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DISTINÇÕES E APROXIMAÇÕES ENTRE TERCEIRIZAÇÃO E UBERIZAÇÃO: os conceitos como palco de disputas

DISTINCTIONS AND APPROACHES BETWEEN OUTSOURCING AND UBERIZATION: concepts as the stage of disputes

DISTINCTIONS ET APPROCHES ENTRE SOUS-TRAITANCE ET UBERISATION: les concepts comme scène des disputes

Resumos

O objetivo deste artigo é definir e relacionar os conceitos de terceirização e uberização, interpretando os dois fenômenos como estratégias de gestão da força de trabalho que buscam reduzir os limites à exploração do trabalho. O ponto central da discussão é perceber que, assim como não ocorria na terceirização, tampouco na uberização há delegação ou externalização das atividades, que persistem sobre o controle das empresas, as quais continuam subordinando os trabalhadores aos seus comandos. Tratam-se, entretanto, de fenômenos de natureza distinta, que se assemelham por acentuarem a mercadorização do trabalho. O artigo, voltado para discussão conceitual teórica, foi construído considerando um conjunto de pesquisas anteriores dos autores sobre terceirização, que foram reunidas e tomadas como pressuposto para a comparação com dados das pesquisas em curso sobre uberização.

Terceirização; Uberização; Mercardorização


This paper’s aim is to define and relate the concepts of outsourcing and uberization, interpreting the two phenomena as workforce management strategies that seek to reduce the limits of labour exploitation. The central point of the discussion is to realize that, just as it did not occur in outsourcing, neither in Uberization, there is delegation or externalization of activities, which persist under the control of companies, which continue to subordinate workers to their commands. However they are distinct phenomena that have similarities in accentuating the commodification of work. The article, aimed at theoretical conceptual discussion, was constructed considering a set of previous research by the authors on outsourcing, which were gathered and taken as a prerequisite for comparison with data from ongoing research on uberization.

Outsourcing; Uberization; commodification


L’objectif de cet article est de définir et de relier les concepts d’externalisation et d’ubérisation, en interprétant les deux phénomènes comme des stratégies de gestion de la main-d’œuvre qui cherchent à réduire les limites de l’exploitation du travail. Le point central de la discussion est de se rendre compte que, tout comme cela ne s’est pas produit dans l’externalisation, ni dans l’Uberisation, il y a délégation ou externalisation d’activités, qui persistent sous le contrôle des entreprises, qui continuent de subordonner les travailleurs à leurs ordres. Il s’agit cependant de phénomènes de nature différente, qui se ressemblent en ce qu’ils accentuent la marchandisation du travail.L’article, destiné à une discussion conceptuelle théorique, a été construit à partir d’un ensemble de recherches antérieures des auteurs sur l’externalisation, qui ont été rassemblées et pris comme hypothèse de comparaison avec les données des recherches en cours sur l’ubérisation.

Sous-traitance; Uberisation; marchandisation


INTRODUÇÃO

Em face do avanço da uberização do trabalho, com razão, tal estratégia de gestão tem tomado a atenção dos debates políticos e acadêmicos. Os esforços em mapear as peculiaridades dessa prática e demonstrar a precarização do trabalho por ela engendrada se somam à discussão sobre a pertinência da regulação protetiva do trabalho em favor desses trabalhadores, em construções teóricas que evidenciam a presença de elementos novos e velhos do trabalho uberizado. Nesse sentido, por vezes, as análises que se referem ao conceito de uberização têm se encontrado com as discussões sobre a terceirização do trabalho, produzindo-se, eventualmente, confusões entre os dois fenômenos.

O próprio conceito de terceirização já vinha sendo objeto de críticas, que demandavam uma análise comprometida com a essência do fenômeno, de forma a se dissociar da narrativa imposta pelas empresas e seus representantes (Filgueiras; Cavalcante, 2015a; 2015b; Dutra; Filgueiras, 2020DUTRA, Renata Queiroz; FILGUEIRAS, Vitor Araújo. The so-called outsourcing (subcontracting) question and its regulation. Revista Direito e Práxis, v. 11, n. 4, pp. 2543-2571, dez. 2020.). Entre os discursos que assumiam a terceirização como externalização de atividades, ela encontrou caminhos para avançar ao ponto de ser admitida no Brasil a possibilidade de terceirizar toda e qualquer atividade, independentemente do seu caráter acessório ou principal, com responsabilidades limitadas pelas obrigações trabalhistas (Lei nº 13.467/2017 e julgamento da ADPF nº 324 pelo STF).

Atualmente, a uberização também tem sido admitida, por vezes, como o aprofundamento da divisão do trabalho, assumindo assim o principal pressuposto do discurso do capital e dificultando a imposição de limites à exploração do trabalho.

Nesse artigo buscamos, a partir do resgate crítico do conceito de terceirização, diferenciá-la do conceito de uberização, interpretando os dois fenômenos como estratégias de gestão da força de trabalho que buscam reduzir os limites à exploração. O ponto central da discussão é perceber que, assim como não ocorria na terceirização, tampouco na uberização há delegação ou externalização das atividades, que persistem sobre o controle das empresas, as quais continuam subordinando os trabalhadores aos seus comandos. Há, no arranjo terceirizado, a presença de um ente interposto, singularidade que o define. Já na uberização, a contratação dos trabalhadores pelas empresas imputa a eles o status de autônomos, usando a tecnologia digital para gerir o trabalho de forma arbitrária, instável e imprevisível para quem trabalha. Nada impede, contudo, e isso tem se tornado comum, que as empresas utilizem simultaneamente a terceirização e a uberização como forma de gestão.

Mesmo sendo fenômenos distintos, terceirização e uberização se assemelham por acentuarem a mercadorização do trabalho; bem como no sentido de se valerem do recrutamento de força de trabalho rotativa e tratada como descartável, no Brasil composta sobretudo por mulheres, pessoas negras e outros grupos excluídos, valendo-se das desigualdades já instaladas, notadamente em contextos de subdesenvolvimento, para aprofundar processos de exploração do trabalho e refutar a incidência dos sistemas de proteção social.

A metodologia de elaboração da investigação, voltada para discussão conceitual dos fenômenos, consistiu na retomada do arcabouço teórico e empírico decorrente de um conjunto de pesquisas anteriores dos autores sobre terceirização, que foram reunidas e tomadas como pressuposto para a comparação com dados das pesquisas em curso sobre uberização, sobretudo oriundas do Projeto Caminhos do Trabalho, desenvolvido no âmbito da Universidade Federal da Bahia.

Esse artigo é composto dessa introdução e de mais três partes. Primeiro, abordaremos criticamente a retórica de aprofundamento da divisão do trabalho e seus impactos na regulação do trabalho. Em um segundo tópico, nos debruçaremos sobre a distinção conceitual entre os dois fenômenos. No terceiro tópico, enfrentaremos os pontos de aproximação entre as práticas distintas. Ao final, apresentaremos nossas conclusões.

TERCEIRIZAÇÃO, UBERIZAÇÃO E MERCADORIZAÇÃO: A NARRATIVA DE APROFUNDAMENTO DA DIVISÃO DO TRABALHO E AS BURLAS À REGULAÇÃO PROTETIVA DO TRABALHO

Compreender o processo de assimilação social de estratégias de gestão empresariais que acentuam a mercadorização do trabalho passa por perceber que essas práticas se aliam a narrativas que buscam reduzir resistências ao processo de exploração, sobretudo, influenciando agentes e instituições envolvidos na relação entre as classes sociais. Observar como esses discursos colaboram para que a exploração do trabalho seja progressivamente intensificada, reduzindo os limites socialmente postos a essa exploração, permite compreender a importância de disputar conceitualmente tais fenômenos.

A terceirização é generalizadamente conceituada como a externalização de parte do processo produtivo de uma empresa, na qual a contratante transferiria atividades para outra organização (normalmente uma pessoa jurídica): a contratada ou “terceirizada”. A ideia é que a contratante passaria a se focar nas atividades em que seria especializada, deixando de realizar aquelas menos centrais aos seus propósitos. As contratadas teriam justamente nessas áreas o seu foco, ou seja, seriam especializadas nas atividades terceirizadas e contratariam diretamente os trabalhadores.

Em suma, supõe-se que a terceirização aprofunda a divisão do trabalho numa economia capitalista “pós-fordista”. Ou seja, se a empresa típica do fordismo foi caracterizada como vertical, com a reestruturação produtiva e a globalização adveio uma empresa mais horizontalizada, que exigiria a fragmentação do processo produtivo. Nessa narrativa, a legislação precisaria se adequar a essas novas empresas e relações de trabalho.

Depois de décadas afirmando a desverticalização, a formação de redes, a especialização e a terceirização, que caracterizariam as “novas” empresas do capitalismo contemporâneo, o discurso de que haveria um fenômeno “novo” da flexibilização e da divisão do trabalho se repete e se acentua neste século: ao mesmo tempo em que lutaram intensamente para legitimar a terceirização, empregadores de diferentes setores foram se distanciando dessa designação, numa aparente contradição. Nas últimas décadas, e especialmente nos últimos anos, formas da organização do trabalho que negam a terceirização têm crescido. Nesse modelo, ao invés de contratar serviços, as empresas estariam “comprando produtos”, estabelecendo relações puramente comerciais entre agentes independentes, de modo a ocultar a questão do trabalho nesse arranjo.

A despeito de nesses “novos” arranjos haver um ente interposto entre empresas e trabalhadores, passou-se a designá-los como contratos de compra (indústria), contrato de facção (setor têxtil), sistema de “integração” (agroindústria, especialmente fumo, aves e suínos), venda “no pé” (frutas e reflorestamento), fugindo do enquadramento da terceirização e das limitadas responsabilidades que a jurisprudência passou a atribuir às empresas envolvidas (v.g. Súmula nº 331 do TST). Importante observar que tais arranjos isolam os trabalhadores e dificultam até mesmo identificarem a tomadora final dos seus serviços, em um processo que mina resistências individuais e possibilidades de organização coletiva.

Nessa nova narrativa, o trabalho não é sequer indiretamente relacionado à empresa “compradora”. Assim, busca-se afastar ao máximo a ideia da vinculação entre trabalhadores e empresa contratante. A empresa “compradora”, “integradora”, etc., tende a não adotar contratos de prestação de serviços com o ente interposto (agora não mais considerado terceirizado), preferindo dispositivos jurídicos com outras denominações (contratos de “integração” com produtores, de fornecimento de roupas com oficinas) ou mesmo sem nenhuma formalização permanente e específica, adotando o uso de e-mails, por exemplo.

No caso dos chamados contratos de facção, típicos do setor de confecções, não se nega necessariamente o trabalho assalariado de quem produz, mas a empresa (“grande marca”) se apresenta como compradora de uma mercadoria, isentando-se de qualquer relação com o seu processo de produção, ainda que o controle minuciosamente.

Os efeitos da terceirização (seja ela explícita ou não assumida) sobre as condições de trabalho foram exaustivamente mapeados pela literatura no Brasil e no mundo, demonstrando que essa prática, ao incrementar a dominação e a precarização do trabalho, tem ensejado menores salários, jornadas mais extensas, fragilização dos sindicatos, maior rotatividade, maior incidência de abusos, descumprimento das leis e inexequibilidade dos créditos trabalhistas, maior exposição ao adoecimento e a acidentes, inclusive fatais, e, não coincidentemente, maior incidência de casos de redução à condição análoga à de escravos. (Filgueiras e Dutra, 2021)

Ainda mais longe, contudo, tem ido a narrativa das “novas” empresas. As corporações e seus representantes têm enfatizado que as mudanças produtivas se associam à expansão de novas formas de trabalho, tornando a figura do emprego (e a proteção social a ele associada) obsoleta.

A narrativa que divulga essas “novas” formas de trabalho, como cooperativas, trabalho autônomo, ocupações inseridas na suposta zona cinzenta, etc., representa, na prática, a tese de que o emprego assalariado estaria perdendo sua relevância na sociedade. Trata-se do novo “adeus” à classe trabalhadora. Se, antes, essas previsões focavam a indústria, agora o emprego assalariado como um todo estaria em declínio (Filgueiras & Cavalcante, 2020FILGUEIRAS, Vitor Araújo; CAVALCANTE, Sávio. O trabalho no século XXI e o novo adeus à classe trabalhadora. Princípios, 39(159), 11-41. 2020. Disponível em: https://doi.org/10.4322/principios.2675-6609.2020.159.001. Acesso em:16.03.2021.
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). Esse novo adeus tem se disseminado ainda mais com as formas de gestão que, usando as novas tecnologias informacionais e comunicacionais (TICs), em particular por meio das chamadas plataformas, engendram a chamada uberização do trabalho.

Nos últimos anos, além da uberização, são muitos os termos que definem mudanças nas empresas e no mundo do trabalho associadas ao uso das novas TICs: gigeconomy, platformeconomy, sharingeconomy, crowdsourcing, on-demandeconomy, trabalho digital, entre outros. É frequente também a ideia de que o objetivo das “plataformas” e “apps” seria conectar a demanda de clientes por serviços específicos com a oferta desses serviços por trabalhadores provedores (The Hamilton Project, 2015). Nessa mesma direção, outra definição mais ampla de platformeconomy como intermediação contempla tanto serviços quanto bens e ativos a serem vendidos (Farell; Greig, 2016).1 1 Conforme desenvolvido em Filgueiras & Cavalcante, 2020. Ressalte-se que arranjos similares para realização de transações de produtos e propriedades não são alvo de nossa análise, mas sim aqueles que envolvem prestação de trabalho humano. Ainda assim, é importante destacar que é o conteúdo das relações, e não sua forma ou a sua designação por parte das empresas, que define a existência ou não de gestão do trabalho por plataformas. Desse modo, o fato de algumas plataformas apresentarem-se como operativas de circulação de mercadorias e não de gestão da produção, não significa que esse arranjo não possa estar englobando a dimensão laboral ou vir a fazê-lo em momento posterior, o que demanda acompanhamento empírico.

A narrativa também se desenha numa perspectiva que articula transformações na estrutura empresarial e do trabalho. Nesse caso, as plataformas digitais significariam uma mudança fundamental no processo de outsourcing, que permitiria aos trabalhadores superar as barreiras dos mercados de trabalho locais para potencialmente realizar tarefas de qualquer lugar do mundo para qualquer lugar do mundo (Graham; Hjorth; Lehdonvirta, 2017). Crowdwork, workondemand e digital labour também podem aparecer como sinônimos, como em Chesalina (2017)CHESALINA, Olga. Social security for platform economy as a challenge for social security in Germany and in Russia: a comparative study. Spanish Labour Law and Employment Relations Journal, v. 7, n. 1-2, p.17-28, 2017. Disponível em: https://e-revistas.uc3m.es/index.php/SLLERJ/article/view/4433. Acesso em: 20.08. 2019
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, para a qual a platformeconomy estaria acompanhada pela ascensão de novas formas de emprego, não mais caracterizadas pela transferência de atividades de uma empresa para agentes específicos, mas para um grande número de indivíduos ou organizações indefinidas.

Em que pesem as diferentes definições, essas terminologias pretendem identificar fenômenos que possuem as seguintes semelhanças: 1) contatos on-line entre produtores/provedores e consumidores, trabalhadores e empresas; 2) uso de plataformas para acesso em computador ou em instrumentos móveis de comunicação; 3) uso intensivo de dados digitais para a organização e gestão dessas atividades; 4) relações instáveis e imprevisíveis para os trabalhadores.2 2 Muitas vezes estabelecidas por “demanda” (arranjos são feitos por produto, sem garantia de continuidade).

A posição que parece predominar é a de que essas transformações têm sido benéficas para quem trabalha, dentre outras razões, porque permitiriam que as restrições de oferta de serviços por questões geográficas fossem reduzidas, facilitando a busca por oportunidades de renda para trabalhadores, independentemente da sua localização (Kittur et al., 2013). Ou, ainda, de que as “plataformas” tornariam a conexão e a comunicação entre provedores de serviços e consumidores mais fácil e dinâmica, constituindo mercados on-line que facilitariam os negócios (Manyika et al., 2016).

Em suma, as corporações alegam que: 1) são empresas de tecnologias digitais; 2) fazem a intermediação de atividades nas quais trabalhadores oferecem serviços de forma autônoma; 3) eliminam a subordinação, promovendo liberdade para trabalhar quando, onde e como quiserem; 4) no caso mais extremo, as empresas alegam que os trabalhadores seriam seus clientes, que pagariam uma “taxa” pelo uso do “aplicativo” ou “plataforma”.

A Uber, por exemplo, se apresenta como um aplicativo que presta serviços a motoristas. Em uma ação judicial no Reino Unido, ela se descreve como: “uma empresa de tecnologia, e que não fornecia um serviço de transporte para os clientes — apenas os colocava em contato com os motoristas” (The Guardian, 2016THE GUARDIAN. Uber driver earned less than minimum wage, tribunal told. 20 jul 2016. Disponível em https://www.theguardian.com/business/2016/jul/20/uber-driver-employment-tribunal-minimum-wage. Acesso em: 05.06.2021.
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). Já a Rappi, empresa de entrega, se define como:

uma empresa de tecnologia “startup” de intermediação de serviços, presente em vários países da América Latina, que por meio de plataforma de e-commerce permite aos fornecedores de diversos segmentos divulgarem e comercializarem os seus produtos, bem como aos entregadores independentes habilitarem-se para a realização de serviços de entregas, que efetuam por meio de motocicleta, bicicleta ou outro modal a sua escolha. Assim, verifica-se que a Requerida é uma empresa de tecnologia intermediadora, que explora a plataforma tecnológica, com o intuito de permitir aos usuários do aplicativo a oferta e a procura de bens e serviços, dentro do novo sistema mundial de economia compartilhada (Brasil, Auto de Infração nº 22.027.794-0, 2020, p.25).

Como dito, muito antes da existência das “plataformas” e dos “aplicativos”, já se declarava a expansão de “novas” formas de trabalho. Portanto, as novas tecnologias digitais não são uma condição necessária para a adoção de modalidades contratuais que negam a condição de assalariamento, mas instrumentalizam, com eficiência, essa lógica.

Assim como em relação à tercerização, o mapeamento feito por pesquisas produzidas em diversos países têm revelado as consequências perversas da chamada uberização sobre as condições de trabalho: jornadas extenuantes; trabalho sem repousos semanais ou férias; rendimentos inferiores ao salário mínimo (sobretudo no caso dos entregadores em bicicletas); abandono por parte das empresas em casos de acidentes e adoecimento; endividamento para custear os instrumentos de trabalho e para suportar os riscos transferidos pelas empresas; submissão a punições arbitrárias e desligamentos em caso de não atendimento das exigências empresariais; exposição a retaliações em caso de adesão a greves e organizações coletivas (condutas antissindicais); ausência de estrutura adequada para alimentação, repouso; e, durante a pandemia da covid-19, ausência de condições sanitárias elementares (Filgueiras & Antunes, 2020; Filgueiras et al, 2020).

TERCEIRIZAÇÃO E UBERIZAÇÃO: UMA NECESSÁRIA DELIMITAÇÃO CONCEITUAL DOS FENÔMENOS

Para começar a desatar esse nó, é necessário reposicionar as premissas que orientam o debate, a fim de que a disputa sobre a regulação do trabalho não seja previamente delimitada pela narrativa empresarial. Isso passa, primeiro, por rever o conceito de terceirização, que pode ser compreendida como estratégia de organização e gestão do trabalho, sem admissão da relação contratual com os trabalhadores, com o uso de um ente interposto (seja ele apresentado como pessoa jurídica, cooperativa, etc.) (Dutra, Filgueiras, 2020FILGUEIRAS, Vitor. et al. Relatório de Pesquisa Projeto Caminhos do Trabalho: tendências, dinâmicas e interfaces, do local ao global. Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2020. Disponível em: http://abettrabalho.org.br/wp-content/uploads/2020/08/Relato%CC%81rio-de-LevantamentosobreEntregadores-por-Aplicativos-no-Brasil.pdf. Acesso em: 03.02. 2021
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; Filgueiras, Cavalcante, 2015). Nesse processo, é de extrema relevância considerar que a empresa tomadora de serviços assume uma posição hierárquica de controle sobre as intermediárias e sobre os trabalhadores concernidos no processo.

Empiricamente, a terceirização está distante do aprofundamento, de fato, da divisão do trabalho entre empresas. Centenas de casos estudados, envolvendo empresas de todos os portes, setores (desde a agroindústria, o setor sucroalcoleiro, citricultura, construção civil, química, petroquímica, até a indústria automotiva e o setor de telemarketing), nacionais e transnacionais (Filgueiras, Souza, 2011, Filgueiras, 2012FILGUEIRAS, Vitor Araújo. Estado e direito do trabalho no Brasil: regulação do emprego entre 1988 e 2008. 2012. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas – FFCH da Universidade Federal da Bahia.; 2013; Filgueiras; Cavalcante, 2015; Dutra, 2018DUTRA, Renata Queiroz. Trabalho, regulação e cidadania: a dialética da regulação social do trabalho. São Paulo: LTr, 2018.), demonstram que a terceirização não implica a externalização das atividades, apesar de reivindicar e procurar vestir esse traje. Pelo contrário, a essência do controle do processo produtivo das atividades terceirizadas não muda, continua sendo da empresa contratante, que apenas promove um modo de contratação diferenciado da força de trabalho. Com isso, busca-se a redução de custos e/ou a externalização de conflitos trabalhistas, aumento de produtividade espúria, recrudescimento da subsunção do trabalho, flexibilidade e externalização de diversos riscos aos trabalhadores. Em suma, com maior ou menor intencionalidade, as empresas buscam reduzir limites à exploração, seja a resistência individual, coletiva, ou via regulação protetiva do Estado.

Portanto, a terceirização é um fenômeno do mercado de trabalho. Não é uma parceria entre empresas diferentes, cada qual administrando seu próprio negócio, determinando suas próprias regras e maneiras de gerir a força de trabalho, trocando produtos ou serviços fora do mercado laboral (tal como na parceria entre um fornecedor de energia e uma fábrica de produtos químicos). A terceirização é uma forma por meio da qual a empresa organiza a sua própria força de trabalho adotando uma forma diferente de contratar pessoal.

Nesse processo, as empresas contratantes quase sempre detêm o know-how necessário às atividades. Isto porque estas atividades são parte de seu processo de produção e manter o know-how impede que o intermediário se torne o capital principal ou efetivo durante o processo, assegurando a manutenção da relação hierárquica, em que as posições-chave no controle são ocupadas pela empresa contratante. Em suma, a terceirização se define como uma estratégia de contratação de pessoal através de um intermediário, que é uma entidade interposta entre um trabalhador e um gestor efetivo do trabalho e da produção.

A configuração que a terceirização pressupõe pode variar desde uma “folha de papel”, como um documento declarando que o empregado é, agora, a “sua própria empresa”, a pessoas jurídicas formalizadas que podem formalmente empregar milhares de trabalhadores. No máximo, e em apenas muitos poucos casos, o intermediário pode ser um sócio minoritário em um negócio controlado pela empresa cliente. Em quaisquer circunstâncias, o controle da produção pertence à empresa dominante. Se o intermediário se torna forte o suficiente para negociar em pé de igualdade com o contratante, ele deixa de ser intermediário e passamos a tratar de uma relação comercial como qualquer outra.

As razões pelas quais o capitalista individual adota a terceirização podem oscilar em cada caso, mas a principal intenção, diretamente calculada ou não, é reduzir os limites à exploração do trabalho. A terceirização se efetiva porque tende a: a) reduzir a resistência individual; b) minar ações coletivas; c) enfraquecer a regulação protetiva estatal; d) diminuir os custos e; e) aumentar a produtividade espúria (Dutra; Filgueiras, 2020DUTRA, Renata Queiroz; FILGUEIRAS, Vitor Araújo. The so-called outsourcing (subcontracting) question and its regulation. Revista Direito e Práxis, v. 11, n. 4, pp. 2543-2571, dez. 2020.).

O impacto do conceito hegemônico de terceirização nas possibilidades de limitação da exploração do trabalho é importante. Ao invés de apreendê-la como uma estratégia de gestão da força de trabalho, normalmente se admite o pressuposto da divisão do trabalho, algo que é inerente à dinâmica do capital. Assim, mesmo com as consequências nefastas do fenômeno, há uma extrema dificuldade para demonstrar que ele não é inevitável, e a análise tende a cair na dicotomia entre “verdadeira” e “falsa”, ou “boa” e “má” terceirização.

Como delineamos no tópico anterior, o empresariado, ao passo que lutou para legitimar a terceirização sem limites, também radicalizou sua lógica ao negar a relação de trabalho, numa contradição apenas aparente, pois em ambos os casos se busca potencializar as condições de exploração. O processo se concretiza com sucesso, para as empresas, quando o arranjo terceirizado é consumado sem que sobre ele incidam sequer as frágeis peias que se construíram juridicamente: os contratos de facção e afins amoldam-se perfeitamente ao conceito posto, embora a alegoria jurídica ajude a reduzir ainda mais os limites à exploração.

De um cenário em que a terceirização fragiliza a proteção ao trabalho, na medida em que o vínculo de emprego com o intermediário é mais frágil que o vínculo que se estabeleceria com o tomador de serviços, disfarçando a persistência da centralidade do controle, encaminha-se para um arranjo em que o trabalhador pode não estabelecer sequer com o intermediário esse vínculo empregatício e em que, ademais, o tomador não é responsabilizado sequer subsidiariamente.

Importante assentar que essa narrativa conseguiu concretizar uma jurisprudência que assume as premissas empresariais, legitimando um arranjo terceirizado no qual sequer persiste a imputação de responsabilidade subsidiária ao tomador de serviços. Os chamados “contratos comerciais” e “contratos de facção”, relevantes sobretudo em relação ao setor têxtil e à indústria calçadista, têm precedentes favoráveis no TST.3 3 Consultar, por exemplo, BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. RR-335-50.2011.5.02.0067, 7ª Turma, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 21/05/2021; e BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. Ag-RR-268-51.2017.5.09.0594, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 30/04/2021.

A negação do assalariamento como estratégia de gestão agrava esse cenário. A despeito de não ser novidade e ter se incrementado muito nas últimas décadas, são as “plataformas” e “aplicativos” a vedete dessa prática empresarial nos últimos anos, conformando a chamada uberização do trabalho. Tais empresas, do ponto de vista retórico, radicalizam a mesma narrativa de aprofundamento da divisão do trabalho e afastamento da empresa, pois chegam a negar a condição de trabalho em sentido lato (e não apenas a de emprego), ao alegar que os trabalhadores é que são clientes das plataformas.

Esforços têm sido conduzidos para conceituara uberização e aproximam tal fenômeno da terceirização. Abílio (2017)ABÍLIO, Ludmila Costhek. Uberização do trabalho: A subsunção real da viração, Site Passapalavra/ Blog da Boitempo, 2017. identifica a uberização como “um novo estágio da exploração do trabalho, que traz mudanças qualitativas ao estatuto do trabalhador, à configuração das empresas, assim como às formas de controle, gerenciamento e expropriação do trabalho”. Ainda segundo a autora, “trata-se de um novo passo nas terceirizações, que, entretanto, ao mesmo tempo que se complementa também pode concorrer com o modelo anterior das redes de subcontratações compostas pelos mais diversos tipos de empresas” (Abílio, 2017ABÍLIO, Ludmila Costhek. Uberização do trabalho: A subsunção real da viração, Site Passapalavra/ Blog da Boitempo, 2017., s/p.). A síntese de Abílio é no sentido de que a uberização consolidaria “a passagem do estatuto de trabalhador para o de um nanoempresário-de-si permanentemente disponível ao trabalho; retira-lhe garantias mínimas ao mesmo tempo que mantém sua subordinação”.

Em texto mais recente, Abílio destaca que no fenômeno da uberização estaria também subsumida a figura de um terceiro controlador da prestação de serviços:

Para compreender como a forma de controle do crowdsourcing opera é preciso ainda mirar na participação de uma terceira parte, para qual também é terceirizada uma parcela do gerenciamento do trabalho. Trata-se da multidão de consumidores vigilantes. (...) O crowdsourcing está relacionado com uma informalização do trabalho que literalmente passa a significar uma perda de formas do trabalho (Abílio, 2020ABÍLIO, Ludmila Costhek. Uberização: a era do trabalhador just-in-time?. ESTUDOS AVANÇADOS (online), v. 34, p. 111-126, 2020., p.121).

Márcio Pochmann também identifica aproximações entre terceirização e uberização. Para o autor, a uberização se encontraria nas ramificações do fenômeno da terceirização irrestrita, compreendendo a primeira como um modo de “organizar e remunerar a força de trabalho distancia-se crescentemente da regularidade do assalariamento formal, acompanhado geralmente pela garantia dos direitos sociais e trabalhistas” (Pochmann, 2016, p.706). Ambas as práticas estariam, segundo Pochmann, subsumidas na narrativa empresarial que trata direitos sociais como custos, reivindicando a contratação sem direitos e o fomento à competição individual entre os trabalhadores, com exclusão dos sindicatos e benefício para o patronato.

Outra definição de uberização que a relaciona com a terceirização é feita por Kalil, ao discutir as mudanças recentes associadas às TIC:

Outro termo igualmente disseminado é a uberização, que ressalta o modelo de negócios da empresa de transportes Uber. Em linhas gerais, ela entende ser uma intermediadora eletrônica entre oferta (motoristas) e demanda (clientes) e que atua no setor de tecnologia. O modelo se caracteriza pela assimetria entre o poder social da máquina em face dos indivíduos separados e divididos. Além disso, é a maior expressão da terceirização no século XXI, em que se busca afastar a configuração da relação de emprego e, consequentemente, o reconhecimento de direitos trabalhistas. Esse mecanismo adotado pela empresa foi denominado de ‘modo Uber de precarização das contratações de trabalho’ (Kalil, 2020KALIL, Renan Bernardi. A regulação do trabalho via plataformas digitais. São Paulo: Blucher, 2020., p. 74).

Rodrigo Carelli explicita o pagamento por peça ou tarefa como aspecto da definição do fenômeno: “A uberização é um processo de organização do trabalho baseado na contratação precária e sob demanda de trabalhador formalmente rotulado como autônomo, com pagamento por peça ou tarefa e controle por programação” (Carelli, 2021, s/p).

No presente artigo, refutando as premissas da narrativa do capital (mormente a retórica de aprofundamento da divisão do trabalho e de negação do assalariamento), que tendem a fragilizar a regulação protetiva do trabalho, definimos uberização como estratégia de organização e gestão do trabalho assalariado, que: 1) faz uso de tecnologias digitais comunicacionais; 2) negando a relação de emprego ou de trabalho, e; 3) impondo uma completa instabilidade e imprevisibilidade aos fundamentos do contrato de trabalho.4 4 Estamos tratando da gestão do trabalho e do seu conteúdo, não da sua aparência. Formas de reprodução do capital podem mudar e são dinâmicas. Os chamados marketplaces, em tese, não gerenciam a força de trabalho. Contudo, podem e tendem a gerenciar, na medida em que se fortalecem. Nesse artigo, não adentraremos nessa seara, que demanda pesquisa específica do caso de cada plataforma. De todo modo, parte-se da premissa de que o direito do trabalho deve ser ativo, adaptando a empresa aos seres humanos, de modo a impor responsabilidades também na hipótese de marketplaces.

O último aspecto do conceito é importante, pois é comum associar uberização ao pagamento por peça, sem jornadas pré-determinadas. De fato, essa prática é comum e muito importante para os “aplicativos”. Contudo, ela não é sempre verificada e muitas empresas, inclusive a própria UBER, pagam aos trabalhadores por jornadas pré-determinadas quando é conveniente. As empresas impõem as condições que lhe interessam, no tempo que desejam, e as modificam arbitrariamente. A critério das “plataformas”, os contratos (“termos de uso”) são modificados subitamente, mas eles mesmos são ou não seguidos pelas empresas a seu bel prazer, por exemplo, punindo e dispensando trabalhadores sem qualquer razão constante nos “termos de uso”.5 5 Em pesquisa realizada por parceria UFBA-UCM, a imensa maioria dos entregadores já havia sido bloqueada, desligada, ou conhecia alguém que já tinha sido bloqueado ou desligado pelos “aplicativos” (na Espanha 82,6% e no Brasil 80%). Dentre eles, quase metade sequer sabia o motivo da punição (44% na Espanha e 45% no Brasil), mesmo que alguns tenham questionado à empresa (Filgueiras et al, 2020). Por isso, pode-se concluir que o que caracteriza a uberização é a imposição, pelas empresas, por meio das TIC e da negação da condição de empregadora, de uma relação totalmente instável e imprevisível para o trabalhador.

A negação da relação de emprego usando a ideia de liberdade e flexibilidade constitui, de fato, uma transferência deliberada de riscos para aumentar o controle sobre os trabalhadores pelas empresas. Ademais, Filgueiras e Antunes (2020) elencam exemplos de medidas de controle explícitas que costumam ser impostas pelas “plataformas”.

As empresas: 1) determinam quem pode trabalhar para elas, sendo mais ou menos exigentes na admissão; 2) delimitam o que será feito, os trabalhadores não podem prestar serviços não contemplados por elas; 3) definem que trabalhador realizará cada serviço (no mínimo, quem pode concorrer pelo serviço) e não permitem captação de clientes; ou seja, as empresas contratam (ou não) o serviço de cada trabalhador (as notas dos clientes são apenas um instrumento para a decisão que é da empresa); 4) delimitam como as atividades serão efetuadas; 5) determinam o prazo para a execução do serviço; 6) estabelecem, de modo unilateral, o valor pago: essa é uma variável-chave, porque os pagamentos são manipulados para dirigir o comportamento dos trabalhadores. Os algoritmos, que nada mais são do que programas, comandados pelas corporações, para processar grande volume de informações, permitem direcionar a força de trabalho segundo a demanda a qualquer momento.

As empresas também pressionam os trabalhadores a: 7) serem assíduos e não negarem serviços demandados e 8) a trabalharem mais tempo com o uso de “incentivos”, que são metas ou horários a serem cumpridos. Elas 9) determinam como os trabalhadores devem se comunicar com elas e 10) usam o “bloqueio” para ameaçar os trabalhadores, impedindo que eles exerçam sua atividade por tempo determinado; 11) utilizam a dispensa a qualquer tempo, sem necessidade de justificativa nem qualquer espécie de aviso, como um mecanismo de coerção e disciplinamento, inclusive quanto à organização e ação coletiva dos trabalhadores, como ficou evidenciado no Brasil durante os chamados “breques” dos apps.

Em síntese, terceirização e uberização são fenômenos distintos, pois o que define a primeira é a gestão do trabalho com uso de ente interposto, e a última se define pela gestão que conjuga: 1) negação do assalariamento, 2) uso das novas TIC e 3) imprevisibilidade e instabilidade. Porém, como veremos, as empresas podem adotá-los simultaneamente.

A uberização, ainda que implique a prestação de serviços para pessoas físicas ou jurídicas (passageiro do aplicativo de transporte ou restaurante cujas entregas são feitas por aplicativo) não se confunde com um arranjo terceirizado porque a “plataforma” não ostenta a condição de intermediária, mas sim de empresa que controla o processo de produção e trabalho, inclusive, eventualmente estabelecendo relações de comando com as próprias pessoas jurídicas envolvidas, como é o caso da imposição de preços, pelas empresas de entrega, sobre os produtos dos restaurantes. Portanto, a “plataforma” é centro de comando e poder exercido sobre os trabalhadores de modo potencializado pelas TIC.

Nesse sentido, é importante destacar que, em qualquer dos fenômenos, os enquadramentos pertinentes, seja do ponto de vista sociológico ou jurídico, devem se basear no conteúdo da relação, e não apenas por sua aparência. A turbação dos conceitos e da forma de apresentar os fenômenos por aqueles que exercem poder lhes atribui dinamicidade. Assim, é imprescindível capturar o que há de essencial em cada fenômeno para compreendê-los, inclusive porque a repetição de uma mesma aparência pode acomodar práticas econômicas distintas. Assim, o que antes era uma cooperativa de entregadores terceirizados de uma pizzaria passa a ter contornos distintos quando há uberização do serviço de entrega de pizzas por “plataforma”. Embora valendo-se da já familiar triangulação, as relações de poder são diferentes na uberização.

Algumas contradições emergem dessas “novas” formas de trabalho. Com a individualização dos serviços e da remuneração, a exploração se torna mais explícita – sabe-se quanto cada trabalhador produz e qual o percentual apropriado pela empresa.

Ademais, as plataformas digitais controlam todo o processo, determinam os formatos exatos dos contratos de trabalho, pagam, mobilizam, ameaçam e dispensam. Os trabalhadores são induzidos a adotar os comportamentos dirigidos pelas empresas, não lhes cabendo alternativa se querem trabalhar. O fato de se submeterem a essas condições significa que a iniciativa, o controle e a autonomia das atividades não estão em suas mãos.

No final das contas, ao contrário da propalada autonomia, os trabalhadores são menos livres e estão mais submetidos ao capital do que os assalariados reconhecidos com tais. Isso porque eles sofrem uma dupla coerção: além da coerção do mercado de trabalho, que é a ameaça de dispensa comum a qualquer empregado, eles também sofrem uma coerção interna, pois, mesmo com contrato vigente, estão sob permanente ameaça de não ter renda.

A tecnologia entra nesse cenário para aperfeiçoar esse controle, pois se sabe precisamente, e em tempo real, quem está fazendo o quê, de que modo, por quanto tempo, em qual velocidade etc. Assim, a grande novidade na organização do trabalho introduzida pelas novas TICs é permitir que as empresas utilizem essas ferramentas como instrumental sofisticado de controle e subjugação da força de trabalho.

Em estratégias como as adotadas na uberização, mas também em arranjos como a “produção integrada”, o que as empresas fazem é transformar os instrumentos de trabalho (veículos, instalações, computadores, terra etc.) em seu capital, sem a necessidade de propriedade formal sobre eles. As empresas podem controlar o processo de trabalho e produção por outros meios (por exemplo, monopolizando a interface com os clientes), em especial instrumentalizando a transferência dos riscos do contrato ao trabalhador (que arca com carros, motos etc. e sua manutenção, endividando-se para trabalhar). Nessa dinâmica, não ter a propriedade de carros, bicicletas, computadores e terras é uma grande vantagem para as empresas, pois elas não precisam imobilizar capital e ainda podem contar com trabalhadores mais inseguros e com menor probabilidade de contestar ordens.

Além de dificultar a resistência individual e a ação coletiva, esses arranjos têm minado a regulação protetiva do trabalho pelo Estado. Estaríamos experimentando novas maneiras de organizar o trabalho e a produção com o crescimento do trabalho por conta própria, das “zonas cinzentas”, ou mesmo da transformação de trabalhadores em clientes. Nessa narrativa, tratar-se-iam de relações inadequadas à regulação da legislação trabalhista6 6 Sobre o novo adeus à classe trabalhadora, ver Filgueiras & Cavalcanti (2020). .

Importa observar que essa apresentação das transformações, enquanto narrativa pública, tem produzido impactos na forma de regulação do trabalho uberizado. Parte importante dos trabalhadores engajados nos aplicativos têm assumido essa narrativa e, em grande medida, reivindicado a condição de autônomos como expressão de um ideal de liberdade no trabalho que não se concretiza na prática. Essa percepção tem moldado a forma de reagir individual e coletiva desses trabalhadores.

Pesquisas têm registrado a conduta individual dos trabalhadores de, em vez de se dirigirem a instituições públicas de regulação para reclamar violações de direitos (como a Justiça do Trabalho), assumem a posição de consumidores das plataformas e fazem uso de canais consumeristas como a plataforma “Reclame aqui” para solucionar conflitos trabalhistas. Investigações jurisprudenciais também têm revelado que, quando ocorrem, as provocações de entregadores de aplicativo ao Poder Judiciário, muitas vezes não buscam discutir o vínculo de emprego, mas apenas os bloqueios injustos e outras obrigações civis. Mesmo algumas das manifestações desses trabalhadores, em movimentos associativos, assumem discursos contrários à formalização do emprego, apesar de reivindicarem direitos previstos na CLT (como pagamento mínimo, regras para punições e dispensas). Os próprios breques dos apps não conseguiram construir um consenso em torno da reivindicação do vínculo de emprego, muito embora tenham se organizado em torno de uma pauta trabalhista.

Na sequência desse padrão de reivindicação, tem predominado no Poder Judiciário brasileiro, embora ainda sem uma uniformização oficial, decisões que assimilam a narrativa da autonomia, da inexistência de subordinação, que não poderia ensejar reconhecimento de vínculo e, em alguns casos, sequer obrigações trabalhistas genéricas, que constitucionalmente (art. 7º, CF/88) poderiam ser extensíveis a todo trabalhador, mesmo que não empregado (Coutinho, 2021COUTINHO, Raianne Liberal. A subordinação algorítmica no arquétipo uber: desafios para a incorporação de um sistema constitucional de proteção trabalhista. 2021. Dissertação (Mestrado em Direito), Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de Brasília..).

Portanto, assimilar a narrativa e as premissas empresariais têm impedido a resistência da regulação protetiva do trabalho a esses fenômenos. Infelizmente, a ideia de que empresas têm se afastado dos trabalhadores tem encontrado eco nas instituições de proteção ao trabalho e, por vezes, no campo mais crítico da academia.

Todas essas evidências, seja em relação à uberização seja em relação à terceirização, revelam que, embora esses arranjos ou estratégias de gestão modifiquem a aparência do assalariamento, eles têm por principal objetivo e efeito aprofundar a exploração do trabalho assalariado. Usando a retórica do afastamento dos trabalhadores e da transformação da natureza das relações de trabalho, busca-se, em verdade, aumentar a subordinação e reduzir as chances de resistência do trabalho, ajudando a expansão de condições de trabalho e de vida que remetem aos primórdios do capitalismo e às suas áreas periféricas (sendo que, mesmo nelas, houve importantes acenos para a proteção social, como o advento da CLT no Brasil).

A terceirização e a uberização são dois exemplos de como a ideia do “novo” tem sido usada para legitimar um velho, não no sentido do ultrapassado, mas de que já foi vivenciado e que leva ao limite a exploração do trabalho.

CAMINHOS QUE SE CRUZAM: QUANDO UBERIZAÇÃO E TERCEIRIZAÇÃO SE APROXIMAM OU SE CONFUNDEM

Nos tópicos anteriores, demonstramos que terceirização e uberização são fenômenos que, embora calcados em uma mesma narrativa empresarial e convergentes quanto ao objetivo de precarização da força de trabalho, redução das resistências e dos limites à exploração do trabalho, assentam-se em arranjos substancialmente distintos, não sendo possível compreender, no caso da uberização, a participação dos consumidores no processo de avaliação ou de outras empresas como usuárias dos serviços, como processo de descentralização que conduza as empresas-aplicativos ao papel de intermediárias.

Muito pelo contrário, comumente essas empresas têm articulado cadeias de outras empresas em posição de comando, o que pode caracterizar, para fins de responsabilização jurídica, a figura do grupo econômico, com responsabilidade solidária entre si (nos termos do art. 2º, § 2º, da CLT), mas não uma caracterização técnico-jurídica da terceirização.

As figuras da terceirização e da uberização, todavia, têm em comum: serem formas de gestão do trabalho; aprofundarem a mercadorização do trabalho; e, de forma mais ou menos radicalizada, engendrarem a burla às estruturas de proteção social, de modo a conduzir fraudulentamente os trabalhadores ao que se denomina “nova informalidade” (Krein; Proni, 2010) – ostensivamente, no caso da uberização, por meio da negação de qualquer vínculo laboral, e, na terceirização, variando entre a inefetividade dos direitos trabalhistas, a informalidade propriamente dita e também a negação do assalariamento.

Também podemos observar como pontos comuns nas duas práticas, o recrutamento de grupos vulneráveis, como forma de instrumentalização das desigualdades (Antunes, 2010ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade no mundo do trabalho. São Paulo: Editora Cortez, 2010.). Se a terceirização já vinha sendo um marcador distintivo da contratação do trabalho de mulheres, e especialmente mulheres negras (telemarketing, serviços de limpeza terceirizados) (Dutra, 2014DUTRA, Renata Queiroz. Do outro lado da linha: poder judiciário, regulação e adoecimento dos trabalhadores em call centers. São Paulo: LTr, 2014., 2018DUTRA, Renata Queiroz. Trabalho, regulação e cidadania: a dialética da regulação social do trabalho. São Paulo: LTr, 2018.; Dutra; Coelho, 2020DUTRA, Renata Queiroz; COELHO, Ilana Barros. “Eles pensam que a gente é invisível”: gênero, trabalho terceirizado e educação jurídica popular / “Theythinkwe are invisible”: gender, outsourcing, and popular legal education. Revista Direito e Práxis, [S.l.], mar. 2020. Disponível em: <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/44987>. Acesso em: 06.05. 2020.
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index....
; Souza, 2012SOUZA, Elaine Silva de. A “Maquiagem” do trabalho formal: um estudo do trabalho das mulheres terceirizadas no setor de limpeza na Universidade Federal da Bahia. 2012. 196 p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia.; Araújo; Ferreira, 2009ARAÚJO, Angela Maria Carneiro; FERREIRA, Verônica Clemente. Terceirização e relações de gênero. In: DRAU, Denise M.; RODRIGUES, Iram J; e CONCEIÇÃO, Jefferson J. (organizadores) “Terceirização no Brasil. Do discurso da inovação à precarização do trabalho”. São Paulo: Annablume/ CUT, 2009, p. 129-150.) e homens negros (na construção civil, nos serviços de portaria e vigilância, e no trabalho rural (Alves, 2019ALVES, Raíssa Roussenq. Entre o silêncio e a negação: trabalho escravo contemporâneo sob a ótica da população negra. São Paulo: Ed. Letramento, 2019.), a composição étnico racial da experiência mais crescente de trabalho uberizado – os entregadores de aplicativos – contempla jovens negros (Aliança Bike, 2019) e tem paralelo no laboratório de exploração do trabalho das mulheres revendedoras de cosméticos (Abílio, 2014ABÍLIO, Ludmila Costhek. Sem maquiagem: o trabalho de um milhão de revendedoras de cosméticos. 1ª ed. São Paulo: Boitempo, 2014.).

Há na experiência do trabalho no Brasil, em sua peculiar caracterização de alta incidência do trabalho informal (Alves, 2019ALVES, Raíssa Roussenq. Entre o silêncio e a negação: trabalho escravo contemporâneo sob a ótica da população negra. São Paulo: Ed. Letramento, 2019.; Theodoro, 2005THEODORO, Mário Lisboa. As características do mercado de trabalho e as origens do informal no Brasil. In: Luciana Jaccoud. (Org.). Questão Social e Políticas Sociais no Brasil Contemporâneo. Brasília: IPEA, 2005, v.1. , p. 91-126.) e de altos níveis de descumprimento da legislação trabalhista mesma na esfera do trabalho formal (Cardoso; Lage, 2007CARDOSO, Adalberto M; LAGE, Telma. As normas e os fatos. Rio de Janeiro: FGV, 2007.; Filgueiras, 2012FILGUEIRAS, Vitor Araújo. Estado e direito do trabalho no Brasil: regulação do emprego entre 1988 e 2008. 2012. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas – FFCH da Universidade Federal da Bahia.), um certo “hábito” de trabalho desprotegido que tem convergido para o alastramento e tolerância dos fenômenos da uberização e da terceirização.

O papel complexo da terceirização no processo de precarização do mercado de trabalho brasileiro - agora protagonizado também pela uberização – permite assimilá-la enquanto fenômeno estrutural, que decorre de um comando de gestão decorrente das diretrizes do atual modelo de acumulação, e que, ao mesmo tempo mobiliza e recruta zonas de exclusão, de forma a envolver o trabalho de sujeitos subalternizados pelo racismo, pelo machismo e outras clivagens discriminatórias, atraindo para tais fenômenos novos significados afeitos à zona do trabalho informal e à sua experiência de vulnerabilidade e violência, , ainda mais no contexto do capitalismo periférico (Dutra e Fleury, 2021DUTRA, R. Q.; FLEURY, F. M. Da pista e do quarto de despejo ao telemarketing: sujeitas subalternas, cuidado e os sentidos da terceirização. Revista da Faculdade Mineira de Direito, 2021, v.24, nº.47, p. 298-326.).

Assim, trata-se de mais do mesmo em uma escalada do discurso que polariza trabalho e direitos, se valendo da precarização produzida pelo próprio modelo, para que as pessoas sejam constrangidas a aderir ao discurso ideológico da desproteção social. Nesse contexto, enquanto a utilidade da terceirização ao capital decorre da alocação de um interposto que blinda e atenua responsabilidades, a uberização é interessante ao capital pela negação do assalariamento e da própria natureza trabalhista do vínculo, aliada ao uso das tecnologias para uma gestão instável e imprevisível. O cruzamento desses dois “proveitos”, certamente, implica um grau ainda mais elevado de exploração do trabalho.

Nesse sentido, vale identificar uma situação típica em que terceirização e uberização se encontram de forma perversa, que é o caso do uso do chamado “Operador Logístico” (OL) pelas “plataformas”. A estratégia diferencia os entregadores, por meio da criação de dois sistemas de contratação: o “Nuvem” e o “OL”. No primeiro, o entregador pode ficar à disposição da empresa a qualquer momento. Já no sistema de OL, o trabalhador cumpre horários fixos, passados por um supervisor que detém uma pessoa jurídica interposta. Nesse segundo caso, o supervisor se coloca como um intermediário entre os entregadores e a empresa, sem também possuir vínculo laboral reconhecido. Como as jornadas são explicitamente pré-definidas, fica ainda mais evidente o vínculo de emprego mascarado. Com o OL, as “plataformas” mantêm a ideia de que sequer mantêm relações de trabalho com os entregadores, mas reforçam esse afastamento com a figura do ente interposto, que tende a ser o foco de eventuais resistências de trabalhadores e instituições. Assim, a figura do supervisor OL reúne a uberização e a terceirização, potencializando a precarização e a exploração.

CONCLUSÃO

As reflexões teóricas desenvolvidas nesse artigo, amparadas em prévias pesquisas empíricas, dão conta da persistência do fenômeno do assalariamento subordinado e do manejo, por organizações capitalistas cada vez mais centralizadas, de estratégias de gestão distintas que tem por objetivo remover os limites impostos à exploração do trabalho.

No Brasil, além de uma abertura irrestrita para a terceirização, materializada na reforma trabalhista de 2017 e nas decisões do STF que a sucederam, tem se mostrado, de forma ainda não consolidada, uma tendência à negação do vínculo empregatício entre as empresas-aplicativos e seus trabalhadores, na direção oposta à verificada no resto do mundo.

A imperatividade de reconhecer e disputar limites para as novas estratégias do capital, que apenas vestem de invólucros novos o velho e essencial conteúdo de exploração do trabalho, passa pelo reconhecimento da persistência do assalariamento nesses novos arranjos e, para isso, da disputa de conceitos que se afirmem mediante afastamento das premissas impostas pelo capital.

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  • POCHMANN, Marcio. A crise capitalista e os desafios dos trabalhadores. Cadernos do CEAS, Salvador, n. 239, p. 698-712, 2016.
  • SOUZA, Elaine Silva de. A “Maquiagem” do trabalho formal: um estudo do trabalho das mulheres terceirizadas no setor de limpeza na Universidade Federal da Bahia. 2012. 196 p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia.
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  • THE HAMILTON PROJECT. A Proposal for Modernizing Labor Laws for Twenty-First- Century Work: The “Independent Worker”. DISCUSSION PAPER 2015-10 | DEC. 2015. Disponível em: https://www.hamiltonproject.org/assets/files/modernizing_labor_laws_for_twenty_first_century_work_krueger_harris.pdf Acesso em: 20.11. 2018.
    » https://www.hamiltonproject.org/assets/files/modernizing_labor_laws_for_twenty_first_century_work_krueger_harris.pdf
  • 1
    Conforme desenvolvido em Filgueiras & Cavalcante, 2020FILGUEIRAS, Vitor Araújo; CAVALCANTE, Sávio. O trabalho no século XXI e o novo adeus à classe trabalhadora. Princípios, 39(159), 11-41. 2020. Disponível em: https://doi.org/10.4322/principios.2675-6609.2020.159.001. Acesso em:16.03.2021.
    https://doi.org/10.4322/principios.2675-...
    . Ressalte-se que arranjos similares para realização de transações de produtos e propriedades não são alvo de nossa análise, mas sim aqueles que envolvem prestação de trabalho humano. Ainda assim, é importante destacar que é o conteúdo das relações, e não sua forma ou a sua designação por parte das empresas, que define a existência ou não de gestão do trabalho por plataformas. Desse modo, o fato de algumas plataformas apresentarem-se como operativas de circulação de mercadorias e não de gestão da produção, não significa que esse arranjo não possa estar englobando a dimensão laboral ou vir a fazê-lo em momento posterior, o que demanda acompanhamento empírico.
  • 2
    Muitas vezes estabelecidas por “demanda” (arranjos são feitos por produto, sem garantia de continuidade).
  • 3
    Consultar, por exemplo, BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. RR-335-50.2011.5.02.0067, 7ª Turma, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 21/05/2021; e BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. Ag-RR-268-51.2017.5.09.0594, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 30/04/2021.
  • 4
    Estamos tratando da gestão do trabalho e do seu conteúdo, não da sua aparência. Formas de reprodução do capital podem mudar e são dinâmicas. Os chamados marketplaces, em tese, não gerenciam a força de trabalho. Contudo, podem e tendem a gerenciar, na medida em que se fortalecem. Nesse artigo, não adentraremos nessa seara, que demanda pesquisa específica do caso de cada plataforma. De todo modo, parte-se da premissa de que o direito do trabalho deve ser ativo, adaptando a empresa aos seres humanos, de modo a impor responsabilidades também na hipótese de marketplaces.
  • 5
    Em pesquisa realizada por parceria UFBA-UCM, a imensa maioria dos entregadores já havia sido bloqueada, desligada, ou conhecia alguém que já tinha sido bloqueado ou desligado pelos “aplicativos” (na Espanha 82,6% e no Brasil 80%). Dentre eles, quase metade sequer sabia o motivo da punição (44% na Espanha e 45% no Brasil), mesmo que alguns tenham questionado à empresa (Filgueiras et al, 2020).
  • 6
    Sobre o novo adeus à classe trabalhadora, ver Filgueiras & Cavalcanti (2020).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    15 Jun 2021
  • Aceito
    13 Out 2021
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