim GS. Dor em oncologia: intervenções complementares e alternativas ao tratamento medicamentoso. Temas Psicol. 2010;18(2):345-55.
  • 13 Paludo ICP, Moré CLOO, Inácio AN. Dor crônica e possibilidades de intervenção no contexto da psicologia: revisão integrativa. Estud Pesqui Psicol. 2024;24:e77561. http://doi.org/10.12957/epp.2024.77561
    » http://doi.org/10.12957/epp.2024.77561
  • 14 Contatore OA, Barros NF, Durval MR, Barrio PCCC, Coutinho BD, Santos JA, Nascimento JL, Oliveira SL, Peres SMP. Uso, cuidado e política das práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde. Cien Saude Colet. 2015;20(10):3263-3273. http://doi.org/10.1590/1413-812320152010.00312015
    » http://doi.org/10.1590/1413-812320152010.00312015
  • 15 Schneider A, Marasca A, Dobrovolski T, Müller C, Bandeira D. Planejamento da avaliação psicológica: implicações para a prática e para a formação. SciELO Prep. 2020. http://doi.org/10.1590/SciELOPreprints.521
    » http://doi.org/10.1590/SciELOPreprints.521
  • 16 Günther H. Pesquisa qualitativa versus pesquisa quantitativa: esta é a questão? Psicol, Teor Pesqui. 2006;22(2):201-9. http://doi.org/10.1590/S0102-37722006000200010
    » http://doi.org/10.1590/S0102-37722006000200010
  • 17 Araújo VMB, Oliveira MS. Metodologia da pesquisa: guia para iniciantes. São Paulo: Atlas; 1997.
  • 18 Lakatos EM, Marconi MA. Metodologia científica. 4. ed. São Paulo: Atlas; 1992.
  • 19 Fontanella BJB, Luchesi BM, Saidel MGB, Ricas J, Turato ER, Melo DG. Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cad Saude Publica. 2011;27(2):388-94. http://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200020 PMid:21359475.
    » http://doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200020
  • 20 Shaughnessy JJ, Zechmeister EB, Zechmeister JS. Metodologia de pesquisa em psicologia. Porto Alegre: Artmed; 2012.
  • 21 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2016.
  • 22 Sousa JR, Santos SCM. Análise de conteúdo em pesquisa qualitativa. Rev Pesq Debate Educ. 2020;10(2):1396-416. http://doi.org/10.34019/2237-9444.2020.v10.31559
    » http://doi.org/10.34019/2237-9444.2020.v10.31559
  • 23 Perissinotti DMN, Sardá JJ Jr. Tratamentos psicológicos e dor. Diferentes técnicas e estratégias clínicas e suas aplicações: tratar o que, para que e como? In: Sardá JJ Jr, editor. Psicologia e dor. 1. ed. São Paulo: Editora dos Editores; 2019. p. 105-26. (vol. 1).
  • 24 Brasil. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CES nº 1, de 11 de outubro de 2023. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia. Diário Oficial da União; Brasília; 11 out. 2023. Seção 1.
  • 25 Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor. Ligas da dor [Internet]. São Paulo: SBED; 2024 [citado 2024 out 3]. https://www.sbed.org/materias.php?cd_secao=131&codant=&friurl=-Ligas-da-Dor-
    » https://www.sbed.org/materias.php?cd_secao=131&codant=&friurl=-Ligas-da-Dor-
  • 26 Santana FM, Sousa GA, Ribeiro MSS. Formação generalista: a percepção de egressos de Psicologia. Fractal. Fractal. 2022;34:e5887. http://doi.org/10.22409/1984-0292/2022/v34/5887
    » http://doi.org/10.22409/1984-0292/2022/v34/5887
  • 27 Gouveia VV. Formação em avaliação psicológica: situação, desafios e diretrizes. Psicologia. 2018;38(1):74-86. http://doi.org/10.1590/1982-3703000208641
    » http://doi.org/10.1590/1982-3703000208641
  • 28 Alves A Fo, Oliveira LB. A motivação dos profissionais de saúde das unidades básicas de saúde. Psicologia. 2014;34(4):984-1001.
  • 29 Sardá JJ Jr, Bobato ST, Cruz RM, Perissinotti DMN. Por que, quando e como realizar uma avaliação multiaxial, psicológica ou neuropsicológica do paciente com dor? Cad Psicol. 2024;4:1-19. http://doi.org/10.9788/CP2024.3-05
    » http://doi.org/10.9788/CP2024.3-05
  • 30 Sardá JJ Jr. Intervenções psicoeducativas e sua utilidade no panorama do tratamento da dor. In: Sardá JJ Jr, editor. Psicologia e dor. 1. ed. São Paulo: Editora dos Editores; 2019. p. 127-34. (vol. 1).

Editado por

Disponibilidade de dados

Os dados que apoiam as descobertas deste estudo estão disponíveis com o autor correspondente mediante solicitação razoável.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Dez 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    29 Nov 2024
  • Aceito
    08 Set 2025
Creative Common - by 4.0
Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/), que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que o trabalho original seja corretamente citado.
location_on
Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 937 Cj2 - Vila Mariana, CEP: 04014-012, São Paulo, SP - Brasil, Telefones: , (55) 11 5904-2881/3959 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: dor@dor.org.br
rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
Reportar erro