Resumo
O objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos das diferentes formas farmacêuticas contendo Butafosfan sob a produção de leite e o metabolismo de vacas leiteiras durante o pós-parto. A partir de ensaios in vitro e in vivo, duas formas farmacêuticas foram testadas em animais de produção. Trinta e seis vacas da raça Holandês, foram divididas aleatoriamente em três grupos: Grupo BUT (n=12), que recebeu solução aquosa de Butafosfan (150 mg mL-1); BUTSR (n=12), que recebeu uma formulação de liberação prolongada de Butafosfan (150 mg mL-1) e o Grupo CL (Controle; n=12), que recebeu solução fisiológica de cloreto de sódio. Todos os grupos, tiveram administração de três doses subcutâneas de 30 mL. A aplicação foi realizada no dia do parto (dia 0) e nos dias 3 e 7 após o parto. Amostras de sangue foram coletadas nos dias 0, 3, 7 e 10 para avaliação de parâmetros metabólitos e a produção de leite foi avaliada do dia 11 aos 60 dias pós-parto. O grupo BUTSR apresentou maior produção de leite (P=0.01), em comparação aos demais grupos. Observou-se que os grupos BUTSR e BUT apresentaram maiores níveis sanguíneos de cálcio (P=0.01) que os animais do grupo CL. O grupo BUTSR obteve maior produção de leite em comparação aos demais grupos, demonstrando que essa forma farmacêutica possui grande potencial, podendo ser uma alternativa para o mercado. Mais estudos são necessários para melhor compreender a ação do Butafosfan no metabolismo de vacas leiteiras no pós-parto recente.
Palavras-chave: Butafosfan; liberação prolongada; Gado Holandês
Abstract
The aim of this study was to evaluate the effects of different pharmaceutical forms of Butaphosphan on milk production and the metabolism in dairy cows during the postpartum period. After in vitro and pharmacokinetic assays, thirty-six multiparous cows belonging to the Holstein breed, were randomly divided into three groups: Group BUT (n=12), that received an aqueous solution of Butaphosphan (150 mg/mL); Group BUTSR (n=12), that received a sustained-release formulation of Butaphosphan (150 mg/mL) and Group Control (CL ; n=12), that received saline solution (NaCl 0.9 %). All the groups received three subcutaneous doses of 30 mL in the neck region, on the day of parturition (day 0) and 3 and 7 days after parturition. Blood samples were collected on days 0, 3, 7 and 10, postpartum. Daily milk production was evaluated from day 11 to 60, postpartum. The animals of the BUTSR group presented greater (P=0.01) milk production than the other groups. It was observed that the BUTSR and BUT groups showed higher blood levels of calcium (P=0.01) than the animals in the CL group. The BUTSR group obtained higher milk production compared to other groups, demonstrating that this pharmaceutical form has great potential for a future product and could be an alternative for the market. More studies are needed to better understand the action of Butaphosphan on the metabolism of dairy cows in the recent postpartum period.
Keywords: Butaphosphan; Sustained Release; Holstein Cow
1. Introdução
Durante o período de pós-parto recente, as vacas leiteiras possuem maiores requerimentos de energia para a produção de colostro e leite, bem como para sua própria mantença(1). No entanto, essa necessidade geralmente não é atendida adequadamente com a ingestão de matéria seca (IMS), resultando em um balanço energético negativo (BEN) (1).
Para atenuar o BEN e possivelmente prevenir possíveis distúrbios metabólicos, várias estratégias podem ser empregadas, incluindo a ingestão de suplementos à base de fósforo, administrados na forma oral ou injetado via subcutâneo ou intramuscular, que podem melhorar o metabolismo energético(2). O Butafosfan é um tipo de fósforo orgânico conhecido pela sua maior biodisponibilidade, do qual 100 mg fornece 17,3 mg de P na forma de 1-butilamino-1-metil ácido etilfosfórico(3,4). Sabe-se que o fósforo é extremamente importante para o organismo, sendo constituinte dos ácidos nucleicos da membrana plasmática, moléculas energéticas como adenosina trifosfato (ATP) e adenosina difosfato (ADP), além de ser crucial para a recuperação do equilíbrio energético e na homeostase mineral dos animais (5,6).
Em circunstâncias normais, múltiplas injeções são administradas devido à meia-vida relativamente curta do Butafosfan (2,7,8), tornando o protocolo inviável ao lidar com um grande número de animais. Devido a isso, novas estratégias foram desenvolvidas em relação ao uso desse composto, como as formulações de liberação sustentada definidas pela capacidade de liberar uma quantidade definida do princípio ativo em determinado intervalo de tempo. Essas formulações podem ser caracterizadas como hidrogéis, estruturas poliméricas tridimensionais, que formam micelas (9,10).
O presente estudo é o primeiro a administrar Butafosfan através de uma formulação de liberação sustentada (Butafosfan SR), biodegradável e que fornece às vacas leiteiras suporte energético semelhante ou melhor do que os protocolos múltiplas doses de Butafosfan associado à cianocobalamina, comumente utilizados (2). O objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos de diferentes formas farmacêuticas de Butafosfan em relação a produção de leite e metabolismo de vacas leiteiras durante o período pós-parto.
2. Materiais e método
Testes in vitro da formulação de liberação sustentada
Previamente, foram realizados testes in vitro da formulação de liberação sustentada. De acordo com as regulamentações de propriedade intelectual, a composição da formulação não será detalhada neste documento. As formulações foram preparadas de acordo com as Boas Práticas Farmacêuticas, utilizando insumos (adjuvantes, substâncias ativas e outros materiais) obtidos de fornecedores qualificados e certificados. Antes do estudo, testes in vitro foram realizados em triplicata para validar as formulações, incluindo teste de gelificação e perfil de liberação do fármaco.
A formulação de liberação sustentada é caracterizada por ser um hidrogel termossensível. Para esses testes, foi utilizada uma concentração de 150 mg mL-1 de Butafosfan. A temperatura de geleificação foi determinada pelo método chamado “inversão de tubo” (11,12). Para isso, alíquotas de 5 mL da formulação foram transferidas para tubos de ensaio, que foram colocados em um banho-maria com termostato de temperatura. Cada solução foi progressivamente submetida a um aumento de temperatura a uma taxa de 2 °C a cada 2 minutos, momento em que os tubos foram invertidos para observar o estado da formulação, se permanecia líquida ou se havia se tornado sólida. Quando a formulação parou de fluir, após a inversão do tubo e tornou-se sólida, a temperatura exibida no termostato foi registrada como temperatura de geleificação.
Um teste de liberação de Butafosfan também foi realizado ao longo de um período extenso de 120 horas, adicionando alíquotas de 5 mL da formulação em tubos de ensaio, que foram colocados em um banho-maria à 39 ºC com agitação (Visomes Plus), para que as formulações pudessem formar o hidrogel. Em seguida, 15 mL de tampão salino-fosfato (PBS) com pH 7,4 foram adicionados aos tubos de ensaio com a formulação, para mimetizar os fluidos corporais (12). Em seguida, a cada 24 horas, todo o meio foi removido e um novo meio foi adicionado, a quantidade de Butafosfan liberada no meio foi avaliada através de análise de absorbância por espectrofotometria UV (FEMTO 700 Plus), à 254 nm. Concomitantemente, 15 mL de PBS pré-aquecido (39°C) foi devolvido ao tubo de ensaio. A partir da análise das diferentes concentrações da solução, a curva de calibração foi construída. A concentração (x) e a área do pico (y) mostraram a seguinte equação linear: Y = 1715,1 X + 1,2387.
Testes in vivo da formulação de liberação sustentada
O estudo farmacocinético foi realizado no Centro de Pesquisa em Animais do Brasil, localizado no município de Amparo, Estado de São Paulo (22°40´59.3´S; 46°52´06.5´W). Foram utilizadas cinco vacas Holandesas com 116 a 404 DEL, 459 a 657 kg e idade de 2 a 6 anos. Antes de iniciar o estudo, os animais foram aclimatados por um período de 5 dias, durante os quais foram realizados exames clínicos diários. Se alguma anormalidade fosse observada nos animais durante este período, eles eram excluídos do estudo. Todos os animais tinham um escore de condição corporal (ECC) igual a 4, de acordo com a escala de 1 a 5 de Wildman et al., (13). Durante este período, não foram permitidos medicamentos ou vacinas.
Os animais receberam uma única aplicação da formulação de liberação sustentada na concentração de 10 mg/kg de Butafosfan, na região do pescoço, através da via subcutânea. Amostras de sangue (tubos Vaccutainer® contendo EDTA; 5 mL) foram coletadas através da veia mamária nos seguintes períodos: 0 hora (pré-tratamento), 4, 8, 16, 30 minutos e 2, 5, 8, 12, 24, 48, 72, 96, 120, 144, 168, 192 e 216 horas após a administração. Posteriormente, foi realizada centrifugação para obter o plasma, que foi armazenado refrigerado a -20 °C para análises posteriores.
As análises farmacocinéticas foram realizadas no laboratório LabFor - Análises Laboratoriais Ltda (Campinas, SP). A partir dos resultados referentes à análise cromatográfica, os seguintes parâmetros farmacocinéticos da formulação foram definidos: concentração plasmática máxima (Cmax), tempo para alcançar a concentração plasmática máxima (Tmax) e área sob a curva (AUC) da concentração plasmática versus tempo entre 0 e 96 horas (AUC0-96 h).
Estudo com vacas de produção
Animais e manejo. O Comitê de Ética em Experimentação Animal da Universidade Federal de Pelotas aprovou todos os procedimentos realizados neste estudo (4983-2017). O estudo foi realizado em uma das maiores fazendas leiteiras comerciais do sul do Rio Grande do Sul, (32,8°16’S, 52,8°32’W), Brasil, que possui 500 animais lactantes, com uma produção média de leite de 30 kg/dia.
Trinta e seis vacas Holandesas multíparas foram alocadas em um sistema Compost Barn e foram alimentadas com uma ração três vezes ao dia, acesso ad libitum à água e foram ordenhadas duas vezes ao dia. A ração foi formulada para atender aos requisitos nutricionais de acordo com o Nutrient Requirements of Dairy Cattle (NRC)(14) (Tabela 1), assumindo uma ingestão total diária de 25,1 kg de matéria seca, para média de produção de leite de 28,7 kg d-1. Todos os animais foram submetidos às mesmas condições de manejo e alimentação.
Ingredientes da dieta (%) de vacas leiteiras Holandesas recebendo suplementação de Butafosfan através de diferentes formulações durante o período pós-parto recente.
Logo após o parto, as vacas foram aleatoriamente designadas para um dos três grupos e o número de lactações (2-6 lactações) foi utilizado como critério de randomização: BUT (n=12), recebendo uma solução aquosa de Butafosfan (Butafosfan diluído em água para injetáveis); BUTSR (n=12), recebendo uma formulação de liberação sustentada de Butafosfan, e Controle (CL; n=12), recebendo solução salina (NaCl 0,9%). Em ambos os grupos tratados com o princípio ativo, foi utilizado 30 mL com 150 mg mL-1 de Butafosfan, em cada administração (BUT e BUTSR). A administração em cada grupo foi administrada por via subcutânea no pescoço no dia do parto (dia 0; dentro de 12 horas pós-parto), e nos dias 3 e 7 após o parto (após a ordenha matinal). Nenhum animal foi excluído durante a duração do experimento.
Coleta e análise. Amostras de sangue foram coletadas nos dias 0, 3, 7 e 10 após o parto, por punção da veia coccígea, utilizando um sistema Vaccutainer (BD Diagnostics, SP, Brasil). As amostras de sangue foram coletadas em dois tubos: um com fluoreto de sódio (4 mL vacuplast®, Zhejiang, China) para obtenção de plasma para a avaliação dos níveis de glicose; e outro com sílica (ativador de coágulo) (10 mL vaccuplast®, Shandong, China) para obtenção de soro para as demais análises bioquímicas.
Aproximadamente 60 minutos após a coleta, as amostras foram centrifugadas à 1800 g por 15 min. O plasma e o soro foram transferidos para tubo de microcentrífuga, identificados e criopreservados à -80 °C, até que as análises fossem realizadas.
As análises de ureia, albumina (ALB), proteínas plasmáticas totais (PPT), gama-glutamil transferase (GGT), aspartato aminotransferase (AST), cálcio, magnésio, fósforo e glicose foram realizadas utilizando reagentes Labtest (Labtest®, Lagoa Santa, MG, Brasil). A análise de ß-hidroxibutirato (BHB) foi realizada com o kit comercial da RANDOX Brasil Ltda (SP, Brasil). Todas as análises foram realizadas utilizando um analisador bioquímico automático Labmax Plenno (Labtest®, MG, Brasil). As concentrações de globulina foram determinadas subtraindo o resultado obtido para ALB do obtido para PPT(15). A avaliação da atividade da paraoxonase 1 foi realizada utilizando o protocolo descrito por Browne et al.(16).
A produção de leite foi registrada no momento da ordenha, diariamente a partir do 11º dia pós-parto (DPP) até o 60º DPP. Os dados relacionados à produção diária de leite foram registrados através do software IDEAGRI® Windows (DeLaval, MG, Brasil).
Análise estatística. Todos os dados foram analisados no programa estatístico JMP 14 (SAS Institute Inc., Cary, EUA, 2016), utilizando PROC MIXED, para avaliar grupo, dia e a interação (grupo x dia), utilizando o método de ANOVA com avaliação pós-hoc de Tukey-Krammer (P < 0,05). A estrutura de covariância utilizada foi aquela com o menor valor no critério de informação bayesiana. Todas as variáveis foram analisadas quanto à normalidade utilizando o método Shapiro-Wilk e apresentaram distribuição normal. Valores de P < 0,05 foram considerados significativos.
3. Resultados
Testes in vitro da formulação de liberação prolongada
A formulação de liberação prolongada apresentou uma temperatura de geleificação de 36 ºC. A liberação de Butafosfan ocorreu ao longo de 120 horas, com uma liberação de 73 mg, durante as primeiras 24 horas. O pico de liberação foi observado às 48 horas (92 mg; Figura 1).
Liberação in vitro de Butafosfan (750 mg) de uma formulação termossensível ao longo de 120 horas.
Testes in vivo da formulação de liberação prolongada
Os animais receberam uma única aplicação de uma formulação de liberação prolongada com uma concentração de 10 mg/kg de Butafosfan. Levou 2 horas para atingir a concentração máxima (Tmax) do princípio ativo (μg L-1) após a administração, com liberação ocorrendo ao longo de 24 horas. A concentração máxima (Cmax) foi de 13.600,00 µg L-1 e a área sob a curva (AUC) foi de 4.120.091,60 µg L-1.
Estudo com vacas de produção
Observou-se que as vacas do grupo BUTSR apresentaram uma produção de leite superior em 3,33 kg por dia-1 (43,41 ± 0,38 kg) em comparação aos animais do grupo CL (40,08 ± 0,39 kg), e em 1,81 kg por dia-1 em comparação ao grupo BUT (41,60 ± 0,37 kg), até o 60º dia pós-parto (P=0,001). Não foi observada diferença entre grupo*dia (P=0,99).
A concentração de cálcio sanguíneo foi maior nos animais dos grupos BUTSR (8,87 ± 0,29 mg/dL) e BUT (9,17 ± 0,29 mg/dL) em comparação ao grupo CL (7,82 ± 0,29 mg/dL) (P≤0,01; Figura 2a). Os grupos BUTSR (69,24 ± 2,43 mg/dL) e BUT (67,97 ± 2,36 mg/dL) apresentaram um valor médio de glicose menor em comparação ao grupo CL (79,05 ± 2,34 mg/dL; P≤0,01; Figura 2d). Os animais do grupo BUTSR tenderam a apresentar níveis mais altos de ALB (2,39 ± 0,04 g/dL) e ureia (30,68 ± 0,80 mg/dL) em relação aos animais do grupo CL (2,25 ± 0,04 g/ dL; 27,91 ± 0,78 mg/dL, respectivamente; P=0,05), mas não diferiram daqueles submetidos ao tratamento BUT (2,36 ± 0,04 g/dL; 29,49 ± 0,82 mg/dL, respectivamente; P=0,05) (Figura 2b e c). As concentrações séricas de outros metabólitos bioquímicos não diferiram entre os grupos (P>0,05, Tabela 2).
Médias (± erro médio padrão) dos parâmetros bioquímicos de vacas leiteiras Holandesas recebendo suplementação de Butafosfan via formulação de liberação prolongada ou solução aquosa, por via subcutânea, durante o período pós-parto recente.
Concentrações sanguíneas de a) cálcio (mg/dL), b) albumina (g/dL), c) ureia (mg/dL) e d) glicose (mg/dL) em vacas leiteiras Holandesas recebendo suplementação de Butafosfan por meio de diferentes formulações no dia 0 (parto), 3 e 7 pós-parto, por via subcutânea. BUTSR (n=12): animais recebendo 30 mL de Butafosfan SR (150 mg/mL de Butafosfan) por meio da plataforma de liberação prolongada; BUT (n=12): animal recebendo 30 mL de solução aquosa de Butafosfan (150 mg/mL de Butafosfan); CL (n=12): animais recebendo 30 mL de solução salina (sc., NaCl 0,9 %). SH: hipocalcemia subclínica.
4. Discussão
A suplementação de Butafosfan em rebanhos leiteiros, especialmente no período pós-parto, é uma alternativa para minimizar os problemas causados pelo déficit energético. No entanto, os protocolos de suplementação precisam ser simplificados com o objetivo de reduzir custos e manter o bem-estar animal. Portanto, no presente estudo, a formulação de liberação sustentada de Butafosfan mostrou-se promissora nos testes in vitro, demonstrando uma temperatura de geleificação adequada, já que a temperatura corporal dos animais normalmente é de 38 - 40 ºC (17) e a formulação passou do estado líquido para o estado de hidrogel em temperaturas ≥ 36 ºC.
Além disso, a formulação de liberação sustentada também mostrou liberação prolongada do princípio ativo por pelo menos 120 horas. De acordo com os resultados da análise farmacocinética, a formulação de liberação sustentada teve um tempo mais longo para atingir a concentração plasmática máxima (Tmax: 2 h), em comparação com os resultados de um estudo que analisou a administração de uma dose de Butafosfan em solução aquosa por via intramuscular e subcutânea em suínos (10 mg kg-1 de peso corporal) e apresentou absorção e eliminação mais rápida, com uma média de Tmax de 0,31h (7). Esses resultados são promissores, levando em consideração a necessidade de suplementação prolongada do princípio ativo em animais com alta demanda energética. Com isso, se decidiu analisar a eficácia dessa suplementação in vivo.
Os animais suplementados com BUTSR demonstraram uma maior produção de leite em comparação aos demais grupos (BUT e CL). Além disso, os animais suplementados com Butafosfan (grupos BUTSR e BUT) apresentaram uma maior produção de leite, níveis mais baixos de glicose e concentrações plasmáticas mais altas de cálcio em comparação com o grupo CL neste estudo. Notavelmente, a maior produção de leite observada foi provavelmente devido a suplementação prolongada do Butafosfan através da formulação de liberação sustentada.
Em outro estudo, utilizando Butafosfan em combinação com a cianocobalamina, foram administrados cerca de 6000 mg de Butafosfan com o mesmo número de administrações que no nosso estudo, totalizando 18.000 mg, obtendo um aumento de apenas 1,9 kg dia1 de leite em comparação ao grupo controle (18). No presente estudo, os animais do grupo BUTSR mostraram um aumento na produção de leite em comparação com os outros grupos do estudo, utilizando uma dose menor de Butafosfan do que o estudo de Kreipe et al. (18). Acredita-se que, como se trata de uma forma farmacêutica de liberação prolongada, o princípio ativo tenha mostrado uma maior biodisponibilidade em comparação com as outras formas farmacêuticas.
Sabe-se que a suplementação com Butafosfan pode ter favorecido a síntese de ATP e a fosforilação de vias metabólicas intermediárias, como a gliconeogênese e a glicólise, melhorando a síntese e utilização de glicose, resultando em aumento da produção de leite, como sugerido por outros autores (2,8,18).
Foi observada uma diminuição nos níveis de glicose em animais suplementados com Butafosfan, como evidenciado pela sua maior produção de leite, sendo a glicose conhecida como o principal precursor da lactose (19,20). Assim, as concentrações mais baixas de glicose registradas nos animais suplementados refletem seu maior uso na produção de lactose, o que, por sua vez, aumentou a entrada de água através do lúmen alveolar da glândula mamária e aumentou o volume de leite produzido (21).
No estudo de Nuber et al. (8), o uso de uma solução aquosa de Butafosfan aumentou as concentrações de glucagon durante o início da lactação. Foi observado no estudo de Weiller et al. (22), que o Butafosfan aumentou a glicose e interferiu na sinalização da insulina em ratos com restrição calórica, com os autores sugerindo que sua ação depende do estado energético do animal. Isso pode ter ocorrido neste estudo, no qual foi observada uma redução na glicose sanguínea, possivelmente aumentando o fornecimento para a glândula mamária e a produção de leite.
As vacas de alta produção têm maiores requisitos de minerais, principalmente fósforo e cálcio, para a síntese do colostro e do leite (23,24). De acordo com Emam et al. (25), as necessidades de cálcio podem aumentar em até 65% no início da lactação. No presente estudo, todos os animais apresentaram hipocalcemia subclínica (HS) no dia do parto (≤8,50 mg dL-1) (26). No entanto, os grupos suplementados com fósforo orgânico apresentaram níveis aumentados de cálcio, ao contrário do grupo CL, que continuou a apresentar HS ao longo do experimento.
Possivelmente, a suplementação de fósforo auxiliou na desmineralização óssea, cuja ativação requer a ligação do hormônio da paratireoide ao seu receptor no tecido ósseo, ativando a enzima adenilato ciclase, que sintetiza a partir do ATP o segundo mensageiro monofosfato de adenosina cíclico 3’,5’ (AMP cíclico) (27,28). Portanto, a maior disponibilidade de fósforo pode ter acelerado a formação desse segundo mensageiro, fazendo com que aumentasse os níveis de cálcio plasmático mais rapidamente do que no grupo CL
Em relação aos metabólitos, os níveis de ALB e ureia no grupo BUTSR tenderam a aumentar em comparação ao grupo CL, mas não diferiram do grupo BUT. Como esses dois metabólitos podem indicar o status de proteína (29,30), presume-se que esses animais aumentem o consumo de matéria seca, uma vez que o Butafosfan foi identificado como um composto orexigênico (31).
As concentrações plasmáticas de fósforo inorgânico permaneceram dentro da faixa de valores fisiológicos (1,29 - 2,58 mmol/L) (32), possivelmente porque o Butafosfan possui um metabolismo rápido e uma meia-vida curta de 116 minutos em vacas leiteiras (33). A nova formulação farmacêutica de liberação prolongada de Butafosfan demonstrou seu potencial, pois permitiu que os animais tratados apresentassem uma maior produção de leite em comparação com os outros grupos. Isso provavelmente ocorreu devido ao aumento da biodisponibilidade do princípio ativo no organismo.
5. Conclusão
Deste estudo, foi possível concluir que os animais do grupo BUTSR tiveram uma maior produção de leite em comparação aos demais grupos, demonstrando que essa forma farmacêutica tem um grande potencial para um futuro produto e poderia ser uma alternativa para o mercado. Além disso, os grupos BUTSR e BUT apresentaram níveis mais altos de cálcio e níveis mais baixos de glicose em comparação ao grupo CL. Mais estudos são necessários para entender melhor a ação do Butafosfan no metabolismo de vacas leiteiras no período pós-parto recente.
Agradecimentos
Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) pelo apoio financeiro, e à Granja 4 Irmãos pelo empréstimo dos animais.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
09 Set 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
21 Nov 2023 -
Aceito
18 Abr 2024 -
Publicado
20 Jul 2024