Open-access “SOMOS TODOS PARDOS?” AUTOCLASSIFICAÇÃO, HETEROCLASSIFICAÇÃO RACIAL E POLÍTICAS DE AÇÃO AFIRMATIVA NO CEARÁ

“ARE WE ALL BROWN”? SELFCLASSIFICATION, RACIAL HETEROCLASSIFICATION AND AFFIRMATIVE ACTION POLICIES IN CEARÁ

Resumos

A discussão em torno do pardo como categoria racial tem sido considerada central para o aperfeiçoamento das políticas de ação afirmativa em todo o país (Costa e Schucman, 2022; De Jesus, 2021; Rios, 2018). No Ceará a questão se torna ainda mais importante, pois o Estado possui a terceira maior população autodeclarada parda do país (64,7%). Este artigo se concentra na análise das especificidades da construção social do negro/pardo no Ceará e em suas recentes ressignificações face à atuação das comissões de heteroidentificação. Inicia analisando casos tornados públicos na imprensa cearense, nos quais as auto e heterodeclarações raciais de ingressantes por cotas foram contestadas. Prossegue com uma discussão teórica sobre como a questão do pardo vem sendo elaborada no Brasil e no Ceará. Analisa depoimentos de dezesseis estudantes cearenses de graduação e pós-graduação autodeclarados negros que apontam para novas problematizações e especificidades locais de ser pardo. Conclui que teorizações sobre o pardo devem levar a sério a importância das mestiçagens afro-indígenas no Ceará, o significado da branquitude cearense e a emergência da cultura negra e pulsante nas suas periferias urbanas.

Classificação Racial; Pardos; Cotas Raciais; Negros; Comissões de Heteroidentificação; Ceará


The discussion around “pardo” (brown) as a racial category has been considered central to the improvement of affirmative action policies throughout the country (Costa and Schucman, 2022; De Jesus, 2021; Rios, 2018). In Ceará, the issue becomes even more important, as the state has the third largest self-declared “pardo” population in the country (64.7%). This article focuses on the analysis of the specificities of the social construction of “negro/pardo” in Ceará and its recent resignifications in view of the actions of heteroidentification commissions. It begins by analyzing cases made public in the Ceará press, in which the self- and heterodeclarations of racial identities of those entering through quotas were challenged. It continues with a theoretical discussion on how the issue of the “pardo” has been elaborated in Brazil and Ceará. It analyzes testimonies of sixteen undergraduate and graduate students from Ceará who self-identify as Black, who point to new problematizations and local specificities of being “pardo”. It concludes that theories about “pardo” should take seriously the importance of Afro-indigenous miscegenation in Ceará, the meaning of Whiteness in Ceará, and the emergence of vibrant Black Culture in its urban peripheries.

Classification; Pardo; Black; Racial Quotas; Heteroidentification Commissions; Ceará


INTRODUÇÃO

A Lei número 12.711, de 2012, que tornou obrigatória as cotas raciais para ingresso de estudantes nas instituições federais de Ensino Superior, até 2018, não estabelecia procedimentos de heteroidentificação para os candidatos, e admitia como suficiente a autodeclaração. A Portaria Normativa Nº. 4, de 6 de abril de 2018 (Ministério do Planejamento, Secretaria de Gestão de Pessoas, Governo Federal), veio regulamentar a criação das Comissões de Heteroidentificação, estabelecendo que estas deveriam atuar de modo complementar à autoidentificação dos candidatos, auferindo, exclusivamente com base no fenótipo, se estão ou não aptos a ingressar por cotas como negros.

O Ceará é o Estado da Federação com a terceira maior população parda do país. De acordo com o último censo, 64,7% dos habitantes se declaram pardos (IBGE, 2022). Sendo a classificação “parda” a que mais gera controvérsias quanto às avaliações feitas pelas Comissões de Heteroidentificação em todo o país (Neves, 2022; Costa; Lima; Miranda, 2022; Daflon, Carvalhaes, Feres Jr, 2017), propõe-se neste artigo a refletir sobre como a política de ações afirmativas vem contribuindo para desenvolver novas elaborações sobre o que é ser negro em um “Estado pardo” como o Ceará. Examina-se especialmente as ressignificações que vem se dando a partir da atuação de jovens intelectuais negros ingressantes por cotas raciais dentro das Universidades públicas.

No Ceará, 5.690.973 pessoas se declaram pardas (64,7%), 2.456.214 brancas (27,9%), 595.694 pretas (6,8%) e 56.372 indígenas (0,6%) (IBGE, 2022). Ao contrário de outros Estados brasileiros, como o Rio de Janeiro e a Bahia, nos quais a população preta, ainda que minoritária, é muito mais significativa, a negritude cearense se caracteriza amplamente pelo tipo de pele escura, porém não retinta, e com outros marcadores que misturam fenótipos afrodescendentes, afro-indígenas e, ainda, de descendência europeia. Se em outros lugares do País, a discussão em torno do pardo (ou mestiço) tem sido central para o aperfeiçoamento das políticas de ação afirmativa (Costa e Schucman, 2022; De Jesus, 2021; Rios, 2018) esta questão se torna ainda mais importante no Ceará, em função aos pardos no Estado serem a ampla maioria.

Toma-se como premissa que raça não é uma categoria biológica, e sim uma construção social, que precisa ser compreendida de modo situacional em espaços e tempos históricos específicos, embora tenha conexões globais (Itzigsohn e Brown, 2020, p. 95).1 Assim sendo, investigar a construção social do pardo/negro, no atual contexto político das cotas raciais, faz-se muito importante, especialmente, quando se leva em consideração o contexto histórico das sucessivas tentativas de apagamento da presença afrodescendente no Ceará. O mito de que “somos todos mestiços” marca o tipo de racismo que historicamente se disseminou no Brasil a partir dos anos 1930 (Schwarcz, 2012). Porém, no Ceará, o mito difundido é de que a matriz populacional não incluiria negros em sua formação (Funes; Ferreira Sobrinho, 2016; Aureliano; Santana, 2021; Mendes, 2010).

O começo do século XXI marca um contexto em que muitos cearenses, como ocorre em outros Estados brasileiros, passam a se reconhecer como negros ao ingressarem em redes afetivas e políticas de resistência ao racismo, bem como em suas vivências nas religiões de matriz africana (Oliveira, 2019). Exigência do direito ao acesso à universidade, e pela permanência nessa, liberdade de crença em religiões afrodescendentes, defesa de manifestações culturais afrodescendentes típicas do Ceará, luta contra a perseguição e violência policial, a criação da Secretaria Estadual de Igualdade Racial, entre outras lutas do movimento negro são meios de afirmar a resistência da população negra no Ceará e a sua importância para a constituição da matriz populacional do Estado.

Assim, pensar sobre as disputas em torno de quem tem ou não direito às cotas raciais em um Estado em que 64,7% da população se autodeclara parda é de suma importância para entender as dinâmicas locais de relações raciais e, ainda mais, para o reforço e a manutenção da própria política de ação afirmativa no Brasil. O artigo se inicia com a apresentação e discussão de casos tornados públicos na imprensa cearense, em que auto e heteroclassificações foram contestadas no ingresso de estudantes por cotas raciais em universidades públicas cearenses.

OS CAMINHOS DA PESQUISA: DAS FRAUDES NAS COTAS À JUDICIALIZAÇÃO DAS AVALIAÇÕES DAS COMISSÕES DE HETEROIDENTIFICAÇÃO

Quando se inicia esta pesquisa, em 2022, a motivação inicial era concentrar no problema frequentemente denunciado de fraudes de pessoas brancas à política de cotas raciais na Universidade Federal do Ceará (UFC), a instituição de ensino superior de maior prestígio no Estado e uma das mais importantes do Brasil.2

Sendo um trabalho sobre processos de auto e heteroclassificação no Ceará, os autores consideram importante deixar evidente logo de início como se reconhecem e são reconhecidos socialmente em termos raciais na cidade de Fortaleza, onde residem, e como o marcador raça se intersecta com classe social, geração, gênero e sexualidade em seus corpos. Geísa Mattos é professora da UFC e pesquisadora branca cisgênero, heterossexual, de classe média alta e de meia idade, que vem se dedicando à pesquisa sobre racismo e à linha de Estudos Críticos da Branquitude desde 2019, o que acabou lhe transformando também em uma ativista antirracista. Sevy Santiago é um jovem bacharelando em Ciências Sociais, também da UFC, que se define como “corpo falante sem deficiência de um viado indubitavelmente branco no desafio de compor uma pesquisa que tenha como objetivo não só a defesa, mas também a manutenção e o aprimoramento das políticas de cotas raciais no Brasil”.

A motivação inicial desta pesquisa era a indignação de ver pessoas brancas ocupando vagas na Universidade que seriam destinadas às pessoas negras. A UFC passou a adotar a reserva de vagas para pessoas negras quando esta se tornou obrigatória a partir da Lei nº 12.711/2012. A maioria dos casos de fraudes denunciados ocorre sobretudo para ter acesso aos cursos mais concorridos, como Medicina e Direito, e causavam indignação, porque muitos dos que fraudavam as cotas eram justamente indivíduos que fazem parte da elite local, o que inclui tanto o pertencimento racial ao grupo branco quanto uma situação socioeconômica privilegiada. Um exemplo típico é o que aparece descrito no trecho desta reportagem que se reproduz a seguir:

Enzo (nome fictício) faz o tipo “de bem com a vida”. Nas redes sociais, compartilha só momentos de alegria com amigos e família: viagens ao exterior, grandes piscinas, fotos de quando passou uma temporada nos Estados Unidos da América. Entre as imagens do Instagram, registros também de um dos campi da Universidade Federal do Ceará (UFC), onde está próximo de concluir um dos cursos mais prestigiados e concorridos da instituição. Seria o clichê idealizado de vida “perfeita”, não fosse um detalhe: de pele muito branca e olhos claros, Enzo teve acesso à vaga na UFC em 2016 por meio de uma das cotas raciais destinadas a pretos, pardos e indígenas. Ele é um dos 13 alunos que, no segundo semestre do ano passado, tiveram as matrículas canceladas pelo então reitor da instituição, Henry Campos, por irregularidades no uso do sistema de autodeclaração de cotas da universidade. Foi a primeira vez que a UFC adotou medida do tipo. Quase todos os “cancelados” cursavam os cursos de Medicina e Direito – os mais concorridos no Sistema de Seleção Unificada (Sisu). E eles podem não ser os únicos: segundo a UFC, nova etapa de verificação foi aberta em 27 de fevereiro deste ano, com 20 alunos convocados (Mazza, 2020)

Mesmo que o repórter tenha utilizado um nome fictício, a história é real e as fotografias expostas por este jovem no Instagram caracterizam um modo de vida só acessível aos que se encontram no topo da hierarquia social, justamente aqueles que, antes da obrigatoriedade das cotas raciais, eram os únicos a terem assento nos bancos das Universidades públicas federais, que também estão entre as mais bem avaliadas e concorridas do País.

Diante de denúncias, cada vez mais numerosas, de candidatos brancos usufruindo da política destinada a reparar as históricas injustiças raciais no país, o Ministério Público no Ceará pressionou e a Justiça Federal decidiu, em 2019, que a Universidade deveria criar um plano de ação para coibir essas práticas. Com isso, desde aquele ano, a UFC criou uma comissão de heteroidentificação para avaliar candidatos acusados de fraude. Em 2021 e 2023, foram oferecidos treinamentos para os integrantes dessa comissão, incluindo oficinas de avaliação fenotípica.

A partir de 2022, a UFC também passou a exigir que os candidatos às cotas raciais enviassem vídeos, junto com sua autodeclaração, para serem avaliados por uma comissão a fim de verificar se estes atendem ou não aos requisitos fenotípicos.

De acordo com relatório da Pro-Reitoria de Graduação da UFC (PROGRAD, 2023), avaliando dados, tanto de 2022 quanto de 2023, mais de 50% dos candidatos denunciados por fraudes tiveram suas matrículas canceladas, porque a Comissão os avaliou como não negros. Em 2022, dos 380 avaliados, 199 não foram considerados aptos a usufruir da política (52%) e, em 2023, de 278 avaliações realizadas, 157, segundo a banca de heteroidentificação, não eram negros (56%).

No decorrer da pesquisa, no entanto, outro fenômeno chamou a atenção dos autores: a implementação mais ampla das Comissões de Heteroidentificação no Ceará levou à judicialização dos resultados de avaliação de candidatos por parte de indivíduos considerados não aptos a ingressar por cotas raciais por não serem considerados pardos/negros. Em alguns casos, era alegada discrepância em relação à avaliação das comissões dentro da mesma Universidade (Viana, 2024). Expandindo a pesquisa para outras Universidades no Ceará, além da UFC, foram encontrados casos como o de João Victor Uchoa, 24 anos, autodeclarado pardo, morador de Quixeramobim, município do interior do Ceará. Ele foi reprovado por cinco Comissões de Heteroidentificação e impedido de ingressar por cotas raciais no Curso de Medicina da Universidade Estadual do Ceará, porém foi considerado apto para ingressar pelo Curso de Ciências Biológicas da mesma Universidade, de acordo com o parecer de outra Comissão.

O processo judicial do estudante contra a Uece continua em andamento. Ele relata que reuniu diversos documentos que comprovam os traços fenotípicos negros, incluindo o laudo de cirurgião plástico “confirmando que tenho um nariz negroide”, e que chegou a procurar o Ministério Público do Ceará (MPCE), mas não conseguiu auxílio. “Desde que nasci, nunca tive uma concepção diferente a meu respeito. O que eu me considero como pessoa, um homem pardo, a Universidade descartou. Não vou mudar porque a Uece tem uma visão diferente sobre mim”, diz João Victor. (Viana, 2024, grifos no original).

Reproduz-se abaixo foto de João Victor publicada pelo jornal Diário do Nordeste (15/01/2024), cuja legenda indicava ser procedente de arquivo pessoal do próprio João Victor Uchoa:

Casos como os de João Victor costumam ser alvos de muita discussão nas redes sociais digitais. Entende-se que esses debates podem ser uma oportunidade para o aprimoramento da política, desde que leve a uma compreensão mais profunda da questão racial na sociedade brasileira, e no Ceará em particular.

Por outro lado, essa complexidade em torno da definição dos pardos vem sendo utilizada por aqueles que sempre foram contra as cotas raciais para atacar a política, como fez recentemente a revista Veja (Ferraz, Pechy e Neves, 2024). As disputas e dúvidas envolvendo questões fenotípicas se concentram entre pardos/negros e brancos/mestiços, já que sobre os pretos, isto é, indivíduos de pele retinta, ou sobre os “brancos branquíssimos” (Shucman, 2012) não pairam dúvidas acerca do seu pertencimento racial.

Antes de entrar na repercussão destes debates no caso específico do Ceará, considera-se importante trazer uma síntese dos impactos transformadores que a política de ação afirmativa e seus recentes aperfeiçoamentos vêm tendo no Brasil, de modo mais amplo. Em seguida, busca-se analisar as discussões contemporâneas no País que fizeram do pardo um nó conceitual e prático. Por último, discutem-se as especificidades da construção social do negro/pardo no Ceará, tomando como base a literatura recente sobre a questão. Também serviram de base para essa discussão duas aulas públicas proferidas por especialistas na questão racial no Ceará (Rodrigues, 2021; Ferreira Sobrinho, 2021), sendo uma da Doutora em Antropologia e Professora da Unilab, Vera Rodrigues, e outra do cientista social, professor e historiador, Hilário Ferreira Sobrinho.

Por fim, os autores analisam depoimentos de 16 estudantes cearenses de graduação e pós-graduação que participaram de um debate promovido por esta pesquisa em março de 2023, tendo como dispositivo deflagrador o documentário Autodeclarado – Dear Brown People (Costa, 2022NCI).

OS IMPACTOS DA LEI DE COTAS NO BRASIL E NO CEARÁ

Existe uma importante produção de estudos sobre os impactos profundos e transformadores que a lei nº 12.711/2012 promoveu ao estabelecer a obrigatoriedade das universidades públicas federais de reservarem vagas para estudantes negros (Rodrigues e Sito, 2019; Guimarães, Rios e Sotero 2020; Pinheiro et al. 2021; Borges e Bernardino-Costa, 2022). Entre os 50% de vagas nas universidades públicas federais para estudantes que tenham cursado o Ensino Médio integralmente em escolas públicas, a política de cotas determina que seja reservado um percentual correspondente ao existente na unidade da federação em que se localiza a instituição para pretos, pardos e indígenas.

A implantação das ações afirmativas nas universidades do País, desde 2012 até 2016, levou a “um aumento da participação de todos os grupos contemplados pela Lei de Cotas nas instituições federais. O grupo mais beneficiado, entre 2012 e 2016, foi o de indivíduos PPI [pretos, pardos e indígenas] de escolas públicas”, de acordo com pesquisa realizada por Senkevics e Mattioli Mello (2019, p. 195-196). Somente na região Nordeste, a população de jovens pretos, pardos e indígenas (PPI) de baixa renda, de 18 a 24 anos no período entre 2012 a 2016 nas Instituições de Ensino Superior (IFES) aumentou de 48,9% para 60,2% (Mello; Senkevics, 2019, p. 192-193).

Quando se considera somente o Ceará, esta mesma faixa da população teve sua participação nas IFES do Ceará aumentadas de 45,8% para 65,4% no mesmo período (Mello; Senkevics, 2019, p. 193). Com relação à Universidade Federal do Ceará, em específico, é possível destacar que no período de 2012 a 2016, o salto é gigante: aumentou de 18,4% para 43,3% (Mello; Senkevics, 2019, p. 202). De diferentes formas, as ações afirmativas para o ingresso no Ensino Superior mostraram, em apenas poucos anos, fortes resultados que apontam para o combate ao elitismo e ao racismo na composição do corpo discente das universidades brasileiras.

A necessidade de defesa dos programas de reservas de vagas universitárias se mostra evidente não apenas pela efetividade que tal política de ação afirmativa apresentou nos anos que se seguiram após a Lei de Cotas, mas também pelo fato de que há ainda muito trabalho a ser feito na luta contra a desigualdade racial. Um desses trabalhos, inclusive, é o próprio esforço de aperfeiçoamento da política de cotas raciais em sua função de garantir que a população à qual se destina, isto é, a população negra (preta e parda) e indígena, esteja de fato usufruindo do direito que conquistou após anos de debates, reivindicações e luta. É nesse momento que o debate sobre a categoria pardo ganha proeminência, tendo em vista que a ideia de “mestiçagem” gera para alguns indivíduos fenotipicamente brancos a assumpção de que teriam direito ao ingresso por cotas, enquanto outros, com traços fenotípicos negros e/ou indígenas, reclamam terem seu acesso barrado por algumas bancas de heteroidentificação, que não os reconhecem como negros.

AUTODECLARAÇÃO E HETEROIDENTIFICAÇÃO

A autodeclaração étnico-racial dos cidadãos nos levantamentos censitários impacta diretamente na política de cotas para ingresso nas Universidades, já que o percentual a ser reservado para pretos, pardos e indígenas vai depender da proporção de cada grupo étnico-racial existente naquele Estado, seguindo o levantamento mais recente feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. No entanto, em que medida a maneira como o indivíduo se percebe racialmente corresponde ao modo como a sociedade o vê? Em um País marcado pelo “mito da mestiçagem”, em que “aqui ninguém é branco” (Sovik, 2009), é possível que muitos sujeitos lidos socialmente como brancos no Ceará – e no Nordeste – se declarem pardos porque entendem que a branquidade seria reservada somente àqueles tipos característicos do Norte Global ou do Sul do País, em que a imigração alemã e italiana foi bem mais forte, gerando indivíduos de pele muito clara, cabelos e olhos claros. Por outro lado, existe também a possibilidade de que negros de pele clara rejeitem se declarar pardos, declarando-se brancos para os recenseadores, pelo desejo de embranquecimento em uma sociedade marcada pelo racismo estrutural.

Os responsáveis pelo censo demográfico no Brasil vêm avaliando as dificuldades de compreensão em relação ao significado da categoria pardo. A partir de 2021, o significado de pardo passou a ser apresentado da seguinte forma pelos recenseadores: “a pessoa que se declarar parda ou que se identifique com mistura de duas ou mais opções de cor ou raça, incluindo branca, preta, parda e indígena” (IBGE, 2022, p. 21). A questão é que, para o IBGE, prevalece a autodeclaração do informante, mesmo diante da explicação do recenseador, enquanto para o ingresso nas Universidades públicas, a heteroidentificação é que será determinante. Isto significa que a declaração do candidato a uma vaga por cotas raciais precisa ser referendada por uma comissão composta por cidadãos “de reputação ilibada, residentes no Brasil, que tenham participado de oficina sobre a promoção da igualdade racial e do enfrentamento ao racismo e preferencialmente experientes na temática da promoção da igualdade racial e do combate ao racismo”, conforme estabelece a Portaria Normativa n. 04, já citada.

No entanto, existe uma discrepância entre a definição adotada sobre o pardo pelo IBGE e o modo como o sujeito vai ser “lido” racialmente pelas bancas de heteroidentificação. Ao contrário da explicação dada pelo recenseador, o indivíduo pode ser considerado branco pela banca mesmo que se “identifique como mistura de duas ou mais opções de cor ou raça”, pois o que será avaliado para ter direito ao acesso por cotas é o fenótipo do candidato, independente de ele ser descendente de pessoas negras. A banca vai, explicitamente, considerar a cor da pele, o tipo de cabelo e os traços do rosto, pois o fundamento da política segue a compreensão de que no Brasil “o racismo é de marca e não de origem”, conforme o clássico ensaio de Oracy Nogueira escrito ainda na década de 1950 (Nogueira [1954], 2006).

O DEBATE SOBRE PARDOS NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

De acordo com Oracy Nogueira (2006, p. 292), o racismo no País “toma por pretexto para as suas manifestações os traços físicos do indivíduo, a fisionomia, os gestos, o sotaque”, pois seu critério principal é o “fenótipo ou aparência racial” (2006, p. 293). Porém, Nogueira (2006, p.293) demarcava a variabilidade e a marca relacional que pode ocorrer no próprio processo de identificação racial ao identificar a importância de características subjetivas tanto de quem “julga” como de quem é “julgado”, assim como ao atentar para a “atitude (relações de amizade, deferência etc.) de quem observa em relação a quem está sendo identificado” (2006, p. 293). Dessa forma, “a concepção de branco e não-branco varia, no Brasil, em função do grau de mestiçagem, de indivíduo para indivíduo, de classe para classe, de região para região” (2006, p. 294).

Levar em conta essa dimensão de gradação na intensidade do preconceito e da diversidade de manifestações fenotípicas entre brasileiros, de acordo com o autor, o levaria à afirmação de que no Brasil “não teria sentido o fenômeno do passing, pois que o indivíduo, sendo portador de traços ‘caucasóides’, será considerado branco, ainda que se conheça sua ascendência negra ou o seu parentesco com indivíduos negróides” (2006, p. 294, grifo do autor).

No entanto, a discussão mais contemporânea sobre pardos sugere que é preciso sim teorizar sobre a passabilidade, no caso brasileiro, e que, se isso é impossível para pretos, no caso dos pardos a discussão faz sentido e ganha importância no contexto das ações afirmativas. De acordo com Alessandra Devulsky (2021, p. 194): “passabilidade” é entendida como o “fato de que alguns negros claros podem ser confundidos e assimilados como brancos em alguns espaços, mesmo que adotem intimamente a ASncia negra como seu marcador racial”.

Esse embranquecimento, muitas vezes, ocorre com muito custo, como descrito por Érico Andrade, em Negritude sem identidade (2023). Este autor produz, a partir de um relato pessoal, uma reflexão sobre como sua trajetória foi marcada pelo acesso à linguagem e à sociabilidade das elites por meio de uma “máscara branca”, o que equivale a habitus de classe e raça impostos pela branquitude. Em uma “escola de classe média”, o autor se via exigido a “pagar” a possibilidade de estar ali com seu “silenciamento racial” (2023, p. 123).

Andrade se alinha à professora e pesquisadora da área do Direito, Alessandra Devulsky (2021) entre os autores que representam uma outra perspectiva para a questão do pardo. Esta perspectiva se tornou conhecida como a crítica ao “colorismo”, e é inspirada na obra da americana Alice Walker de 1983, In Search For Our Mothers’ Gardens, mas também na obra de intelectuais e ativistas históricos do movimento negro no Brasil, como Sueli Carneiro (2011, p. 70-71), que tradicionalmente defendeu a inclusão dos pardos no grupo de negros, afirmando que uma das características do racismo é justamente a representação estereotipada e fixa de pessoas negras em contraposição às representações de brancos em sua diversidade de aparências, ao ponto de um negro “bastar” para representar todos.

Dentro da crítica ao colorismo, entende-se que a concessão feita pela branquitude às pessoas negras é sempre reafirmativa da separação entre o branco e o não-branco, de forma que esse último é colocado de forma subalterna. “É como se fosse possível promover um achatamento ontológico que reduz toda diversidade da negritude a um mesmo patamar de inferioridade, sendo o traço epidérmico do corpo negro o seu critério de identificação” (Andrade, 2023, p. 96). Érico Andrade parte da “defesa de que a experiência corporal da negritude forma uma partilha de uma rede de afetos e que essa partilha será experienciada pelas pessoas negras de modo singular” (2023, p. 101).

O projeto de branqueamento exige de pessoas negras que se aproximem dos ideais de branquitude, por meio de “roupas, signos ostentatórios de riqueza, estéticas eurocêntricas” (Devulsky, 2021, p. 44) para terem a mínima possibilidade de transitar nos espaços que são exclusivos à branquitude. Essa variação e gradação de quem pode ser identificado como branco está em constante contato com a agência das pessoas no fazer de sua autoidentificação.

Se, por um lado, quaisquer tentativas de homogeneização e reducionismo da negritude, tanto em suas expressões fenotípicas quanto em suas expressões culturais, corroboram com o projeto colonial da branquitude, como estes autores têm afirmado, quais os limites a partir dos quais alguém deixaria o “limbo racial”, em que o pardo, muitas vezes, é colocado e passaria a ser considerado apto a ser beneficiado pelas cotas raciais? Em outras palavras, como questiona Rodrigo Ednilson de Jesus (2021), “quem quer (pode) ser negro no Brasil”?

Existem diversos fatores na dimensão fenotípica que contam para a interpelação de uma pessoa como negra – como formato de boca, nariz e tipo de cabelo –, porém, “é a quantidade de melanina na epiderme de um homem ou de uma mulher, na maior parte das vezes, o que ressalta, de modo mais arguto, qual será o local predeterminado na economia dos afetos e na distribuição de riquezas” (Devulsky, 2021, p. 48-49).

No entanto, o que acontece quando a cor da pele não é tão escura para o indivíduo ser considerado indiscutivelmente preto, e nem tão clara para se configurar branco? O reconhecimento racial de uma pessoa parda, nestes casos, pode ser um processo complexo, pois o fenótipo pode deixar dúvidas, abrindo espaço à contestação de auto e heteroidentificação.

Autores como Gleidson Dias (2018) e Roger Raupp Rios (2018) vem reforçando o entendimento de que as Comissões de Heteroidentificação não são verificadoras de uma “pretensa verdade sobre a raça” (Rios, 2018, p. 236). Para Dias (2018, p. 143), o sentimento subjetivo de uma pessoa, especialmente se filha de pai ou mãe negra, de que também é negra, é “direito subjetivo e intocável”, mas esta perspectiva vai ser confrontada com o “realismo fenotípico” das bancas de heteroidentificação. Para Rios (2018, p. 236), as bancas não são “donas da verdade”, mas devem “investigar os sentidos que, ao longo da História e no presente, quando concretizada a política, são socialmente atribuídos mediante a construção social da identidade racial” (Rios, 2018, p. 236).

Até aqui é possível entender que a classificação racial das pessoas não é mera descrição de um fato biológico, mas resultado da interpretação de grupos sociais, principalmente com base no fenótipo. A partir desta leitura racial, dentro de dada sociedade, compreende-se que certos indivíduos estariam sujeitos à opressão e discriminação dentro de um sistema racista e é para estes que se destinam as políticas de reparação. Neste entendimento, raça continua sendo uma construção social, cujos significados são dinâmicos e contingentes histórica e regionalmente. Sendo o fato regional importante nesta consideração, passa-se a analisar agora o fenótipo característico quando se analisa a identificação das pessoas negras no Ceará, tendo por base o seu contexto histórico e cultural.

A CONSTRUÇÃO SOCIAL E HISTÓRICA DA NEGRITUDE NO CEARÁ

Negra de pele retinta, antropóloga gaúcha e professora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afrobrasileira (Unilab), em Redenção, Vera Rodrigues conta que, frequentemente, é lida como “africana” desde que veio morar no Ceará, em 2013. Quando ela descarta essa suposição perante seus interlocutores, costuma escutar deles a pergunta, quase certeza, de que ela então seria do Maranhão, da Bahia ou do Rio de Janeiro, e face a resposta de Vera de que vem do Rio Grande do Sul, segue-se quase sempre a incredulidade, visto o estereótipo de que gaúchos são loiros de olhos azuis, descendentes de alemães ou italianos (Rodrigues, 2017).

No mesmo trabalho, Vera Rodrigues chama a atenção para o paradoxo do Ceará, tradicionalmente, não reconhecer a presença de negros em sua matriz populacional, ao mesmo tempo em que se orgulha de ter sido o primeiro a abolir a escravatura, em 25 de março de 1884. No entanto, Vera se recusa a cair na armadilha do mito de “no Ceará não existem negros” e ao contrário, oferece uma perspectiva rica para se pensar na diversidade da experiência diaspórica no País e no Estado. Inspirada em Brah (2011), “uma ungandesa de ascendência índia”, que tematiza sobre cartografias da diáspora, e também no trabalho dos historiadores locais como Ratts (2000), ela apresenta, por exemplo, as lutas das dezenas de comunidades quilombolas no interior do Estado para obterem reconhecimento do Governo. Essas se fortalecem na década de 1990, mas são sempre alvo de ameaça das elites dominantes.

O Instituto Histórico do Ceará assumiu, durante a última década do século XIX, a tarefa de “legitimação do território da pátria Ceará por meio do discurso histórico e da criação de um tipo cearense” (Mendes, 2010, p. 49). Essa missão ocorre por meio da exclusão da identidade negra ao levar em conta apenas “duas raízes: a europeia e a indígena, a primeira louvada como arauto de civilização e a segunda necessária para legitimar a ocupação do território” (Mendes, 2010, p. 50).

A construção historiográfica que negava a presença da negritude no Ceará visava corroborar com o projeto de embranquecimento. Tentativas pouco expressivas e/ou frustradas de trazer imigração europeia para o Nordeste, em geral, e para o Ceará, em particular (Funes; Ferreira Sobrinho, 2016; Aureliano; Santana, 2021), foram acompanhadas de outros esforços como o movimento abolicionista formado pela elite branca, que tentava ativamente excluir quaisquer expressões de protagonismo negro da luta (Marques, 2013, p. 353-355), coexistindo com a forte perseguição e repressão às manifestações culturais afrodescendentes no Ceará com a chegada da República (Funes; Ferreira Sobrinho, 2016; Marques, 2013; Mendes, 2010).

Perspectivas contemporâneas sobre os significados de ser negro no Ceará reforçam o paradoxo da “negação da existência” associada com evidências de racismo no cotidiano (Mendes, 2010). Por outro lado, a partir da segunda década do século XXI, em Fortaleza, nota-se um processo cultural e socialmente rico pelo qual jovens moradores de periferia de Fortaleza passam a se reconhecer e se afirmar como negros (Santos, L., 2023; Santos, N., 2023). Os cabelos, antes muitas vezes alisados nas tentativas de embranquecimento, aparecem exibidos em forma de “blacks”, volumosos, trançados, ou sob turbantes. Inspirados por rappers de São Paulo como Mano Brown, uma referência central, surgem também poetas e rappers negros e negras em Fortaleza, tematizando os significados de suas vivências raciais, como o coletivo Pretarau, surgido em 2019, que realiza rodas de conversa e atividades formativas para jovens escritoras negras (Mapa Cultural Secult Ceará).

Muitos destes jovens ingressaram, a partir de 2013, nas Universidades públicas, nas quais vivenciaram esse processo de se perceberem negros e negras de forma ainda mais intensa, organizados em coletivos, nos quais reivindicam seus lugares de sujeitos no processo de conhecimento e desafiam a branquitude acadêmica (Santos, L., 2023). A produção cultural da negritude local se torna viva, intensa e crescente, como demonstram trabalhos produzidos por jovens intelectuais negros egressos do Curso de Ciências Sociais da UFC, alguns dos quais se tornaram produtores culturais e lideranças desses movimentos, como Lilica Santos (2023), ou produtores da chamada “moda de favela” como Nair Santos (2023) e Carll Serena Souza (2023).

Porém, o vigor desta juventude negra e a importância do acesso desta à Universidade vem sendo ameaçada por debates em âmbito nacional e local, como o descrito acima, no qual a discussão se torna confusa e por demais flexível em torno do pardo, abrindo espaço para que brancos possam acessar as cotas. Vera Rodrigues tem sido assertiva em abordar essa questão, enfatizando a necessidade da heteroidentificação, e enfrentando o problema de indivíduos lidos socialmente como brancos, que se apresentam como negros e negras publicamente, achando terem pleno direito à autoidentificação racial para acessar as cotas.

Em aula pública proferida a convite da autora Geísa Mattos (Rodrigues, 2021),3 a Professora Vera Rodrigues apresentou sua preocupação quanto ao fato de a categoria pardo, no Ceará, ser mobilizada por pessoas socialmente brancas que, apesar de não apresentarem traços afrodescendentes em seus fenótipos e de não serem interpeladas como pessoas negras, também não se consideram brancas por não possuírem traços que as aproximem do branquíssimo “sulista” ou do “europeu” de cabelos e olhos claros e uma pele pálida:

Tenho observado no contexto cearense que a ideia de ser pardo não necessariamente vem imbuída de que ser pardo é ser parte da população negra. É como se ser pardo fosse algo à parte disso. “Eu sou pardo porque eu não sou sulista, não tenho olho azul”, como se não houvesse aquilo que a Sueli Carneiro já chamou atenção para nós, no artigo sobre pessoas de pele clara, uma heterogeneidade de ser branco. Então, a criatura não tem traços negróides, nunca vivenciou a dinâmica racial brasileira de opressão, mas pega a categoria pardo e manipula no sentido de dizer “ora, se eu não sou loira e de olhos azuis então sou parda” e pardo parece que virou aquele saco de gatos que todo mundo quer entrar, mas só que eu diria que não é pra todo mundo [...]. Me parece que é preciso referendar cada vez mais no termo de fenotipia que a categoria pardo faz parte da população negra (Rodrigues, 2021).

O historiador Hilário Ferreira, também em aula promovida a convite (Ferreira Sobrinho, 2021)4 explorou como o termo “pardo” foi utilizado pelos colonizadores portugueses, primeiramente, para a designação dos habitantes nativos, inclusive trazendo cartas de Pero Vaz de Caminha como ilustração prática do uso do termo, de forma que o termo pardo sempre foi uma marcação de quem não tem acesso à branquitude:

Os descendentes dessas pessoas [atualmente os negros no Ceará], os seus antepassados, foram vistos pelos portugueses como pardos. A palavra pardo sempre esteve associada a uma cor, utilizando um termo, negra clara ou morena, mas o moreno no sentido de uma pele não-branca, uma pele não embranquecida. Ao longo da História pardo nunca significou pessoa de pele clara branca.

OS PARDOS NO CEARÁ NA PERSPECTIVA DE JOVENS INTELECTUAIS NEGROS

Como parte desta pesquisa, exibiu-se em maio de 2023, no auditório do Departamento de Ciências Sociais da UFC, o documentário “Autodeclarado – Dear Brown People” (2022), dirigido por Maurício Costa, que aborda, de modo central, o papel das Comissões de Heteroidentificação em definir quem é ou não negro.5 O convite foi divulgado amplamente nas redes sociais e por e-mails institucionais da UFC. A ideia foi promover uma roda de conversa sobre o tema a partir das provocações do documentário. Atraiu-se uma plateia de aproximadamente 50 pessoas, a maioria de jovens negras e negros. Após a exibição, 16 destes jovens, estudantes de graduação e pós-graduação, se manifestaram, encaminhando o debate para aspectos ainda pouco explorados da questão e para as especificidades de ser pardo no Ceará, trazendo reflexões muito valiosas a partir de suas próprias vivências e estudos.

Mesmo antes do filme ser exibido, ainda enquanto se conversava com a plateia presente, chamou a atenção o fato de que o que os motivava a estar ali era menos o fato de brancos estarem fraudando a política – a motivação inicial para esta pesquisa – mas sim o receio deles não serem reconhecidos como negros pelas bancas de heteroidentificação e o incômodo com o chamado “colorismo” e com a ideia de “passabilidade” associada aos pardos. Com isso, os depoimentos dos jovens intelectuais negros e negras mudaram a perspectiva inicial do começo desta pesquisa, conduzindo a outras questões que pareciam mais relevantes a eles de serem discutidas, quanto aos pardos no contexto do Ceará.

A primeira surpresa foi constatar que estudantes que ingressam por cotas raciais como pardos nem sempre se identificam como parte da negritude. O reconhecimento de si mesmos como negros ocorre, muitas vezes, no contexto das reflexões coletivas dentro da Universidade, lendo autores e autoras negras e convivendo com organizações estudantis, como se deu com Sabrina Maria Monteiro6, que em 2023 cursava Licenciatura em Ciências Sociais na UFC:

Eu sabia que eu não era branca, mas eu não sabia se eu podia me afirmar como negra, então eu me afirmava como parda e aí, durante a graduação, algumas colegas que foram essenciais para formulação do fórum de negros e negras, me ajudaram nesse processo de letramento racial, que mudou completamente minha vida. Foi então que eu passei a me afirmar como mulher negra parda.

Se o reconhecimento do pardo, enquanto negro, não é simples mesmo para os que ingressam por cotas raciais, outro desafio que eles trouxeram à tona foi o de não serem considerados “negros de verdade”, em função de não terem a pele retinta. A ideia de “passabilidade” dos pardos foi um dos principais temas da conversa após a exibição do filme. A antropóloga cearense Izabel Accioly,7 presente no debate, expressou o seu incômodo com a expressão “privilégio pardo” que apareceu mencionada por um dos entrevistados do documentário, sintetizando preocupações semelhantes a de muitos ali presentes: “privilégio pardo é você conseguir entrar no lugar que tem branco, mas você não é aceito, você é tolerado”.

Além disso, Izabel Accioly chamou a atenção para a importância política dos pardos no grupo dos negros, tendo em vista que estes constituem a maioria da população em vários Estados do País, mas especialmente no Ceará, em que, dos 72% de negros, apenas 6,8% da população cearense se reconhece preta, o restante é parda (IBGE, 2022). “Se excluem os pardos, qual é a força política que os pretos vão conseguir mobilizar? Uma das coisas que eu vejo no documentário, que eu sinto também nas conversas, é essa ideia das pessoas pardas se sentirem usadas. Quando é interessante contam com a gente, quando não é mais a gente vai para lata do lixo”.

Pardos, por terem a pele não retinta, podem ser lidos racialmente como negros no Ceará, mas não serem reconhecidos desse modo em outros Estados nos quais a presença preta é mais proeminente, como na Bahia ou Rio de Janeiro. Porém, para quem vivenciou o racismo em diversos momentos da vida no Ceará, não ser reconhecido como negra pode ser uma ofensa para a qual é preciso aprender a responder adequadamente, como ensina Izabel:

Eu, como uma mulher negra de pele clara que já viveu em outros estados do país, sei que há uma diferença no modo como as pessoas negras são vistas aqui no Ceará [em relação] ao Sudeste e no Sul do país. Eu acho que a gente tem que pensar o seguinte: a gente tem que ter peito o suficiente também para responder quando alguém vier dizer pra gente que não considera a gente negro. Sabe aquela coisa de não ficar de melindre, de entender “isso não é pessoal, ele não está querendo me ofender”? Às vezes é ofensa sim, mas eu [posso responder]: “entendi, você não me acha negro, tudo bem, não tem nenhum problema, mas as minhas experiências de vida me colocam em outro lugar; passei por diversas situações, e na minha trajetória, nos lugares que eu passei, eu fui reconhecida sim, então fica você achando que eu não sou negra e fico eu aqui sentindo que eu sou na minha pele”.

Embora as vivências sejam fundamentais para alguém se reconhecer racialmente como negro, o problema é que o processo de autoreconhecimento precisa ser validado pela banca de heteroidentificação, no caso da política de ação afirmativa. Como esta se baseia apenas no fenótipo, o candidato ao ingresso por cotas raciais não vai poder expressar como vivenciou o racismo, e mesmo que o faça, sua narrativa não pode ser considerada pela banca, segundo a Portaria Normativa que regulamenta a atuação das Comissões. Nesse sentido, compreender quais características fenotípicas são constitutivas da negritude (parda) em cada Estado é fundamental.

Uma resposta a isso tem sido avançar na elaboração sobre a mestiçagem afro-indígena no Ceará, um tema que apareceu como central nos depoimentos logo depois da exibição do filme. Muitos jovens ingressantes por cotas raciais percebem que não são exclusivamente afrodescendentes, que a mestiçagem da qual seu fenótipo resulta inclui indígenas, e também brancos:

Eu queria entender o meu lugar no mundo e o lugar também das pessoas que me cercam. A minha família, particularmente, é muito misturada entre negros e brancos e depois eu descobri que também indígena. Então, esse termo “pardo” sempre apareceu como um questionamento pra mim, mas também como uma incógnita do que que isso significava na minha vida ser nomeado assim, ser visto assim…

Alguns importantes insights para desvendar o que significa ser pardo no Ceará surgiu no próprio debate. A jovem trans negra, Angela Abuk, estudante de Ciências Sociais da UFC, contestou a forma como a questão do pardo era tratada tanto no documentário, quanto por algumas pessoas que se manifestaram na discussão. A díade negro/branco precisa ser repensada no caso do Ceará, de acordo com ela:

Eu acho que esse debate não devia ser atravessado por essa divisão tão precisa das duas raças porque, se a gente está pensando num contexto de Ceará, a gente pensa um Estado que é marcadamente indígena. Os povos indígenas aqui no Ceará passaram por um processo de violência tal qual nos outros estados, porém eles estão muito presentes: os Tremembé, os Tapeba, enfim. Eles convivem com a gente no dia a dia e se você perguntar, por exemplo, para alguém da sua família, é bem provável que teve alguma avó indígena, porque essas pessoas estavam aqui antes de a gente chegar, antes de a gente ser arrastado pra esse território. [...]. O debate sobre pardos no nosso país é muito atravessado pela ideia de que pardos são negros e é isso, acabou, não existem outras identidades que não a negra e a branca, né? A Kaê Guajajara tem uma música chamada Mãos Vermelhas em que ela fala: “chamam de pardos pra embranquecer, enfraquecer e desestruturar você”. Isso faz parte do processo de ser negro, também. Eles chamam a gente de pardo, pra tirar a gente da categoria da negritude, pra que a gente não se sinta negro e pra que a gente não se organize enquanto negros. A gente não pode deixar os indígenas de fora do debate sobre o pardo porque eles constituem grande parte do que é o “povo brasileiro”.

Egressa do curso de Licenciatura em Ciências Sociais no qual ingressou por cotas raciais como parda, a jovem Nayara Braz, que pesquisa o tema das vivências de mulheres cotistas negras na UFC, expressou a importância de trazer o foco do debate também para a miscigenação afro-indígena, que seria muito marcante nos traços fenotípicos de negros cearenses:

O movimento negro caminha a passos lentos quando o assunto é construção de sínteses com os povos originários. Os povos originários estão muito distantes dos grandes centros acadêmicos. Se pensar o acesso de negros à Academia é se deparar com números ruins, pensar a presença de indígenas na Academia é quase impossível. Ainda estão tentando buscar por uma legislação que permita um reconhecimento étnico de pessoas que nasceram em meios urbanos. Enfim, discussões que não entram no mainstream acadêmico e sequer ganham espaço nas agendas de pesquisadores de raça (que muitas vezes reduzem o debate entre branquitude e negritude – a la pesquisadores europeus que também teorizam ignorando os tantos outros massacres étnicos). (Nayara Braz, depoimento escrito para esta pesquisa, março de 2024).

Nayara também trouxe outra perspectiva para a questão que serviu de motor inicial para esta pesquisa, que foram os casos de pessoas brancas se passando por pardas para usufruir da política de ação afirmativa, trazendo complexidade a uma abordagem do que ela chamou de “corpos e subjetividades completamente fragmentadas entre o ser ou não branco”:

Não há como ignorar que a maioria da população brasileira carrega no corpo e na psique o acumulado histórico de um embranquecimento forçado. Que hoje resulta em corpos e subjetividades completamente fragmentadas entre o ser ou não branco. Para além do mau caratismo (também carregado de vivências mestiças!), há muita gente fragmentada racialmente/etnicamente. Afinal, esse foi um desejo das políticas eugenistas. O Brasil, famoso por acolher tantas culturas, também gera brasileiros assim, cheios de rastros não detectados, digitais difíceis de decodificar. Cada estado tem um Calcanhar de Aquiles diferente (Nayara Braz, depoimento escrito para esta pesquisa, março de 2024).

O “mau caratismo” a que Nayara se refere seria mesmo dos “brancos fraudadores de cotas”, que usando de recursos estéticos – como encrespar os cabelos, fazer bronzeamento artificial e maquiagem para escurecer – tentam “se passar” por negros para usufruir da política, em uma espécie de passabilidade ao contrário. No entanto, como outras jovens negras cearenses, Nayara vem chamando a atenção para uma questão importante de ser teorizada quando se trata do aperfeiçoamento da política de ação afirmativa no Brasil: cada Estado brasileiro tem o seu Calcanhar de Aquiles, quando se trata de enfrentar o nó conceitual e prático do pardo no País. No Ceará, este calcanhar precisa ser tratado com uma reflexão mais aprofundada sobre a mestiçagem afro-indígena. É importante entender em cada Estado como esse nó conceitual se apresenta, com suas especificidades, a partir da realidade sócio-histórica-cultural local.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A discussão sobre o pardo, como categoria racial, precisa ganhar contornos locais, a fim de oferecer subsídios consistentes à atuação das Comissões de Heteroidentificação, fortalecendo as políticas de ação afirmativa em cada Estado. No caso do Ceará, indivíduos mestiços afro-indígenas, mesmo não tendo fenótipo tão próximo ao do negro/preto como o que se vê na Bahia ou no Rio de Janeiro, não serão considerados brancos no Estado, sendo tidos como subalternos e inferiorizados, em diversas situações, nas quais interagem com a branquitude local. Por outro lado, estes mestiços de origem afro-indígena são urbanos, na maioria das vezes, e não podem reivindicar o seu território ou seu lugar nas cotas de indígenas. Serão eles reconhecidos como pardos pelas bancas de heteroidentificação?

Por outro lado, quem são os brancos em Fortaleza? Por que, em um bairro de elite, como Meireles, 65% da população se declara branca e 30% parda (IBGE, 2010), mas são muito raros os negros frequentando como clientes os restaurantes, academias e outros espaços ditos “nobres”? Se o mito fundador cearense é de que “aqui não existem negros”, há também uma crença difundida de que tampouco existem brancos no Estado. A branquitude no Nordeste, de modo geral, e no Ceará, em particular, é considerada inferior na hierarquia implícita dos brancos no Brasil, e por isso cearenses, mesmo de pele clara, sofrem discriminação em Estados do Sul e do Sudeste, nos quais há maior preponderância de “branquíssimos” – loiros e de olhos azuis. No Ceará, pessoas que têm privilégios de brancas por terem a pele clara podem ter sangue indígena e também negro, o que se revela em traços fenotípicos menos preponderantes. Estes brancos mestiços não sofrerão racismo em seu lugar de origem, especialmente, se pertencentes às camadas médias e altas.

Quem vive o racismo diariamente é a população de pele escura, moradores de periferia e com mais traços afrodescendentes, como confirmam estudos recentes (Mendes, 2010; Oliveira, 2019). A branquitude no Ceará, ao contrário, tem sua existência firmemente ancorada em seus privilégios e atua para reforçá-los sistematicamente nos bairros de elite (Macedo, 2021; Mattos, 2022), mesmo que não sejam “brancos suficientes” aos olhos de brasileiros netos de imigrantes alemães do Rio Grande do Sul, ou que não sejam “suficientemente negros”, de acordo com referenciais afrodescendentes da Bahia, por exemplo. Para os brancos cearenses, usar a referência do “branquíssimo” do Norte Global ou do Sul do País como referência para ingressar por cotas raciais tem sido uma estratégia comum, que na prática tenta negar reparação àqueles que sempre sofreram racismo.

Porém, nas periferias de Fortaleza, a maioria dos moradores tem a cor bem mais escura do que os moradores de bairros ricos, como Meireles e Aldeota. Os cabelos crespos são muito marcantes, assim como boca, nariz e outros traços afrodescendentes bem característicos, e, embora alguns possam ter cabelos lisos como os povos originários, ou alisados pelas tentativas de embranquecimento, em função de uma “consciência racial fragmentada” (Braz, 2024), têm sempre a pele escura. A juventude negra, nas periferias dos grandes centros urbanos do Ceará tem também um modo de se afirmar cada vez mais forte culturalmente e politicamente (Mattos 2017; Oliveira, 2019; Santos, L., 2023; Santos, N. , 2023; Souza, 2023). Tem feito a diferença dentro da Universidade, ao desafiar saberes colonizados (Santos, L., 2023).

Essa negritude, que é o alvo do racismo cotidiano e da violência policial, precisa continuar sendo destinatária das políticas públicas de reparação à escravidão que durou quase quatro séculos neste País, e ainda perdura nas formas de exploração e humilhação de trabalhadores negros pelas elites brancas. São esses negros, agora ocupando espaços na Universidade, que incomodam a branquitude local. Eles se tornam, cada vez mais, visíveis em espaços antes exclusivos para os brancos, e, pensando por si mesmos, vão fornecendo suas importantes contribuições para desfazer o “nó conceitual” dos pardos, ao mesmo tempo em que tecem novos significados para compreender racialmente sua ancestralidade e suas resistências.

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  • 1
    Embora vários autores/as contemporâneos/as venham trabalhando com essa perspectiva epistemológica sobre raça, a referência aqui é ao pioneirismo de W.E.B. Du Bois, cuja obra foi muito bem analisada e sintetizada por Itzigsohn e Brown (2020).
  • 2
    A Universidade Federal do Ceará foi considerada a 23ª melhor Instituição de Ensino Superior da América Latina, segundo a edição de 2023 do ranking britânico Times Higher Education (THE), de acordo com notícia publicada no portal da UFC, em julho de 2023. Disponível em https://www.ufc.br/noticias/17966-ufc-avanca-10-posicoes-e-e-a-23-melhor-da-america-latina-e-a-1-do-norte-e-nordeste-aponta-ranking-britanico. Acesso em março de 2024.
  • 3
    Aula pública de Vera Rodrigues proferida como parte do programa da disciplina optativa denominada Racismo e Branquitude, ofertada por Geísa Mattos no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFC em 2021. Disponível no YouTube NERI-UFC: https://www.youtube.com/watch?v=UQGv_ypnGzc&t=6545s
  • 4
    Aula pública de Hilário Ferreira proferida no mesmo contexto da disciplina mencionada na nota anterior. Disponível no YouTube NERI-UFC: https://www.youtube.com/watch?v=c0-iyN-1PMM&t=293s
  • 5
    O documentário não será discutido neste artigo, porém, a plateia levantou várias críticas à forma como este foi produzido e editado, que pareceu aos presentes “confuso”, “contraditório” e “implicitamente anti-cotas”.
  • 6
    Todos os interlocutores citados nessa sessão autorizaram serem citados por seus nomes verdadeiros.
  • 7
    Izabel Accioly é cearense, professora, ativista negra e influenciadora digital conhecida no Instagram como @afroantropologa. Mestre em Antropologia pela Universidade Federal de São Carlos, em que ingressou por cotas raciais.
  • Editor Chefe:
    Renato Francisquini Teixeira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jun 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    05 Abr 2024
  • Aceito
    23 Jan 2025
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