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SINDICALISMO E TERCEIRIZAÇÃO NO BRASIL: pontos para reflexão

UNIONISM AND OUTSOURCING IN BRAZIL: thinking points

LE SYNDICALISME ET LA SOUS-TRAITANCE AU BRÉSIL: éléments de réflexion

Resumos

O objetivo deste artigo é propor uma perspectiva de interpretação sobre o sindicalismo face à terceirização no contexto atual, buscando apreender e sistematizar os posicionamentos das Centrais Sindicais, com foco na CUT, no tema em questão. Interessa-nos discutir a relação entre o sindicalismo brasileiro e o padrão segmentado das relações de trabalho no país, vistos em perspectiva histórica, tomando a terceirização como um processo que atualiza e ressignifica tal padrão. Afinal, o que está em disputa com o tema da terceirização? Que implicações tem trazido para os trabalhadores e para a agenda sindical e o futuro do sindicalismo? Levando-se em conta as características históricas das classes trabalhadoras e da organização sindical, que questões suscitam a terceirização e o presente momento de sua regulamentação? Assim posicionado, pretendemos propor algumas reflexões sobre como a terceirização – enquanto característica central das dinâmicas produtivas e do trabalho no capitalismo contemporâneo, no mundo e no Brasil – desafia o sindicalismo, colocando-lhe renovadas limitações e possibilidades.

Terceirização; Sindicalismo; Regulação do trabalho; Capitalismo brasileiro


This article puts forth a possibility for interpreting unionism faced with outsourcing in a contemporary context, seeking to comprehend and systematize the positions of the Labor Unions regarding this question, especially focusing on the CUT (Workers Union Center). We discuss the relationship between Brazilian unionizing and the segmented pattern of the working relationships in the country, from a historic perspective, considering outsourcing as a work process that updates and resignifies this pattern. After all, what is at stake with the theme of outsourcing? What implications has this brought to workers and to the union’s agenda and the future of unionism? As to Brazil, taking into consideration the historic characteristics of the working classes and of the organization of Unions, what questions do outsourcing and the present moment of regulation bring? Thus, we put forth some questions regarding how outsourcing – as a central characteristic of the production dynamics and of work in contemporary capitalism, worldwide and in Brazil – challenges the Unions, meaning new limitations and possibilities.

Outsourcing; Unionism; Work Regulation; Brazilian Capitalism


L’objectif de cet article est de proposer une interprétation possible du syndicalisme dans le contexte actuel de la sous-traitance. On essaie de comprendre et de systématiser la position des Confédérations Syndicales à ce sujet, en nous concentrant sur la CUT. L’intérêt est de vérifier la relation qui existe entre le syndicalisme brésilien et le modèle segmenté des relations de travail dans le pays et ceci, dans une perspective historique, en considérant la sous-traitance comme un processus qui met à jour et re-signifie un tel modèle. Au final, quel est l’enjeu de la sous-traitance ? Quelles en sont les implications pour les travailleurs, les activités des syndicats et l’avenir du syndicalisme ? Quant au Brésil, si l’on tient compte des caractéristiques historiques de la classe ouvrière et de l’organisation syndicale, quelles sont les questions posées par la sous-traitance et son actuelle réglementation? Nous proposons quelques réflexions issues de ces questionnements, à savoir, comment la sous-traitance – en tant que caractéristique principale des dynamiques de production et du travail dans le cadre du capitalisme contemporain, dans le monde et au Brésil – pose-t-elle un défi au syndicalisme confronté à de nouvelles limitations et possibilités ?

Sous-traitance; Syndicalisme; Réglementation du Travail; Capitalisme Brésilien


INTRODUÇÃO

O tema da terceirização ganhou evidência nacional com o processo de votação, na Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 4330/2004, de autoria do deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO), o qual propôs autorizar, praticamente sem restrições, a terceirização em todos os setores da economia. O fato desencadeou uma forte onda de protestos nas redes sociais e nas ruas, especialmente a partir da reação das entidades sindicais, suscitando amplo debate público, mobilizando parlamentares, lideranças partidárias, sindicalistas, empresários, juízes, advogados, pesquisadores sociais, jornalistas e outros.

A terceirização ou subcontratação, embora não se trate de uma total novidade, adquiriu importância no início dos anos 1990. Entre estudiosos do tema, constituiu-se o entendimento de que esse é um eixo central das estratégias empresariais de flexibilização e precarização das relações de trabalho no Brasil (Ramalho e Martins, 1994MARTINS, Heloísa. Os dilemas do movimento sindical em face da terceirização. In: MARTINS, Heloísa; RAMALHO, José R. (orgs.). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, 1994.; Druck, 1999DRUCK, Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica – um estudo do Complexo Petroquímico da Bahia/SP. Salvador: Boitempo/Edufba, 1999.; Druck e Borges, 2002DRUCK, Graça; Borges, Angela. Terceirização: balanço de uma década. Cadernos do CRH, Salvador, n. 37, p. 111-139, jul./dez., 2002.; Krein, 2005; Pochmann, 2009POCHMANN, Marcio. A superterceirização do trabalho. São Paulo: LTr, 2009.; Marcelino, 2008MARCELINO, Paula. Terceirização e ação sindical: a singularidade da reestruturação do capital no Brasil. Campinas. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), 2008.; Dau, Rodrigues e Conceição, 2009.

Com a intensificação da reestruturação produtiva, das políticas neoliberais e da inserção do país na globalização, disseminou-se nas estratégias de gestão e organização produtivas (incluindo os setores mais “dinâmicos” da indústria e mais “avançados” dos serviços) a subcontratação: de redes de fornecedores, para constituir regimes produtivos compartilhados; dos chamados “serviços de apoio” ou “periféricos”; de atividades tidas como “nucleares”, com o serviço realizando-se dentro ou fora da empresa contratante; de trabalho em domicílio (não mais apenas por segmentos industriais tidos como “tradicionais”, onde jamais deixou de existir); de “pessoa jurídica” ou de “autônomo” nas áreas essenciais das empresas, incluindo ex-empregados; de cooperativas de trabalho; de novas empresas de gestão dos contratos de terceiras, prática denominada de “quarteirização”, entre outras formas (Druck e Borges, 2002DRUCK, Graça; Borges, Angela. Terceirização: balanço de uma década. Cadernos do CRH, Salvador, n. 37, p. 111-139, jul./dez., 2002.; Krein, 2007KREIN, Dari, Teixeira. Tendências recentes nas relações de emprego no Brasil – 1990/2005. Tese (Doutorado em Economia) – IE/UNICAMP, 2007.).1 1 Guimarães (2009a, 2009b e 2009c) tem evidenciado um fenômeno ainda pouco estudado, mas que ganha relevância, no mundo e no Brasil, em associação com os processos de terceirização e flexibilização do trabalho: o incremento do mercado de intermediação de empregos. Perguntando-se no que consiste a novidade neste caso, comenta: “A partir do momento em que ele [tal mercado] se institucionaliza, a circulação da mercadoria ‘força de trabalho’ passa a estar mediada por um terceiro, por um novo agente econômico – o intermediário –, que não se confunde nem com o comprador nem com o vendedor de força de trabalho, sendo especializado em promover a circulação desta última” (Guimarães, 2009c, p. 51).

Para Druck (1999DRUCK, Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica – um estudo do Complexo Petroquímico da Bahia/SP. Salvador: Boitempo/Edufba, 1999., p. 157), a terceirização é entendida como “externalização de atividades” ou “transferência de atividades e responsabilidades para terceiros”. Faria (2014, p. 44) trata-a como um componente central da nova dinâmica capitalista, com a empresa passando a “gerenciar a qualidade da produção comprada de terceiro, elaborar o marketing e cuidar da logística de distribuição”, convertendo-se, praticamente, em “uma grande empresa de serviços”. Considera, entretanto, que, no caso do Brasil, tal expediente visa, sobretudo, à redução dos custos do trabalho. Abreu e Sorj (1994ABREU, Alice; SORJ, Bila. Subcontratação e trabalho a domicílio: a influência de gênero. In: MARTINS, Heloísa; RAMALHO, José R. (Orgs.). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, 1994., p. 64) avaliam que convivem no país duas formas, uma “motivada pelas necessidades de alcançar níveis de qualidade e produtividade superiores”, e outra, denominada “terceirização por contingência”, que mira a “externalização da produção como mecanismo de redução de custos de produção”. Na síntese de Marcelino (2008MARCELINO, Paula. Terceirização e ação sindical: a singularidade da reestruturação do capital no Brasil. Campinas. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), 2008., p. 44),

Toda vez que uma empresa resolve terceirizar, o que ela faz é transferir para outra os riscos e parte dos custos com a contratação da força de trabalho (os trabalhadores, os terceiros). Isso porque o contrato deixa de ser trabalhista (empresa x trabalhador) e passa a ser comercial ou civil (empresa x empresa). Tal acontece se a empresa subcontratada é ou não especialista na função, se o contrato dela com seus trabalhadores é ou não por tempo indeterminado e se a relação entre contratante e subcontratada é ou não duradoura.

Ao trazer grande impacto ao processo produtivo e à gestão do trabalho, envolvendo cada vez mais suas áreas nucleares, e não apenas secundárias, suscita um reposicionamento dos atores estratégicos do mundo do trabalho. Para Conceição e Lima (2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 187), em vista dos “ângulos muito distintos de observação do fenômeno, não resta dúvida de que esta é uma das áreas contemporâneas do conflito entre capital e trabalho”.

Afinal, o que está em disputa com o tema da terceirização? Que implicações tem trazido para os trabalhadores e para a agenda sindical e o futuro do sindicalismo? Quanto ao Brasil, levando-se em conta as características históricas das classes trabalhadoras e da organização sindical, que questões suscitam a terceirização e o presente momento de sua regulamentação?

Interessa-nos discutir a relação entre o sindicalismo brasileiro e o padrão constitutivamente segmentado das relações de trabalho no país, vistos em perspectiva histórica, tomando a terceirização como um processo que atualiza e ressignifica tal padrão. Assim posicionado, pretendemos propor algumas reflexões sobre como a terceirização – enquanto característica central das dinâmicas produtivas e do trabalho no capitalismo contemporâneo, no mundo e no Brasil – desafia o sindicalismo, colocando-lhe renovadas limitações e possibilidades. O objetivo deste artigo é propor uma perspectiva de interpretação sobre o sindicalismo face à terceirização no contexto atual, buscando apreender e sistematizar os posicionamentos das Centrais Sindicais, com foco no Sindicalismo CUT,2 2 Denominação que adotamos para nos referirmos ao complexo de organizações, “verticais” e “horizontais”, “de base” e “de direção”, “orgânicas” e “filiadas”, que compõem a Central Única dos Trabalhadores – CUT. O foco no Sindicalismo CUT se justifica por várias razões: sua origem no chamado “novo sindicalismo”, um marco na história do sindicalismo brasileiro; sua conversão na maior organização sindical geral de trabalhadores do país, desde os anos 1980, quando foi fundada; seu acúmulo prático-discursivo e sua influência no debate público sobre os temas do trabalho/emprego e da terceirização. no tema em questão.

Este texto se baseia, principalmente, nos seguintes suportes: diálogo com a bibliografia considerada pertinente (especialmente centrada em estudos sobre padrões históricos e atuais de trabalho e ação sindical no país, assim como sobre a problemática brasileira da terceirização), visando elementos para um entendimento mais consistente do assunto; apreensão do posicionamento histórico e atual do Sindicalismo CUT e (sempre que considerado importante para a construção do argumento central deste artigo) de outros atores do campo sindical e fora dele, face ao tema, por meio de pesquisa bibliográfica, documental e midiática; retomada de reflexões acumuladas em estudos próprios, com destaque para os referidos ao sindicalismo.

NA ORIGEM: trabalhadores segmentados e experiências sindicais

Ao longo do Século XX, o desenvolvimento capitalista foi acompanhado pela introdução de garantias sociais aos trabalhadores assalariados. A constituição do Estado de Bem Estar Social nos países centrais, já sob o paradigma fordista, sustentou-se nas associações históricas entre capitalismo e assalariamento (quando as relações salariais se expandiram não só na indústria, mas, também, ao incorporar à dinâmica capitalista as atividades agrícolas e de serviços) e entre assalariamento e proteção social (com a institucionalização de direitos sociais, vinculados ao contrato salarial, com coberturas cada vez mais universais).3 3 Conforme Castel (1998), o salariado, de uma condição marginal, tornou-se sob o capitalismo mais desenvolvido do século XX uma condição de estabilidade e de direitos, de proteção social.

A marca da segmentação no caso brasileiro

Esse padrão contrasta com o estatuto do trabalho alcançado com o desenvolvimento capitalista no Brasil. Para Cardoso (2010CARDOSO, Adalberto. A construção da sociedade do trabalho no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010., p. 15), a desigualdade social se tornou “uma das condições estruturantes da sociabilidade brasileira”. Mesmo com a Revolução de 1930, o Estado teria cedido diante da elite agrária, com a regulação apenas do mercado de trabalho urbano, com isso criando “uma utopia irresistível num ambiente de grande vulnerabilidade socioeconômica das massas: a utopia da proteção estatal” (Cardoso, 2010CARDOSO, Adalberto. A construção da sociedade do trabalho no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010., p. 207).

Segundo Santos (1987, p. 68), só após 1930 se estabeleceram, no País, as bases de uma regulamentação do processo de acumulação, que denominou de “cidadania regulada”, fundada “não em um código de valores políticos, mas em um sistema de estratificação ocupacional”. São “cidadãos” os “membros da comunidade que se encontram localizados em qualquer uma das ocupações reconhecidas e definidas em lei”, aos demais restando a condição de “pré-cidadãos” (grifos do autor). Nesse arranjo, complementam-se: a regulamentação das profissões, a carteira profissional e o sindicato controlado. É o que “proporcionará as condições institucionais para que se inflem, posteriormente, os conceitos de marginalidade e de mercado informal de trabalho”. Para Cardoso (2010CARDOSO, Adalberto. A construção da sociedade do trabalho no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010., p. 223), esse arranjo se constituiu “na forma institucional da luta de classes entre nós: uma luta por efetividade dos direitos existentes, uma luta por extensão dos direitos a novas categorias profissionais, e uma luta por novos direitos”. Para ganhar facticidade, a cidadania regulada teve que ser “conquistada” pelos trabalhadores.

Em se comparando com os processos europeu e norte-americano, no caso brasileiro, a industrialização (tardia), o assalariamento (parcial) e a incorporação de mecanismos de proteção social (tutelado e restrito) se estabeleceram em associação com marcantes segmentações sociais (clivagens de classe social, de gênero, de etnia/raça, de geração, de região de origem e outras). Mesmo quanto aos trabalhadores, fortes distinções nos planos material e simbólico se constituíram como estigmas sociais, entre os de origem rural e urbana, os “nortistas” e os “sulistas” (e suas variações: “baianos” e paulistas; “paraíbas” e cariocas etc.), os inseridos na indústria e os do setor de serviços, os qualificados e os não-qualificados, os assalariados e os “autônomos”, os “formais” e os “informais”.

O impulso industrializante dos anos 1950, subsequentemente à fase de “substituição de importações”, fez-se ancorado no tripé: capital nacional privado, capital estatal e capital privado multinacional, com dominância deste último. Resulta daí uma combinação discrepante entre um polo dinâmico, integrado à economia mundial e dotado de alguns mecanismos de proteção social (“fordismo periférico”, nos termos de Lipietz, 1989LIPIETZ, Alain. O fordismo periférico. Revista Ensaios. Porto Alegre, Vol. 2. n. 10, 1989.), e outro, vinculado subalternamente àquele, incorporando amplas parcelas dos trabalhadores em uma gama heterogênea de formas de produção e trabalho, fundadas em bases precárias, fragmentadas, dispersas.

Para Guimarães (2004GUIMARÃES, Nadya. Caminhos Cruzados: estratégias de empresas e trajetórias de trabalhadores. São Paulo: Editora 34, 2004., p. 30), “em contextos sociais como o nosso, a experiência do trabalho nem de longe pode ser analiticamente resolvida pela extensão da metáfora dos ‘chãos-de-fábrica’”. Mesmo os chamados estudos pioneiros da Sociologia do Trabalho no Brasil, que miraram na constituição entre nós da moderna sociedade industrial, precisaram considerar o mundo social além (aquém) da fábrica. Lopes (1964LOPES, Juarez Rubens Brandão. Sociedade Industrial no Brasil (Biblioteca Virtual de Ciências Humanas), 1964., p. 16) tratou da transição do “arcaico” ao “moderno”, focando na “passagem de lavrador” para “operador de máquina em fábrica”, considerando que essa, em geral, se completava “depois de duas ou três gerações de ajustamento à vida urbana”. Enquanto isso, os operários viviam uma pesada influência de seu passado “tradicional”. Rodrigues (1970)RODRIGUES, Leôncio. Industrialização e atitudes operárias. São Paulo: Brasiliense, 1970. tratou da origem “tradicional” da nova classe operária do moderno ramo automobilístico, analisando sua conduta frente à empresa, ao sindicato e à política. Tudo concorreria para seu apoio às lideranças populistas, pela ausência de um padrão de conflito de tipo classista. Simão (1966SIMÃO, Azis. Sindicato e Estado. S. Paulo: Dominus, 1966., p. 03) destacou o “fato novo e dominante” da “interferência do Estado nas relações das classes”, incluindo o reordenamento da organização sindical. Para Lopes, Pessanha e Ramalho (2012, p. 125), naquelas leituras, destacaram-se em comum uma imagem de “heteronomia” da classe operária e do sindicalismo brasileiro.

O paradigma da modernização não impediu uma atenção para o que ainda não era “moderno”, assim como, em alguma medida, para os modos de articulação “moderno-atrasado”. Foi, no entanto, na crítica de inspiração marxista ao paradigma dualista, desenvolvida em seguida, que a discussão sobre tais articulações ganhou maior centralidade. Um destaque cabe a Oliveira (2003a[1972], p. 32), para quem “o processo real mostra uma simbiose e uma organicidade, uma unidade de contrários, em que o chamado ‘moderno’ cresce e se alimenta da existência do ‘atrasado’”. No modo de acumulação de capital à brasileira seria funcional a ele o “crescimento não-capitalístico do setor Terciário”, quando “a aparência de ‘inchação’ esconde um mecanismo fundamental da acumulação: os serviços realizados à base de pura força de trabalho, que é remunerada a níveis baixíssimos, transferem, permanentemente, para as atividades econômicas de corte capitalista, uma fração do seu valor” (Oliveira, 2003a, p. 57). Outras abordagens estrutural-históricas trataram, no Brasil e na América Latina, da problemática das “populações marginais”, do “trabalho por conta própria”, da “pobreza”, em muito revisitando os conceitos de “exército industrial de reserva”, “superpopulação relativa”, “modo de produção”, “acumulação de capital”, “acumulação primitiva”, “classes sociais” etc.4 4 Cf. Nun (1969); Quijano (1970); Kowarick (1973); Tokman (1977); Santos (1978); Singer (1980); Cacciamali (1982).

Para melhor ilustrar o caráter segmentado das configurações de classes no capitalismo brasileiro, recorremos a um outro estudo de Oliveira (2003b[1987], p. 66). O foco recai sobre a implantação da Petrobrás na Bahia, a partir dos anos 1960. Com o golpe de 1964, a oligarquia bancária local conseguiu “fusionar-se com os novos interesses”. Com a incorporação de novas funções técnico-administrativas, surgiram as novas “classes médias”. Sobre os operários, nota-se que, em meio a uma vasta oferta de mão de obra, a incorporação de uma matriz técnica intensiva em capital resultou em vínculos precários, forte segmentação entre os trabalhadores e entraves à afirmação de uma identidade de classe. Outro segmento envolvia um conjunto não-homogêneo de atividades não capitalistas. Naquele contexto, uma reação política por parte dos trabalhadores foi avaliada como “uma quase-impossibilidade”. Contudo, o ambiente político que se instaurava no país já nos anos 1970, tendo no “novo sindicalismo” uma de suas principais expressões, repercutiu na nova classe trabalhadora baiana. Druck (1999DRUCK, Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica – um estudo do Complexo Petroquímico da Bahia/SP. Salvador: Boitempo/Edufba, 1999., p. 176) observa que o sindicalismo petroquímico de Camaçari “passa a ser uma grande referência de atuação coletiva para os trabalhadores, impulsionando a criação de novos sindicatos e revigorando outros”.

A promessa do “novo sindicalismo”5

A emergência de uma classe operária concentrada em grandes empresas na região do ABC, na maioria multinacionais do ramo automobilístico, com salários diferenciados, suscitou um debate sobre se se tratava, ali, de uma “aristocracia operária”, base de um sindicalismo de tipo business union norteamericano. Rodrigues (1970)RODRIGUES, Leôncio. Industrialização e atitudes operárias. São Paulo: Brasiliense, 1970. e Almeida (1975)ALMEIDA, Mª Hermínia T. Sindicato no Brasil: novos problemas, velhas estruturas. Debate e Crítica, São Paulo, Hucitec, 1975. se lançaram na defesa dessa tese. Humphrey (1979) foi um dos primeiros a contestá-la. Mesmo admitindo o caráter diferenciado daquela situação, avaliou que o controle estatal sobre os sindicatos e a adoção de uma política salarial de “arrocho” alimentavam novas formas de conflitos fabris, que, desde baixo, pressionavam os sindicatos. Outros trabalhos, na maioria realizados já sob o impacto das greves que eclodiram no final dos anos 1970, reconheceram nesses segmentos um vigoroso potencial político. Muitos aproveitaram para fazer a crítica das abordagens deterministas.

O impacto daquelas lutas operárias e populares na sociedade brasileira alterou os termos do debate político. Moisés (1982, p. 182), inspirando-se na crítica de Weffort (1973)WEFFORT, Francisco. Origens do sindicalismo populista no brasil. São Paulo: Estudos Cebrap, 1973. ao “sindicalismo populista” do pré-1964,6 6 French (1995, p. 12-13), entre outros, criticou o fato de Weffort ter produzido uma “ortodoxia” da noção de “sindicalismo populista”. nota que os novos movimentos teriam logrado articular demandas sociais e políticas em perspectiva autônoma, ao contrário daquele, onde “a questão nacional muitas vezes hegemonizava a luta sindical, em detrimento da questão social e da própria questão democrática”. Para Sader e Paoli (1986)SADER, Eder; PAOLI, Ma Célia. Sobre “classes populares” no pensamento sociológico brasileiro. In Cardoso, Ruth (org.), A aventura antropológica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986., rompia-se, ali, um modelo interpretativo das ciências sociais sobre os trabalhadores.

Para Sader (1988)SADER, Eder. Quando novos personagens entram em cena: experiências e lutas dos trabalhadores da Grande São Paulo, 1970-1980. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988., três agências (ou centros de elaboração discursiva), naquele contexto, foram as principais responsáveis por organizarem práticas de resistência no cotidiano dos segmentos populares. Cada uma, a seu modo, procurava reconstruir as relações com os segmentos populares: da Igreja Católica, surgiram as Comunidades Eclesiais de Base e a Teologia da Libertação; das organizações de esquerda, emergiram novas práticas políticas; da estrutura sindical oficial controlada pelo Estado, surgiu um “novo sindicalismo”. Do cruzamento dessas novas experiências constituiu-se uma nova matriz discursiva.

Pela via da construção de organizações como o Partido dos Trabalhadores, a CUT, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, entre outras, assentaram-se as bases do que ficou conhecido como campo democrático e popular. É assim que grupos oriundos de segmentos tão diferenciados, como operários metalúrgicos, bancários, petroleiros, urbanitários, professores, trabalhadores das telecomunicações, da construção civil, do comércio, dos transportes, do serviço público, sem terra, pequenos produtores rurais, por conta própria, domésticas, desempregados articularam-se em novos ou renovados espaços de agenciamento. As segmentações constitutivas da formação das classes trabalhadoras no Brasil receberam, nesse período histórico, um tratamento político e a marca da independência de classe.

Desde o seu congresso de fundação, em 1983,7 7 No mesmo ano, também foi criado o Comando Nacional das Classes Trabalhadoras – CONCLAT, reunindo os segmentos articulados em torno da corrente Unidade Sindical e os considerados “pelegos”, de perfil mais conservador, sendo rebatizado de Central Geral dos Trabalhadores – CGT, em 1986. a CUT se define como uma central classista, voltada para a luta pelos objetivos imediatos e históricos dos trabalhadores, que almeja uma sociedade sem explorados nem exploradores. No II Concut (realizado em 1986), explicita mais claramente sua referência no socialismo, associando-a à ideia de democracia, entendida como alargamento da participação das classes populares no processo político. Assim, para além de uma condição de representação empírica dos trabalhadores brasileiros, propõe-se como sua representação política, como representação e direção da classe. É nessa condição que atua politicamente no processo da “transição democrática”, liderando greves nacionais de categorias, protestos nacionais e greves gerais, entre outras formas de luta.

A nova institucionalidade trazida com a Constituição de 1988 suscitou da CUT novos posicionamentos, potencializando as tensões internas. Os setores tidos como minoritários propunham a primazia da ação direta frente à ação institucional, para evitar o risco da “capitulação ao poder burguês” (face ao Estado) e de “burocratização” (face às bases). Já os setores ditos majoritários, mostravam-se mais propensos à participação nos espaços institucionais, de modo a ampliar a influência da Central na sociedade. No III Concut (de 1988), estes, sob protestos dos primeiros, patrocinaram um conjunto de mudanças que visou imprimir à CUT um perfil mais claro de “central sindical” (ao invés de “movimento”), devendo caber-lhe o papel de representante dos “trabalhadores organizados” e de condutora da “contratação coletiva”. À CUT direção se justapôs a CUT estrutura (o que foi favorecido pela crescente imbricação entre suas formas organizativas e a estrutura sindical oficial). A noção de democracia se inspira no modelo do Welfare State, de representação organizada dos interesses. A referência ao socialismo perdeu importância (o que foi favorecido pela crise do “socialismo real”). A relação entre democracia e socialismo ganhou novos contornos.

Com esses ajustes, o Sindicalismo CUT se volta para os trabalhadores assalariados e sindicalizados. Entretanto, continua tendo um papel relevante no cenário político do país.

SEGMENTAÇÕES REINVENTADAS E REARRANJOS SINDICAIS

A onda neoliberal chega ao Brasil no início dos anos 1990, com a eleição de Fernando Collor. É quando o país inicia, propriamente, sua inserção na era da globalização e se intensificam os processos de reestruturação produtiva, que colocaram a economia em sintonia com a nova dinâmica capitalista da acumulação flexível.8 8 Que, para Harvey (2004, p. 140 e 141), “se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo”. Quanto ao trabalho, “parece implicar níveis relativamente altos de desemprego ‘estrutural’ (em oposição a ‘friccional’), rápida destruição e reconstrução de habilidades, ganhos modestos (quando há) de salários reais [...] e o retrocesso do poder sindical”. Resulta daí uma clara tendência de aumento da subcontratação e do trabalho temporário: “A atual tendência dos mercados de trabalho é reduzir o número de trabalhadores ‘centrais’ e empregar cada vez mais uma força de trabalho que entra facilmente e é demitida sem custos quando as coisas ficam ruins” (Harvey, 2004, p. 114).

Os duros anos 1990 e os novos rumos do sindicalismo

Castro e Leite (1994) citam três principais momentos da reestruturação produtiva no país. No início dos anos 1980, restringiu-se à adoção dos Círculos de Controle de Qualidade, sem alterações importantes nas formas de organização do trabalho e na base tecnológica. No final da década, caracterizou-se por uma maior difusão de equipamentos de base microeletrônica, entretanto, com pouca adoção de inovações organizacionais. Nos anos 1990, foi marcada pela incorporação de novas estratégias organizacionais, visando à flexibilização do trabalho. Segundo Ramalho (1997)RAMALHO, José R. Precarização do trabalho e impasses da organização coletiva no Brasil. In: Antunes, Ricardo (org.). Neoliberalismo, trabalho e sindicatos: reestruturação no Brasil e na Inglaterra. São Paulo: Boitempo, 1997., enquanto nos setores mais “modernos”, a reação sindical obrigou as empresas a certo nível de negociação, nos demais, a tendência foi de precarização do trabalho e de fragilização da organização sindical. É nesse contexto que se insere a utilização extensiva da terceirização. Para Druck e Borges (2002)DRUCK, Graça; Borges, Angela. Terceirização: balanço de uma década. Cadernos do CRH, Salvador, n. 37, p. 111-139, jul./dez., 2002., essa se constituiu na principal estratégia de gestão do trabalho na reestruturação produtiva, tendo resultado em uma mudança significativa no perfil dos trabalhadores e na diversificação das formas de trabalho em geral.

No campo do marco regulatório, Oliveira (2002)OLIVEIRA, Marco. Política trabalhista e relações de trabalho no Brasil: da Era Vargas ao Governo FHC. Tese (Doutorado em Economia), Instituto de Economia/Unicamp, 2002. identificou a conformação, no início da década de 1990, de três posições principais: pela “democratização das relações de trabalho” (defendida principalmente pela CUT); pela “desregulamentação” das relações de trabalho (proposta empresarial); por uma “reforma parcial”, primando pela defesa do sistema confederativo e da CLT (reunindo a CGT e a maioria das confederações de trabalhadores). Impôs-se, ao longo da década, o projeto “desregulamentador”, mas não sem resistências.

Para a fragilização da proposta da CUT contribuíram: o quadro de desemprego; a hegemonia neoliberal na sociedade; sua ambígua relação com a estrutura sindical; o acirramento das disputas internas, quando a polarização entre a defesa do socialismo (correntes minoritárias) e de um sindicalismo propositivo e negocial (setor majoritário) chegou ao limite da quase ruptura (no IV Concut, em 1991);9 9 O patrocínio, pelo setor majoritário, da participação da CUT em negociações com o governo sobre a reforma da previdência e nas câmaras setoriais foi central para isso. Quanto às câmaras setoriais, foram constituídas como fóruns de negociação, envolvendo governo, empresários e sindicatos, em vários ramos da economia (metalúrgica, máquinas agrícolas, química, construção civil), entre 1992 e 1993, quando ganhou destaque o Acordo do Setor Automotivo. As Câmaras Setoriais foram desativadas por decisão do então Ministro da Fazenda, FHC. a afirmação do sindicalismo de resultados, que, em 1990, forma a Força Sindical, de índole pragmática e liberal (Cf. Cardoso, 1999CARDOSO, Adalberto. A trama da modernidade: pragmatismo sindical e democratização no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Revan/IUPERJ, 1999.; Tropia, 2009TRÓPIA, Patrícia. Força Sindical: política e ideologia no sindicalismo brasileiro. São Paulo, 2009.).

Com FHC, no campo da regulação do trabalho, a estratégia inicial visou avançar na sua desregulamentação por partes: lei das cooperativas profissionais, desindexação salarial, restrição do poder de fiscalização do MTE, restrição ao exercício da greve no setor público, desvinculação da remuneração na forma de participação nos lucros e resultados em relação à remuneração na forma de salário, promoção do trabalho temporário, do trabalho parcial, do banco de horas, entre outras. Ao lado disso, o governo assume uma postura intransigente no trato das reivindicações sindicais e populares. O episódio da “greve dos petroleiros” demarcou o novo momento (Rizek, 1998RIZEK, Cibele. A greve dos petroleiros. Praga. São Paulo: Editora Hucitec, 1998.). Com isso, o programa de privatizações avançou, apesar da resistência sindical (em especial, da CUT),10 10 A Força Sindical, desde o início, posicionou-se a favor (Comin, 1995). atingindo setores estratégicos para a economia e para o Sindicalismo CUT (siderurgia, telecomunicações, bancos, energia etc.).

Embora as taxas médias de sindicalização persistissem,11 11 Segundo Cardoso (1999), entre 1988 e 1998 verificou-se uma certa estabilidade nas taxas de sindicalização. os efeitos do desemprego sobre a negociação coletiva foram contundentes. Baltar e Krein (2013BALTAR, Paulo; KREIN, Dari. A retomada do desenvolvimento e a regulação do mercado do trabalho no Brasil. Caderno do CRH, Salvador, v. 26, n. 68, p. 273-292, Maio/Ago. 2013., p. 282) observam que, na média, teria havido uma queda no poder de barganha sindical nas negociações coletivas, também associada a uma tendência de descentralização dos acordos. “Nesses acordos por empresa tendeu a prevalecer uma estratégia defensiva de fazer concessões procurando preservar os empregos existentes ou buscando compensar a dificuldade da negociação salarial na convenção por acordos de participação nos lucros e resultados”. Sobre as categorias mais estratégicas, base principal da CUT, os impactos foram contundentes12 12 Embora a CUT continuasse apresentando uma performance positiva, quanto ao número de sindicatos filiados e de trabalhadores formalmente representados. Entre 1994 e 1997, os sindicatos filiados passaram de 2.009 para 2.570 (um crescimento de 27,92%). (Oliveira, 2002OLIVEIRA, Marco. Política trabalhista e relações de trabalho no Brasil: da Era Vargas ao Governo FHC. Tese (Doutorado em Economia), Instituto de Economia/Unicamp, 2002.).

Quanto mais se ampliava o fosso entre os trabalhadores tidos como mais estáveis (cada vez em menor número) e os submetidos a contratos mais precários (em crescimento), mais difícil era para o Sindicalismo CUT realizar o seu projeto de “representação do conjunto da classe trabalhadora”, ainda mais em um contexto politicamente adverso. Sofre revezes no campo da negociação coletiva (perda de poder de barganha efetiva) e no campo da ação política (perda de capacidade de pautar a agenda política do país - protagonismo político).

Nesse contexto, a agenda da participação institucional ganha mais importância (Véras de Oliveira, 2010VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto. A Constituição de 1988, a questão da participação e o sindicalismo: problematizações. In KREIN, José Dari; SANTANA, Marco; BIAVASCHI, Magda (Org.). Vinte anos da Constituição Cidadã no Brasil. São Paulo: LTr, 2010. e 2011). Além das possibilidades abertas com a Constituição “Cidadã”, colocava-se uma situação nova com os temas das “políticas compensatórias”, do “terceiro setor” e da “parceria”. O risco para os movimentos sindical e popular, neste ambiente, era o de sofrer os efeitos de uma onguização no seu perfil de atuação.13 13 Ganhou relevância a atuação sindical no sistema Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador – CODEFAT (de caráter tripartite), principalmente com a instituição do Plano Nacional de Formação Profissional - PLANFOR, no Ministério do Trabalho, em 1995. Às entidades sindicais permitiu-se (e incentivou-se), não só a condição de representantes dos trabalhadores no conselho, mas, também, a de proponentes e executoras (em “parceria” com o Estado) de planos de qualificação profissional e de projetos de intermediação de mão de obra. Acompanhou esse processo a conformação, no Sindicalismo CUT, de um novo arranjo prático-discursivo, no qual adquiriu centralidade a ideia de cidadania, quando surgiu a expressão “sindicato cidadão”. Além da participação institucional, associava-se com: a prioridade na defesa do emprego, dos direitos sociais e da própria democracia, face às políticas neoliberais; a diversificação da agenda sindical (com os temas de gênero, etnia/raça, formação profissional, meio ambiente, saúde do trabalhador, entre outros); um envolvimento com iniciativas de “economia solidária” etc.

Em 2001, o governo, visando avançar em uma reforma global da legislação trabalhista, apresentou a PEC 623, propondo a substituição da primazia do legislado sobre o negociado. Aprovado na Câmara, o projeto deveria ser votado no Senado ainda em 2002, mas, por pressão sindical, perdeu o caráter de urgência e, no começo do governo Lula, saiu de pauta.

Os duros anos 1990 afetaram, especialmente, o Sindicalismo CUT e o seu projeto de representação geral (social e política) das classes trabalhadoras brasileiras.

A Era Lula e os paradoxos do sindicalismo CUT14

A candidatura de Lula representou uma promessa. Um programa focado na defesa do social, da produção, do desenvolvimento e do resgate do projeto nacional sinalizava um contraponto ao neoliberalismo. Alinhava-se, de um lado, a perspectiva das demandas sociais, derivada do caráter desigual da formação social brasileira, que havia sido ressignificada pelas lutas sociais dos anos 1980 (publicização) e desqualificada pelo desmanche dos anos 1990 (reprivatização). A essas se agregavam as demandas de segmentos empresariais em defesa da produção face à financeirização da economia. Do outro lado, colocavam-se as exigências do capital financeiro, visando submeter o país à sua lógica. Ao mesmo tempo, no Brasil não se poderia ignorar as pressões dos segmentos fisiológicos (tanto mais importantes quanto mais o novo governo tivesse que lançar mão da ampliação da base parlamentar de sustentação). A condição de governo de coalizão (sustentado em uma política alargada de alianças) e a opção de fazer concessões ao Mercado (já indicada na “Carta aos Brasileiros”) sintetizam a realidade que ali se impôs. Com isso, o perfil do novo governo ultrapassou em muito os referenciais históricos do campo democrático e popular.

Para o Sindicalismo CUT, esta se apresentou como uma oportunidade histórica, seja no sentido de estancar o desmanche neoliberal, seja no de iniciar o enfrentamento das desigualdades estruturais do país. Estavam postas, em tese, duas possibilidades: afirmar-se como sujeito político autônomo, determinado a disputar, sob condições inéditas, os destinos do país pela ótica das demandas sociais; ou creditar ao governo o fundamental da iniciativa quanto a isso, vendo-se como parceiro dele. A primeira opção poderia contribuir para minar as bases de apoio do governo e, assim, perder aquela oportunidade. A segunda trazia o risco de comprometer sua própria legitimidade, uma situação tanto mais difícil de sustentar quanto mais o governo viesse a assumir atitudes contraditórias com os compromissos históricos do campo.

Quanto à postura do governo no trato com os setores organizados da sociedade, foram várias as sinalizações no sentido da constituição de espaços de negociação social: o Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – CDES, o Fórum Nacional do Trabalho – FNT15 15 Veras de Oliveira (2005). No FNT, a posição do Governo situou-se, contraditoriamente, entre os compromissos históricos do seu núcleo petista e sindicalista e os compromissos construídos com sua base aliada. Os empresários buscaram pautar sua agenda de flexibilização da legislação trabalhista. Entre as Centrais Sindicais, mantiveram-se divergências sobre questões trabalhistas e sindicais, ao mesmo tempo em que se construiu uma base de convergências: naquele ambiente, passou a prevalecer uma posição de maior resistência à flexibilização com a FS. Os resultados da discussão seguiram para o Congresso Nacional em Projeto de Lei apresentado pelo governo, mas não avançou e o próprio Fórum se esvaziou. , a Mesa Nacional de Negociação Coletiva para servidores federais, o Fórum Nacional da Previdência Social,16 16 Instituído em 2007, teve por objetivo discutir reformas de longo prazo para o sistema previdenciário brasileiro, tendo envolvido representantes de empregadores, trabalhadores e setores do Governo Federal. as conferências ministeriais (nas pastas do trabalho e emprego, saúde, educação, meio ambiente, cidades, entre outras) etc. Face a isso, prevaleceu, na CUT, a disposição em: participar e legitimar os novos espaços, atuar propositivamente nas políticas sociais, evitar críticas às ações do governo, emprestar seus quadros para participar da gestão.17 17 Nos dois mandatos de Lula, vários foram os sindicalistas oriundos da CUT que ocuparam cargos de ministros e inúmeros nos escalões inferiores (nestes casos, também incluindo sindicalistas oriundos de outras centrais). Em alguns momentos, como o da Reforma da Previdência e o do “escândalo do mensalão”, a política de alinhamento da CUT com o governo foi testada nos seus limites. Derivou daí o agravamento das divergências internas, com a cisão de um dos grupos para, em seguida, criar a Conlutas.18 18 A Coordenação Nacional de Lutas – CONLUTAS foi criada em 2004, a partir de segmentos na maioria alinhados com o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado – PSTU. Diferentemente das demais centrais, inclui, na sua estrutura, também movimentos sociais urbanos e rurais (Galvão e Trópia, 2014).

Com a ausência de uma proposta de reforma global da legislação trabalhista, várias iniciativas do governo Lula repercutiram na regulação do trabalho, muitas vezes em favor da lógica da flexibilização. São exemplos: o Contrato do Primeiro Emprego19 19 Que instituiu contratos por tempo determinado para jovens de 16 a 24 anos, com redução de alguns direitos. ; a legalização de contratos de prestadores de serviços por empresas de uma só pessoa (PJs); a adoção de exigências trabalhistas diferenciadas para pequenas e micro empresas (lei do Super Simples),20 20 Em 2007, as centrais sindicais fizeram uma manifestação conjunta contra a flexibilização de direitos por ocasião da aprovação da Super Receita, intitulada “Nem um direito a menos, só direitos a mais” (Galvão, 2009). entre outras. Em vários desses casos, criaram-se expedientes de rebaixamento dos direitos trabalhistas, promovendo diferenciações entre trabalhadores face aos direitos do trabalho.

Na outra mão, o governo negociou com as centrais sindicais a apresentação de um projeto de lei, propondo o seu reconhecimento (Lei 11.648 de 200821 21 Conferindo às centrais, nacionalmente constituídas, a atribuição de coordenar políticas gerais de ação em nome de suas filiadas e da generalidade dos trabalhadores. Para ser reconhecida, é preciso atender aos requisitos de, no mínimo, 100 sindicatos filiados, atingindo pelo menos 5% dos trabalhadores sindicalizados no país (Galvão, 2009). ). Uma vez reconhecidas, as centrais ganharam o direito de receber 10% do total da Contribuição Sindical recolhida dos trabalhadores (Galvão, 2009GALVÃO, Andréia. A reconfiguração do movimento sindical no Governo Lula. Outubro, n. 18, 2009.). Amplia-se, com isso, a fragmentação da cúpula do movimento sindical brasileiro22 22 Além da CUT (fundada em 1983), da CGTB (criada em 1983, como CONCLAT, sendo convertida em CGT, em 1986, e Central Geral do Trabalhadores Brasileiros, em 1994) e da Força Sindical (fundada em 1991), surgiram: a CONLUTAS (em 2004); a Nova Central Sindical – NCST (formada, em 2005, a partir das confederações mais tradicionais); a União Geral dos Trabalhadores – UGT (criada, em 2007, a partir da fusão entre a Confederação Geral dos Trabalhadores – CGT, a Central Autônoma dos Trabalhadores – CAT e a Social-Democracia Sindical – SDS); a Central dos Trabalhadores do Brasil – CTB (formada, em 2007, a partir da Corrente Sindical Classista – CSC, ligada ao Partido Comunista do Brasil e até então atuante na CUT). Em 2009, a CONLUTAS e uma parte dos sindicalistas ligados à Intersindical, vinculados ao PSOL, conduziram tratativas para uma possível fusão, mas no congresso realizado para tal propósito, em junho de 2010, as divergências se impuseram e a proposta não foi consumada. Sobre a UGT, ver Trópia, Marcelino e Galvão (2009). . Apesar disso, no entanto, há uma convergência na atuação das centrais nesse período (excetuando-se a Conlutas). Além das articulações visando os espaços de negociação, como o FNT, a convergência foi favorecida por uma agenda de lutas em comum,23 23 Que teve a marca das “marchas a Brasília”, tendo conseguido mobilizar “mais de uma vez, milhares de dirigentes, ativistas e trabalhadores de base”, resultando em audiências com o presidente da República, ministros, parlamentares etc. Marcaram também esse esforço as plenárias conjuntas entre as Centrais, realizadas em 2007 e 2009, com o fim de aprovar uma agenda comum. Na de 2009, promovida pela CGTB, CTB, CUT, Força Sindical e NCST e realizada em São Paulo, participaram mais de 20 mil dirigentes sindicais, ativistas sindicais e trabalhadores de base, sendo denominada Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Dieese, 2014, p. 361). com destaque para a luta por uma política de valorização do salário mínimo.24 24 “O salário mínimo foi a primeira prioridade de ação conjunta das Centrais Sindicais, já na primeira Marcha da Classe Trabalhadora, realizada em dezembro de 2004, razão pela qual o movimento ganhou o nome de Marcha pelo Salário Mínimo”. Pode ser elencada, ainda nesse esforço de ação conjunta, a luta pela redução da jornada de trabalho, entre outras (Dieese, 2012, p. 368). Como resultado, foi criada uma Comissão Quadripartite – com governo, trabalhadores, empregadores e aposentados – para elaborar uma política permanente de reajuste do salário mínimo, sendo esta aprovada pelo Congresso, em 2008. O salário mínimo passou a ter aumentos reais expressivos já a partir de 2005, contribuindo com um cenário mais favorável aos trabalhadores. Para Baltar e Krein (2013BALTAR, Paulo; KREIN, Dari. A retomada do desenvolvimento e a regulação do mercado do trabalho no Brasil. Caderno do CRH, Salvador, v. 26, n. 68, p. 273-292, Maio/Ago. 2013., p. 284), “fortes aumentos do valor do salário mínimo e reajustes das categorias profissionais maiores do que a inflação fizeram com que a elevação do poder de compra da renda do trabalho acontecesse com diminuição das diferenças entre trabalhadores”.

Tal situação favoreceu uma retomada da ação sindical. Algumas características do período merecem ser destacadas, para que seus alcances e limites possam ser melhor avaliados (Baltar e Krein, 2013BALTAR, Paulo; KREIN, Dari. A retomada do desenvolvimento e a regulação do mercado do trabalho no Brasil. Caderno do CRH, Salvador, v. 26, n. 68, p. 273-292, Maio/Ago. 2013.; Krein e Teixeira, 2014KREIN, Dari, Teixeira, MARILANE Oliveira. As controvérsias das negociações coletivas nos anos 2000 no Brasil. In: VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto; BRIDI, Ma Aparecida; Ferraz, Marcos (orgs.). O sindicalismo na Era Lula: paradoxos, perspectivas e olhares. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014.): o Governo exerceu papel central na promoção da negociação coletiva e social (por exemplo, ao favorecer a constituição de espaços macro de negociações coletivas, de caráter tripartite, a exemplo da Mesa Nacional Tripartite Permanente da Indústria da Construção e do setor da Cana de Açúcar); parte dos resultados positivos das negociações coletivas certamente deveu-se à ação sindical; mas a influência sindical sobre a regulação do trabalho, mesmo em um contexto favorável, esteve limitada por condicionantes institucionais e culturais (a estrutura sindical é organizada por categoria profissional e base territorial, o marco regulatório é de tipo legislado - pondo em segundo plano as negociações coletivas); as melhorias no mercado de trabalho conviveu, contraditoriamente, com a flexibilização das relações de trabalho, que continuou (não houve mudança global no marco legal; mudanças pontuais favoreceram a flexibilização; no cotidiano da produção estratégias flexibilizadoras seguiram sendo implementadas).

O sindicalismo teve que lidar com as consequências da flexibilização e precarização do trabalho, mas sem que tenha avançado nesse tema nas negociações coletivas. O que se coloca em questão é a capacidade de uma configuração como a que se constituiu nos Governos Lula/Dilma em estabelecer um padrão de regulação pública do trabalho capaz de fazer frente às pressões precarizantes impostas pelas novas dinâmicas do capitalismo contemporâneo. Assim como, evidenciam-se os desafios do sindicalismo no sentido de que venha a assumir um papel mais efetivo na construção dessa possibilidade de regulação.

A QUESTÃO DA TERCEIRIZAÇÃO: fio condutor para redefinição do padrão de relações de trabalho no brasil?

Segundo Faria (1994)FARIA, Aparecido. Terceirização: um desafio para o movimento sindical. In: MARTINS, Heloísa; RAMALHO, José R. (Orgs.). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, 1994., a terceirização ganhou impulso no Brasil visando, principalmente, reduzir custos com trabalho. Para Conceição e Lima (2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 189), a enorme heterogeneidade do mercado de trabalho brasileiro favoreceu esse propósito:

São grandes as diferenças de salários, benefícios, jornadas de trabalho, condições de trabalho e organização sindical, que se verificam entre as grandes, médias e pequenas empresas; entre as multinacionais e nacionais; entre as regiões do País; entre os setores de atividade. Neste quadro, a terceirização pode, de fato, significar para a empresa que terceiriza acentuada redução de custos.

Na avaliação de Druck (1999)DRUCK, Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica – um estudo do Complexo Petroquímico da Bahia/SP. Salvador: Boitempo/Edufba, 1999., a generalização de tais práticas tem tido um efeito de precarização do trabalho.25 25 Incidindo sobre uma base de relações de trabalho historicamente flexível e precária, a terceirização concorre para a manutenção e o aprofundamento de antigas clivagens no perfil das classes trabalhadoras, assim como para a criação de novas. Uma de suas implicações se refere às relações de gênero: “Essas relações de trabalho estimuladas pela terceirização vêm se constituindo como os novos (ou renovados, como no caso do trabalho a domicílio) espaços de confinamento da mão de obra feminina, contribuindo para a incorporação das mulheres sob condições de trabalho precárias, nas quais há uma superposição de novos e antigos mecanismos de segmentação de gênero” (Araújo, 2009, p. 137). Sobre a temática da terceirização, tratada em perspectiva de gênero, no Brasil, ver, além da autora citada: Delgado (1994); Lombardi (1997); Hirata (1998); Segnini (1998); Amorin (2003). Em balanço de uma década da terceirização na indústria petroquímica da Bahia, Druck e Borges (2002)DRUCK, Graça; Borges, Angela. Terceirização: balanço de uma década. Cadernos do CRH, Salvador, n. 37, p. 111-139, jul./dez., 2002. constatam que tais processos começaram pelas atividades de apoio (serviços de limpeza, vigilância, segurança, manutenção predial), no começo da década de 1990, avançando, também, nas atividades fim (produção e elaboração, laboratórios e processos, manutenção de máquinas e equipamentos),26 26 Sobre a reestruturação no ramo químico-petroquímica no país, ver, também, Carrion (1998) e Guimarães (2004). ao final desta.

Inúmeros estudos, realizados a partir dos anos 1990, atestam o avanço, daí por diante, da terceirização em todos os segmentos da economia. O setor automotivo tornou-se um emblema. Estudos sobre a reestruturação produtiva no setor o ilustram e fundamentam.27 27 Como Castro (1995), Arbix e Zilbovicius (1997), Abreu, Beynon e Ramalho (2000), Abreu, Githay e Ramalho (2000), Conceição (2001), Ramalho e Santana (2006), Antunes (2006, particularmente Parte II), Rodrigues e Ramalho (2007); Bridi (2009), Garcia (2009), entre outros. Destaca-se, neste caso, o modelo da fábrica de caminhões da Volkswagen de Resende, denominado de Consórcio Modular. Para Arbix e Zilbovicius (1997ARBIX, Glauco; ZILBOVICIUS, Mauro. Consórcio modular na VW: um novo modelo de produção? In: ARBIX, Glauco; ZILBOVICIUS, Mauro (orgs.). De JK a FHC: a reinvenção dos carros. São Paulo: Scritta, 1997., p. 466), tratou-se de em um “salto”:

Estaríamos assistindo a um segundo momento de um processo já iniciado com a desverticalização e terceirização: primeiro, a focalização na montagem, terceirizando-se toda atividade de transformação; segundo, a focalização em projeto, distribuição e serviço, configurando-se um negócio de montagem distinto desse. O negócio de montagem de veículos, reconfigurado deste modo, abre espaço para a reestruturação das tradicionais autopeças, ou pelo menos daquelas com folego para assumir uma nova área de atuação.28 28 Segundo Conceição e Lima (2009, p. 203), o modelo consiste no seguinte: “As empresas terceiras fornecem e montam, no mesmo espaço físico da Volkswagen, os principais componentes do veículo: motores, chassis, eixos/suspensão, armação carrocerias, rodas, pintura e tapeçaria. A Volkswagen supervisiona o processo, garante qualidade e põe sua ‘marca’ no veículo. Em várias oportunidades, diretores da empresa alemã argumentaram inclusive que o ‘core business’ da empresa não era mais propriamente produzir ou montar veículos, mas sim comercializá-los a partir da garantia de qualidade que sua marca proporcionava”.

Quanto ao setor bancário, Sanches (2006, p. 18) observa que, além das atividades de apoio amplamente terceirizadas no início dos anos 1990, anos depois, o processo atingiu áreas estratégicas, como Retaguarda e Compensação, e seguiu avançando para outras áreas (telefonia, recepção, teleatendimento, cobrança, análise de crédito, tecnologia da informação etc.), com a disseminação de novas modalidades de serviços bancários realizados por terceiras (“promotores de crédito”, “correspondentes bancários”, entre outras).29 29 Ver, ainda: Dieese (1994), Blanco (1994), Jinkings (2000 e 2006), Silva (2996), Soares (2013), Fontes e Macedo (2014).

Os cenários socioeconômicos e políticos sofreram alterações significativas nos anos 1990 e 2000, contudo os processos de terceirização continuaram ocupando espaços em todas as áreas da economia brasileira.30 30 Sobre o setor de telecomunicações, ver: Laranjeira (1998 e 2007), Garcia (2002), Sirlei (2004), Wolff e Cavalcante (2006), Cavalcante (2009), Véras de Oliveira (2011), Santana e Jatahy (2014). Associado a este setor, e como parte da disseminação e complexificação do fenômeno da terceirização, surgiu o segmento de teleatividades, um importante elo das cadeias de terceirização nos diversos ramos da economia (ver, a respeito, por exemplo, Antunes e Braga, 2009). Para o caso do tradicional setor têxtil/confecções, conferir, especialmente sobre o tema do trabalho a domicílio, além do clássico estudo de Abreu (1986), Abreu e Sorj (1993 e 1994), Delgado (1994), Colli (2000), Kontic (2001 e 2007), Araújo e Amorim (2002), Lima (2002 e 2009 – em ambos os casos, considera-se, também, o setor de calçados), Jikings e Amorim (2006), Heleno (2013), Vilasboas (2015), entre outros. Sobre o setor calçadista, por exemplo, Navarro (2003 e 2005). Quanto à terceirização no serviço público, uma área de particular importância para o conjunto da sociedade, em vista de sua associação com os processos de privatização e as transformações no padrão de gestão públicas, introduzidas nos anos 1990 no país, podem ser conferidos em: Faria (2001); Ferraz (2001); Costa (2008); Amorim (2008), Augusto Jr. et al (2009). Na construção civil, onde é tradicional a prática da subcontratação, ver, por exemplo, Marcelino (2008) e Costa (2013). Pesquisa realizada por Pochmann (2009)POCHMANN, Marcio. A superterceirização do trabalho. São Paulo: LTr, 2009. ,31 31 Realizada em parceria com o Sindicato dos Empregados em Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros, Colocação e Administração de Mão de Obra, Trabalho Temporário, Leitura de Medidores e Entrega de Avisos do Estado de São Paulo – SINDEEPRES, filiado à UGT. O Sindicato tem base estadual, tendo sido fundado em 1992. A pesquisa fez parte de um esforço articulado em três partes: “Sindeepres, A transnacionalização da terceirização na contratação do trabalho”; “Sindeepres, A superterceirização dos contratos de trabalho”; “Sindeepres, A sindicalização no emprego formal terceirizado no estado de São Paulo”. no Estado de São Paulo, referente ao período de 1985 a 2005, constatou que: 12,1% dos empregos formais gerados no período localizaram-se nas empresas de terceirização de mão de obra, as quais cresceram de um patamar de 257 para 6.308 empreendimentos. O número de PJs, em 20 anos, teria crescido 174 vezes, sendo, em geral, alocados em atividades fim. Em pesquisa do SINDEEPRES, realizada em 2012, também sobre o Estado de São Paulo, em continuidade aos estudos com Márcio Pochamann, constata-se que os empregos de terceirização continuaram aumentando, mesmo com o retorno do crescimento econômico.

Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria – CNI, sobre a utilização de serviços terceirizados pela indústria brasileira, realizada em 2009,32 32 http://www.millssi.com.br/wp-content/uploads/2014/05/Sondagem_Especial_terceirizacao_WEB.pdf. Acesso em 02/07/2015. indicou que: 54% das empresas “utiliza ou utilizou nos últimos três anos, serviços terceirizados”; 91% das que terceirizam buscaram a redução de custos; “Na média da indústria, o percentual de trabalhadores terceirizados no total de trabalhadores da empresa é 14%”; entre as dificuldades da terceirização, 47% das que terceirizam apontaram a “insegurança jurídica” e “possíveis passivos trabalhistas”. Em 2014, a CNI repete a sondagem33 33 http://arquivos.portaldaindustria.com.br/app/conteudo_18/2014/08/13/6746/SondagemEspecialTerceirizacao.pdf. Acesso em 02/07/2015. e constata que: o número de empresas que utiliza ou utilizou serviços terceirizados nos últimos três anos passou para 70%; sobre as dificuldades com “insegurança jurídica” e “possíveis passivos trabalhistas”, aumentou para 59,9%; na maioria dos “setores da indústria considerados a terceirização supera 60% das empresas”; “dos quatro principais serviços terceirizados, três são ligados à estratégia produtiva da empresa (montagem e manutenção de equipamentos, logística e consultoria técnica)”.

Estudo da CUT/DIEESE (2014CUT/DIEESE. Terceirização e desenvolvimento, uma conta que não fecha. CUT/DIEESE: São Paulo, v. 2, 2014., p. 13)34 34 Um primeira versão foi lançada em 2011 (CUT/DIEESE, 2011). estima que: “os trabalhadores terceirizados perfazem 26,8% do mercado formal de trabalho, totalizando 12,7 milhões de assalariados”;35 35 Em São Paulo, passa de 30%. O Sudeste é a Região com maior percentual: 29,4%. em média percebem um salário 24,7% menor; estão submetidos a jornadas de trabalho 7,5% maiores;36 36 Não estão computadas aqui as horas-extras, não captadas pela RAIS/CAGED. permanecem no emprego por um período 53,5% menor (maior rotatividade). Avalia que a terceirização tem como faces mais perversas: o descumprimento da lei trabalhista durante a vigência do contrato e, principalmente, ao final deste, quando, com frequência, ocorre calote; maiores riscos de acidentes no trabalho e doenças ocupacionais; menores salários e benefícios; mais discriminações e preconceitos; prejuízo para a ação sindical; no serviço público, está associado a fraudes em licitações, evasão fiscal, focos de corrupção, burla da obrigatoriedade constitucional do serviço público, processos de privatização, aumento de denúncias trabalhistas e previdenciárias.37 37 Entre os principais instrumentos da terceirização no serviço público estão as OSs e OSCIPs. Conforme Augusto Jr. et al (2009, p. 121): “As Organizações Sociais foram instituídas a partir da Lei Federal 9.637/1998 e correspondem a uma forma de propriedade não-estatal, constituída pelas associações civis sem fins lucrativos, impedidas de ser propriedade de qualquer indivíduo ou grupo, e estão orientadas diretamente para o atendimento do interesse público [...] Criadas posteriormente às Organizações Sociais, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público foram instituídas a partir da Lei 9.790/1999, correspondendo ao conjunto de instituições sem fins lucrativos, de atendimento geral, cujos objetivos sociais podem englobar a promoção gratuita da assistência social, da cultura, da saúde, do voluntariado, da educação, dentre outros. A legislação brasileira garante a participação dessas organizações no processo de terceirização na administração pública”.

O processo de disseminação de práticas de terceirização no Brasil, no que se refere à problemática do trabalho, desenvolveu duas principais linhas de tensão: uma a partir dos movimentos de regulação pública e outra, das ações de resistência do movimento sindical.

Os caminhos tortuosos e incertos da regulação da terceirização

Até o momento, não há, no Brasil, legislação específica regulamentando as atividades terceirizadas. Mas se acumularam jurisprudências e proposições. Por cerca de 40 anos, o tema tem sido objeto de disputa pelas vias do Executivo, do Legislativo e do Judiciário brasileiro, com movimentos liberalizantes e restritivos.

Com a Lei 6.019, de 1974, permitiu-se a contratação de trabalho temporário, por no máximo 90, nos casos de substituição ocasional de trabalhadores diretos ou nas situações de pico da produção, não sendo oferecidas as mesmas garantias trabalhistas. Com a Lei 7.102, de 1983, as empresas de serviços de vigilância e de transporte de valores foram autorizadas a atuarem como terceirizadas (Conceição e Lima, 2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.; Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.; Biavaschi e Droppa, 2015).

Em 1986, o TST instituiu o Enunciado 256, que, na prática, restringiu a terceirização, excetuando-se os casos previstos nas Leis 6.019 e 7.102. Em 1993, esse foi substituído pela Súmula 331, quando foi admitida a terceirização para atividades meio, ao mesmo tempo em que às empresas contratantes coube uma responsabilidade de tipo “subsidiária”38 38 A responsabilidade “subsidiária” implica compromisso trabalhista da empresa contratante para com os trabalhadores da subcontratada apenas no caso de ficar comprovada a impossibilidade desta última arcar com tais compromissos. Quanto à responsabilidade “solidária”, aos trabalhadores das empresas subcontratadas cabem executar simultaneamente, subcontratada e contratante, quando da reclamação de seus direitos trabalhistas (Conceição e Lima, 2009). e aos trabalhadores terceirizados não foi garantido o acesso aos direitos em igualdade de condições com os não terceirizados. A Súmula, não vinculante, tem apenas força de orientação jurisprudencial (Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.; Biavaschi e Droppa, 2015). Ao mesmo tempo em que legitima práticas de terceirização,39 39 Conforme Conceição e Lima (2009, p. 198), com isso abriu-se espaço para “a terceirização da própria atividade-fim da empresa”. No início dos anos 1990, os empresários teriam optado pela não regulamentação da terceirização: “qualquer ‘empecilho’ à empresa que tivesse o efeito de obstaculizar, dificultar ou diminuir a terceirização – tais como legislações, acordos coletivos etc. – era prontamente rechaçada pelas representações empresariais. Em última instância, se não havia da parte de governo e das representações dos trabalhadores pressão suficiente para a regulamentação, não seriam os empresários que pressionariam por ela. Neste ambiente de hegemonia das ideias neoliberais em favor do livre mercado, a ausência de regulamentação era o melhor cenário para aqueles que queriam acelerar o processo de terceirização a todo custo” (Conceição e Lima, 2009, p. 199). a Súmula se constituiu na única salvaguarda legal dos trabalhadores contra o avanço da terceirização (DIEESE/ CUT, 2014).

Em 1994, a Lei 8.863 estendeu a autorização de funcionamento de empresa terceirizada para toda as áreas de vigilância patrimonial nos setores público e privado (Conceição e Lima, 2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.). Em 1997, com a Reforma Administrativa (PEC 41/97), introduziu-se a terceirização na Administração Pública direta e indireta (Biavaschi e Droppa, 2015, p. 129).

Em 1998, a Lei 9.601 instituiu o contrato de trabalho por tempo determinado (Conceição e Lima, 2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.). No mesmo ano, o Governo apresentou o PL 4302, propondo alterar a Lei 6.019, de 1974, regulamentando a terceirização via ampliação do tempo contratual do trabalho temporário para atividades fins (Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.; Biavaschi e Droppa, 2015, p. 129).40 40 Para Conceição e Lima (2009, p. 199), no final da década de 1990, o empresariado passa a defender a regulamentação da terceirização, ao se ver “premido já pela expansão dos crescentes processos trabalhistas”. No início do Governo Lula, em 2003, as Centrais Sindicais pressionaram no sentido da retirada do projeto da pauta do Congresso Nacional (Conceição e Lima, 2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 200).41 41 Conceição e Lima (2009, p. 202) notam que, diante da insegurança jurídica crescente e do ambiente criado com o Governo Lula, a CNI e a FIESP passaram a buscar algum entendimento com as Centrais Sindicais sobre o tema da terceirização. Coube à FIESP apresentar às Centrais Sindicais um conjunto de propostas consolidada no documento “Terceirização Protegida”. Alguns pontos o balizaram: o entendimento do processo de terceirização como “irreversível”; é constitucional o livre exercício da atividade econômica, não devendo haver restrições para a terceirização, seja de atividades fim ou meio; a Súmula 331, como principal orientação no âmbito do Direito do Trabalho, causa insegurança no empresariado; a responsabilidade “solidária” isenta de riscos a empresa subcontratada e penaliza a contratante; a regulamentação é necessária para proteger empresários e trabalhadores.

Em 2000, a Súmula 331 foi atualizada, estendendo a responsabilidade “subsidiária” pelos trabalhadores terceirizados para todo o setor público (Biavaschi e Droppa, 2015). Em 2004, Sandro Mabel (PL-GO) apresentou o PL 4330 na Câmara, propondo a terceirização praticamente sem restrições. Em 2007, Vicentinho (PT-SP) apresentou o PL 1621 na Câmara,42 42 Elaborado a partir dos debates no Grupo de Trabalho criado pela CUT para tratar do tema (Dou, 2009). propondo igualdade de direitos entre terceirizados e trabalhadores diretos, a proibição da terceirização em atividades fins e a responsabilidade “solidária” da contratante. Entretanto, o Projeto foi anexado ao PL 4330 (Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.; Biavaschi e Droppa, 2015).

Em 2011, o TST, com o crescimento da pressão empresarial, realizou audiência pública, com participação de empresários, trabalhadores e pesquisadores da área. Em seguida, foi criado o Fórum Nacional Permanente em Defesa dos Direitos dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização – FÓRUM43 43 O Fórum congrega: Central Única dos Trabalhadores – CUT, Força Sindical – FS, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil - CTB, União Geral dos Trabalhadores – UGT, Nova Central Sindical dos Trabalhadores - NCST, Intersindical, Federação Única dos Petroleiros – FUP, Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro da CUT – CONTRAF/CUT, Movimento pelos Direitos Humanos – MHuD, Conselho Sindical da Baixada Santista. Integra, ainda, o Fórum pesquisadores e associações de pesquisa que atuam no mundo do trabalho, entre elas: Associação Latino Americana de Advogados Laborais – ALAL, Associação Latino Americana de Juízes do Trabalho – ALJT, Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho – ANAMATRA, Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas – ABRAT, Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT, Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas – ABRAT, Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho – SINAIT, CESIT/IE/Unicamp, entre outros. (Biavaschi e Droppa, 2015). Em julho de 2013, o governo articula a instalação de uma mesa quadripartite, reunindo Governo Federal, Congresso, Centrais Sindicais dos Trabalhadores e empresários para discutir o tema, não seguindo adiante. Ainda em 2013, mobilização do FÓRUM provocou novo adiamento da votação do PL 4330. Em audiência pública na Câmara Federal, 19 ministros do TST assinaram nota pública contra o PL 4330/04. Com as pressões, “o projeto saiu de pauta, ao menos até as eleições de 2014. Porém, a pressão de setores patronais pela aprovação continuou intensa (Biavaschi e Droppa, 2015, p. 135-136)”.

Em 2014, a pressão empresarial continuou, agora se concentrando no Supremo Tribunal Federal – STF, com o intuito de derrubar a Súmula 331 (Biavaschi e Droppa, 2015). Em abril de 2015, o PL 4330 foi aprovado e remetido ao Senado, convertendo-se em PLC 30.

Ação sindical frente à terceirização

Martins (1994)MARTINS, Heloísa. Os dilemas do movimento sindical em face da terceirização. In: MARTINS, Heloísa; RAMALHO, José R. (orgs.). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, 1994. já indicava, no começo dos anos 1990, a preocupação dos sindicatos brasileiros com a terceirização e suas implicações negativas para os trabalhadores e a ação sindical.44 44 O livro Martins e Ramalho (1994) foi resultado de seminário que reuniu, em São Paulo, em 1993, pesquisadores, assessores sindicais e sindicalistas, sinalizando a importância que o tema já havia adquirido naquele momento. Caberia ao sindicatos negociar? O que negociar? A crítica deve ser feita à terceirização em si ou, tomando-a como inexorável, ao modo como é implementada?

Para Ramalho (1994, p. 165), a percepção de uma postura sindical tendente à negociação não pode significar, para os estudos do trabalho, a não percepção das diferenças entre o sindicalismo da CUT e da FS, visto que o primeiro “permanece reafirmando sua opção pelo socialismo e aparentemente isto não significa que busque ‘parceria’”. Seria preciso considerar ainda que, na CUT, esse tema estava em disputa entre seus setores “minoritários” e “majoritários”, mais reticentes e mais propensos à negociação, respectivamente.

No estudo sobre a indústria química e petroquímica da Bahia, Druck (1999)DRUCK, Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica – um estudo do Complexo Petroquímico da Bahia/SP. Salvador: Boitempo/Edufba, 1999. observa que, com o processo de terceirização em curso, gestavam-se dois grandes grupos de trabalhadores. De um lado, destacava-se uma “elite”, formada pelo reduzido contingente dos que continuaram empregados nas grandes empresas, que via suas condições de trabalho serem rebaixadas e alimentava um sindicalismo de tipo corporativista, fechado na defesa de seus interesses específicos. Do outro lado, aglomeram-se os que, mesmo se mantendo ocupados no setor, perdiam a condição de “estáveis”. Tal situação trouxe implicações novas para as identidades de classe e a ação sindical, tendendo a criar um “fosso” entre esses dois grupos. Nota, por outro lado, a autora, que, do ponto de vista do padrão de respostas das centrais sindicais, não se observava diferenças importantes. Considera, no entanto, que, no campo da CUT, se procurava combinar denúncias e negociações e, quanto aos trabalhadores já terceirizados, defendia-se seu enquadramento na categoria profissional principal da fábrica. No caso estudado, constata que tudo isso ocorria sob um efeito de redução da base sindical e que, mesmo assim, já no início da década, o Sindicato havia criado um “setor de empreiteiras”, com o propósito de, no plano imediato, “tentar influir e resolver os problemas mais cruciais dos trabalhadores de terceiras” (Druck, 1999DRUCK, Graça. Terceirização: (des)fordizando a fábrica – um estudo do Complexo Petroquímico da Bahia/SP. Salvador: Boitempo/Edufba, 1999., p. 237), entretanto, avalia, com resultados inexpressivos, demonstrando ser incapaz de enfrentar a segmentação de sua base social e de se manter articulado em relação aos movimentos sociais, uma marca dos anos 1980.

No que se refere ao Sindicalismo CUT, em termos mais amplos, sua estratégia de ação esteve centrada, entre 1990 e 2003, “basicamente no posicionamento contrário à terceirização”, entretanto, com o avanço do processo, os sindicatos passaram a atuar no seu combate também por meio da negociação (Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 168). Por toda a década de 1990, a CUT Nacional limitou-se a algumas referências esparsas em suas resoluções congressuais. Até que, em 2004, criou um Grupo de Trabalho, no âmbito da Secretaria de Organização, com o fim de articular as ações da Central em três frentes: “a organização dos trabalhadores e trabalhadoras terceirizados; a discussão de cláusulas de acordo a serem negociadas com as representações empresariais nos diferentes ramos de atividade; a elaboração de um conjunto de diretrizes para a construção de um projeto de lei que efetivamente possibilite uma regulamentação da terceirização no Brasil” (Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 168). O referido GT se constituiu no principal espaço de discussão, de articulação e de elaboração da Central sobre o tema.45 45 A CUT, dentre as Centrais, foi quem mais produziu iniciativas e reflexões sobre a terceirização. Como expressão sistemática disso, vejam-se as pesquisas conduzidas em parceria com o Dieese (CUT/Dieese, 2011 e 2014) e o livro organizado com a participação de pesquisadores, assessores sindicais e sindicalistas (Dau, Rodrigues e Conceição (2009). Foi aí que se gestou a proposta de PL que o deputado federal Vicentinho apresentou na Câmara em 2007 (Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.; Conceição e Lima, 2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.). Após anos de resistência, alguns saldos poderiam ser contabilizados:

Driblando os entraves da estrutura sindical oficial, alguns sindicatos filiados à Central já representam politicamente trabalhadores terceirizados, negociam e celebram acordos coletivos. A busca de igualdade de condições de trabalho, remuneração e benefícios; alterações nos estatutos dos sindicatos para incluir a representação de trabalhadores terceirizados; o acesso dos trabalhadores terceirizados aos serviços oferecidos pelos sindicatos; a unificação das ações nos locais de trabalho por meio do aproveitamento de espaços de representação já constituídos, como a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), Comissões de Trabalhadores, Comissões de Negociação de Participação nos Lucros e Resultados e outras, são algumas diretrizes para estratégias de representação a partir dos locais de trabalho (Dau, 2009DAU, Denise. A expansão da terceirização no Brasil e a estratégia da CUT de enfrentamento à precarização do trabalho. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 182).

Entretanto, conforme a própria CUT admitiu por ocasião de sua Plenária Nacional de 2008, os resultados são em termos mais concretos parcos:

Se, por um lado, contabilizamos avanços políticos e um acúmulo significativo nos debates, por outro lado ainda há longo caminho a ser trilhado para construirmos um campo de forças mais favorável para reverter os efeitos maléficos das terceirizações nas relações e nas condições de trabalho. Tomando como ponto de partida as experiências concretas dos ramos e sindicatos filiados, a prioridade no próximo período é de avançar na Representação e Organização dos Trabalhadores e Trabalhadoras Terceirizados e na Negociação e Contratação Coletiva, demais eixos da nossa estratégia nos quais, em tese, temos maior governabilidade, com ações importantes, porém ainda pontuais/localizadas no âmbito de alguns ramos e sindicatos.

Para Marcelino (2009), apesar de um “norte claro” quanto ao tema da terceirização, o Sindicalismo CUT não teria conseguido ir além de uma postura “contraditória” e “ineficiente”. Para estabelecer um contraste, chama a atenção para um dos dois casos estudados, o do Sindicatos dos Trabalhadores da Construção Civil da região de Campinas – SINTICOM, sendo representante, também, de trabalhadores terceirizados, que, embora filiado à CUT, se posicionava em oposição ao campo “majoritário”, quando destaca:

Isso significa que as assembléias na porta da refinaria são constantes; há vários anos o sindicato mobiliza os trabalhadores nas datas-base em greves mais ou menos longas. As negociações entre Sinticom e empresas envolvem salários e benefícios. O sindicato não negocia banco de horas, demissão voluntária, flexibilização da jornada, introdução de novas tecnologias e a própria terceirização. Dentro da sua pauta de negociação, também como já foi dito, a PLR entrou muito recentemente (Marcelino, 2009, p. 194).

No balanço realizado por Krein e Teixeira (2014)KREIN, Dari, Teixeira, MARILANE Oliveira. As controvérsias das negociações coletivas nos anos 2000 no Brasil. In: VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto; BRIDI, Ma Aparecida; Ferraz, Marcos (orgs.). O sindicalismo na Era Lula: paradoxos, perspectivas e olhares. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014. sobre os instrumentos de negociação coletiva no período de 1998 a 2013, concluem que, no que se refere a ganhos de regulação sobre o tema da terceirização, seu conteúdo é, em geral, “bastante frágil”, nos quais destacam-se restrições como “a proibição de utilização de cooperativas de mão de obra e a não terceirização de certas atividades consideradas essenciais no setor”.46 46 Em balanço sobre os processos de negociação coletiva envolvendo o tema da terceirização no Brasil, Oliveira, Costa e Gebrim (2009), com base principalmente nos dados de 2005 do Sistema de Acompanhamento de Contratações Coletivas – SACC, do DIEESE, constataram que 32% dos instrumentos normativos analisados naquele ano apresentaram itens sobre a terceirização. Em geral, versaram sobre: restrições à contratação de trabalhadores terceirizados, exigências às empresas terceiras, fiscalização das empresas subcontratadas, responsabilidade da empresa contratante, rompimento do contrato, garantias aos trabalhadores terceirizados, cláusulas sindicais etc. Entretanto, tais itens foram distribuídos desproporcionalmente, com foco preponderante na tentativa de inibir a terceirização de atividade fim, sendo menos incidentes as garantias para os trabalhadores já terceirizados. Dentre as negociações registradas no SACC, apenas 8% teriam acordado sobre garantias à organização e negociação sindical.

Em matéria de regulação social da terceirização no país, ao que tudo indica, encontra-se ainda em um patamar muito pouco efetivo. Em uma tradição de regulação do trabalho, como a brasileira, do legislado predominando amplamente sobre o negociado, evidencia-se a importância do debate que hora se estabelece sobre o PL 4330/PLS 30.

MOMENTO ATUAL E DESAFIOS SINDICAIS: pontos finais de reflexão

No dia 7 de abril último, foi colocado em votação, na Câmara de Deputados, o substitutivo do deputado Artur Maia (SD-BA), referente ao PL 4330/2004, de autoria do deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO). O Projeto original e o substitutivo, que foi à votação, tiveram como objetivo principal autorizar a terceirização nas atividades fim. A situação desencadeou uma forte onda de protestos nas redes sociais e nas ruas, especialmente a partir da ação das entidades sindicais, fazendo com que as sessões marcadas para a votação das emendas, nos dias 14 e 15 do mesmo mês, fossem suspensas. A votação só foi concluída no dia 22, quando foi aprovada a principal emenda, confirmando a autorização para a terceirização em “atividades meio” e “atividades fim”. Na mesma sessão, foram aprovadas emendas aglutinativas, a exemplo da extensão da terceirização para setores da administração pública; a determinação do prazo de um ano para o trabalhador poder voltar à empresa como terceirizado; a responsabilidade “solidária” da contratante com relação às obrigações trabalhistas e previdenciárias das contratadas; empresas fornecedoras de mão de obra pagarão alíquota de 11% sobre a receita bruta para a Previdência Social, enquanto as que terceirizam serviços que envolvam maquinário pagarão 20% sobre a folha de pagamento; devem ser garantidos aos terceirizados, no local de trabalho, os mesmos direitos dos trabalhadores contratantes; os trabalhadores da contratada serão representados pela empresa contratante, desde que pertençam à mesma categoria, mas sem a obrigatoriedade de observação dos acordos e convenções coletivas anteriormente firmados; quando ocorrer a troca de empresa contratada, sendo mantidos os mesmos trabalhadores, devem ser garantidos os salários e benefícios; permite-se a “quarteirização” (em havendo necessidade de serviços técnicos especializados e se estiver previsto no contrato original), devendo ser comunicada aos sindicatos; os direitos previstos para os terceirizados são estendidos aos trabalhadores terceirizados da administração direta e indireta; as empresas sujeitas ao cumprimento de cotas para deficientes, devem mantê-las; os contratos de terceirização deverão prever uma garantia por parte da contratada. O Projeto seguiu para o Senado, ganhando a denominação de PLS 30, onde se encontra atualmente tramitando. Por algum tempo, o tema continuará alimentando a atenção da sociedade e a mobilização de atores estratégicos.47 47 O Sindicalismo CUT, por meio da pesquisa CUT/Dieese (2014), avalia que a aprovação das medidas propostas terá efeito desastroso para os trabalhadores e a ação sindical, enumerando entre outros os seguintes: aumento significativo da proporção de trabalhadores terceirizados no conjunto da economia; queda de salários e cortes de benefícios; queda no número de postos de trabalho (com jornadas de trabalho em média maiores); intensificação da rotatividade do emprego (em vista da grande incidência de empregos por tempo determinado), drásticas repercussões sobre benefícios (não acumulados), condições de trabalho e perspectivas de carreira (eterno recomeço); maior vulnerabilidade a acidentes e doenças ocupacionais; intensificação das formas de discriminação e preconceito com trabalhadores terceirizados, com o aprofundamento da segmentação entre trabalhadores; maiores dificuldades de fiscalização das condições de trabalho; queda na filiação e arrecadação sindical; maiores dificuldades para a ação sindical e negociação coletiva; mais burla da obrigatoriedade do serviço público etc.

Na resposta sindical, chamou a atenção, em particular, a divergência que se revelou entre as principais Centrais. Assumiram, de imediato, posição em contrário (quando da primeira votação na Câmara, no dia 7 de abril): a CUT, a CTB, a Intersindical e a Conlutas. A FS e a UGT48 48 A UGT é uma das Centrais com maior inserção entre os trabalhadores terceirizados. Segundo Trópia, Marcelino e Galvão (2009, p. 149), o Sindeepres se destaca, “com cerca de 160 mil trabalhadores filiados, o qual representaria, segundo dados da entidade, cerca de meio milhão de trabalhadores. Além do Sindeepres, a Federação das cooperativas de trabalhadores do estado de São Paulo também é base da UGT”. se posicionaram a favor, sendo que esta última reviu sua posição e passou a integrar a campanha já com vistas à segunda votação. A FS, no entanto, manteve apoio à proposta, com sua principal liderança e Deputado Federal, Paulinho da Força (SD-SP), revelando-se como um dos principais articuladores em favor de sua aprovação.49 49 Conforme apurou Marcelino (2008, p. 292): “Ao contrário da CUT, a FS não tem orientações no sentido de filiar trabalhadores terceirizados mesmo não pertencendo a mesma base sindical, não orienta seus sindicatos a buscar negociações coletivas que abarquem os mesmos direitos para terceirizados e não terceirizados, não incentiva e nem repudia a integração com sindicatos ligados à outra central. Em uma palavra, omite-se de ações concretas no cotidiano sindical”.

O impulso reativo das forças sociais e políticas, alinhadas na defesa dos direitos dos trabalhadores, gerou uma oportunidade ímpar de retomar a iniciativa política. A retomada das mobilizações, a partir da condução das centrais sindicais e dos movimentos populares, foi particularmente importante quanto às disputas que vêm marcando as manifestações de ruas e as redes sociais, a começar pelas manifestações de julho de 2013.

A possibilidade de sucesso na construção de um padrão de regulação pública das relações de trabalho no país, capaz de reverter a precarização trazida com os processos de terceirização e de flexibilização das relações de trabalho, tem, na tramitação final desse Projeto e no saldo político que daí resultar, um capítulo decisivo. Ao sindicalismo cabe, sempre, um desafio especial no esforço de construção de tal possibilidade, entretanto, proponho que o desafio, nesse momento, adquire um peso ainda maior, seja porque não se vislumbra outra agência que seja capaz de ocupar o espaço central de condução dessa bandeira, seja porque o desempenho desse papel requer o enfrentamento de problemas históricos e atuais referidos à sua própria condição organizativa e política. Senão, vejamos.

Quanto à primeira proposição, advogamos que, em perspectiva comparada, os contextos configurados, em seus aspectos mais gerais, i) nos anos 1990 (entre os Governos Collor a FHC), ii) nos Governos Lula (dois mandatos) e Dilma I (primeiro mandato) e iii) no Governo Dilma II (início do segundo mandato), trouxeram componentes diferenciados para a dinâmica de implementação da terceirização e da flexibilização das relações de trabalho no país e para as condições de atuação do sindicalismo face a tais dinâmicas. A partir do que discutimos até aqui, arriscamos um quadro comparativo esquemático, apenas para facilitar o raciocínio que se pretende propor. No contexto i), o processo deslanchou e avançou graças à confluência de, pelo menos, quatro fatores (que se potencializaram reciprocamente):

a) os empresários se sentiram estimulados e ou pressionados a desencadear um processo de reestruturação produtiva com um eixo principal na terceirização; aliado a isso, buscaram atuar junto aos poderes instituídos e à mídia, visando legitimá-lo.

b) os governos que se sucederam no período (com importante respaldo de outros poderes institucionais e da mídia) atuaram favorecendo a flexibilização e precarização das relações de trabalho, por meio de: estímulos à reestruturação produtiva, reformas na legislação trabalhista, agendas de privatizações e de reforma do Estado, atitudes antissindicais e de criminalização dos movimentos sociais, política macroeconômica dissociada do horizonte do emprego etc.

c) o quadro de rebaixamento dos indicadores do emprego e da renda do trabalho (grau de formalização, níveis salariais, resultados quantitativos e qualitativos das negociações coletivas, entre outros), ao mesmo tempo em que resultou das condições anteriores, tudo junto, produziu um ambiente extremamente desfavorável para os trabalhadores e para a ação sindical.

d) ao sindicalismo restou uma ação fundamentalmente defensiva, de resistência (mesmo sob variações produzidas por condições e orientações diversas); teve que lidar com: quadro econômico adverso, governos hostis, ações empresariais precarizantes e antissindicais, ambiente político geral desfavorável, além dos problemas históricos da institucionalidade sindical e de equacionamento político de suas divergências; sendo que, ainda assim, se manteve como referência das demandas dos trabalhadores nas negociações coletivas e junto à Justiça, assim como no âmbito das interlocuções políticas mais gerais, com o Executivo, o Parlamento etc.; em ambos os casos, com desempenho claramente inferior ao do período anterior.

Comparado ao contexto i), pode-se afirmar que no contexto ii) o processo de terceirização e flexibilização continuou, embora não no mesmo ritmo nem com os mesmos componentes:

a) os governos do período atuaram sob limites e ambivalências em favor dos temas do trabalho e da proteção social: evitaram colocar em pauta a reforma trabalhista (demandada pelos empresários), adotaram uma política econômica de estímulo ao crescimento, ao incremento do mercado interno e à geração de emprego, desenvolveram políticas sociais com foco na transferência de renda e na recomposição do salário mínimo, favoreceram a constituição de espaços de negociação social, incorporaram sindicalistas em várias e importantes pastas, entre outras. Mas, por outro lado, adotaram medidas flexibilizadoras (além do mais, as ações de governo favoráveis à perspectiva dos direitos sociais e de cidadania encontram resistência em segmentos da base aliada, em setores dos demais poderes institucionais, na mídia etc.);

b) os indicadores do emprego reagem positivamente: o desemprego cai, a formalização cresce, a renda média dos trabalhadores sobe, os resultados das negociações coletivas melhoram etc., favorecendo o desempenho do sindicalismo, seja no plano das negociações coletivas, seja no da interlocução no plano político mais geral;

c) os empresários continuam implementando a terceirização e a flexibilização (e pressionando por sua regulamentação, em bases favoráveis), entretanto, tornam-se mais cautelosos, em vista do ambiente político e de alguma recomposição do poder de barganha sindical e dos trabalhadores;

d) o sindicalismo se vê favorecido pela melhora do quadro geral do mercado de trabalho, assim como pela inserção e maior trânsito junto ao governo federal (exceção feita aos segmentos posicionados em oposição ao governo); aumenta, com isso, sua eficácia no plano das negociações coletivas; amplia sua influência política mais geral, mas não recupera o protagonismo político que conquistou nos anos 1980 (em geral, o que vale, principalmente, para o Sindicalismo CUT, tendo delegado ao Governo a iniciativa da agenda social e do trabalho).

Sobre o contexto iii):

e) o Governo se encontra em uma posição claramente fragilizada, de modo que não reúne a mesma capacidade de influir sobre a agenda pública quando comparado com o contexto anterior; associado a isso, tem feito uma clara opção de recompor seu poder de ação, sobretudo com concessões ao Mercado e aos segmentos fisiológicos da base aliada, afastando-se da agenda social e dos segmentos que a representam, com destaque para o sindicalismo.

f) os empresários, aproveitando-se do ambiente político geral, aumentam a pressão por uma regulamentação fracamente favorável à terceirização e flexibilização das relações de trabalho, neste momento, elegendo a aprovação do PL 4330/PLS 30 como prioridade; enquanto isso, favorecidos pelo quadro de instabilidade econômica que se instaura, sentem-se estimulados a avançar na implementação prática de um processo que, mesmo no contexto anterior, não havia sofrido interrupção.

g) com a crise econômica já instalada e as medidas de ajuste fiscal que vêm sendo implementadas pelo Governo, os indicadores de emprego já começam a dar sinais de franca deterioração, o que afetará os ganhos dos trabalhadores e as condições de atuação sindical.

h) com isso, o novo quadro que se desenha sobrecarregará o sindicalismo no sentido de buscar compensar as perdas deste em relação ao contexto anterior; não podendo mais contar com medidas governamentais que favoreçam, ao contrário do período anterior, o emprego e a renda do trabalhador e com os mesmos espaços de influência na agenda do governo, nem com o quadro econômico favorável ao emprego e à barganha sindical, nem, ainda, com uma certa cautela empresarial (nas negociações diretas e em suas investidas junto aos poderes instituídos), cabe ao ator sindical assumir o protagonismo na condução de uma agenda política do trabalho, sob pena de sucumbirem, trabalhadores e sindicalismo, à avalanche conservadora que se anuncia.

Assim, reafirmamos que não se vislumbra outra agência que seja capaz de ocupar o lugar central na condução dessa agenda no Brasil, de modo a pôr no horizonte a possibilidade de construção de um padrão de regulação pública das relações de trabalho em um patamar civilizado. Reafirmamos, por outro lado, que o desempenho desse papel requer o enfrentamento de problemas históricos e atuais referidos à sua própria condição organizativa e política. Sobretudo, requer que se ponha em causa sobre as formas de construção de uma representação mais ampla das classes trabalhadoras no país, considerando-se seu caráter historicamente segmentado e a atualização dessa segmentação, trazida com os processos de terceirização e flexibilização em curso.

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  • 1
    Guimarães (2009aGUIMARÃES, Nadya. Desemprego, uma construção social - São Paulo, Paris, Tóquio. Belo Horizonte: Editora Argvmentvm; PPGS/USP, 2009a., 2009bGUIMARÃES, Nadya. À procura de trabalho: instituições do mercado e redes. Belo Horizonte: Editora Argvmentvm, 2009b. e 2009cGUIMARÃES, Nadya. Trajetórias surpreendentes: os intermediadores de emprego e seus trabalhadores. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009c.) tem evidenciado um fenômeno ainda pouco estudado, mas que ganha relevância, no mundo e no Brasil, em associação com os processos de terceirização e flexibilização do trabalho: o incremento do mercado de intermediação de empregos. Perguntando-se no que consiste a novidade neste caso, comenta: “A partir do momento em que ele [tal mercado] se institucionaliza, a circulação da mercadoria ‘força de trabalho’ passa a estar mediada por um terceiro, por um novo agente econômico – o intermediário –, que não se confunde nem com o comprador nem com o vendedor de força de trabalho, sendo especializado em promover a circulação desta última” (Guimarães, 2009cGUIMARÃES, Nadya. Trajetórias surpreendentes: os intermediadores de emprego e seus trabalhadores. In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009c., p. 51).
  • 2
    Denominação que adotamos para nos referirmos ao complexo de organizações, “verticais” e “horizontais”, “de base” e “de direção”, “orgânicas” e “filiadas”, que compõem a Central Única dos Trabalhadores – CUT. O foco no Sindicalismo CUT se justifica por várias razões: sua origem no chamado “novo sindicalismo”, um marco na história do sindicalismo brasileiro; sua conversão na maior organização sindical geral de trabalhadores do país, desde os anos 1980, quando foi fundada; seu acúmulo prático-discursivo e sua influência no debate público sobre os temas do trabalho/emprego e da terceirização.
  • 3
    Conforme Castel (1998)CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Petrópolis: Editora Vozes, 1998., o salariado, de uma condição marginal, tornou-se sob o capitalismo mais desenvolvido do século XX uma condição de estabilidade e de direitos, de proteção social.
  • 4
    Cf. Nun (1969)NUN, José. Superpoblación relativa, ejército industrial de reserva y masa marginal. Revista Latino-americana de Sociología. Buenos Aires, 1969, v. 5, nº 2.; Quijano (1970)QUIJANO, Anibal. La formation du monde de la marginalité urbaine. Espaces et Societes, Paris, n. 01, 1970.; Kowarick (1973); Tokman (1977)TOKMAN, Victor. Dinamica del mercado de trabajo urbano: el sector informal urbano em America latina. Programa Regional del Empleo para America Latina y El Caribe. OIT, 1977.; Santos (1978)SANTOS, Milton. Pobreza urbana. São Paulo: Hucitec; Recife: UFPE, 1978.; Singer (1980)SINGER, Paul. A economia urbana de um ponto de vista estrutural. In: SOUZA, Guaracy; FARIA, Vilmar (Org.). Bahia de todos os pobres. Petrópolis, RJ: Vozes; Cebrap, 1980.; Cacciamali (1982)CACCIAMALI, Ma Cristina. Um estudo sobre o setor informal urbano e formas de participação na produção. Tese (Doutorado em Economia), FEA/USP, 1982..
  • 5
    Véras de Oliveira (2011)VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto. Sindicalismo e democracia no Brasil: do novo sindicalismo ao sindicato cidadão. São Paulo: Annablume Editora, 2011.; Ladosky e Véras de Oliveira (2015).
  • 6
    French (1995FRENCH, John. O ABC dos operários: conflitos e alianças de classe em São Paulo, 1900-1950. São Paulo: Hucitec, 1995., p. 12-13), entre outros, criticou o fato de Weffort ter produzido uma “ortodoxia” da noção de “sindicalismo populista”.
  • 7
    No mesmo ano, também foi criado o Comando Nacional das Classes Trabalhadoras – CONCLAT, reunindo os segmentos articulados em torno da corrente Unidade Sindical e os considerados “pelegos”, de perfil mais conservador, sendo rebatizado de Central Geral dos Trabalhadores – CGT, em 1986.
  • 8
    Que, para Harvey (2004HARVEY, David. Condição pós-moderna. 13ª Edição. São Paulo: Edições Loyola, 2004., p. 140 e 141), “se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo”. Quanto ao trabalho, “parece implicar níveis relativamente altos de desemprego ‘estrutural’ (em oposição a ‘friccional’), rápida destruição e reconstrução de habilidades, ganhos modestos (quando há) de salários reais [...] e o retrocesso do poder sindical”. Resulta daí uma clara tendência de aumento da subcontratação e do trabalho temporário: “A atual tendência dos mercados de trabalho é reduzir o número de trabalhadores ‘centrais’ e empregar cada vez mais uma força de trabalho que entra facilmente e é demitida sem custos quando as coisas ficam ruins” (Harvey, 2004HARVEY, David. Condição pós-moderna. 13ª Edição. São Paulo: Edições Loyola, 2004., p. 114).
  • 9
    O patrocínio, pelo setor majoritário, da participação da CUT em negociações com o governo sobre a reforma da previdência e nas câmaras setoriais foi central para isso. Quanto às câmaras setoriais, foram constituídas como fóruns de negociação, envolvendo governo, empresários e sindicatos, em vários ramos da economia (metalúrgica, máquinas agrícolas, química, construção civil), entre 1992 e 1993, quando ganhou destaque o Acordo do Setor Automotivo. As Câmaras Setoriais foram desativadas por decisão do então Ministro da Fazenda, FHC.
  • 10
    A Força Sindical, desde o início, posicionou-se a favor (Comin, 1995COMIN, Álvaro. A estrutura sindical corporativa: um obstáculo à consolidação das Centrais Sindicais no Brasil. Dissertação (Mestrado em Sociologia), FFLCH/USP, 1995.).
  • 11
    Segundo Cardoso (1999)CARDOSO, Adalberto. A trama da modernidade: pragmatismo sindical e democratização no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Revan/IUPERJ, 1999., entre 1988 e 1998 verificou-se uma certa estabilidade nas taxas de sindicalização.
  • 12
    Embora a CUT continuasse apresentando uma performance positiva, quanto ao número de sindicatos filiados e de trabalhadores formalmente representados. Entre 1994 e 1997, os sindicatos filiados passaram de 2.009 para 2.570 (um crescimento de 27,92%).
  • 13
    Ganhou relevância a atuação sindical no sistema Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador – CODEFAT (de caráter tripartite), principalmente com a instituição do Plano Nacional de Formação Profissional - PLANFOR, no Ministério do Trabalho, em 1995. Às entidades sindicais permitiu-se (e incentivou-se), não só a condição de representantes dos trabalhadores no conselho, mas, também, a de proponentes e executoras (em “parceria” com o Estado) de planos de qualificação profissional e de projetos de intermediação de mão de obra.
  • 14
    Araújo e Véras de Oliveira (2014)ARAÚJO, Angela; VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto. O sindicalismo na era Lula: entre paradoxos e novas perspectivas. In: VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto; BRIDI, Ma Aparecida; Ferraz, Marcos (orgs.). O sindicalismo na Era Lula: paradoxos, perspectivas e olhares. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014..
  • 15
    Veras de Oliveira (2005)VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto. O Diálogo social e a reforma trabalhista e sindical no Brasil: debate atual. In: ESTANQUE, Elísio et al. (org.). Mudanças no trabalho e ação sindical: Brasil e Portugal no contexto da transnacionalização. São Paulo: Cortez, 2005.. No FNT, a posição do Governo situou-se, contraditoriamente, entre os compromissos históricos do seu núcleo petista e sindicalista e os compromissos construídos com sua base aliada. Os empresários buscaram pautar sua agenda de flexibilização da legislação trabalhista. Entre as Centrais Sindicais, mantiveram-se divergências sobre questões trabalhistas e sindicais, ao mesmo tempo em que se construiu uma base de convergências: naquele ambiente, passou a prevalecer uma posição de maior resistência à flexibilização com a FS. Os resultados da discussão seguiram para o Congresso Nacional em Projeto de Lei apresentado pelo governo, mas não avançou e o próprio Fórum se esvaziou.
  • 16
    Instituído em 2007, teve por objetivo discutir reformas de longo prazo para o sistema previdenciário brasileiro, tendo envolvido representantes de empregadores, trabalhadores e setores do Governo Federal.
  • 17
    Nos dois mandatos de Lula, vários foram os sindicalistas oriundos da CUT que ocuparam cargos de ministros e inúmeros nos escalões inferiores (nestes casos, também incluindo sindicalistas oriundos de outras centrais).
  • 18
    A Coordenação Nacional de Lutas – CONLUTAS foi criada em 2004, a partir de segmentos na maioria alinhados com o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado – PSTU. Diferentemente das demais centrais, inclui, na sua estrutura, também movimentos sociais urbanos e rurais (Galvão e Trópia, 2014GALVÃO, Andréia; TRÓPIA, Patrícia. A SCP-Conlutas em perspectiva. In: VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto; BRIDI, Ma Aparecida; Ferraz, Marcos (orgs.). O sindicalismo na Era Lula: paradoxos, perspectivas e olhares. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014.).
  • 19
    Que instituiu contratos por tempo determinado para jovens de 16 a 24 anos, com redução de alguns direitos.
  • 20
    Em 2007, as centrais sindicais fizeram uma manifestação conjunta contra a flexibilização de direitos por ocasião da aprovação da Super Receita, intitulada “Nem um direito a menos, só direitos a mais” (Galvão, 2009GALVÃO, Andréia. A reconfiguração do movimento sindical no Governo Lula. Outubro, n. 18, 2009.).
  • 21
    Conferindo às centrais, nacionalmente constituídas, a atribuição de coordenar políticas gerais de ação em nome de suas filiadas e da generalidade dos trabalhadores. Para ser reconhecida, é preciso atender aos requisitos de, no mínimo, 100 sindicatos filiados, atingindo pelo menos 5% dos trabalhadores sindicalizados no país (Galvão, 2009GALVÃO, Andréia. A reconfiguração do movimento sindical no Governo Lula. Outubro, n. 18, 2009.).
  • 22
    Além da CUT (fundada em 1983), da CGTB (criada em 1983, como CONCLAT, sendo convertida em CGT, em 1986, e Central Geral do Trabalhadores Brasileiros, em 1994) e da Força Sindical (fundada em 1991), surgiram: a CONLUTAS (em 2004); a Nova Central Sindical – NCST (formada, em 2005, a partir das confederações mais tradicionais); a União Geral dos Trabalhadores – UGT (criada, em 2007, a partir da fusão entre a Confederação Geral dos Trabalhadores – CGT, a Central Autônoma dos Trabalhadores – CAT e a Social-Democracia Sindical – SDS); a Central dos Trabalhadores do Brasil – CTB (formada, em 2007, a partir da Corrente Sindical Classista – CSC, ligada ao Partido Comunista do Brasil e até então atuante na CUT). Em 2009, a CONLUTAS e uma parte dos sindicalistas ligados à Intersindical, vinculados ao PSOL, conduziram tratativas para uma possível fusão, mas no congresso realizado para tal propósito, em junho de 2010, as divergências se impuseram e a proposta não foi consumada. Sobre a UGT, ver Trópia, Marcelino e Galvão (2009)GALVÃO, Andréia. A reconfiguração do movimento sindical no Governo Lula. Outubro, n. 18, 2009..
  • 23
    Que teve a marca das “marchas a Brasília”, tendo conseguido mobilizar “mais de uma vez, milhares de dirigentes, ativistas e trabalhadores de base”, resultando em audiências com o presidente da República, ministros, parlamentares etc. Marcaram também esse esforço as plenárias conjuntas entre as Centrais, realizadas em 2007 e 2009, com o fim de aprovar uma agenda comum. Na de 2009, promovida pela CGTB, CTB, CUT, Força Sindical e NCST e realizada em São Paulo, participaram mais de 20 mil dirigentes sindicais, ativistas sindicais e trabalhadores de base, sendo denominada Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Dieese, 2014, p. 361).
  • 24
    “O salário mínimo foi a primeira prioridade de ação conjunta das Centrais Sindicais, já na primeira Marcha da Classe Trabalhadora, realizada em dezembro de 2004, razão pela qual o movimento ganhou o nome de Marcha pelo Salário Mínimo”. Pode ser elencada, ainda nesse esforço de ação conjunta, a luta pela redução da jornada de trabalho, entre outras (Dieese, 2012DIEESE. A situação do trabalho no Brasil na primeira década dos anos 2000. São Paulo: Dieese, 2012., p. 368).
  • 25
    Incidindo sobre uma base de relações de trabalho historicamente flexível e precária, a terceirização concorre para a manutenção e o aprofundamento de antigas clivagens no perfil das classes trabalhadoras, assim como para a criação de novas. Uma de suas implicações se refere às relações de gênero: “Essas relações de trabalho estimuladas pela terceirização vêm se constituindo como os novos (ou renovados, como no caso do trabalho a domicílio) espaços de confinamento da mão de obra feminina, contribuindo para a incorporação das mulheres sob condições de trabalho precárias, nas quais há uma superposição de novos e antigos mecanismos de segmentação de gênero” (Araújo, 2009, p. 137). Sobre a temática da terceirização, tratada em perspectiva de gênero, no Brasil, ver, além da autora citada: Delgado (1994)DELGADO, Ma Berenice. Terceirização e trabalho feminino. In: MARTINS, Heloísa; RAMALHO, José R. (orgs.). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, 1994.; Lombardi (1997); Hirata (1998)HIRATA, Helena. Reestruturação produtiva e relações de gênero. Revista Latinoamericana de Estudos do Trabalho, ano 4, n. 7, 1998.; Segnini (1998)SEGNINI, Liliana. Mulheres no trabalho bancário: difusão tecnológica, qualificação e relações de gênero. São Paulo: EDUSP, 1998.; Amorin (2003)AMORIN, Elaine. No limite da precarização: terceirização e trabalho feminino na indústria de confecção. Dissertação de Mestrado, Campinas, IFCH/UNICAMP, 2003..
  • 26
    Sobre a reestruturação no ramo químico-petroquímica no país, ver, também, Carrion (1998)CARRION, Rosinha M. Reestruturação produtiva, processo de trabalho e qualificação dos operadores na indústria petroquímica do Rio Grande do Sul. Tese de Doutoramento, PPGA/ UFGRS, 1998. e Guimarães (2004)GUIMARÃES, Nadya. Caminhos Cruzados: estratégias de empresas e trajetórias de trabalhadores. São Paulo: Editora 34, 2004..
  • 27
    Como Castro (1995)CASTRO, Nadya. A máquina e o equilibrista: inovações na indústria automobilística brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995., Arbix e Zilbovicius (1997)ARBIX, Glauco; ZILBOVICIUS, Mauro. Consórcio modular na VW: um novo modelo de produção? In: ARBIX, Glauco; ZILBOVICIUS, Mauro (orgs.). De JK a FHC: a reinvenção dos carros. São Paulo: Scritta, 1997., Abreu, Beynon e Ramalho (2000)ABREU, Alice; BEYNON, Huw; RAMALHO, José R. The dream factory: VW’s modular system in Resende. Brazil. Work, Employment and Society, v. 14, issue 2. UK, Cambridge University, 2000., Abreu, Githay e Ramalho (2000), Conceição (2001)CONCEIÇÃO, Jefferson. As fábricas do ABC no olho do furacão: a indústria de autopeças e a reestruturação da cadeia de produção automotiva nos anos 90. Dissertação de Mestrado, IMES, São Caetano do Sul, 2001., Ramalho e Santana (2006)RAMALHO, José R.; SANTANA, Marco (org.). Trabalho e desenvolvimento regional: efeitos sociais da indústria: efeitos sociais da indústria automobilística no Rio de Janeiro: Mauad, 2006., Antunes (2006ANTUNES, Ricardo (Org.). Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2006., particularmente Parte II), Rodrigues e Ramalho (2007)RODRIGUES, Iram; Ramalho, José R. (orgs.). Trabalho e sindicato em antigos e novos territórios produtivos. São Paulo: Annablume, 2007.; Bridi (2009)BRIDI, Ma Aparecida. Trabalhadores dos anos 2000: o sentido da ação coletiva na fábrica de nova geração. São Paulo: LTr, 2009., Garcia (2009)GARCIA, Sandro. Global e local: o polo automobilístico de Gravataí. São Paulo: Annablume, 2009., entre outros.
  • 28
    Segundo Conceição e Lima (2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 203), o modelo consiste no seguinte: “As empresas terceiras fornecem e montam, no mesmo espaço físico da Volkswagen, os principais componentes do veículo: motores, chassis, eixos/suspensão, armação carrocerias, rodas, pintura e tapeçaria. A Volkswagen supervisiona o processo, garante qualidade e põe sua ‘marca’ no veículo. Em várias oportunidades, diretores da empresa alemã argumentaram inclusive que o ‘core business’ da empresa não era mais propriamente produzir ou montar veículos, mas sim comercializá-los a partir da garantia de qualidade que sua marca proporcionava”.
  • 29
    Ver, ainda: Dieese (1994)DIEESE. Terceirização e reestruturação produtiva do setor bancário no Brasil. Estudos Setoriais. Espírito Santo, n. 2, 1994., Blanco (1994), Jinkings (2000 e 2006JINKINGS, Isabella; Amorim, Elaine. Produção e desregulamentação na indústria têxtil e de confecções. In:Antunes, Ricardo (org.). Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2006.), Silva (2996), Soares (2013)SOARES, José. Radiografia da mobilização bancária. Tese (Doutorado em Sociologia), PPGSA/UFRJ, 2013., Fontes e Macedo (2014)FONTES, Paulo; MACEDO, Francisco. As ambivalências das conquistas: os dilemas do Sindicato dos Bancários de São Paulo na era Lula. In: VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto; BRIDI, Ma Aparecida; Ferraz, Marcos (orgs.). O sindicalismo na Era Lula: paradoxos, perspectivas e olhares. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014..
  • 30
    Sobre o setor de telecomunicações, ver: Laranjeira (1998LARANJEIRA, Sônia. Reestruturação no setor de telecomunicações: aspectos da realidade internacional. Revista Latinoamericana de Estudios del Trabajo: Relações industriais, análises comparativas. Ano 4, n. 8, p. 159-178, 1998. e 2007), Garcia (2002)GARCIA, Sandro. Relações interfirmas e emprego na rede de empresas: a experiência de externalização de uma empresa no setor de telecomunicações. Sociologias, Porto Alegre, v. 4, no 8, jul/dez 2002., Sirlei (2004), Wolff e Cavalcante (2006)WOLFF, Simone; CAVALCANTE, Sávio. O mundo virtual e reificado das telecomunicações: o caso Sercomtel. In: Antunes, Ricardo (org.). Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2006., Cavalcante (2009), Véras de Oliveira (2011)VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto. Sindicalismo e democracia no Brasil: do novo sindicalismo ao sindicato cidadão. São Paulo: Annablume Editora, 2011., Santana e Jatahy (2014)SANTANA, Marco; JATAHY, Paula. O sindicalismo telefônico do Rio de Janeiro na era Lula: orientações e práticas. In: VÉRAS DE OLIVEIRA, Roberto; BRIDI, Ma Aparecida; Ferraz, Marcos (orgs.). O sindicalismo na Era Lula: paradoxos, perspectivas e olhares. Belo Horizonte: Fino Traço, 2014.. Associado a este setor, e como parte da disseminação e complexificação do fenômeno da terceirização, surgiu o segmento de teleatividades, um importante elo das cadeias de terceirização nos diversos ramos da economia (ver, a respeito, por exemplo, Antunes e Braga, 2009ANTUNES, Ricardo; BRAGA, Ruy. Infoproletários: degradação real do trabalho virtual. São Paulo: Boitempo, 2009.). Para o caso do tradicional setor têxtil/confecções, conferir, especialmente sobre o tema do trabalho a domicílio, além do clássico estudo de Abreu (1986)ABREU, Alice. O avesso da moda: trabalho a domicílio na indústria de confecção. São Paulo: Hucitec, 1986., Abreu e Sorj (1993ABREU, Alice; SORJ, Bila (Org.). O trabalho invisível: estudos sobre trabalho a domicílio no Brasil. Rio de Janeiro: Rio Fundo, 1993. e 1994), Delgado (1994)DELGADO, Ma Berenice. Terceirização e trabalho feminino. In: MARTINS, Heloísa; RAMALHO, José R. (orgs.). Terceirização: diversidade e negociação no mundo do trabalho. São Paulo: Hucitec, 1994., Colli (2000)COLLI, Juliana. A trama da terceirização: um estudo do trabalho no ramo da tecelagem. Campinas: Editora Unicamp, 2000., Kontic (2001KONTIC, Branislav. Aprendizado e metrópole: a reestruturação produtiva da indústria do vestuário em São Paulo. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – FFLCH/USP, 2001. e 2007), Araújo e Amorim (2002)ARAÚJO, Angela; AMORIM, Elaine. Redes de subcontratação e trabalho a domicílio na indústria de confecção: um estudo na região de Campinas. Cadernos Pagu, n.17-18, 2002., Lima (2002LIMA, Jacob. As artimanhas da flexibilização: o trabalho terceirizado em cooperativas de produção. São Paulo: Terceira Margem, 2002. e 2009 – em ambos os casos, considera-se, também, o setor de calçados), JikingsJINKINGS, Nise. A reestruturação do trabalho nos bancos. In: Antunes, Ricardo (org.). Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2006. e Amorim (2006)LIMA, Jacob. A terceirização e seus espaços: os territórios da precariedade – a experiência da indústria de confecções e calçados. DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., Heleno (2013)HELENO, Edilane A. Configurações do trabalho a domicílio nas confecções de roupa de jeans no município de Toritama. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) - João Pessoa: UFPB, 2013., Vilasboas (2015)VILASBOAS, Jaqueline. A capital goiana do jeans: flexibilidade, subcontratação e gênero no setor de confecção do município de Jaraguá. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), PPGCS/IFCH/UNICAMP, 2015., entre outros. Sobre o setor calçadista, por exemplo, Navarro (2003NAVARRO, Vera. Reestruturação produtiva na indústria de calçados de couro em Franca/SP. Ideias, ano 9, n. 10 (1), 2003. e 2005). Quanto à terceirização no serviço público, uma área de particular importância para o conjunto da sociedade, em vista de sua associação com os processos de privatização e as transformações no padrão de gestão públicas, introduzidas nos anos 1990 no país, podem ser conferidos em: Faria (2001)FARIA, Flávio. Terceirização no serviço público e cooperativas de trabalho. Consultoria Legislativa, Brasília, 2001.; Ferraz (2001)FERRAZ, Luciano. Lei de Responsabilidade Fiscal e terceirização de mão-de-obra no serviço público. Revista Jurídica Administração Municipal, v. 4, n. 3, 2001.; Costa (2008)COSTA, Cândida. Nas malhas da instabilidade: os trabalhadores públicos em um cenário de mudanças. São Luis: EDFMA, 2008.; Amorim (2008)AMORIM, Helder. Terceirização no setor público: reflexões sobre seu justo limite constitucional. Dissertação de Mestrado, Rio de Janeiro, PUC, 2008., Augusto Jr. et al (2009). Na construção civil, onde é tradicional a prática da subcontratação, ver, por exemplo, Marcelino (2008)MARCELINO, Paula. Terceirização e ação sindical: a singularidade da reestruturação do capital no Brasil. Campinas. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), 2008. e Costa (2013).
  • 31
    Realizada em parceria com o Sindicato dos Empregados em Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros, Colocação e Administração de Mão de Obra, Trabalho Temporário, Leitura de Medidores e Entrega de Avisos do Estado de São Paulo – SINDEEPRES, filiado à UGT. O Sindicato tem base estadual, tendo sido fundado em 1992. A pesquisa fez parte de um esforço articulado em três partes: “Sindeepres, A transnacionalização da terceirização na contratação do trabalho”; “Sindeepres, A superterceirização dos contratos de trabalho”; “Sindeepres, A sindicalização no emprego formal terceirizado no estado de São Paulo”.
  • 32
  • 33
  • 34
    Um primeira versão foi lançada em 2011 (CUT/DIEESE, 2011CUT/DIEESE. Terceirização e desenvolvimento, uma conta que não fecha. CUT/DIEESE: São Paulo, v. 1, 2011.).
  • 35
    Em São Paulo, passa de 30%. O Sudeste é a Região com maior percentual: 29,4%.
  • 36
    Não estão computadas aqui as horas-extras, não captadas pela RAIS/CAGED.
  • 37
    Entre os principais instrumentos da terceirização no serviço público estão as OSs e OSCIPs. Conforme Augusto Jr. et al (2009, p. 121): “As Organizações Sociais foram instituídas a partir da Lei Federal 9.637/1998 e correspondem a uma forma de propriedade não-estatal, constituída pelas associações civis sem fins lucrativos, impedidas de ser propriedade de qualquer indivíduo ou grupo, e estão orientadas diretamente para o atendimento do interesse público [...] Criadas posteriormente às Organizações Sociais, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público foram instituídas a partir da Lei 9.790/1999, correspondendo ao conjunto de instituições sem fins lucrativos, de atendimento geral, cujos objetivos sociais podem englobar a promoção gratuita da assistência social, da cultura, da saúde, do voluntariado, da educação, dentre outros. A legislação brasileira garante a participação dessas organizações no processo de terceirização na administração pública”.
  • 38
    A responsabilidade “subsidiária” implica compromisso trabalhista da empresa contratante para com os trabalhadores da subcontratada apenas no caso de ficar comprovada a impossibilidade desta última arcar com tais compromissos. Quanto à responsabilidade “solidária”, aos trabalhadores das empresas subcontratadas cabem executar simultaneamente, subcontratada e contratante, quando da reclamação de seus direitos trabalhistas (Conceição e Lima, 2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009.).
  • 39
    Conforme Conceição e Lima (2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 198), com isso abriu-se espaço para “a terceirização da própria atividade-fim da empresa”. No início dos anos 1990, os empresários teriam optado pela não regulamentação da terceirização: “qualquer ‘empecilho’ à empresa que tivesse o efeito de obstaculizar, dificultar ou diminuir a terceirização – tais como legislações, acordos coletivos etc. – era prontamente rechaçada pelas representações empresariais. Em última instância, se não havia da parte de governo e das representações dos trabalhadores pressão suficiente para a regulamentação, não seriam os empresários que pressionariam por ela. Neste ambiente de hegemonia das ideias neoliberais em favor do livre mercado, a ausência de regulamentação era o melhor cenário para aqueles que queriam acelerar o processo de terceirização a todo custo” (Conceição e Lima, 2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 199).
  • 40
    Para Conceição e Lima (2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 199), no final da década de 1990, o empresariado passa a defender a regulamentação da terceirização, ao se ver “premido já pela expansão dos crescentes processos trabalhistas”.
  • 41
    Conceição e Lima (2009CONCEIÇÃO, Jefferson; LIMA, Cláudia. Empresários e trabalhadores diante da regulamentação da terceirização: é possível um acordo mínimo? In: DAU, Denise; RODRIGUES, Iram; CONCEIÇÃO, Jefferson (orgs). Terceirização no Brasil: do discurso da inovação à precarização do trabalho. São Paulo: Annablume/CUT, 2009., p. 202) notam que, diante da insegurança jurídica crescente e do ambiente criado com o Governo Lula, a CNI e a FIESP passaram a buscar algum entendimento com as Centrais Sindicais sobre o tema da terceirização. Coube à FIESP apresentar às Centrais Sindicais um conjunto de propostas consolidada no documento “Terceirização Protegida”. Alguns pontos o balizaram: o entendimento do processo de terceirização como “irreversível”; é constitucional o livre exercício da atividade econômica, não devendo haver restrições para a terceirização, seja de atividades fim ou meio; a Súmula 331, como principal orientação no âmbito do Direito do Trabalho, causa insegurança no empresariado; a responsabilidade “solidária” isenta de riscos a empresa subcontratada e penaliza a contratante; a regulamentação é necessária para proteger empresários e trabalhadores.
  • 42
    Elaborado a partir dos debates no Grupo de Trabalho criado pela CUT para tratar do tema (Dou, 2009).
  • 43
    O Fórum congrega: Central Única dos Trabalhadores – CUT, Força Sindical – FS, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil - CTB, União Geral dos Trabalhadores – UGT, Nova Central Sindical dos Trabalhadores - NCST, Intersindical, Federação Única dos Petroleiros – FUP, Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro da CUT – CONTRAF/CUT, Movimento pelos Direitos Humanos – MHuD, Conselho Sindical da Baixada Santista. Integra, ainda, o Fórum pesquisadores e associações de pesquisa que atuam no mundo do trabalho, entre elas: Associação Latino Americana de Advogados Laborais – ALAL, Associação Latino Americana de Juízes do Trabalho – ALJT, Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho – ANAMATRA, Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas – ABRAT, Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT, Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas – ABRAT, Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho – SINAIT, CESIT/IE/Unicamp, entre outros.
  • 44
    O livro Martins e Ramalho (1994) foi resultado de seminário que reuniu, em São Paulo, em 1993, pesquisadores, assessores sindicais e sindicalistas, sinalizando a importância que o tema já havia adquirido naquele momento.
  • 45
    A CUT, dentre as Centrais, foi quem mais produziu iniciativas e reflexões sobre a terceirização. Como expressão sistemática disso, vejam-se as pesquisas conduzidas em parceria com o Dieese (CUT/Dieese, 2011CUT/DIEESE. Terceirização e desenvolvimento, uma conta que não fecha. CUT/DIEESE: São Paulo, v. 1, 2011. e 2014) e o livro organizado com a participação de pesquisadores, assessores sindicais e sindicalistas (Dau, Rodrigues e Conceição (2009).
  • 46
    Em balanço sobre os processos de negociação coletiva envolvendo o tema da terceirização no Brasil, Oliveira, Costa e Gebrim (2009), com base principalmente nos dados de 2005 do Sistema de Acompanhamento de Contratações Coletivas – SACC, do DIEESE, constataram que 32% dos instrumentos normativos analisados naquele ano apresentaram itens sobre a terceirização. Em geral, versaram sobre: restrições à contratação de trabalhadores terceirizados, exigências às empresas terceiras, fiscalização das empresas subcontratadas, responsabilidade da empresa contratante, rompimento do contrato, garantias aos trabalhadores terceirizados, cláusulas sindicais etc. Entretanto, tais itens foram distribuídos desproporcionalmente, com foco preponderante na tentativa de inibir a terceirização de atividade fim, sendo menos incidentes as garantias para os trabalhadores já terceirizados. Dentre as negociações registradas no SACC, apenas 8% teriam acordado sobre garantias à organização e negociação sindical.
  • 47
    O Sindicalismo CUT, por meio da pesquisa CUT/Dieese (2014)CUT/DIEESE. Terceirização e desenvolvimento, uma conta que não fecha. CUT/DIEESE: São Paulo, v. 2, 2014., avalia que a aprovação das medidas propostas terá efeito desastroso para os trabalhadores e a ação sindical, enumerando entre outros os seguintes: aumento significativo da proporção de trabalhadores terceirizados no conjunto da economia; queda de salários e cortes de benefícios; queda no número de postos de trabalho (com jornadas de trabalho em média maiores); intensificação da rotatividade do emprego (em vista da grande incidência de empregos por tempo determinado), drásticas repercussões sobre benefícios (não acumulados), condições de trabalho e perspectivas de carreira (eterno recomeço); maior vulnerabilidade a acidentes e doenças ocupacionais; intensificação das formas de discriminação e preconceito com trabalhadores terceirizados, com o aprofundamento da segmentação entre trabalhadores; maiores dificuldades de fiscalização das condições de trabalho; queda na filiação e arrecadação sindical; maiores dificuldades para a ação sindical e negociação coletiva; mais burla da obrigatoriedade do serviço público etc.
  • 48
    A UGT é uma das Centrais com maior inserção entre os trabalhadores terceirizados. Segundo Trópia, Marcelino e Galvão (2009GALVÃO, Andréia. A reconfiguração do movimento sindical no Governo Lula. Outubro, n. 18, 2009., p. 149), o Sindeepres se destaca, “com cerca de 160 mil trabalhadores filiados, o qual representaria, segundo dados da entidade, cerca de meio milhão de trabalhadores. Além do Sindeepres, a Federação das cooperativas de trabalhadores do estado de São Paulo também é base da UGT”.
  • 49
    Conforme apurou Marcelino (2008MARCELINO, Paula. Terceirização e ação sindical: a singularidade da reestruturação do capital no Brasil. Campinas. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), 2008., p. 292): “Ao contrário da CUT, a FS não tem orientações no sentido de filiar trabalhadores terceirizados mesmo não pertencendo a mesma base sindical, não orienta seus sindicatos a buscar negociações coletivas que abarquem os mesmos direitos para terceirizados e não terceirizados, não incentiva e nem repudia a integração com sindicatos ligados à outra central. Em uma palavra, omite-se de ações concretas no cotidiano sindical”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    21 Maio 2015
  • Aceito
    05 Ago 2015
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