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HospitalElder Life Program na unidade de urgência e emergência de um hospital público universitário: um programa de intervenção multicomponente para prevenção de delirium1 1 O estudo faz parte do projeto de pesquisa “Implantação do Hospital Elder Life Program no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minhas Gerais”, que recebeu aprovação do Conselho de Pesquisa do Hospital e do Comitê de Ética da universidade (número do certificado: 15527819.2.0000.5149). Todos os procedimentos éticos foram cumpridos e os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resumo

Objetivo

Avaliar a viabilidade da implementação de uma adaptação do Hospital Elder Life Program (HELP) com a participação de cuidadores familiares em hospital público universitário.

Método

Estudo piloto descritivo exploratório desenvolvido com 30 pacientes internados e seus cuidadores. Os Formulários de Registro foram aplicados para identificar fatores de risco para delirium, selecionar protocolos de intervenção e acompanhar a implementação. Nível de satisfação dos participantes e barreiras para implementar o programa foram avaliados por meio de entrevistas qualitativas. Resultados secundários foram coletados dos prontuários médicos. Análise estatística descritiva foi realizada para caracterizar a amostra e análise de conteúdo foi usada para analisar dados qualitativos.

Resultados

A maioria dos pacientes era do sexo feminino (60%), com idade média de 74,3 anos, ensino fundamental incompleto (60%), viúvo/divorciado (56,7%) e morava com familiares (83,3%) em casa (93,3%). Haviam sido hospitalizados 56,7% no último ano e 93,3% tinham pelo menos um fator de risco para delirium. Assistência alimentar e reposição de líquidos foi o protocolo com maior adesão (96,2%) e orientação (76,5%) com menor. Os participantes ficaram satisfeitos e acreditam que o HELP contribuiu para melhorar os resultados dos pacientes. Os motivos para não realização da intervenção proposta estavam relacionados à estrutura ou organização hospitalar, ao paciente e ao acompanhante.

Conclusão

Nossos resultados sugerem que ter membros da família atuando como “voluntários” é uma estratégia viável para implementar o HELP. Essa estratégia pode promover sua implementação em hospitais públicos de países de baixa e média renda.

Palavras-chave:
Modelos de Atenção à Saúde; Cuidadores; Educação em saúde; Delírio; Idosos

Abstract

Objective

To evaluate the feasibility of implementing an adaptation of the Hospital Elder Life Program (HELP) with the participation of family caregivers in a public university hospital.

Method

Descriptive exploratory pilot study developed with 30 hospitalized patients and their caregivers. Registration Forms were applied to identify risk factors for delirium, to select intervention protocols, and track implementation. Participants' level of satisfaction and barriers to implementing the program were assessed through qualitative interviews. Secondary results were collected from medical records. Descriptive statistical analysis was performed to characterize the sample and content analysis was used to analyze qualitative data.

Results

Most patients were female (60%), with a mean age of 74.3 years, incomplete elementary school (60%), widowed/divorced (56.7%) and living with family members (83.3%) at home (93.3%). 56.7% had been hospitalized in the last year and 93.3% had at least one risk factor for delirium. Food assistance and fluid replacement was the protocol with the highest adherence (96.2%) and guidance (76.5%) with the lowest. Participants were satisfied and believe that HELP contributed to improving patient outcomes. The reasons for not performing the proposed intervention were related to the hospital structure or organization, the patient and the companion.

Conclusion

Our results suggest that having family members act as “volunteers” is a viable strategy to implement HELP. This strategy can promote its implementation in public hospitals in low and middle-income countries.

Keywords:
Healthcare Models; Caregivers; Health Education; Delirium; Elderly

Introdução

O delirium é um estado confusional agudo frequentemente observado em idosos hospitalizados e está fortemente associado a resultados adversos em curto e longo prazo (Marcantonio, 2017Marcantonio, E. R. (2017). Delirium in hospitalized older adults. The New England Journal of Medicine, 377(15), 1456-1466.; Oh et al., 2017Oh, S. E., Fong, T. G., Hshieh, T. T., & Inouye, S. K. (2017). Delirium in older persons: advances in diagnosis and treatment. Journal of the American Medical Association, 318(12), 1161-1174.). Está constantemente relacionado ao aumento do risco de morte, complicações hospitalares e tempo de permanência em todas as unidades de internação, como unidades geriátricas, unidades de terapia intensiva (UTI) e serviços de emergência (Inouye et al., 2014Inouye, S. K., Westendorp, R. G., & Saczynski, J. S. (2014). Delirium in elderly people. Lancet, 383(9920), 911-922.). É uma condição presente em até 30% dos idosos no serviços de emergência (Gower et al., 2012Gower, L. E. J., Gatewood, M. O., & Kang, C. S. (2012). Emergency department management of delirium in the elderly. Western Journal of Emergency Medicine: Integrating Emergency Care with Population Health, 13(2), 194-201.) e custa mais de US$ 164 bilhões (2011 USD) por ano nos Estados Unidos (Oh et al., 2017Oh, S. E., Fong, T. G., Hshieh, T. T., & Inouye, S. K. (2017). Delirium in older persons: advances in diagnosis and treatment. Journal of the American Medical Association, 318(12), 1161-1174.). O delirium está associado a um aumento substancial da mortalidade, 37% vs. 14% (com e sem delirium, respectivamente), e pode persistir por até 6 meses após a alta do serviço de emergência (Han et al., 2010Han, J. H., Shintani, A., Eden, S., Morandi, A., Solberg, L. M., Schnelle, J., Dittus, R. S., Storrow, A. B., & Ely, E. W. (2010). Delirium in the emergency department: an independent predictor of death within 6 months. Annals of Emergency Medicine, 56(3), 244-252.). Kennedy et al. (2014)Kennedy, M., Enander, R. A., Tadiri, S. P., Wolfe, R. E., Shapiro, N. I., & Marcantonio, E. R. (2014). Delirium risk prediction, healthcare use and mortality of elderly adults in the emergency department. JAGS, 62(3), 462-469. observaram um aumento no tempo de internação em uma mediana de 2 dias. Mesmo após a alta, é mais provável que esses pacientes tenham pior recuperação cognitiva e funcional, além de um maior risco de morte (Marcantonio, 2017Marcantonio, E. R. (2017). Delirium in hospitalized older adults. The New England Journal of Medicine, 377(15), 1456-1466.).

Kennedy et al. (2014)Kennedy, M., Enander, R. A., Tadiri, S. P., Wolfe, R. E., Shapiro, N. I., & Marcantonio, E. R. (2014). Delirium risk prediction, healthcare use and mortality of elderly adults in the emergency department. JAGS, 62(3), 462-469. definiram idade avançada, histórico de demência, ataque isquêmico transitório e acidente vascular cerebral isquêmico, taquipneia, suspeita de infecção e história de hemorragia intracraniana como fatores preditores de delirium nos serviços de emergência. Má visão e audição, múltiplas comorbidades, sintomas depressivos, além de exposição a fatores de risco ou precipitantes, como drogas psicoativas, dor e privação do sono, também estão envolvidos na etiologia do delirium (Marcantonio, 2017Marcantonio, E. R. (2017). Delirium in hospitalized older adults. The New England Journal of Medicine, 377(15), 1456-1466.; Inouye et al., 2014Inouye, S. K., Westendorp, R. G., & Saczynski, J. S. (2014). Delirium in elderly people. Lancet, 383(9920), 911-922.). O cuidado integrado direcionado aos fatores precipitantes modificáveis, com o apoio de uma equipe multidisciplinar e da família orientada, pode oferecer benefícios substanciais (Inouye et al., 2014Inouye, S. K., Westendorp, R. G., & Saczynski, J. S. (2014). Delirium in elderly people. Lancet, 383(9920), 911-922.; Marcantonio, 2017Marcantonio, E. R. (2017). Delirium in hospitalized older adults. The New England Journal of Medicine, 377(15), 1456-1466.).

O Hospital Elder Life Program (HELP), desenvolvido em 1993, é um dos primeiros programas de intervenção multicomponente para delirium (Inouye et al., 1999Inouye, S. K., Bogardus, S. T., Charpentier, P. A., Leo-Summers, L., Acampora, D., Holford, T. R., & Cooney, L. M. (1999). A multicomponent intervention to prevent delirium in hospitalized older patients. The New England Journal of Medicine, 340(9), 669-676.). Esse programa envolve intervenções que abordam seis fatores de risco previamente identificados para delirium e são implementadas por voluntários treinados por uma equipe interdisciplinar (Inouye et al., 1999Inouye, S. K., Bogardus, S. T., Charpentier, P. A., Leo-Summers, L., Acampora, D., Holford, T. R., & Cooney, L. M. (1999). A multicomponent intervention to prevent delirium in hospitalized older patients. The New England Journal of Medicine, 340(9), 669-676.). Além de melhorar a qualidade da assistência aos idosos, o HELP é eficaz na redução de delirium, quedas, custos, tempo de internação e ocorrência de institucionalização após a alta (Hshieh et al., 2018Hshieh, T. T., Yang, T., Gartaganis, S. L., Yue, J., & Inouye, S. K. (2018). Hospital Elder Life Program: systematic review and meta-analysis of effectiveness. The American Journal of Geriatric Psychiatry, 26(10), 1015-1033.). Uma avaliação abrangente do modelo HELP foi recentemente realizada por meio de uma revisão sistemática com metanálise (Hshieh et al., 2018Hshieh, T. T., Yang, T., Gartaganis, S. L., Yue, J., & Inouye, S. K. (2018). Hospital Elder Life Program: systematic review and meta-analysis of effectiveness. The American Journal of Geriatric Psychiatry, 26(10), 1015-1033.), que demonstrou redução significativa na incidência de delirium (razão de chances, em inglês, odds ratio [OR] = 0,47, intervalo de confiança de 95% [IC]: 0,37-0,59). A incidência de quedas no ambiente hospitalar diminuiu 42% entre os pacientes no grupo de intervenção (OR = 0,38, IC 95%: 0,35-0,95). A relação custo-efetividade dos cuidados diminuiu cerca de US$ 1.600 a US$ 3.800 nos custos hospitalares por paciente internado (Hshieh et al., 2018Hshieh, T. T., Yang, T., Gartaganis, S. L., Yue, J., & Inouye, S. K. (2018). Hospital Elder Life Program: systematic review and meta-analysis of effectiveness. The American Journal of Geriatric Psychiatry, 26(10), 1015-1033.). Também foram encontrados indícios na redução do tempo de hospitalização e nas taxas de institucionalização após a alta entre os participantes do HELP (Hshieh et al., 2018Hshieh, T. T., Yang, T., Gartaganis, S. L., Yue, J., & Inouye, S. K. (2018). Hospital Elder Life Program: systematic review and meta-analysis of effectiveness. The American Journal of Geriatric Psychiatry, 26(10), 1015-1033.).

O HELP foi replicado com sucesso em vários países e, atualmente, está empregado em mais de 200 hospitais em todo o mundo (Hshieh et al., 2018Hshieh, T. T., Yang, T., Gartaganis, S. L., Yue, J., & Inouye, S. K. (2018). Hospital Elder Life Program: systematic review and meta-analysis of effectiveness. The American Journal of Geriatric Psychiatry, 26(10), 1015-1033.). No entanto, a maioria dos estudos de adaptação do HELP foi realizada em países de alta renda, com características econômicas e culturais diferentes do Brasil e de outros países da América Latina.

Considerando o aumento do risco entre idosos hospitalizados, o alto custo dos cuidados e a natureza evitável do delirium, educar os membros da família pode trazer resultados positivos para pacientes e cuidadores (Carbone & Gugliucci, 2015Carbone, M. K., & Gugliucci, M. R. (2015). Delirium and the family caregiver: the need for evidence-based education interventions. The Gerontologist, 55(3), 345-352.). Um ensaio clínico randomizado recente realizado na China identificou que a realização do HELP com envolvimento familiar foi eficaz na redução do delirium pós-operatório em pacientes idosos após procedimento cirúrgico não cardíaco, mantendo ou melhorando sua função física e cognitiva e reduzindo o tempo de permanência (Wang et al., 2020Wang, Y. Y., Yue, J. R., Xie, D. M., Carter, P., Li, Q. L., Gartaganis, S. L., Chen, J., & Inouye, S. K. (2020). Effect of the tailored, family-involved Hospital Elder Life Program on postoperative delirium and function in older adults: a randomized clinical trial. JAMA Internal Medicine, 180(1), 17-25.). O HELP foi adaptado às circunstâncias locais na China e demonstrou eficácia no sistema de saúde chinês. No entanto, ainda não foi realizado um estudo investigando as adaptações do HELP em países da América Latina.

O objetivo do presente estudo foi avaliar a viabilidade da implementação de uma adaptação do Hospital Elder Life Program (HELP) com a participação de cuidadores familiares em uma Unidade de Urgência e Emergência (UUE) de um hospital público universitário. O engajamento dos cuidadores como voluntários do HELP pode ser uma estratégia para a implementação do programa em países de baixa e média renda, como os da América Latina.

Métodos

Este estudo piloto descritivo exploratório foi desenvolvido na UUE de um hospital geral público e universitário com 504 leitos no Brasil. Os dados foram coletados de junho a agosto de 2019. O estudo recebeu aprovação do conselho de pesquisa do hospital e do comitê de ética da universidade (número do certificado: 15527819.2.0000.5149). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Participantes

Cerca de 15% dos 56 leitos na UUE do hospital são ocupados por idosos, que passam, em média, de três a sete dias nesse departamento. Esse tempo de permanência é superior ao relatado no estudo de Kennedy et al. (2014)Kennedy, M., Enander, R. A., Tadiri, S. P., Wolfe, R. E., Shapiro, N. I., & Marcantonio, E. R. (2014). Delirium risk prediction, healthcare use and mortality of elderly adults in the emergency department. JAGS, 62(3), 462-469., o que reflete na falta de leitos para admissão em outras unidades públicas. Como consequência, observa-se uma superlotação na UUE, com a ocorrência de numerosos distúrbios e estresse frequente.

Como fatores de inclusão, foram considerados:

  • presença de pelo menos um fator de risco específico para delirium (problema de memória, necessidade de assistência no autocuidado nas últimas 24 horas e/ou confusão mental durante uma hospitalização ou doença anterior) identificado por meio de autorrelato ou relato do cuidador;

  • presença de um acompanhante (membro da família ou um cuidador) na admissão na UUE com abordagem pela equipe de pesquisa nas primeiras 24 horas. Os cuidadores deveriam ter 18 anos ou mais, saber ler e escrever em português e fornecer consentimento informado por escrito.

Como fatores de exclusão foram considerados idosos que receberam alta precoce ou transferência para outros setores do hospital dentro das 24 horas iniciais da admissão, presença de incapacidade para se comunicar verbalmente (por exemplo, afasia grave, demência profunda, coma ou ventilação mecânica), estar em cuidados paliativos, apresentar delirium na admissão e manifestação de recusa pelo paciente ou pelo cuidador.

Procedimentos de intervenção

A estratégia de intervenção para este estudo é uma adaptação do HELP (HELP, © 1999 Sharon K. Inouye) e do programa HELP adaptado para o envolvimento de familiares (Rosenbloom-Brunton et al., 2010Rosenbloom-Brunton, D. A., Henneman, E. A., & Inouye, S. K. (2010). Feasibility of family participation in a delirium prevention program for the older hospitalized adult. Journal of Gerontological Nursing, 36(9), 22-35.) a ser realizada no ambiente da UUE. Este estudo adaptou os referidos protocolos HELP para um contexto de UUE no Brasil e para a implementação das intervenções pelos cuidadores familiares. Os protocolos do HELP implementados por familiares treinados foram: orientação, atividades terapêuticas, mobilização precoce, aprimoramento do sono, protocolo de audição e visão, assistência alimentar e reposição de líquidos (Inouye et al., 1999Inouye, S. K., Bogardus, S. T., Charpentier, P. A., Leo-Summers, L., Acampora, D., Holford, T. R., & Cooney, L. M. (1999). A multicomponent intervention to prevent delirium in hospitalized older patients. The New England Journal of Medicine, 340(9), 669-676.). Cada protocolo pode ter mais de uma intervenção recomendada para o paciente. A equipe interdisciplinar (geriatras, farmacêutico clínico, fonoaudiólogos, nutricionista, terapeuta ocupacional e fisioterapeuta) forneceu consultoria e apoio ao programa. Os residentes (um de terapia ocupacional [TO] e dois residentes de fisioterapia [FT]), previamente treinados no HELP, forneceram orientações ao cuidador. A avaliação, o planejamento e o treinamento dos cuidadores para o protocolo de mobilidade foram realizados pelos residentes de FT. Para todos os outros protocolos, o residente de TO forneceu as recomendações para intervenção e o treinamento dos cuidadores. Cartilhas sobre delirium, exercícios de mobilidade no leito e aprimoramento do sono foram desenvolvidas para ajudar os cuidadores no processo de treinamento. Os cuidadores receberam todo o material necessário para realizar as intervenções recomendadas. Óculos, amplificadores de som e dispositivos de auxilio, como andadores e bengalas, eram emprestados aos pacientes, se necessário.

Devido ao ambiente físico da UUE no referido hospital, as recomendações para cada protocolo foram adaptadas considerando o conjunto de atividades já realizadas pelos pacientes no hospital e os requisitos físicos das mesmas. Por exemplo, como, para a maioria dos pacientes, os banheiros estão localizados em pontos distantes do leito, cada ida ao banheiro envolve caminhar aproximadamente 50 metros.

Instrumentos aplicados

Após a admissão no estudo, os idosos e seus cuidadores foram entrevistados usando o Formulário de Registro do Participante, que foi traduzido e adaptado do Manual Organizacional e de Procedimentos do HELP (Hospital Elder Life Program, 1999Hospital Elder Life Program – HELP. (1999). Organizational and procedural manual: assessment and data collection forms. Recuperado em 5 de novembro de 2019, de https://www.hospitalelderlifeprogram.org/
https://www.hospitalelderlifeprogram.org...
). Esse formulário foi utilizado para identificar fatores de risco para delirium e selecionar os protocolos de intervenção apropriados. A avaliação abordou os seguintes tópicos: informações sociodemográficas; histórico médico passado e atual; dor utilizando a Escala Visual Analógica de Dor (Huskisson, 1974Huskisson, E. C. (1974). Measurement of pain. Lancet, 304(7889), 1127-1131.; Martinez et al., 2011Martinez, J. E., Grassi, D. C., & Marques, L. G. (2011). Análise da aplicabilidade de três instrumentos de avaliação de dor em distintas unidades de atendimento: ambulatório, enfermaria e urgência. Revista Brasileira de Reumatologia, 51(4), 304-308.), variando de 0 (sem dor) a 10 (dor intensa - máxima); deficiência visual, usando o teste de Jaeger; deficiência auditiva pelo teste Whisper (MacPhee et al., 1988MacPhee, G. J. A., Crowther, J. A., & McAlpine, C. H. (1988). A simple screening test for hearing impairment in elderly patients. Age and Ageing, 17(5), 347-351.; Labanca et al., 2017Labanca, L., Guimarães, F. S., Costa-Guarisco, L. P., Couto, E. A. B., & Gonçalves, D. U. (2017). Triagem auditiva em idosos: avaliação da acurácia e reprodutibilidade do teste do sussurro. Ciência & Saúde Coletiva, 22(11), 3589-3598.); estado nutricional; condição de sono; nível de desempenho nas atividades da vida diária há um mês atrás e no momento presente, usando o Índice de Katz (Katz et al., 1963Katz, S., Ford, A. B., & Maskowitz, R. W. (1963). Studies of illness in the aged. The index of ADL: a standardized measure of biological and psychosocial function. Journal of the American Medical Association, 185(12), 914-919.); nível de mobilidade, considerando um mês atrás e o momento presente; cognição, utilizando o Mini Exame do Estado Mental (Folstein et al., 1975Folstein, M. F., Folstein, S. E., & Mchugh, P. R. (1975). “Mini Mental State”: a practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. Journal of Psychiatric Research, 12(3), 189-198.; Brucki et al., 2003Brucki, S. M. D., Nitrini, R., Caramelli, P., Bertolucci, P. H. F., & Okamoto, I. H. (2003). Suggestions for utilization of the mini-mental state examination in Brazil. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, 61(3B), 777-781.); humor e comportamento; passatempos e atividades de interesse; e espiritualidade.

O Formulário de Registro de Intervenção foi utilizado para rastrear até que ponto o cuidador implementou as intervenções multicomponentes recomendadas. Nesse formulário, as recomendações eram feitas diariamente pelos membros da equipe de pesquisa. Os cuidadores foram incentivados a registrar a frequência da realização da intervenção, bem como os motivos para a não realização. Uma intervenção foi considerada “Realizada” se o paciente executasse todas as intervenções recomendadas pelo número recomendado de vezes. “Parcialmente realizada” indicou que o paciente fez algumas, mas não todas as intervenções do protocolo ou não realizou a intervenção pelo número recomendado de vezes. “Não realizada” indicou que o paciente não realizou nenhuma parte da intervenção recomendada. A realização das intervenções foi avaliada diariamente.

Os pesquisadores realizaram entrevistas semiestruturadas para entender o nível de satisfação do paciente e do cuidador com o HELP, os motivos da não adesão e as barreiras à implementação. O nível de satisfação foi avaliado uma vez antes da alta e os parâmetros de implementação foram coletados diariamente. O anonimato do entrevistado foi garantido para permitir a liberdade de expressão em relação às percepções sobre o HELP. A avaliação do nível de satisfação e todas as avaliações foram realizadas por membros da equipe de pesquisa que não tiveram nenhum papel na intervenção e estavam cegos à natureza do estudo.

Os resultados secundários (quedas e morte) foram coletados dos prontuários dos idosos que concordaram em participar do estudo. O Confusion Assessment Method (CAM) (Inouye et al., 1990Inouye, S. K., Van Dyck, C. H., Alessi, C. A., Balkin, S., Siegal, A. P., & Horwitz, R. I. (1990). Clarifying confusion: the confusion assessment method: a new method for detection of delirium. Annals of Internal Medicine, 113(12), 941-948.), traduzido para o português e validado para uso no Brasil (Fabbri et al., 2001Fabbri, R. M. A., Moreira, M. A., Garrido, R., & Almeida, O. P. (2001). Validity and reliability of the Portuguese version of the Confusion Assessment Method (CAM) for the detection of delirium in the elderly. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, 59(2A), 175-179.), foi empregado para confirmar o delirium em casos suspeitos e identificar casos em pacientes de alto risco (Marcantonio, 2017Marcantonio, E. R. (2017). Delirium in hospitalized older adults. The New England Journal of Medicine, 377(15), 1456-1466.).

Análise de dados

Foi realizada análise estatística descritiva para caracterizar a amostra em termos de variáveis sociodemográficas e adesão ao programa, além de percepções dos idosos e familiares/cuidadores em relação ao HELP. As variáveis contínuas foram expressas em média e desvio padrão (DP), bem como mediana e intervalo interquartil. As variáveis categoriais foram expressas em frequência e proporção absolutas.

A análise de conteúdo foi utilizada para os dados obtidos durante as entrevistas. O objetivo desse tipo de análise é compreender o pensamento do sujeito por meio do conteúdo expresso, a fim de obter indicadores relevantes para a inferência de conhecimentos relacionados à questão estudada (Bardin, 1977Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. São Paulo: Martins Fontes.). Na análise de conteúdo, utilizamos o método de dedução de frequência (por exemplo, repetições apresentadas no texto) e a análise de categorias temáticas (Bardin, 1977Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. São Paulo: Martins Fontes.). Esse processo consistiu em três etapas: 1) pré-análise do material pela equipe de pesquisa para identificar temas emergentes; 2) exploração do material que busca codificar os dados em categorias; e 3) a definição de critérios claros para a inclusão ou exclusão de elementos textuais em cada categoria e a codificação de todos os dados. Dois pesquisadores codificaram os dados independentemente. Não houve discordâncias entre os pesquisadores em relação à codificação. A interpretação dos dados incluiu a determinação de frequências para identificar a importância relativa de cada categoria para os participantes.

Resultados

Características do paciente e dos cuidadores

Durante o período de coleta de dados, 321 pacientes com 60 anos ou mais foram admitidos na UUE. Entre esses, 148 eram potencialmente elegíveis para inscrição no estudo. Trinta pacientes e seus cuidadores preencheram os critérios de elegibilidade e concordaram em participar. A idade e o sexo foram semelhantes entre os pacientes admitidos na UUE e aqueles incluídos no estudo (p>0,05). As características sociodemográficas, os principais problemas de saúde na admissão e os fatores de risco do paciente são mostrados na Tabela 1. A maioria dos pacientes (n=17; 56,7%) esteve internada nos últimos doze meses; desses indivíduos, nove (52,9%) foram hospitalizados mais de uma vez.

Tabela 1
Características sociodemográficas, principais problemas de saúde na admissão e fatores de risco dos pacientes. Belo Horizonte, MG, 2019.

A funcionalidade nas atividades de vida diária se apresentou de forma reduzida na admissão hospitalar quando comparada ao desempenho de um mês atrás, conforme dados descritos na Tabela 2.

Tabela 2
Frequência absoluta de independência/dependência de atividades de vida diária e status de mobilidade antes e após a hospitalização. Belo Horizonte, MG, 2019.

Além dos problemas funcionais e de mobilidade mostrados na Tabela 2, a maioria dos pacientes apresentava outros fatores de risco relacionados ao delirium, como comprometimento da visão (56,7%), comprometimento da visão e audição (30%) ou apenas comprometimento da audição (6,7%), declínio cognitivo (43,3%), falta de apetite (43,3%) e sono insuficiente em casa (30%) e/ou no hospital (40%). Alguns pacientes (36,7%) relataram sentimento de desânimo, tristeza ou desesperança no mês anterior e 23,3% relataram perda de interesse ou prazer em atividades anteriormente prazerosas. A maioria (96,7%) relatou que religião, fé ou espiritualidade era uma fonte de força e conforto para eles, sendo que 86,7% pertenciam a uma religião.

A maioria dos pacientes (n=18) recebeu alta da UUE para casa e os outros 12 foram transferidos para outra enfermaria do hospital. A permanência na UUE variou de 24 horas a 10 dias. Nenhum paciente apresentou eventos adversos, como delirium, quedas ou morte, durante a estadia na UUE. Cinco pacientes morreram durante a hospitalização e dois desenvolveram delirium hiperativo após a transferência para outras enfermarias.

Características dos cuidadores

Quarenta cuidadores de pacientes hospitalizados idosos registrados consentiram em participar do estudo. Portanto, alguns pacientes tiveram mais de um cuidador aplicando as intervenções. Em sua maioria, os cuidadores eram mulheres, filho(a) ou nora, com idade entre 18 e 40 anos. As características sociodemográficas dos cuidadores são mostradas na Tabela 3.

Tabela 3
Características sociodemográficas dos cuidadores. Belo Horizonte, MG, 2019.

Viabilidade das intervenções

As taxas de adesão foram calculadas com base em 85 formulários de registro de intervenção. O protocolo “assistência alimentar e reposição de líquidos” obteve maior adesão (96,2%), seguido de “mobilização precoce” (90,5%), “aprimoramento do sono” (81,8%), “audição e visão” (79,4%), “atividades terapêuticas” (77,6%) e “orientação” (76,5%). A Tabela 4 apresenta informações sobre a realização de cada protocolo e a frequência de recomendação das intervenções.

Tabela 4
Realização geral de cada protocolo e frequência de recomendação das intervenções. Belo Horizonte, MG, 2019.

A avaliação de satisfação do HELP respondida pelos pacientes e familiares ou cuidadores indicou que a maioria estava satisfeita (30,8%) ou muito satisfeita (69,2%) com o programa. Todos os participantes acreditavam que o HELP contribuiu durante a estadia na UUE. A maioria das intervenções foi concluída e os motivos para a não conclusão foram analisados em quatro categoriais temáticas: fatores do paciente, fatores dos acompanhantes, intervenção percebida como desnecessária ou sem importância e fatores relacionados à estrutura ou organização hospitalar.

Fatores do paciente

Os fatores dos pacientes envolveram a recusa, desânimo ou falta de interesse, estado clínico que limita a participação (sonolência, mal-estar e cansaço) e recomendação momentaneamente suspensa ou restrita pela equipe devido à piora do quadro clínico ou à necessidade de exame/procedimento.

Fatores do acompanhante

Fatores relacionados ao acompanhante consistiram nas manifestações de não oferta de atividade por parte dos cuidadores, fato que ocorreu sem justificativa detalhada ou em função de “esquecimento”. Outra situação relacionada a não oferta da atividade se vinculou à mudança de cuidadores e à falta de diretrizes para a implementação da assistência. Ocasionalmente, os cuidadores não transmitiam as informações e cartilhas ao outro que assumia o cuidado do paciente após a saída do primeiro cuidador.

Intervenção percebida como desnecessária ou sem importância

Essa categoria surgiu tanto entre os pacientes quanto entre seus familiares ou cuidadores. Embora o HELP tenha sido visto como um programa positivo, ocasionalmente algumas intervenções propostas foram percebidas como desnecessárias, uma vez que o paciente tinha a função preservada. Isso foi especialmente verdadeiro no que diz respeito a intervenções de comunicação orientadora e de promoção do sono. Outras vezes, a intervenção era percebida como sem importância pelos cuidadores, que não incentivavam o paciente a realizar determinada atividade ou a adotar determinado comportamento, como usar óculos.

Fatores relacionados à estrutura ou organização hospitalar

Duas subcategorias emergiram de fatores relacionados à estrutura ou organização hospitalar: a indisponibilidade de materiais para realização das intervenções e as atividades intensivas de cuidado que ocupavam o tempo livre e limitaram a implementação das intervenções propostas pela equipe HELP. Os materiais percebidos como indisponíveis foram: óculos, com efeito negativo no protocolo de audição e visão, e cobertores, com efeito negativo no protocolo de aprimoramento do sono. Além disso, as atividades de cuidados intensos muitas vezes impactam a realização das atividades terapêuticas e o protocolo de mobilização precoce.

Discussão

A maioria dos estudos de adaptação do HELP foi realizada em países desenvolvidos. Este é o primeiro estudo realizado em um país latino-americano e um dos poucos a incluir pacientes acompanhados por cuidadores familiares em intervenções preventivas para delirium. Os países de baixa e média renda têm problemas relacionados à captação de recursos para a implementação de programas, bem como ao recrutamento e treinamento de voluntários, especialmente em hospitais públicos. Os presentes resultados sugerem que os cuidadores podem servir como voluntários e essa estratégia pode ser viável para a implementação do HELP em países de baixa e média renda.

O Brasil é o quinto país mais populoso do mundo, com mais de 202 milhões de habitantes, e está entre aqueles com transições demográficas mais rápidas (United Nations, 2015United Nations – UN. (2015). World Population Prospects: The 2015 Revision. Recuperado em 8 de novembro de 2019, de https://population.un.org/wpp/
https://population.un.org/wpp/...
). A grande população idosa impõe novos e preocupantes desafios para o Brasil e para outros países de baixa e média renda. Para esse grupo populacional, os custos de saúde tendem a ser até três vezes maior do que para a população total (Garcez-Leme & Leme, 2014Garcez-Leme, L. E., & Leme, M. D. (2014). Costs of elderly health care in Brazil: challenges and strategies. MedicalExpress, 1(1), 3-8.; Veras & Oliveira, 2016Veras, R. P., & Oliveira, M. R. (2016). Linha de cuidado para o idoso: detalhando o modelo. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 19(6), 887-905.). Um estudo transversal, prospectivo, realizado com 200 pacientes idosos hospitalizados, atendidos no pronto-socorro de um hospital público de ensino de São Paulo, relatou a ocorrência de delirium em 56 desses pacientes (28%) nas primeiras 24 horas (Ohl et al., 2019Ohl, I. C. B., Chavaglia, S. R. R., Ohl, R. I. B., Lopes, M. C. B. T., Campanharo, C. R. V., Okuno, M. F. P., & Batista, R. E. A. (2019). Evaluation of delirium in aged patients assisted at emergency hospital service. Revista Brasileira de Enfermagem, 72(Suppl. 2), 161-168.). Tais circunstâncias enfatizam a importância da implementação do HELP no Brasil e em outros países em desenvolvimento.

Os resultados desse estudo revelaram taxas de adesão muito altas para todas as intervenções, o que é compatível com dados de outros locais onde o HELP foi implementado (Inouye et al., 2000Inouye, S. K., Bogardus Junior, S. T., Baker, D. I., Leo-Summers, L., & Cooney Junior, L. M. (2000). The Hospital Elder Life Program: a model of care to prevent cognitive and functional decline in older hospitalized patients. Journal of the American Geriatrics Society, 48(12), 1697-1706.).

No presente estudo, a assistência alimentar e reposição de líquidos foi o protocolo com maior adesão (96,2%). Além disso, observamos que o apetite empobrecido era um dos fatores de risco mais prevalentes na admissão (43,3%). Guyonnet & Rolland (2015)Guyonnet, S., & Rolland, Y. (2015). Screening for malnutrition in older people. Clinics in Geriatric Medicine, 31(3), 429-437. mostraram que o mau estado nutricional está associado a resultados negativos entre os idosos. Muitos fatores estão envolvidos no comprometimento do estado nutricional, como doenças crônicas, solidão, declínio na realização de atividades da vida diária, má dentição, polifarmácia, inatividade e pobreza (Guyonnet & Rolland, 2015Guyonnet, S., & Rolland, Y. (2015). Screening for malnutrition in older people. Clinics in Geriatric Medicine, 31(3), 429-437.). Portanto, a prevenção da desnutrição é importante para evitar complicações e morte na população idosa (Lorenzo et al., 2015Lorenzo, M. D., Eleonora, P., Alessandro, P., Anna, M. G., & Valeria, B. (2015). Malnutrition in the elderly. In C. R. Martin & V. R. Preedy (Eds.), Diet and nutrition in dementia and cognitive decline (pp. 211-222). London: Elsevier.).

Reduções no desempenho das atividades da vida diária e mobilidade foram encontradas na admissão à UUE em comparação com o mês anterior, na casa do paciente. A necessidade de assistência em relação ao autocuidado nas últimas 24 horas foi o fator de risco mais prevalente para delirium na admissão (93,3% dos pacientes). Uma mudança de contexto, como a que ocorre durante a hospitalização, altera pistas contextuais para agir e pode exercer um impacto negativo no engajamento dos idosos (Fritz & Cutchin, 2016Fritz, H., & Cutchin, M. P. (2016). Integrating the science of habit: opportunities for occupational therapy. OTJR, 36(2), 92-98.). No que diz respeito à mobilidade, as abordagens do paciente e do cuidador foram importantes para a realização deste protocolo. A mobilização precoce incluiu muitas recomendações personalizadas de atividades funcionais e teve uma baixa taxa “não realizada” (1,2%). Manter a deambulação, andando aproximadamente 50 metros três vezes por dia, é uma parte importante da prevenção do delirium. Portanto, estudos futuros devem esclarecer as distâncias que os pacientes percorrem durante a realização de atividades diárias nos contextos de UUE (Babine et al., 2019Babine, R. L., Hyrkäs, K. E., Mckenzie, C. G., & Wierman, H. R. (2019). Mobilizing older adults: a multi-site, exploratory and observational study on patients enrolled in the Hospital Elder Life Program (HELP). Geriatric Nursing, 40(3), 239-245.).

No entanto, enfrentamos barreiras à implementação de intervenções para os protocolos de audição e visão, aprimoramento do sono e orientação. A falta de familiaridade com a intervenção proposta, a orientação contrastando com os hábitos do paciente e da família e a funcionalidade relativamente preservada foram consideradas suficientes para os cuidadores e/ou pacientes recusarem certas intervenções recomendadas. Para lidar com esse problema, Fritz & Cutchin (2016)Fritz, H., & Cutchin, M. P. (2016). Integrating the science of habit: opportunities for occupational therapy. OTJR, 36(2), 92-98. recomendam considerar a natureza dos hábitos e ter conhecimento sobre os princípios de modificação de hábitos. A educação dos cuidadores sobre a importância das intervenções de prevenção ao delirium e o foco na mudança de atitudes são fundamentais. Os cuidadores também atribuíram a falta de adesão ao esquecimento e à necessidade de ajudar com outros aspectos do cuidado nas UUE.

A recusa do paciente também estava relacionada ao desânimo e à falta de interesse. Vale ressaltar que 36,7% dos pacientes relataram sentimentos de tristeza, desânimo ou desesperança e quase um quarto relatou perda de interesse ou prazer em atividades anteriormente prazerosas. Um estudo anterior realizado na região sul do Brasil relatou mais sentimentos de solidão e maior frequência de depressão entre idosos hospitalizados em comparação com aqueles que não foram hospitalizados (Gullich et al., 2016Gullich, I., Duro, S. M. S., & Cesar, J. A. (2016). Depression among the elderly: a population-based study in Southern Brazil. Revista Brasileira de Epidemiologia, 19(4), 691-701.). O mesmo estudo constatou que participar de atividades religiosas diminuiu o risco de depressão entre os participantes (Gullich et al., 2016Gullich, I., Duro, S. M. S., & Cesar, J. A. (2016). Depression among the elderly: a population-based study in Southern Brazil. Revista Brasileira de Epidemiologia, 19(4), 691-701.). A religiosidade serve como um importante fator psicossocial para a promoção da saúde mental, proporcionando esperança aos idosos, o que pode ajudá-los a superar doenças, incapacidades e problemas emocionais (Amorim et al., 2017Amorim, D. N. P., Silveira, C. M. L., Alves, V. P., Faleiros, V. P., & Vilaça, K. H. C. (2017). Associação da religiosidade com a capacidade funcional em idosos: uma revisão sistemática. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 20(5), 722-730.). Na presente amostra, religião, fé e/ou espiritualidade foram aspectos importantes e uma fonte de conforto. Considerando que a religião pode ser uma fonte significativa de estratégias de enfrentamento de problemas de saúde, especialmente mental (Vicente et al., 2018Vicente, A. R. T., Castro-Costa, E., Firmo, J. O. A., Lima-Costa, M. F., & Loyola Filho, A. I. (2018). Religiousness, social support and the use of antidepressants among the elderly: a population-based study. Ciência & Saúde Coletiva, 23(3), 963-971.), é possível que as atividades religiosas e espirituais sejam importantes atividades terapêuticas relacionadas ao HELP direcionadas à recuperação do paciente.

Os cuidadores eram predominantemente filhas/filhos ou mulheres que moravam com o paciente e possuíam maior escolaridade que o paciente. A maioria dos cuidadores concluiu o ensino médio, enquanto a maioria dos idosos era analfabeta ou possuía ensino fundamental incompleto. De fato, uma característica dos países em desenvolvimento é a possibilidade de os idosos compartilharem suas casas com seus filhos adultos e outros parentes. Além disso, as mulheres são geralmente as principais cuidadoras dos idosos. As famílias latino-americanas estão mais dispostas a fornecer apoio assistencial a idosos dependentes do que as famílias de outros países com renda alta ou média-alta (Lloyd-Sherlock et al., 2018Lloyd-Sherlock, P., Mayston, R., Acosta, A., Gallardo, S., Guerra, M., Sosa, A. L., de Oca, V. M., & Prince, M. (2018). Allocating family responsibilities for dependent older people in Mexico and Peru. The Journal of Development Studies, 54(4), 682-701.).

Este estudo tem algumas limitações que devem ser reconhecidas. Nosso objetivo foi descrever a viabilidade da implementação de uma adaptação do HELP em um contexto de UUE. Devido ao pequeno tamanho da amostra, não conseguimos analisar a eficácia do programa em comparação com outras estratégias de intervenção para a prevenção do delirium. Além disso, como o programa foi implementado em um único hospital afiliado a uma instituição acadêmica, nossas intervenções foram adaptadas e implementadas pelos residentes. Isso poderia constituir uma barreira de recursos em instituições sem esses estudantes, que precisariam encontrar alternativas para adaptar e treinar os cuidadores. No entanto, a intervenção é implementada pelos cuidadores, o que ajuda a reduzir os custos com a equipe assistencial a fim de fornecer uma abordagem potencialmente econômica, apesar da necessidade de uma equipe reduzida para conduzir o projeto. Isso pode ser um fator facilitador para a implementação do HELP em hospitais públicos de países de baixa e média renda. Por fim, devido às restrições do serviço, não foi possível executar uma implementação sistemática de três características do programa HELP (intervenções de enfermagem, revisão de medicamentos e rodadas interdisciplinares sistemáticas). Estudos futuros devem analisar quais recursos do programa HELP são essenciais para seu sucesso e a eficácia.

Conclusão

Este é o primeiro estudo a descrever a implementação do Hospital Elder Life Program (HELP) no Brasil. Neste estudo, ter os membros da família atuando como “voluntários” foi uma estratégia viável para a implementação do programa HELP. As taxas de adesão em todas as intervenções foram altas e semelhantes às relatadas em outros locais onde o HELP foi implementado. Os pacientes e seus cuidadores ficaram satisfeitos com o programa e declararam que o HELP contribuiu para melhorar os resultados dos pacientes durante o período de hospitalização.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer a contribuição dos participantes do estudo, bem como de todos os profissionais e alunos residentes que atenderam aos idosos hospitalizados no Hospital das Clínicas da UFMG em Belo Horizonte (MG), Brasil. Agradecemos especialmente ao Dr. Sharon K. Inouye por todo o apoio e sugestões para o manuscrito.

  • 1
    O estudo faz parte do projeto de pesquisa “Implantação do Hospital Elder Life Program no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minhas Gerais”, que recebeu aprovação do Conselho de Pesquisa do Hospital e do Comitê de Ética da universidade (número do certificado: 15527819.2.0000.5149). Todos os procedimentos éticos foram cumpridos e os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
  • Como citar: Assis, L. O., Pinto, A. C. S., Moraes, E. N., Cintra, M. T. G., & Bicalho, M. A. C. (2022). HospitalElder LifeProgram na unidade de urgência e emergência de um hospital público universitário: um programa de intervenção multicomponente para prevenção de delirium. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 30, e3064. https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO232830641
  • Fonte de Financiamento

    Pró-reitoria de Extensão – Universidade Federal de Minas Gerais (PROEX – UFMG): Programa de Bolsas de Extensão (PBEXT 2019) e Promoção de Bolsas de Estágio (GEP - CENEX-HC 2019).

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Editado por

Editora de seção

Profa. Dra. Luzia Iara Pfeifer

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    01 Jul 2021
  • Revisado
    23 Nov 2021
  • Revisado
    03 Mar 2022
  • Aceito
    08 Abr 2022
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