Open-access COMISSÕES DE HETEROIDENTIFICAÇÃO EM UMA IES: experiências, dilemas e desafios

HETEROIDENTIFICATION COMMITTEES IN A HIGHER EDUCATION INSTITUTION: experiences, dilemmas and challenges

Resumos

O artigo busca compreender as experiências de avaliadores nas comissões de heteroidentificação na Universidade Federal do ABC para as vagas reservadas a pretos, pardos e indígenas, no período de 2018 e 2022. O estudo problematiza os desafios e dilemas enfrentados no uso da heteroidentificação como mecanismo complementar à autodeclaração feita pelos candidatos, refletindo sobre as circunstâncias e implicações desse processo. Além disso, o artigo apresenta a operacionalização das bancas de heteroidentificação na Universidade Federal do ABC, com base nas práticas observadas durante o período de análise. A pesquisa foi realizada por meio de entrevistas com cinco participantes que atuaram nas comissões, buscando entender as questões envolvidas na aplicação desse procedimento de avaliação. Por fim, a investigação busca fornecer subsídios para o entendimento das dinâmicas das comissões de heteroidentificação (CHI) no debate sobre ações afirmativas, bem como para o aprimoramento dos procedimentos utilizados na instituição.

Ações Afirmativas; Comissões de heteroidentificação étnico-racial; UFABC


The article seeks to understand the experiences of evaluators in the hetero-identification committees at the Federal University of ABC for vacancies reserved for black, mixed-race and indigenous people, between 2018 and 2022. The study problematizes the challenges and dilemmas faced in using hetero-identification as a complementary mechanism to the self-declaration made by candidates, reflecting on the circumstances and implications of this process. Furthermore, the article presents the operationalization of hetero-identification boards at UFABC, based on practices observed during the period of analysis. The research was carried out through interviews with five participants who worked on the committees, seeking to understand the issues involved in the application of this evaluation procedure. Finally, the investigation seeks to provide support for understanding the dynamics of hetero-identification commissions (CHI) in the debate on affirmative actions, as well as for improving the procedures used in the institution.

Affirmative Actions; Ethnic-racial heteroidentification commissions; UFABC


INTRODUÇÃO

As Comissões de Heteroidentificação (CHI) foram implementadas em diferentes contextos políticos ao longo do século XXI, em diversas Instituições Públicas de Ensino Superior (IPES). Criadas com objetivos preventivos e fiscalizatórios, essas comissões atuam como um mecanismo de verificação da autodeclaração étnico-racial de candidatos pretos, pardos, indígenas e quilombolas, com o intuito de assegurar a veracidade das informações prestadas.

Embora as Comissões de Heteroidentificação (CHI) centralizem diversas discussões sobre ações afirmativas no país, o tema não é recente. Desde 2004, quando a Universidade de Brasília (UnB) se tornou a primeira universidade federal a adotar ações afirmativas para a população negra, em seus cursos de graduação, com a criação de uma comissão para validar a autodeclaração étnico-racial de seus candidatos, essas têm gerado repercussão nacional e suscitado debates sobre sua implementação e eficácia.

Inicialmente, poucas universidades adotaram as Comissões de Heteroidentificação (CHI), mas atualmente são 94 comissões em funcionamento (Santos, 2021). A disseminação dessas comissões tem impulsionado a produção acadêmica, que se dedica a entender suas razões, operacionalizações, desafios e dilemas. No entanto, ainda existem lacunas significativas, especialmente, no que diz respeito às experiências vividas pelos avaliadores dessas comissões. Essa compreensão é fundamental para avaliar os impactos das Comissões de Heteroidentificação (CHI), tanto no que se refere à implementação das ações afirmativas quanto à promoção de justiça social.

Assim, este artigo se propõe a examinar a operacionalização das bancas de heteroidentificação na Universidade Federal do ABC (UFABC), instituição reconhecida como exemplar na aplicação de ações afirmativas para diferentes grupos sociais, conforme será detalhado adiante. Embora a UFABC mantenha suas Comissões de Heteroidentificação (CHI) em funcionamento desde 2019, ainda não há publicações acadêmicas sobre a dinâmica dessas comissões. A partir de um estudo de caso com cinco entrevistas realizadas com avaliadores da Comissões de Heteroidentificação (CHI) da UFABC, entre 2018 e 2022, busca-se contribuir para um entendimento mais aprofundado das dinâmicas internas dessas comissões, das tensões subjacentes ao processo de heteroidentificação e ampliar o debate sobre as políticas de inclusão e as formas de classificação racial no Brasil.

PANORAMA DAS COMISSÕES DE HETEROIDENTIFICAÇÃO NO BRASIL

Desde as primeiras iniciativas de implementação de ações afirmativas no Brasil, realizadas nas universidades estaduais do Rio de Janeiro – a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e a Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) –, emergiram preocupações acerca da possibilidade de fraudes nos processos seletivos para ingresso no Ensino Superior público. Tal preocupação decorre do entendimento de que a categoria “raça” é uma construção social, caracterizada pela fluidez de enquadramentos raciais em função de variações regionais, culturais e construções subjetivas dos indivíduos, entre outros fatores. À vista disso, a Lei Estadual nº 3.708 (Rio de Janeiro, 2001), que instituiu a reserva de vagas nessas universidades, dispôs a seguinte orientação:

§ 3º - O edital do processo de seleção, atendido o princípio da igualdade, estabelecerá as minorias étnicas e as pessoas com deficiência beneficiadas pelo sistema de cotas, admitida a adoção do sistema de autodeclaração para negros e pessoas integrantes de minorias étnicas, cabendo à Universidade criar mecanismos de combate à fraude (ALERJ, 2003, texto digital).

De acordo com Machado (2004), essas instituições públicas de Ensino Superior realizaram conferências, seminários e palestras sobre ações afirmativas junto às comunidades universitárias. Com base nos debates realizados e no exercício de suas autonomias universitárias, ambas as universidades optaram por adotar a autodeclaração como o único critério de ingresso para negros e demais “minorias étnicas”.

Essa escolha, conforme César (2004), alinhava-se às recomendações internacionais das Nações Unidas, que, no início do século XXI, destacavam a relevância da autodeclaração em políticas de ações afirmativas. De forma complementar, as investigações de Maio e Santos (2005) reforçam essa perspectiva, indicando que a Declaração Final da Conferência de Durban também sugeria a utilização desse mecanismo em situações que demandassem a coleta ou registro de dados raciais.

No entanto, conforme Neves (2022), algumas universidades, como a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) e a Universidade do Estado da Bahia (UNEB), enfrentaram polêmicas relacionadas com fraudes nas vagas reservadas para pretos e pardos. As discussões em torno da implementação de mecanismos de prevenção e fiscalização, entretanto, ganharam maior destaque em 2004, quando a Universidade de Brasília (UnB) se tornou a primeira universidade federal do país a estabelecer políticas afirmativas para pretos e pardos. Após deliberações com a comunidade universitária, por meio da comissão de implementação das cotas, na qual estudantes negros do coletivo EnegreSer desempenharam um papel político de protagonismo, a UnB decidiu instituir uma comissão de heteroidentificação (Carvalho, 2005).

A instalação da Comissões de Heteroidentificação (CHI) na UnB intensificou debates já presentes na sociedade, questionando a viabilidade de identificar quem seria negro, indígena ou branco em um país marcado por um longo histórico de miscigenação. Nesse contexto, diversas mídias amplificaram as controvérsias, seja por meio de veículos jornalísticos, posicionamentos acadêmicos, ou mobilizações contrárias às ações afirmativas com recortes raciais e às Comissões de Heteroidentificação.

Embora seja possível identificar debates sobre cotas étnico-raciais desde o início da década de 1990, sob diferentes ângulos midiáticos, é a partir do século XXI, especialmente, a partir de 2004, que o tema adquire maior centralidade nas pautas da grande mídia. Tal destaque decorre da adoção da Comissões de Heteroidentificação (CHI) pela UnB, amplamente repercutida nos meios de comunicação de massa, com ênfase em publicações do Grupo Globo e da revista Veja (Campos; Feres Júnior; Daflon, 2013).

Na esfera acadêmica surgiram também posicionamentos críticos às bancas de heteroidentificação, expressos por intelectuais das Ciências Sociais e por organizações científicas, como a Comissão de Relações Étnicas e Raciais da Associação Brasileira de Antropologia (Crer-ABA) e a própria Associação Brasileira de Antropologia (ABA). Nesse mesmo sentido, a edição de 2005 da Revista Horizontes Antropológicos organizou um dossiê sobre a relevância das ações afirmativas, focando no uso de Comissões de Heteroidentificação. O dossiê reuniu contribuições de 18 intelectuais renomados no campo das relações raciais no Brasil, que dialogaram com o artigo “os “olhos da sociedade” e os usos da Antropologia: O caso do Vestibular da Universidade de Brasília (UNB)”, de Marcos Chor Maio e Ricardo Ventura Santos (2005). Essas discussões apontavam e problematizavam as potencialidades e os desafios do uso de ações afirmativas no Brasil, considerando a complexidade inerente ao sistema de classificação racial do país.

No campo jurídico, ações contrárias às cotas raciais também foram mobilizadas. O Partido Democratas (DEM), por exemplo, apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF), em 2009, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 186. Essa ação contestava diretamente a administração da UnB, questionando práticas de ações afirmativas como forma de ingresso na instituição e alegando possíveis violações de artigos e incisos da Constituição Federal de 1988. Conforme destacado por Valter Silvério (2012):

A ADPF/186 pode ser considerada na realidade uma ação que tinha como objetivo questionar a constitucionalidade da criação de todo e qualquer programa de ação afirmativa com provisão de cotas raciais para negros e, para tanto, tomou por base o programa da UnB amplamente divulgado pela mídia por ter como procedimento de verificação da pertença étnico-racial uma comissão de verificação. Ao dar entrada no Supremo Tribunal Federal (STF), o referido partido mobilizou não só a principal corte do país, mas, também, as controvérsias entre os contrários e favoráveis em relação à política(Silvério, 2012, p. 11).

Assim, as Comissões de Heteroidentificação (CHI) foram percebidas de formas distintas: por alguns, como um ‘tribunal racial’; por outros, como um mecanismo indispensável para garantir os direitos de grupos socialmente marginalizados (Campos, Feres Júnior, Daflon, 2013; Daflon, Feres Júnior, 2012; Feres Júnior, Campos, Daflon, 2011; Silvério, 2012; Theodoro, 2012).

Os debates, entretanto, concentraram-se majoritariamente nas esferas pública e jurídica. No que diz respeito às dinâmicas internas das universidades, em termos quantitativos, até o final de 2010, mais de 70 universidades públicas (estaduais e federais) já adotavam alguma modalidade de política de ação afirmativa. No que se refere ao ingresso, por meio de ações afirmativas, com recorte de raça/cor e/ou etnia, com exceção de seis universidades1 (15%), a maioria utilizava a autodeclaração étnico-racial como critério de admissão (aproximadamente 85%). Essas instituições compreendiam que “qualquer tentativa de buscar formas de aferição que postulem objetividade científica sinalizaria uma incompreensão do real significado de ‘raça’” (Feres Júnior; Daflon; Campos, 2012, p. 97).

Em 2012, com a promulgação da Lei de Cotas, a autodeclaração de raça/cor foi estabelecida como o único procedimento de ingresso para pretos e pardos (Brasil, 2012). Na época, o número de instituições com mecanismos de validação da autodeclaração étnico-racial ainda era limitado. Com a nova legislação, as universidades federais, que até então estavam atrás das estaduais na implementação das ações afirmativas, passaram a ser obrigadas a adotá-las. Embora a legislação não tenha impedido a autonomia das universidades em adotar outros critérios de validação da autodeclaração étnico-racial, a maioria das universidades federais não implementou as Comissões de Heteroidentificação (CHI). Aqueles que optaram por adotá-las, em muitos casos, acabaram tornando-as obsoletas (Feres Júnior; Daflon; Campos, 2012).

Em 2014, ocorreu um marco significativo com a promulgação da Lei nº 12.990, que determinou a reserva de 20% das vagas em concursos públicos federais para pessoas negras (Brasil, 2014). Assim como a Lei de Cotas, essa legislação adotou a autodeclaração étnico-racial como um critério obrigatório no processo seletivo. Contudo, a Lei nº 12.990 apresentou maior rigor na prevenção de fraudes, conforme disposto no seguinte artigo:

Art. 2º Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

Parágrafo único. Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.” (Brasil, 2014).

Até 2015, não existia uma normatização específica para lidar com casos de fraude nessa política, o que representava, para muitos, uma lacuna importante. A partir desse ano, esse panorama começou a ser alterado com a realização de uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). Durante a audiência, foi sugerida a tipificação do crime de fraude nas ações afirmativas, bem como mecanismos de prevenção e fiscalização, com a justificativa de que já havia registros de pessoas se beneficiando indevidamente dessa política pública (Altafin, 2015). Diante disso, Paulo Sérgio Rangel, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, defendeu a necessidade de estabelecer critérios rigorosos para coibir tais práticas.

Em 1º de agosto de 2016, foi publicada a Normativa nº 3, pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão de Pessoas e Relações do Trabalho no Serviço Público, que regulamenta as diretrizes para a verificação da autodeclaração de candidatos negros, conforme a Lei nº 12.990, e em 6 de abril de 2018, foi publicada a Portaria Normativa nº 04, também do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão de Pessoas, que instituiu o método de heteroidentificação racial como um procedimento complementar à autodeclaração racial para candidatos que se autodeclaram negros em concursos públicos federais, com base na Lei nº 12.990/2014.

Nos anos seguintes, começaram a ganhar maior visibilidade os casos e denúncias de fraudes na autodeclaração racial em universidades públicas. Segundo Santos (2021), em 2017 e 2018, houve um aumento expressivo nas denúncias, impulsionadas por Organizações da Sociedade Civil, Instituições Públicas de Ensino Superior (IPES) e o Ministério Público Federal, que pressionaram diversas universidades federais a implementarem Comissões de Heteroidentificação (CHI) (Guimarães; Rios; Sotero, 2020; Neves, 2022; Trindade, 2021). Como resultado, uma série de comissões foi estabelecida e, atualmente, segundo Sales Augusto Santos (2021), existem 94 Comissões de Heteroidentificação (CHI) em funcionamento nas universidades federais brasileiras.

Com a ampliação e consolidação das Comissões de Heteroidentificação (CHI) nas IPES, os debates sobre as ações afirmativas com recortes étnico-raciais ganharam destaque, especialmente, no que tange às dinâmicas de classificação racial no Brasil. As Comissões de Heteroidentificação (CHI) se baseiam predominantemente na análise de características fenotípicas, o que pode levar a um endurecimento das categorias que compõem a população negra (pretos e pardos). Nesse contexto, surgem dilemas, em função da fluidez das classificações étnico-raciais no país, principalmente, no caso dos pardos.

A EXPANSÃO DAS COMISSÕES DE HETEROIDENTIFICAÇÃO

A partir da difusão das denúncias de fraudes no interior das Universidades, ocorreram alguns eventos específicos para tratar dessa temática, como o “I Seminário sobre as Políticas de Ações Afirmativas nas Universidades Brasileiras e a Atuação das Comissões Verificadoras de Autodeclaração na Graduação das IES Públicas”, o “I Encontro de Gestores de Verificação de Autodeclaração para Concorrentes às Vagas” e a “ I Oficina de capacitação sobre a temática da promoção da igualdade racial e do enfrentamento ao racismo para docentes, servidores administrativos e membros de comissões/bancas verificadoras de autodeclaração em atendimento a nova Orientação Normativa nº 04 de 06 de abril de 2018, para a atuação em concursos públicos no período de 20/08 a 31/09 de 2018”, na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), entre outros (Marques, 2019).

Além disso, as Comissões de Heteroidentificação têm protagonizado diferentes debates nas Universidades públicas brasileiras, bem como na produção científica no campo das ações afirmativas. De acordo com Silva et al. (2022, p.01), a temática das Comissões de Heteroidentificação (CHI):

Deixou de ser um apêndice da produção acadêmica sobre ações afirmativas para se tornar um debate central para operadores da política de cotas no Brasil. Tais comissões são hoje um ponto nevrálgico do debate sobre inclusão nas áreas de educação e trabalho no setor público, seja porque dizem respeito à operacionalização das cotas, seja porque deixam expostas fraturas do sistema classificatório racial brasileiro (Silva et al., 2022, p. 01).

Após a adesão das Comissões de Heteroidentificação por diversas Universidades, destacam-se algumas publicações iniciais: o e-book “Heteroidentificação e cotas raciais: dúvidas, metodologias e procedimentos”, organizado por Gleidson Renato Martins Dias e Paulo Roberto Faber Tavares Junior (2018), e o Dossiê Temático “A importância das Comissões de Heteroidentificação para a garantia das Ações Afirmativas destinadas aos Negros e Negras nas Universidades Públicas Brasileiras”, publicado em 2019 e organizado pela Prof.ª Dr.ª Eugenia Portela de Siqueira Marques (UFMS), que reúne nove artigos, em sua maioria, estudos de casos de Comissões de Heteroidentificação (CHI) nas Universidades dos respectivos pesquisadores. Desde essas publicações, houve um aumento considerável na produção de artigos, dissertações e teses sobre a temática.

Além da expansão das Comissões de Heteroidentificação, o aumento da entrada de estudantes pretos, pardos e indígenas nas Universidades, após a implementação da Lei de Cotas, trouxe uma maior visibilidade às questões raciais, especialmente, no âmbito das ações afirmativas. Como destacam Guimarães, Rios e Sotero (2020, p. 309): “coletivos negros passaram a desempenhar um papel decisivo na recepção de estudantes cotistas e no controle das ações afirmativas nas universidades públicas”. Nesse contexto, estudos realizados por Fonseca e Costa (2019), Marques (2019) e Santos, Camilloto e Dias (2019) indicam que essa mobilização coletiva surge, em grande parte, como resposta à identificação de usos indevidos da política de cotas, refletindo a crescente conscientização sobre a necessidade de garantir a efetividade e integridade das ações afirmativas.

Além disso, pesquisas conduzidas por Guimarães, Rios e Sotero (2020), Rios (2022), Sales Augusto dos Santos (2021) e Silva et al. (2022) ampliam essa perspectiva ao evidenciar que a percepção de possíveis fraudes é particularmente acentuada em cursos de maior prestígio e concorrência, como Medicina, Engenharias, Cinema e Direito. Em alguns desses cursos, observa-se uma disparidade entre o percentual de vagas reservadas e o número de estudantes com fenótipos negros, sugerindo que, proporcionalmente, a presença de tais estudantes ainda é significativamente inferior, apesar de os dados de preenchimento das vagas indicarem o contrário.

De modo geral, a literatura sobre Comissões de Heteroidentificação é predominantemente composta por estudos de caso de Universidades públicas brasileiras que implementaram esses instrumentos. Esses estudos, geralmente, traçam o histórico das motivações que levaram à consideração da ideia de implantar as comissões, até o momento decisivo de sua implementação. Além disso, os estudos abordam os agentes políticos, institucionais e externos envolvidos no processo.

Vale destacar que a maioria dessas investigações utiliza dados qualitativos, sendo esses fundamentais para a compreensão dos fenômenos. No entanto, alguns estudos, como os de Nunes (2019), Santos, Camilloto e Dias (2019), Santos (2021), entre outros, se distinguem por trazer dados quantitativos de determinados anos e/ou editais de ações afirmativas. Nas investigações, também se observa um argumento recorrente: a defesa da existência de Comissões de Heteroidentificação (CHI), apesar dos dilemas e controvérsias que podem surgir a partir de sua implementação. Muitos desses estudos se baseiam nas teorias de Oracy Nogueira (2006), que sustenta que o preconceito no Brasil é caracterizado pelo “preconceito de marca”. A partir dessa premissa, é defendida a necessidade de avaliar quem tem direito às vagas destinadas às pessoas pretas, pardas e indígenas (PPI) por meio da análise de características fenotípicas dos candidatos.

Embora a maioria das produções apoie a existência das Comissões de Heteroidentificação (CHI) sem muitas ressalvas, também existem estudos críticos que evidenciam os dilemas desse instrumento, reconhecendo, ao mesmo tempo, que há fraudes cometidas por pessoas não-negras. Como mencionado anteriormente, o dossiê da Revista Horizontes Antropológicos (2005) é um exemplo, assim como pesquisas desenvolvidas por outros autores. Entre esses se destacam os estudos de Paulo Sérgio da Costa Neves (2022) e Ribeiro (2020).

Neves (2022), em sua pesquisa qualitativa, conduzida em diferentes regiões do país, identifica um dilema central relacionado ao uso das comissões: por um lado, as Comissões de Heteroidentificação (CHI) atuam na prevenção e fiscalização de fraudes que visam impedir o acesso de pessoas brancas (ou não-negras) à política de cotas. Por outro lado, essas comissões também podem gerar inflexibilidades em relação à categoria “negro”, especialmente no caso de pessoas pardas de tonalidade “mais clara”, que, em certos parâmetros mais rígidos, acabam sendo desconsideradas como tais. Esse fenômeno é um reflexo das mudanças nos moldes de classificação racial, que, diferentemente do século anterior, exigem uma definição mais rígida das identidades raciais.

Esse mesmo fenômeno foi destacado por Guimarães, Rios e Sotero (2020), ao investigarem a atuação de coletivos negros no contexto das ações afirmativas. Os autores observam que a estratégia de defesa das cotas por meio da heteroidentificação étnico-racial deu margem para questionamentos sobre a negritude, expondo um paradoxo: a relação entre a congruência de “ser negro” e o enrijecimento dessa identidade, agora baseada predominantemente em características fenotípicas.

De forma complementar, o artigo “Comissões de Heteroidentificação e Universidade Pública: Processos, dinâmicas e disputas na implementação das políticas de ação afirmativa”, de Silva et al. (2022), destaca desafios relacionados à inclusão de pessoas pardas de pele mais clara, com foco nas experiências de reprovação nas Comissões de Heteroidentificação (CHI) da Universidade Federal Fluminense (UFF). Essas análises reforçam as tensões inerentes à operacionalização das políticas de ação afirmativa, evidenciando os limites do reconhecimento de identidades raciais em contextos institucionais.

Ribeiro (2020), por sua vez, argumenta que as Comissões de Heteroidentificação (CHI) vêm sendo tratadas como a principal solução para a prevenção e fiscalização de fraudes no âmbito das ações afirmativas. Contudo, o autor critica o que chama de “essencialização jurídica” promovida por essas comissões, ao proporem um “método objetivo” para designar quem é negro no Brasil. Segundo Ribeiro, essa abordagem introduz uma nova forma de identificação racial, submetendo as pessoas negras a um processo jurídico que busca enquadrá-las em categorias raciais padronizadas. Essa dinâmica, segundo o autor, reflete um deslocamento das identidades raciais, agora moldadas e burocratizadas pelo sistema jurídico nacional, que fixa essas discussões em termos legais, muitas vezes, em detrimento de suas dimensões socioculturais e históricas.

Além das discussões acadêmicas, diretamente relacionadas às Comissões de Heteroidentificação (CHI), também têm ganhado atenção os estudos sobre suas repercussões em outros campos, como na mídia tradicional. Pesquisas como as de Amorim (2021) e Freitas e Sarmento (2020) exploram como a implementação das Comissões de Heteroidentificação (CHI) é retratada nesses espaços. No entanto, as análises que abordam as discussões em mídias digitais ainda são relativamente escassas. Entre os poucos estudos disponíveis se destacam os de Azevedo (2023) e Leite (2020) Rodrigues (2020), que começam a preencher essa lacuna ao investigar as dinâmicas contemporâneas de debate público sobre a temática nas plataformas digitais.

Por fim, observa-se que as pesquisas sobre as Comissões de Heteroidentificação ainda estão em desenvolvimento, tanto em termos gerais quanto no contexto de instituições específicas. Essa lacuna no campo acadêmico destaca a importância de aprofundar as investigações sobre as dinâmicas, os desafios e os impactos dessas comissões, especialmente em Universidades como a UFABC. Explorar essas experiências, de forma mais ampla, pode contribuir, significativamente, para o aprimoramento das políticas de ações afirmativas no Brasil.

BREVE APRESENTAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC (UFABC)

A Universidade Federal do ABC foi criada em 2006, na região do ABC Paulista,2 em resposta a demandas populares que, até 2004, enfrentavam a ausência de instituições públicas de Ensino Superior na localidade (Oliveira, 2010). A UFABC se destacou por sua proposta pedagógica inovadora, estruturada em cursos interdisciplinares, com o objetivo de fomentar a aprendizagem em diversos campos do conhecimento científico e tecnológico. O objetivo central desse projeto era promover a aprendizagem em diversos campos do conhecimento científico e tecnológico, por meio da nova Universidade (UFABC, 2006).

Essa abordagem interdisciplinar reflete o compromisso da UFABC com a formação de profissionais capazes de pensar de maneira ampla e integrada, rompendo com modelos rígidos e fragmentados de ensino. A proposta busca preparar estudantes para lidar com questões complexas, promovendo uma visão holística que articula diferentes perspectivas científicas e sociais na busca por soluções inovadoras para os desafios contemporâneos. Esse compromisso com a inovação pedagógica também se reflete na estrutura dos cursos e nos processos de ingresso da Universidade.

Atualmente, a UFABC oferece quatro modalidades de ingresso para cursos de graduação, adotando exclusivamente o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como critério de seleção anual, por meio do Sistema de Seleção Unificada (SiSU): o Bacharelado em Ciência e Tecnologia (BC&T), implementado em 2006; o Bacharelado em Ciências e Humanidades (BC&H), iniciado em 2010; a Licenciatura em Ciências Naturais e Exatas (LCNE) e a Licenciatura em Ciências Humanas (LCH), ambas introduzidas em 2020. Os campi da instituição estão situados nas cidades de Santo André e São Bernardo do Campo.

Além de sua proposta pedagógica inovadora, desde sua fundação, a UFABC tem se destacado pelo compromisso com a inclusão e a democratização do acesso ao Ensino Superior. A Universidade adota políticas de ação afirmativa que garantem 50% das vagas para estudantes oriundos de escolas públicas, visando ampliar o acesso ao Ensino Superior (Universidade Federal do ABC, 2018). Dentro desse percentual, foi estabelecida uma subcota específica para as populações negras e indígenas, com base nos dados étnico-raciais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) à época. A distribuição da população do Estado de São Paulo, conforme o IBGE de 2010, indicava: 63,9% de pessoas autodeclaradas brancas, 29,1% pardas, 5,5% pretas, 1,4% amarelas e 0,1% indígenas (SEADE, 2010).

Assim, a partir dessas informações, observa-se o compromisso democrático da UFABC com a inserção de grupos marginalizados na sociedade brasileira, como pessoas pretas, pardas e indígenas, de gêneros dissidentes, de baixa renda, Pessoas com Deficiência, entre outros. Ao viabilizar a entrada desses sujeitos no espaço acadêmico, a instituição fomenta a inclusão de “novas” perspectivas, epistemologias e linguagens, historicamente relegadas à margem, promovendo um diálogo transformador com a comunidade universitária.

História e Procedimentos Adotados da Comissão Verificadora de Autodeclaração Racial dos Cursos de Graduação da UFABC

Conforme Ariel,3 as bancas de heteroidentificação da UFABC foram instituídas como resposta às demandas apresentadas pelos coletivos negros presentes na Universidade. Os órgãos institucionais da Universidade, como a Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) e a Pró-reitoria de Assuntos Comunitários e Políticas Afirmativas (PROAP), foram pressionados a agir diante das denúncias de possíveis fraudes no sistema de cotas. Segundo Ariel: “Os coletivos começaram a pressionar: “tem fraude, tem fraude, TEM FRAUDE!”4

E Ariel respondeu: “Então, se tem fraude, o quê que a gente pode fazer para evitar que as fraudes continuem? Então, aí vem a heteroidentificação.”. Nesse contexto, houve um amplo debate na comunidade acadêmica, envolvendo os órgãos institucionais, que culminou na implementação das averiguações de autodeclarações étnico-raciais nos processos seletivos dos cursos de Bacharelados Interdisciplinares. Essa possibilidade foi indicada no item 7.4.1.1 do Edital nº 167 de 2017:

A qualquer tempo, caso haja denúncia contra a utilização desta modalidade de concorrência, o candidato ou aluno, caso tenha a matrícula homologada, poderá ser convocado para entrevista por Comissão constituída pela UFABC exclusivamente para este fim e composta, preferencialmente, por membros do Núcleo de Estudos Africanos e Afro-Brasileiros da UFABC/NEAB. (UFABC, 2017, p 15).

Desse modo, pode-se identificar o início da implementação das Comissões de Heteroidentificação na UFABC. Embora a sinalização das bancas tenha ocorrido em 2017, essas começaram a ser efetivamente realizadas apenas em 2019. É importante ressaltar que esse processo demandou alguns anos para ser concretizado. Segundo Ariel, “era necessário formar pessoas que estivessem preparadas para participar das bancas de heteroidentificação”. Por isso, desde 2018, a UFABC realiza uma chamada pública para o “Curso de capacitação para Comissões de Heteroidentificação de Pretos, Pardos e Indígenas”. O curso ocorre em formato intensivo, com duração de cinco dias e carga horária média de 20 horas. A formação é elaborada por uma ação conjunta dos seguintes grupos da UFABC:

  1. Pró-Reitoria de Assuntos Comunitários e Políticas Afirmativas (PROAP);

  2. Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD);

  3. Núcleo de Estudos Africanos e Afro-Brasileiros (NEAB);

  4. Coletivo Negro Vozes.

Ainda, de acordo com as informações de Ariel, esse curso é ministrado anualmente por docentes da instituição, além de profissionais externos à comunidade acadêmica, cuja relevância está associada à área em questão, como sujeitos que integram a Defensoria Pública, o Ministério do Trabalho, entre outros:

Ele não é um curso que vai direto na questão da heteroidentificação. Ele é um curso mais amplo, que tem como objetivo discutir a política afirmativa. Olha! Primeiro entenda o que é uma política afirmativa e depois entenda o lugar que a heteroidentificação ocupa nessa política. (Entrevista realizada em 18 de agosto de 2021).

Dessa maneira, são destacados os diversos temas relacionados às questões raciais, como racismo e trabalho, ações afirmativas, formulações jurídicas, entre outros tópicos que abordam o papel da raça, enquanto categoria social, nas dinâmicas da sociedade. No último dia do curso, eles participam de uma atividade prática, na qual simulam o funcionamento de uma banca de heteroidentificação.5 Segundo a pessoa entrevistada, é perceptível que os cursistas aplicam na prática os conhecimentos adquiridos durante o curso:

A gente vai percebendo que as pessoas chegavam com alguns filtros, como o regional, da branquitude, de classe… Vários filtros, né? A gente não consegue desmontar todos eles, né? Mas as pessoas dizem: ‘Ahh, agora eu entendi’, ‘Ah, agora eu tô vendo tal coisa’, ‘Ah, isso eu não tinha percebido’ (Entrevista realizada em 18 de agosto de 2021).

Sobre essa mesma temática, Alex,6 outra pessoa entrevistada, complementa:

Pessoas que entram pensando: ‘pra mim todo mundo é pardo’, porque é uma pessoa branca. ‘Pra mim todo mundo é pardo’... E aí, descobre que não, inclusive que existem pessoas brancas que não são tão claras quanto ela, mas que são brancas. (Entrevista realizada no dia 18 de novembro de 2021).

No mais, Alex explica que, após a capacitação proporcionada pelo curso, os participantes podem ser convocados para integrar a banca de heteroidentificação, com exceção dos estudantes da instituição, para evitar conflitos de interesse. Ela esclarece, ainda, que a participação na comissão é voluntária e não remunerada. Já Ariel acrescenta que a realização das bancas de verificação vem sendo constantemente aprimorada para atender às demandas. Essas mudanças incluem ajustes na descrição dos documentos metodológicos nos editais, bem como melhorias na atuação das bancas.

No Edital nº 13 de março de 2021, da UFABC, por exemplo, observa-se um maior detalhamento sobre as heteroatribuições raciais no item 6.4.3. (UFABC, 2021, p. 16) em relação aos editais anteriores:

A Comissão para Heteroidentificação de Autodeclaração Étnico-racial (PPI) analisará a autodeclaração de pretos, pardos ou indígenas (PPI) por meio de verificação dos aspectos fenotípicos, marcados por traços negróides, relativamente à cor da pele (preta ou parda) e aos aspectos físicos predominantes. (UFABC, 2021, p. 16).

Assim, de acordo com a instituição, a heteroatribuição é realizada exclusivamente com base nas características fenotípicas. Essas classificações raciais fundamentam-se, principalmente, em conhecimentos adquiridos por meio do curso preparatório.

A Comissão verificadora de autodeclaração racial da UFABC, até 2022, era composta por três pessoas em cada atuação. Preferencialmente, eram selecionados integrantes do Núcleo de Estudos Africanos e Afro-Brasileiros da UFABC (NEAB/UFABC), servidores da própria instituição e pessoas capacitadas da sociedade social que atuavam na área de estudos étnico-raciais. No que dizia respeito à composição da comissão, Ariel explicou que foram seguidas as orientações do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão de Pessoas e Relações do Trabalho no Serviço Público para a formação da banca, buscando garantir a diversidade entre os membros. Assim, a composição refletia a inclusão de representantes externos à UFABC, integrantes da comunidade interna da universidade, e diversidade de gênero, étnico-racial, regional e etária. Entretanto, Ariel destacou que não houve grande variação regional entre os participantes devido à ausência de inscrições de pessoas de outras regiões. Dessa forma, a maioria dos integrantes da comissão era formada por paulistas.

No período de homologação das matrículas7 podiam ocorrer até três Comissões de Heteroidentificação simultaneamente, e cada candidato era analisado individualmente em uma sala. Conforme Ariel, quando as comissões estavam sendo realizadas presencialmente, os aprovados preliminarmente no Sistema de Seleção Unificada (SISU) chegavam ao campus Santo André da UFABC e eram recepcionados por estudantes da instituição no ginásio. Após a recepção, eram encaminhados para salas do 1º andar do prédio, na qual assistiam a um vídeo de 05 minutos e 51 segundos intitulado “Cotas Raciais e Heteroidentificação na UFABC #SejaUFABC”, cujo objetivo era esclarecer a quem se destinam as cotas raciais, o que é raça, o que é etnia e quais parâmetros são considerados na avaliação da Comissão de Heteroidentificação que se seguiria.

Ariel explica que a estratégia de produzir um vídeo foi articulada em função de desentendimentos ocorridos com candidatos em anos anteriores. Ele conta que os termos de “heteroidentificação” eram frequentemente associados à heterossexualidade, e muitos candidatos, não sabiam o que são, de fato, o que são as cotas raciais ou como as classificações étnico-raciais ocorrem no país.

Após assistirem ao vídeo, os candidatos às vagas, individualmente (maiores de 18 anos), se dirigem à Comissão. Ariel esclarece que a banca recebe o candidato, solicita o Registro Geral (RG), confere os dados, e pede que a pessoa assine a autodeclaração étnico-racial, juntamente com a autorização para a filmagem. Na gravação, os indivíduos devem dizer o nome completo em voz alta e, em seguida, afirmar a sua autodeclaração étnico-racial. Somente essas duas enunciações são consideradas, ou seja, histórias e trajetórias que tentem justificar o pertencimento racial não são, nem serão consideradas na gravação, mesmo que o candidato tente apresentar tais justificativas. Após a finalização da gravação, é permitida e exigida a saída do participante do processo seletivo.

As análises e heteroatribuições raciais são discutidas entre os membros da comissão após a saída do candidato. Segundo Ariel, a pessoa que está se candidatando precisa apenas de um “sim” – ou seja, se uma das três pessoas da banca a reconhecer como negra, sua inscrição será homologada. Após os deferimentos e indeferimentos das matrículas, os candidatos indeferidos podem apresentar recurso, caso desejem. Nesse caso, são convocados novos membros para compor uma segunda comissão.

Relatos de Algumas Experiências na Comissão Verificadora de Autodeclaração racial da UFABC

Após a realização de quatro entrevistas semiestruturadas com pessoas de diferentes gêneros, ocupações e idades, que passaram pelos processos relacionados à Comissão de Heteroidentificação da UFABC, foi possível notar alguns dilemas. Como apontado anteriormente, a banca de verificação étnico-racial da UFABC utiliza exclusivamente as características fenotípicas dos candidatos. Embora exista um curso de capacitação para a atuação na banca, cada avaliador traz consigo suas subjetividades. Assim, quando foi feita a seguinte pergunta aberta: “Você lembra alguma situação marcante que ocorreu durante a sua participação na banca?” tanto para Ariel quanto para Alex, surgiram duas respostas positivas, trazendo à tona versões distintas de uma mesma história.

De acordo com as pessoas entrevistadas, houve uma candidata que se autodeclarou como parda e foi indeferida pela banca da instituição. Após isso, a candidata entrou com recurso, retornou à UFABC e passou por uma nova comissão. Ariel, que não participou dessas bancas, mas que acompanhou o processo da candidata, conta:

A menina foi indeferida, aí ela voltou e trouxe ao campus o pai e o avô. Era uma relação mais ou menos assim: o avô era preto, o pai, pardo, e a menina… tenta imaginar uma jovem negra, mas com a pele muito muito muito muito clara e com o cabelo alisado... Então não passaria mesmo, né? (...) Se eu estivesse na banca, conhecendo desse universo todo, eu teria deferido a matrícula dela, eu teria deferido... Mas a banca tem três pessoas, e os três indeferiram. Se uma única pessoa tivesse deferido, pronto, tá garantido. (Entrevista realizada em 18 de agosto de 2021).

Já Alex, que também não esteve na composição dessas bancas e, também, acompanhou o caso da requerente, contou uma narrativa divergente da de Ariel:

Foi o caso mais emblemático… A menina era super clara, super clara.. Era branca!! E quando ela veio fazer a banca (...) O pai tava junto. Aí foi pra sala, na sala ele queria entrar. Não entrou! E claro, ela não passou. (...) Foi pro recurso, e no recurso, não satisfeita, ela trouxe o avô junto. Porque o avô, sim, era negro... O pai era pardo. A menina, super branca. Ele era casado com uma mulher muito clara e a menina pegou os traços todos da mãe. (Entrevista realizada no dia 18 de novembro de 2021).

Posteriormente, o caso foi judicializado e a candidata perdeu. Essas visões distintas sobre a mesma pessoa acontecem por diversos fatores. Conforme Osório (2003), existem diferentes métodos de identificação racial, mas nenhum método é 100% eficaz ou infalível. No contexto brasileiro, três modelos são mais utilizados: o primeiro denominado “autoatribuição de pertença”, no qual a pessoa se inclui no grupo étnico-racial com o qual se identifica e, portanto, se considera um membro; o segundo método é a “heteroatribuição de pertença”, em que uma terceira pessoa define o grupo ao qual a pessoa avaliada “pertence”; e, por fim, o terceiro método, que consiste na identificação de grandes populações, utilizando técnicas biológicas, como a análise de DNA, com o objetivo de estudar os ascendentes próximos da pessoa pesquisada.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) utiliza os métodos de autoatribuição racial e heteroatribuição racial. De acordo com Osório (2003), no Brasil contemporâneo, a classificação racial tem sido realizada, principalmente, por meio de características fenotípicas. Nesse processo, indivíduos que apresentam menos características físicas atribuídas aos fenótipos considerados negros como cor da pele, formato do nariz, dos lábios e textura do cabelo, tendem a se autodeclarar como brancos. Essa autoatribuição pode variar de acordo com a posição socioeconômica do sujeito, bem como com a região do país em que ele está inserido. A ideologia racista brasileira, que privilegia a raça branca em detrimento das demais, exerce uma influência significativa na busca pelo embranquecimento (Osório, 2003).

Um exemplo claro dessa busca pode ser observado no tratamento do cabelo. De acordo com Alex, muitas mulheres com cabelos de origem afro (crespos e cacheados) chegam às Comissões de Heteroidentificação com os fios alisados, na tentativa de se adequarem aos padrões sociais dominantes. Da mesma forma, alguns homens optam por raspar a cabeça, adotando práticas que buscam minimizar as características fenotípicas associadas ao negro. No entanto, a entrevistada afirma que, mesmo com os cabelos alisados ou com os homens sem cabelo, não tem sido difícil identificar quem é negro, pois as características fenotípicas predominantes continuam evidentes.

A aparência é um ponto fundamental para se entender os debates raciais. De acordo com Gomes (2019), o cabelo e a cor da pele são elementos constitutivos na configuração racial no Brasil, e essa articulação feita entre esses dois fatores interfere em como a população negra se vê e como essa é vista.

Assim, a construção da identidade dos sujeitos envolve diversas esferas, incluindo a aquisição de conhecimento, conhecimento político de seu pertencimento étnico-racial e as experiências vividas. Alex e Ariel relataram situações em que algumas pessoas pretas se autodeclaram enquanto pardas, seja por receio de não serem consideradas “pretas o suficiente”, seja por falta de convicção quanto à sua identidade racial.

Nesse mesmo contexto de discussão sobre as categorias preta e parda, Alex e Ariel relatam que, durante o curso de capacitação para as Comissões de Heteroidentificação (CHI) da Universidade, houve situações em que indivíduos ligados às concepções que são proferidas por alguns segmentos de organizações negras, como o Frei Davi, da Educafro, afirmaram que indivíduos pardos não deveriam usufruir do sistema de cotas, ou seja, que apenas pessoas pretas deveriam ocupar esses espaços. Casos semelhantes também foram observados no estudo de Neves (2022) sobre as Comissões de Heteroidentificação (CHI) de outras Instituições Federais de Ensino Superior (IFES). Alex destaca que a organização do curso demonstrou um grande empenho em esclarecer as desigualdades que também afetam os pardos na sociedade brasileira, desafiando essa visão equivocada. Além disso, adotaram a postura de não recrutar pessoas que compartilham esse pressuposto para integrar as comissões.

Além disso, a temática de oportunismo foi levantada durante as entrevistas. Os entrevistadores questionaram aos participantes se havia casos de pessoas brancas tentando fraudar o sistema de cotas, na modalidade PPI. Ariel e Alex expuseram que, de fato, existem relatos de tentativas de fraude, como candidatos que utilizam maquiagem com coloração mais escura que o tom natural de sua pele, fazem bronzeamento excessivo, ou ainda, pessoas que não se consideram negras, mas acreditam que têm direito às vagas por possuírem ascendência negra em seus familiares diretos, como mãe ou parentes próximos. Por outro lado, Cris,8 outra pessoa entrevistada sobre o tema, disse que, em sua experiência nas Comissões de Heteroidentificação (CHI), nunca presenciou dilemas com seus colegas em relação às classificações raciais e não observou tentativas de fraudes ou oportunismos.

Tiê,9 que também contribuiu para a pesquisa, quando indagada sobre casos de oportunismo, falou sobre um caso específico envolvendo uma denúncia de suposta fraude de um estudante matriculado na instituição. O estudante foi convocado para se apresentar à Comissão de Heteroidentificação e, nesse caso, a avaliação não se limitou apenas à análise fenotípica. Além das características físicas, foi considerada a justificativa do estudante para sua autodeclaração como pessoa parda. Após a saída do estudante da sala, na interpretação de Tiê, a banca ficou em dúvida sobre a classificação racial do candidato.

Segundo Tiê, essa dúvida surgiu porque o universitário foi solicitado a justificar seu pertencimento racial e soube fazê-lo. No entanto, Tiê tinha convicção de que ele era branco, com base em seu fenótipo (características físicas e cor da pele). Por isso, discordou da decisão da banca, que aceitou a autodeclaração racial do estudante.

Indagou-se a mesma questão sobre casos de fraudes e oportunismos a Cris, que relatou ter participado de uma comissão responsável por verificar a denúncia de suposta fraude de um outro estudante matriculado na instituição. Nessa ocorrência, a fraude foi confirmada, resultando na expulsão do estudante. Durante o diálogo, ela refletiu sobre o fato de que a ocorrência exigiu muita responsabilidade, pois a decisão poderia mudar a vida inteira de alguém. A pessoa denunciada foi analisada cautelosamente, e a decisão da banca foi unânime.

Por fim, as estatísticas de deferimentos e indeferimentos da comissão da UFABC não foram disponibilizadas para esta pesquisa, o que teria possibilitado uma análise mais abrangente da situação, por meio de dados quantitativos que representassem indicadores como: (a) número de denúncias de supostas fraudes; (b) índice de indeferimentos por curso; (c) taxa de reprovação de heteroidentificação por ano; (d) índice de aprovação e reprovação de heteroidentificação por gênero, entre outros. Observa-se, sobretudo, uma busca institucional por proteger esses dados, que são fundamentais para a realização de reflexões, críticas e aprimoramento das operacionalizações das Comissões de Heteroidentificação (CHI).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das reflexões acima, é perceptível que as Comissões de Heteroidentificação étnico-racial trazem muitas questões sobre identidade à tona. No caso específico da Universidade Federal do ABC, nota-se que apesar dos dilemas encontrados nas bancas, existe um grande compromisso dos responsáveis e envolvidos diretamente com essas em entender as complexidades das classificações afro-brasileiras. Porém, dado o fato de que não há consenso absoluto com relação às classificações étnico-raciais dos indivíduos (seja por razões regionais, por razões de trajetórias de vida etc.), as Comissões de Heteroidentificação são e tendem a continuar sendo um tema polêmico. Afinal, qual a visão que deve prevalecer quando se trata de classificar o outro em termos “raciais”?

Isso, certamente, não desqualifica a percepção de muitos estudantes e membros das administrações universitárias de que há um número considerável de “fraudes”. Porém, alguns dos casos trazidos aqui mostram que nem todos os preteridos nas comissões eram fraudadores no sentido estrito do termo. Visão que, com visto, tem respaldo nos discursos de vários intelectuais dos movimentos negros após 1978, ou seja, as Comissões rompem não apenas com os discursos decoloniais que alimentaram muitas das lutas antirracistas no país, mas também com uma tradição de algumas décadas do próprio movimento negro.

Como dito, o objetivo aqui não é o de desqualificar as posições que se opõem sobre esse tema. O intuito foi mostrar algumas das zonas turvas e indefinidas que rodeiam a discussão atual sobre heteroidentificação e autodeclaração nas políticas afirmativas nas Universidades públicas. Acredita-se que existem diversos caminhos a serem pensados quanto aos dilemas e paradoxos imbricados nessa situação. Espera-se assim que este texto possa incitar não somente ao debate sobre o tema, mas também novas pesquisas empíricas para poder embasar as escolhas e decisões em dados e não apenas em impressão. Afinal, esse é o papel das Ciências Sociais críticas!

Quadro 1
Modalidades de ações afirmativas para os cursos de graduação na UFABC

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    » https://prograd.ufabc.edu.br/pdf/edital_063_2021_anexo_1.pdf
  • 1
    Entre as seis universidades restantes, três empregavam comissões de verificação (7,5%), duas solicitavam fotografias (5,0%) e uma combinava ambos os métodos (2,5%) (Feres Júnior; Daflon; Campos, 2011).
  • 2
    A Região do Grande ABC inclui sete cidades: Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra.
  • 3
    Nome fictício de alguém que nos concedeu uma entrevista, em razão de ter acompanhado todo o processo de implementação das Comissões de Heteroidentificação étnico-racial da UFABC. Neste artigo, todas as pessoas que foram entrevistadas autorizaram a gravação e transcrição das entrevistas, pois estarão protegidas sob anonimato, respeitando a ética de pesquisa. Portanto, todos os nomes serão fictícios.
  • 4
    Entrevista concedida ao autor no dia 18 de agosto de 2021.
  • 5
    Conforme Ariel, esse tipo de exercício ocorria de modo presencial até o ano de 2019.
  • 6
    Alex é um nome fictício de uma pessoa que já atuou nos processos relacionados à Comissão de Heteroidentificação da UFABC. A entrevista foi realizada pela autora em 18 de novembro de 2021.
  • 7
    Isso no modelo presencial, que precedeu a pandemia de COVID-19, de 2020 a meados de 2022.
  • 8
    Entrevista efetuada com a autora em 23 de novembro de 2021.
  • 9
    Entrevista executada com a autora em 26 de fevereiro de 2021.
  • Editor-chefe
    Renato Francisquini Teixeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jun 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    15 Abr 2022
  • Aceito
    10 Dez 2024
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