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Teor de cimento e seus efeitos sobre a resistência ao choque térmico de concretos espinelizados in-situ

Cement content and the thermal shock performance of in-situ spinel formation in refractory castables

Resumos

Concretos refratários aluminosos contendo espinélio são amplamente utilizados como revestimentos de panelas siderúrgicas, devido a sua elevada resistência à corrosão. Além do bom desempenho anti-corrosivo, estes materiais devem suportar as variações bruscas de temperatura causadas pela ciclagem térmica, responsáveis pela diminuição da vida útil do revestimento. Neste contexto, a análise da resistência ao dano por choque térmico se torna parâmetro fundamental para a correta seleção do revestimento refratário. Esta propriedade pode ser melhorada por meio da incorporação de mecanismos de tenacificação à estrutura do concreto. Uma fase que auxilia na tenacificação do material é o CA6, que está associada ao cimento de aluminato de cálcio (CAC), matéria-prima usada como ligante. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é caracterizar o efeito do teor de cimento na microestrutura do concreto e suas conseqüências nos danos causados por choque térmico. Os resultados obtidos indicam que concretos com valores intermediários de cimento possuem melhor desempenho em relação ao choque térmico, nas temperaturas de uso das panelas. Dessa forma, o controle do teor de cimento possibilita aumentar a resistência ao dano por choque térmico e, consequentemente, a vida útil do revestimento.

concreto refratário; espinélio; choque térmico; CA6


Spinel containing aluminous refractory castables are currently used in steel ladle due to their high corrosion resistance. Besides this property, these materials have to withstand sudden temperature variations caused by thermal cycling, which could be one of the main causes for shortening the lining's working life. Within this context, the thermal shock damage resistance analysis becomes a fundamental variable for the correct refractory selection. This property can be improved by toughening mechanisms, such as the presence of CA6, associated to calcium aluminate cement in the castable composition. Therefore, the objective of this work is to characterize the cement content effect in the microstructure of in-situ spinel formation castable and its consequences on damage due to thermal shock. The attained results indicated that castables with intermediate cement contents have better thermal shock performance within the range of the ladles' working temperatures. By controlling the amount of cement added to the composition it is possible to increase the thermal shock damage resistance and, therefore, increase the castable working life.

refractory castables; spinel; thermal shock; CA6


Teor de cimento e seus efeitos sobre a resistência ao choque térmico de concretos espinelizados in-situ

Cement content and the thermal shock performance of in-situ spinel formation in refractory castables

G. B. CintraI; M. A. L. BraulioI; L. R. M. BittencourtII; V. C. PandolfelliI

IGrupo de Engenharia de Microestrutura de Materiais - GEMM, Departamento de Engenharia de Materiais DEMa, Universidade Federal de S. Carlos - UFSCar, Rod. Washington Luiz, km 235, C.P. 676, S. Carlos, SP, 13565-905 vicpando@power.ufscar.br

IIMagnesita S.A., Centro de Pesquisas e Desenvolvimento - CPqD, Praça Louis Ensch 240, Contagem, MG

RESUMO

Concretos refratários aluminosos contendo espinélio são amplamente utilizados como revestimentos de panelas siderúrgicas, devido a sua elevada resistência à corrosão. Além do bom desempenho anti-corrosivo, estes materiais devem suportar as variações bruscas de temperatura causadas pela ciclagem térmica, responsáveis pela diminuição da vida útil do revestimento. Neste contexto, a análise da resistência ao dano por choque térmico se torna parâmetro fundamental para a correta seleção do revestimento refratário. Esta propriedade pode ser melhorada por meio da incorporação de mecanismos de tenacificação à estrutura do concreto. Uma fase que auxilia na tenacificação do material é o CA6, que está associada ao cimento de aluminato de cálcio (CAC), matéria-prima usada como ligante. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é caracterizar o efeito do teor de cimento na microestrutura do concreto e suas conseqüências nos danos causados por choque térmico. Os resultados obtidos indicam que concretos com valores intermediários de cimento possuem melhor desempenho em relação ao choque térmico, nas temperaturas de uso das panelas. Dessa forma, o controle do teor de cimento possibilita aumentar a resistência ao dano por choque térmico e, consequentemente, a vida útil do revestimento.

Palavras-chave: concreto refratário, espinélio, choque térmico, CA6.

ABSTRACT

Spinel containing aluminous refractory castables are currently used in steel ladle due to their high corrosion resistance. Besides this property, these materials have to withstand sudden temperature variations caused by thermal cycling, which could be one of the main causes for shortening the lining's working life. Within this context, the thermal shock damage resistance analysis becomes a fundamental variable for the correct refractory selection. This property can be improved by toughening mechanisms, such as the presence of CA6, associated to calcium aluminate cement in the castable composition. Therefore, the objective of this work is to characterize the cement content effect in the microstructure of in-situ spinel formation castable and its consequences on damage due to thermal shock. The attained results indicated that castables with intermediate cement contents have better thermal shock performance within the range of the ladles' working temperatures. By controlling the amount of cement added to the composition it is possible to increase the thermal shock damage resistance and, therefore, increase the castable working life.

Keywords: refractory castables, spinel, thermal shock, CA6.

INTRODUÇÃO

Panelas siderúrgicas utilizadas no refino secundário do aço apresentam um ambiente operacional extremamente severo, sendo necessário o uso de revestimentos refratários com capacidade de suportar elevadas temperaturas, escórias agressivas e longos tempos de residência [1, 2]. Concretos aluminosos contendo espinélio são comumente usados para tal finalidade, uma vez que a incorporação desta fase aumenta significativamente a resistência à corrosão, contribuindo para a diminuição do desgaste no revestimento [3].

Além de resistir à corrosão, esses refratários devem suportar também as tensões termomecânicas decorrentes da ciclagem térmica e do gradiente térmico gerado pela diferença de temperatura entre a face quente e a face fria [4]. Estas tensões promovem a formação de trincas que aumentam a penetração do metal líquido, diminuindo a vida útil do revestimento. Estudos mostram que o dano por choque térmico pode comprometer o bom desempenho obtido pela incorporação do espinélio, tornando-se fator determinante no tempo de vida útil dos revestimentos [5].

A deterioração no material causada pelo choque térmico pode ser minimizada por meio de mecanismos que dificultem a propagação das trincas geradas pelas tensões termomecânicas. Os principais mecanismos utilizados em refratários são: adição de agregados, geração de microtrincas, aumento da porosidade e incorporação de fases com formato de agulhas (whiskers). Uma fase cristalina comumente utilizada para tal propósito é o CA6 (hexa-aluminato de cálcio), por possuir elevada refratariedade e, normalmente, na presença de fase líquida, apresentar-se na forma de agulha (cristais alongados e aciculares), o que é favorável ao aumento da resistência ao dano por choque térmico. Adicionalmente, a formação in situ do CA6 pode gerar microtrincamento na estrutura, aumentando a energia de fratura do concreto, e com isso, reduzir o dano provocado pela trinca. Em contrapartida, o CaO reage com a microssílica e com a alumina, originando fases de baixo ponto de fusão, que aumentam a quantidade de fase líquida do sistema e diminuem a refratariedade.

O CaO é incorporado ao sistema pelo uso do cimento de aluminato de cálcio (CAC), principal ligante usado em concretos espinelizados. A quantidade de CaO presente no sistema, bem como a temperatura de sinterização, influenciam diretamente na formação do CA6. Portanto, o teor de ligante (CAC) adicionado ao sistema será determinante na microestrutura final do concreto e, consequentemente, no seu desempenho frente ao choque térmico.

Deste modo, o objetivo deste trabalho é avaliar a influência das variações microestruturais causadas pelo teor de cimento, em concretos aluminosos com espinelização in situ, e seus efeitos sobre a resistência ao dano por choque térmico. Foram analisados três teores distintos de cimento (2, 4 e 6%-p), em três temperaturas de queima (1150, 1300 e 1500 ºC). Adicionalmente, estabeleceu-se uma correlação entre microestrutura e o dano sofrido, por meio de microscopia eletrônica de varredura e de medidas das propriedades mecânicas, enquanto a resistência ao choque térmico foi avaliada por meio da medida da variação do módulo elástico e da resistência mecânica, em função dos ciclos de choque térmico.

Mecanismos de tenacificação associados ao CA6

O CA6 é uma fase formada em temperaturas superiores à aproximadamente 1400 ºC, pela reação entre o CaO e a Al2O3 presentes na matriz, agregando excelentes benefícios termomecânicos ao concreto, decorrentes da morfologia alongada e da alta refratariedade apresentada por esta fase (Fig. 1). O formato acicular favorece o ancoramento, melhorando o desempenho das propriedades a quente, como a resistência mecânica e a fluência [6]. As agulhas também tenacificam o material, por meio da deflexão de trincas e pelo mecanismo conhecido como "crack bridging" [7]. Nestes mecanismos, a energia de propagação da trinca é consumida, diminuindo o caminho percorrido pela mesma, e consequentemente, o dano por choque térmico.


Outro beneficio associado ao CA6 é o microtrincamento decorrente da expansão volumétrica apresentada por esta fase durante a sua reação de formação, gerando tensões na estrutura do concreto que podem originar trincas e aumentar a porosidade. Estudos da literatura indicam que microtrincas podem ser benéficas, uma vez que aumentam a energia de fratura dos materiais dificultando a propagação de trincas e reduzindo o dano sofrido por choque térmico [8].

Além de influenciar no microtrincamento e na quantidade de CA6, o teor de cimento pode afetar a quantidade de fase líquida formada pela reação do CaO com a alumina e com a microssílica. Em altas temperaturas, fases com baixa viscosidade aumentam a resistência à propagação de trincas, uma vez que reduzem a tensão termomecânica gerada, por meio do aumento do raio de curvatura da ponta da trinca e melhor acomodação das tensões, diminuindo assim a energia elástica armazenada. Além disso, podem dificultar a propagação de trincas por meio de "crack bridging". Porém, em temperaturas abaixo às de transição vítrea, estas fases pode ter efeito contrário, aumentando a fragilidade do material, e reduzindo os efeitos dos mecanismos de tenacificação.

MATERIAIS E MÉTODOS

Materiais

A fim de estudar o efeito do cimento de aluminato de cálcio (CAC) sobre as propriedades termomecânicas dos concretos espinelizados in-situ, foram preparados concretos aluminosos contendo magnésia, com três teores distintos de cimento: 2, 4 e 6% em peso (Secar 71, Kerneos, França).

Foram utilizadas aluminas tabulares (dmax< 6mm) como agregados dos concretos preparados (Almatis, EUA). A matriz foi projetada com o uso de sínter de magnésia (dmax< 45µm e 95% de MgO, Magnesita S.A., Brasil), alumina reativa CL370 (Almatis, EUA) e microssílica 971U (Elkem, Materials, Noruega). O sistema foi projetado para obtenção de um total de 21%-p de espinélio. Como dispersante foi usado 0,2%-p de um éter-policarboxilato (Bayer, Alemanha).

Formulações com coeficientes de empacotamento q = 0,26 foram projetadas pelo modelo de Alfred por meio de um programa desenvolvido em parceria entre o grupo de pesquisa GEMM/DEMa/UFSCar e a Alcoa Alumínio S.A.. Os concretos foram elaborados com teores de água que promovam fluidez mínima inicial sobre vibração de 80%, garantindo moldagem adequada.

Os concretos foram moldados na forma de barras de secção retangular com dimensões aproximadas 150 mm x 25 mm x 25 mm, curados em ambiente saturado por vapor de água por 24 h, calcinados a 600 ºC e sinterizados por 5 h de patamar em três temperaturas: 1150 ºC, 1300 ºC e 1500 ºC.

Para caracterizar o dano por choque térmico nestes concretos, mediu-se: a porosidade aparente, a variação linear dimensional (VLD), resistência mecânica, módulo elástico e a variação das propriedades mecânicas em função dos ciclos de choque térmico. Adicionalmente, foram obtidas imagens de microscopia eletrônica de varredura (MEV) e foram analisadas as fases formadas em função da temperatura de queima por meio da difração de raios X quantitativa.

Medida das propriedades físicas

A porosidade aparente foi medida utilizando-se o método de Arquimedes, onde os corpos de prova são imersos em querosene em ambiente de vácuo durante uma hora. A porosidade aparente foi calculada a partir dos valores de peso úmido, peso imerso e peso a seco, por meio da seguinte equação:

O cálculo da variação linear dimensional (VLD) é realizado utilizando-se a medida do comprimento inicial da barra antes da sinterização (Li) e do comprimento final da amostra após sinterização (Lf), conforme a equação abaixo:

Para os concretos deste estudo, a medida de VLD é um indicativo da expansão residual do concreto após a queima, podendo ser associada com o desenvolvimento de fases em altas temperaturas, uma vez que transformações polimórficas não são previstas [9].

Para analisar a morfologia das fases formadas em altas temperaturas, foram obtidas imagens da microestrutura dos concretos por meio de microscopia eletrônica de varredura para amostras sinterizadas a 1500 ºC. Adicionalmente, a difração de raios X foi utilizada para determinar as fases e suas respectivas quantidades com um equipamento Siemens D5005 e o programa TOPAS (Bruker-AXS, Alemanha), baseado no método de Rietveld, para análise quantitativa.

Ensaio de choque térmico e medida das propriedades mecânicas

Para avaliar o dano por choque térmico, foi utilizado o método de ciclos múltiplos (fadiga térmica), no qual os corpos de prova são submetidos a diversos ciclos de aquecimento e resfriamento bruscos, mantendo a diferença de temperatura fixa em valores superiores aos necessários para nuclear trincas (ΔTensaio> ΔTc) [10]. A degradação provocada pela propagação destas trincas é monitorada pela medida das variações nas propriedades mecânicas, tornando possível a classificação dos concretos de acordo com o dano sofrido, e com isso, selecionar os materiais mais resistentes ao choque térmico.

No presente trabalho, estipulou-se como sendo um ciclo completo o processo de aquecer e resfriar o corpo de prova. Cada amostra foi inserida em um forno previamente aquecido com temperatura fixa de 1025 ºC, permanecendo por um intervalo de 15 min. Posteriormente, foram rapidamente retiradas do forno e resfriadas em temperatura ambiente, caracterizando um ΔT aproximado de 1000 ºC.

A avaliação da degradação do módulo elástico e da resistência mecânica em função dos ciclos de choque térmico foi efetuada na seguinte seqüência: a) medida da resistência mecânica e do módulo elástico antes do ensaio de choque térmico; b) 10 ciclos de choque térmico por amostra, sendo que a cada 2 ciclos foi feita a medida do módulo elástico; c) ao final de 10 ciclos, foi medida a resistência mecânica residual das amostras. Desta forma, foi obtido o valor de módulo elástico para os ciclos 0, 2, 4, 6, 8 e 10, e os valores da resistência mecânica sem choque térmico e após 10 ciclos. O módulo elástico foi obtido pelo método de ressonância de barras. A partir das freqüências de ressonância obtidas e conhecendo a densidade do material, calcula-se o valor do módulo elástico E, do módulo de cisalhamento G e do coeficiente de Poisson. Por ser um ensaio de natureza não destrutiva é possível acompanhar a queda do módulo elástico de uma mesma amostra em função dos números de ciclos de choque térmico [11]. Devido à relação linear entre módulo elástico e resistência mecânica já observada pelos autores [12], espera-se que o comportamento apresentado pelas curvas de módulo elástico em função do número de ciclos possa também representar a variação da resistência mecânica.

As medidas de resistência mecânica foram realizadas por meio do ensaio de flexão 3 pontos (MTS Systems Corp., modelo 810, EUA). A taxa de aplicação de carga foi de 24,9 N/s e o módulo de ruptura obtido conforme a equação:

onde, P é a força aplicada no instante da fratura, L é a distância entre os apoios, B e H são, respectivamente, largura e altura da barra, e X é o fator de correção e corresponde à distância entre a posição onde ocorreu a fratura e o centro da barra.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Primeiramente, foi analisado o efeito do teor de cimento sobre a formação de fases em temperaturas elevadas. Os resultados obtidos por meio de difração de raios X mostram a variação das fases em função da temperatura de queima, para concretos com 3 quantidades distintas de CAC (Tabela I).

A quantidade de fases associadas ao CaO, como o CA2 e o CA6, é maior com o aumento do teor de cimento (CAC). Pela Tabela I, observa-se que o CA2 só foi detectado nas composições 6%-p com temperatura de queima 1300 ºC, sendo posteriormente consumido em temperaturas mais elevadas pela reação com a alumina excedente presente na matriz, originando o CA6. No caso dos concretos com 4%-p, não foi detectada a presença de CA2 e a quantidade de CA6 formada foi menor. Para os concretos 2%-p, nenhuma destas duas fases mostrou-se presente. Este resultado pode ser visualizado na Fig. 2, onde a presença de agulhas de CA6 é vista somente nos concretos contendo 4 e 6%-p de CAC.


A formação destas fases afeta as propriedades mecânicas do refratário. Os resultados de VLD mostram que quanto maior o teor de CAC, maior é a expansão residual após a queima (Fig. 3). Isto ocorre devido ao caráter expansivo da formação in-situ do espinélio (1150 ºC para 1300 ºC) e do CA6 (1300 ºC para 1500 ºC).


Além de aumentar a expansão residual, a formação de CA6 gera microtrincamento, contribuindo para o aumento da porosidade, e consequentemente, para a diminuição da resistência mecânica e do módulo elástico. A Tabela II mostra que a porosidade aparente cresce com o aumento do teor de cimento, enquanto a resistência mecânica e o módulo elástico são maiores para os concretos contendo menores teores de CAC.

A relação entre o aumento do teor de CAC e de microtrincamento é confirmada pela Fig. 4. Nota-se que os concretos com menores teores de cimento possuem estruturas mais densas, indicando maior acomodação das fases. Além disso, observam-se grãos grosseiros de alumina fraturados nos concretos com 6%, decorrentes da formação de agulhas de CA6 no interior dos agregados.


As Figs. 4, 5 e 6 apresentam a degradação do módulo elástico em função do número de ciclos de choque térmico e temperatura de queima, enquanto a Fig. 7 indica a resistência mecânica antes e após 10 ciclos de choque térmico, para três temperaturas de queima distintas: 1150 ºC, 1300 ºC e 1500 ºC. Todas as curvas de módulo elástico apresentaram comportamento semelhante, no qual a queda mais intensa ocorre nos primeiros ciclos, seguido pela estabilização dos valores após o quarto ciclo.




A 1150 ºC a degradação causada pelo choque térmico foi ligeiramente maior para os concretos contendo menos cimento. Os valores de módulo elástico, resistência mecânica, porosidade, VLD e percentual de CA2 e CA6 apresentaram pouca variação em função da composição (do teor de CAC). Desta forma, a pequena vantagem mostrada pelo concreto com 6% de CAC pode estar associada a algumas fases do cimento, não identificadas pela difração de raios X (como o CA e o CA2), devido à baixa quantidade.

Aumentando a temperatura de queima para 1300 ºC, nota-se um desempenho superior do concreto contendo 6%, comparado aos demais. Esta composição obteve a menor redução de módulo elástico e o maior valor de resistência mecânica residual após 10 ciclos de choque térmico. Novamente, os resultados de resistência mecânica, módulo elástico, VLD e porosidade possuem valores semelhantes para as 3 composições. No entanto, a difração de raios X revela que o concreto com 6% de CAC contem 4% em peso de CA2, enquanto nos outros concretos esta fase não foi encontrada. O CA2 é uma fase formada a partir do CaO e pode ser a responsável por este desempenho superior.

A 1500 ºC, verificam-se os resultados mais relevantes, uma vez que esta temperatura se aproxima daquela de uso das panelas siderúrgicas. Dentre as composições testadas, o concreto com valor intermediário de CAC (4% em peso) obteve a menor degradação, apresentando a menor queda percentual de módulo elástico e o maior valor final de resistência mecânica.

A composição contendo 2%-p CAC foi muito danificada pelo choque térmico, apresentando a maior queda percentual de módulo elástico dentre as composições testadas, e um baixo valor final de resistência mecânica. Este resultado pode estar relacionado com a elevada densificação apresentada por estes materiais (ver Tabela II e Fig. 4), contribuindo para o aumento da energia elástica armazenada, e também pela ausência de CA6 (não detectado pela análise de raios X), reduzindo os mecanismos de tenacificação presentes na microestrutura, o que o torna mais susceptível à propagação de trincas.

O desempenho dos concretos com 6%-p CAC piorou consideravelmente quando se aumentou a temperatura de queima de 1300 ºC para 1500 ºC. Este fato pode estar associado ao microtrincamento excessivo decorrente da formação de CA6in-situ, gerando coalescência das trincas (agrupamento de microtrincas formando trincas maiores em um menor número), agravando a degradação sofrida. O efeito deletério do microtrincamento excessivo sobrepõe os possíveis benefícios de tenacificação associados ao CA6, presente em grande quantidade nestes concretos.

Dessa forma, o melhor desempenho apresentado pelos concretos com valor intermediário de cimento (4%-p) está relacionado à quantidade de CA6 gerada, de modo a incorporar suas vantagens de tenacificação, aumentando assim a resistência ao choque térmico (comparado ao 2%-p) e minimizando as desvantagens associadas ao microtrincamento excessivo, encontrada nos concretos com grande quantidade de CA6 (6%-p).

CONCLUSÕES

O presente trabalho apresentou o efeito do teor de cimento usado em concretos espinelizados sobre a formação de fases em altas temperaturas e suas conseqüências sobre a resistência ao choque térmico. O desempenho destes concretos frente ao choque térmico foi avaliado em laboratório por meio da medida da variação do módulo elástico e da resistência mecânica. Observou-se que em temperaturas entre 1150 ºC e 1300 ºC, a resistência ao choque térmico é influenciada por fases secundárias do cimento, como o CA2. Apesar de estas fases gerarem poucas alterações nas propriedades mecânicas, a degradação sofrida é significativamente influenciada. Este fato pode estar relacionado à morfologia das fases geradas. Já a 1500 ºC, o desempenho dos concretos foi correlacionado com a quantidade de CA6 e de microtrincas. Observou-se que o concreto com teor intermediário de cimento, apresentou a menor degradação por choque térmico, associado a valores intermediários de CA6 e microtrincas. O desempenho inferior dos concretos com mais CAC pode estar relacionado ao microtrincamento excessivo, gerando coalescência de trincas, enquanto para os concretos com menores teores de cimento, a principal fonte de degradação pode estar relacionada à ausência de mecanismos de tenacificação.

Dessa forma, o teor de cimento influencia a degradação por choque térmico, alterando significativamente os mecanismos de tenacificação presentes (CA6 e microtrincas). O controle deste parâmetro pode contribuir para a melhoria do desempenho de concretos espinelizados utilizados nas panelas, aumentando a vida útil do revestimento.

AGRADECIMENTOS

Ao suporte financeiro e técnico fornecido por CNPq, FAPESP e Magnesita S. A.. À contribuição dada por Douglas H. Milanez, Eric Y. Sako e Felipe R. Semeghin.

(Rec. 05/12/2007, Rev. 12/02/2008, Ac. 02/06/2008)

  • [1] M. Fuhrer, A. Hey, W. E. Lee, J. Eur. Ceram. Soc. 18 (1998) 813.
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  • [3] S. Mukhopadhyay, P. K. Das Poddar, Ceram. Int. 30 (2004) 369.
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  • [5] M. A. Quintela, F. D. Santos, C. A. Pessoa, J. A. Rodrigues, V. C. Pandolfelli, Proc. Unified Int. Tech. Conf. Refractories, UNITECR'05, Orlando, EUA (2005) 380.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Fev 2009
  • Data do Fascículo
    Dez 2008

Histórico

  • Aceito
    02 Jun 2008
  • Revisado
    12 Fev 2008
  • Recebido
    05 Dez 2007
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