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The incomplete revolution: adapting to women's new roles

RESENHA

Clóvis Roberto Zimmermann

ESPING-ANDERSEN, Gøsta. The incomplete revolution: adapting to women's new roles. Cambridge: Polity Press, 2009, 214 p.

Esping-Andersen argumenta, em seu novo livro the incomplete revolution (2009), que o futuro social da Europa e dos EUA depende muito de como serão respondidos três grandes desafios do novo século, que ameaçam aumentar a desigualdade social: em primeiro lugar, como serão adaptadas as instituições ao novo papel das mulheres - a "revolução incompleta" do nosso tempo; em segundo lugar, como serão preparados os filhos para a economia pós-industrial; e, em terceiro lugar, como serão respondidos os desafios impostos pela nova demografia, em particular a baixa fertilidade e o envelhecimento da população.

No novo livro, ainda sem tradução para o português, Gösta Esping-Andersen - um dos mais renomados estudiosos das políticas sociais e do welfare state - analisa como as diferentes sociedades têm respondido a esses desafios. O autor se concentra na discussão da igualdade de gênero, do papel da família na reprodução das desigualdades sociais, em especial nas desigualdades associadas com o envelhecimento da população. Posteriormente, utilizando vasto material empírico, através de análises comparadas, procura identificar os tipos de reforma que o Estado de Bem-Estar social deveria empreender para otimizar as chances não apenas dos indivíduos em seus ciclos de vida, mas também o bem-estar coletivo. A ambição intelectual é a de identificar propostas que possam contribuir para a diminuição das desigualdades sociais. Um dos grandes dilemas da Europa é que a universalização do acesso à educação universitária não foi capaz de reverter o quadro de desigualdades sociais, especialmente de gênero. Em virtude disso, esse livro será de grande interesse para profissionais interessados em discutir a mudança do papel das mulheres, a diminuição das desigualdades sociais, a necessidade de novas políticas sociais e os possíveis cenários do Welfare State no futuro.

O sociólogo dinamarquês Esping-Andersen tornou-se famoso com seu livro The three worlds of welfare capitalism, publicado em 1990, especialmente por realizar um perfil tipológico do welfare state, identificando três tipos de Estado de Bem-Estar social capitalistas: liberal; conservador ou corporativo e social democrata. O autor conseguiu muitos adeptos às suas teses, mas também uma gama variada de críticas, as principais advindas das feministas. Assim, criticou-se Esping-Andersen por não levar em conta a situação das mulheres, uma vez que suas tipologias seriam tipicamente masculinas. Esping-Andersen rebateu essas críticas em uma publicação de 1999, intitulada Fundamentos sociais das sociedades pós-industriais. No ano de 2002, publicou um novo livro sobre os desafios do Estado de Bem-Estar social para o século XXI, tematizando o papel das crianças, das mulheres e dos idosos. Esse novo livro, A revolução incompleta, procura sistematizar as pesquisas do autor nessa área nos últimos anos.

O novo livro de Esping-Andersen foi bem recebido no meio acadêmico. Segundo a professora Jacqueline Scott da Universidade de Cambridge, trata-se de um livro fascinante, pois sugere que as novas reformas nas políticas sociais devem começar com os bebês. Para Jacqueline Scott, trata-se de uma tese provocante, criativa e oportuna, já que aborda as consequências não-planejadas para a família, a fertilidade e o envelhecimento da população. Na opinião da professora Jane Waldfogel da Columbia University, nesse livro arrebatador e provocativo, Esping-Andersen brilhantemente reúne estudos de demografia, economia, sociologia, desenvolvimento infantil, argumentando que a revolução no papel das mulheres deve ser levada em conta nas futuras reformas do Estado de Bem-Estar. Caso isso não ocorra, haverá o aumento das desigualdades para as gerações atuais e futuras.

O texto de Esping-Andersen ocupa 214 páginas, sendo dividido em 2 partes e 5 capítulos. A primeira parte inicia com os desafios atuais, em que são exploradas as temáticas das famílias e da revolução no papel das mulheres. Posteriormente, é debatido um tema de grande relevância para o contexto brasileiro, que são as novas desigualdades sociais. Na segunda parte do livro, são discutidas as adaptações do Estado de Bem-Estar a essas mudanças descritas na primeira parte do livro. O terceiro capítulo debate a adaptação das políticas sociais à revolução das mulheres. O quarto faz uma discussão acerca dos investimentos nas crianças como possibilidade de equalizar as condições de vida. Ao final do livro, o desafio do processo de envelhecimento na Europa é debatido pelo autor.

A principal tese do autor é a existência de uma revolução das mulheres. Por revolução das mulheres Esping-Andersen entende as mudanças biográficas, de modo especial a entrada das mulheres no mercado de trabalho. Para o autor, as biografias das mulheres estão mudando radicalmente em um tempo bastante curto, basicamente de uma geração para a outra. A mulher típica das décadas do pós-guerra na Europa cuidava dos afazeres domésticos, enquanto a filha provavelmente optou por uma vida de trabalho e sua consequente autonomia econômica. O eixo central dessa ruptura geracional foi o avanço educacional e, com isso, melhorias na renda das mulheres. Na maioria das nações avançadas, as mulheres já possuem maior escolaridade que os homens, e onde a revolução feminina foi iniciada mais cedo, ou seja, na América do Norte e na Europa do Norte, a grande maioria (cerca de 75%) são empregadas em toda a sua vida, com reduzidas interrupções na maternidade.

O novo papel das mulheres tem causado grandes efeitos em toda a sociedade, alterando os papéis da família convencional, adiando a formação da família, contribuindo para a diminuição das taxas de natalidade, aumentando a instabilidade conjugal, bem como a proliferação de famílias monoparentais, muitas das quais socialmente vulneráveis. Da mesma forma, a propensão das mulheres a ter menos filhos afeta o crescimento da população em longo prazo, e o ritmo acelerado de envelhecimento da sociedade também é visto como um produto da revolução das mulheres.

Contudo, essa revolução está incompleta, estratificada, atingindo em maior grau as mulheres de classe média e alta, bem educadas e com maior remuneração. As mulheres das classes baixas e pouco instruídas exibem um fraco apego ao trabalho remunerado e são muito mais propensas a abraçar a tarefa de dona de casa tradicional. Contudo, Esping-Andersen demonstra, com dados empíricos, que na Europa existe uma variação dramática em todos os países. Na Escandinávia, a diferença de emprego entre maior e menor escolaridade das mulheres é menor e para todos os efeitos, a dona de casa é uma espécie em extinção. Isso ainda está longe de ser o caso na Europa Continental e no Sul. Para exemplificar, na Suécia, 60% mulheres com menor grau de instrução estão trabalhando, em comparação com apenas 27% na Itália.

Dentre desafios postos à adaptação das políticas sociais à revolução das mulheres, Esping-Andersen destaca que o trabalho remunerado, ou seja, a carreira, não é necessariamente incompatível com a maternidade, algo que acontece nos países nórdicos. Em todo o caso, aumentar a fertilidade, induzindo as mulheres a reduzir a sua oferta de trabalho seria maciçamente contraprodutivo. As análises do autor indicam que é necessário investir em políticas de apoio às mulheres, incluindo um regime de tributação individual, licença de maternidade paga aos pais com segurança no emprego e creches subsidiadas pelo Estado. O acesso a creches de qualidade e de preferência grátis ou a preços acessíveis é condição sine qua non para qualquer equilíbrio viável no futuro.

O livro The incomplete revolution do sociólogo Esping-Andersen é uma obra bem estruturada, realizando primeiramente um diagnóstico, com vasto material empírico sobre a revolução incompleta das mulheres. Posteriormente, são traçados os desafios dessa revolução aos modernos Estados de Bem-Estar social. As conclusões do livro apontam para o fato de que as políticas sociais devem começar com os bebês, uma vez que diversos estudos indicam que a educação universal nos níveis superiores não foi capaz de romper com o círculo intergeracional da desigualdade social. Nesse quesito é que reside a novidade do novo livro de Esping-Andersen.

Clóvis Roberto Zimmermann - Doutor em sociologia pela Universidade de Heidelberg na Alemanha. Professor de Sociologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Coordenador da Pós-Graduação em Ciências Sociais da mesma universidade. Autor do livro Politische Partizipation in Brasilien: ein Vergleich der stadtplanungsmodelle von Porto Alegre und Curitiba. Frankfurt am Main/Londres: IKOVerlag für interkulturelle Kommunikation, 2006. clovis.zimmermann@gmail.com

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Out 2011
  • Data do Fascículo
    Abr 2011
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