Resumo
Este ensaio objetiva perscrutar o filme Eu, Daniel Blake, tendo como foco o tratamento do diretor Ken Loach acerca da particularidade do trabalho assalariado e da burocracia do Estado no capitalismo contemporâneo, apoiados na estética oferecida por Lukács, o qual aponta ser a particularidade a questão central que envolve o processo de criação artística e a qual tomamos como ponto de partida para realizar uma análise fílmica materialista. Apontamos que o tratamento dado às categorias tem em sua gênese a tomada de partido por parte do diretor, uma vez que as aborda de maneira crítica e comprometida com a realidade, delineando, assim, o seu potencial reflexivo. Logo, ao retratar uma realidade singular vivida por um trabalhador britânico submetido a uma condição socioeconômica superestrutural que tem no regime do capital o elemento universal, a forma como a particularidade é retratada permite transcender a obra, que se constitui em uma síntese capaz de refletir a condição de exploração e estranhamento das mediações sobre as quais estão submetidos os trabalhadores em várias partes do mundo, bem como o papel do Estado. Concluímos que a estética materialista mostra-se um meio robusto e denso, que pode contribuir com as investigações da sociabilidade contemporânea.
Palavras-chave:
Estética; Particularidade; Trabalho; Estado; Cinema
Resumen
Este ensayo tiene como objetivo escrutar la película Yo, Daniel Blake, teniendo como foco el trato del director Ken Loach hacia la particularidad del trabajo asalariado y la burocracia del Estado en el capitalismo contemporáneo, apoyados en el trato dado a la estética por Lukács, quien indica que la particularidad es la cuestión central que envuelve el proceso de creación artística y la que tomamos como punto de partida para realizar un análisis fílmico materialista. Señalamos que el tratamiento dado a las categorías tiene en su génesis la toma de partido del director en su abordaje crítico y comprometido con la realidad, delineando así su potencial reflexivo. Al retratar una realidad singular vivida por un trabajador británico sometido a una condición socioeconómica superestructural que tiene en el régimen del capital el elemento universal, la forma como la particularidad es retratada permite trascender la obra, que se constituye en una síntesis capaz de reflejar la condición de explotación y extrañamiento de las mediaciones a las que están sometidos los trabajadores en varias partes del mundo, así como el papel del Estado. Concluimos que la estética materialista demuestra ser un medio robusto y denso que puede contribuir a las investigaciones acerca de la sociabilidad contemporánea.
Palabras clave:
Estética; Particularidad; Trabajo; Estado; Cine
Abstract
This essay aims to examine the film I, Daniel Blake, focusing on the treatment of director Ken Loach for the particularity of wage labor and the state bureaucracy in contemporary capitalism, supported by the treatment given to aesthetics by Lukács, which points out that the particularity is the central issue that involves the process of artistic creation and which we take as the starting point for a materialistic filmic analysis. We point out that the treatment given to categories has, in its genesis, the taking of the role of the director in approaching in a critical and committed way with reality, thus delineating his reflective potential. In portraying a singular reality experienced by a British worker subjected to a super-structural socioeconomic condition that has the universal element in the capital system, the way the particularity is portrayed allows transcending the work, which is a synthesis capable of reflecting the condition of exploitation and estrangement of the mediations on which workers are subjected in various parts of the world, as well as the role of the State. We conclude that materialist aesthetics is a robust and dense medium that can contribute to the research on contemporary sociability.
Keywords:
Aesthetics; Particularity; Labor; State; Cinema
INTRODUÇÃO
Para além da empoeirada discussão acerca da oposição entre distração (massas) e recolhimento (amantes da arte), o cinema consolidou-se como a arte mais popular do nosso tempo (REIS, 2015REIS, R. R. Ideologia e educação estética. Revista Crítica Marxista, n. 41, p. 105-122, 2015. ). É seguro afirmar que a arte cinematográfica alcançou um espaço importante entre as formas de representação artística. Se, por um lado, pode ser tido apenas como entretenimento; por outro, pode ser fonte de reflexões sobre a realidade. Como declarou o renomado e polêmico diretor francês Jean-Luc Godard, o cinema seria a verdade a 24 quadros por segundo. Esta declaração expressa o potencial da sétima arte como revelação das manifestações humanas ao representar as vivências e as experiências da realidade social. Concordamos com Godard, além de Lukács (1967LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 4. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1967., 2012LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.), que defende que o cinema pode se formar a partir de espelhamentos refletidos da realidade em si, tal como ela é.
Têm-se despontado no campo da administração estudos que tratam de produções artísticas (FERRAZ, MOURA-PAULA, BIONDINI et al., 2017FERRAZ, D. L. S. et al. Ideologia, subjetividade e afetividade nas relações de trabalho: análise do filme ‘Que horas ela volta?’. Revista Brasileira de Estudos Organizacionais, v. 4, n. 1, p. 252-278, 2017. ; MORAES, GOMES e HELAL, 2016MORAES, A.F.G.; GOMES, D.C.; HELAL, D.H. Brazilian Jeitinho and Culture: an analysis of the films Elite Squad 1 and 2. RAM, v. 17, n. 3, p. 84-104, 2016.). Xavier e Carrieri (2014XAVIER, W. S.; CARRIERI, A. P. Concepções de uma estética materialista para uma arte transformadora: a superação do caráter abstrato na particularidade do trabalho artístico. Cadernos EBAPE.BR, v. 12, n. 3, p. 590-604, 2014. ) indicam que, diante do crescimento desses estudos, é igualmente importante pensar o lugar dado ao objeto artístico e fugir das análises abstratas e subjetivistas. Isto porque, ao considerar as elaborações artísticas parte de uma superestrutura que é condicionada e condiciona a infraestrutura produtiva capitalista, um objeto artístico não tem um caráter neutro; assim, não pode ser desprendido das condições socioeconômicas objetivas que o engendram; ao contrário, quando se ignoram as relações materiais que condicionam a vida humana, as contradições que regem a sociabilidade hodierna ficam opacas. Assim, Toledo, Lima e Carrieri (2016TOLEDO, D. A. C; LIMA, O.; CARRIERI, A. P. Aesthetics and commodity-labor: Analysis of the lukacsian aesthetic properties in business magazines. RAUSP, v. 51, n. 2, p. 137-150, 2016.) ratificam a ausência de análises estéticas materialistas nos estudos organizacionais.
Nesse caso, nosso objetivo consiste em tecer, tendo como base a estética lukacsiana, uma análise fílmica materialista da película Eu, Daniel Blake (I,Daniel BlakeI, DANIEL Blake. Direção: Ken Loach. Produção: Rebecca O’Brien. Reino Unido: Wild Bunch, Why Not Productions, BBC Films, 2016. 1 DVD (100 min), widescreen, son. color. ), focando o tratamento do diretor Ken Loach acerca da particularidade do trabalho assalariado1 1 O trabalho assalariado pode ser caracterizado pela venda da força de trabalho, uma vez que o trabalhador não detém os meios de produção e se vê impelido(a) a ter de laborar para sobreviver. e da burocracia do Estado no capitalismo contemporâneo, especialmente na forma como a obra reflete essas categorias. Para Reis (2015REIS, R. R. Ideologia e educação estética. Revista Crítica Marxista, n. 41, p. 105-122, 2015. , p. 106), “[...] uma crítica ontológica do cinema significa tentar entender de que modo os interesses da classe hegemônica ajustam a formação estético-cultural da sociedade aos seus próprios objetivos de controle social”. Assim, o estudo de tais categorias cumpre papel relevante nos estudos organizacionais, na medida em que buscamos avançar na crítica à maneira hegemônica com que é tratada a questão da burocracia, questionando, também, a neutralidade do Estado. A respeito da estética artística, nossa reflexão contribui para suprir a lacuna existente neste campo, como apontada anteriormente, em razão de a arte contemporânea e de outras formas de representação subjetivistas que apartam forma e conteúdo atribuírem um caráter irracional ao trabalho artístico. Ademais, as manifestações artísticas são dotadas de grande potencial formativo, de modo que a análise fílmica materialista pode contribuir com a ampliação das investigações científicas na Administração.
Nosso percurso investigativo apoia-se no tratamento dado à estética por Lukács (1966LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 1. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1966., 1967LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 4. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1967., 1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.). Partimos dos seus pressupostos analíticos e os utilizamos como forma de crítica do filme, conforme expõe Cotrim (2013COTRIM, L. Apresentação de “Lukács e o Cinema”. In: CHAGAS, R. (Org.). Cinema, Educação e Arte. Boa Vista: Editora da UFRR, 2013., p. 48): “[...] pressuposto de toda análise lukacsiana de maturidade: o de que há obras de arte, de sorte que a análise deve partir da própria obra.” Ela prossegue: “Isso significa, de uma parte, não tomar a apreciação subjetiva como ponto de partida para a apreensão da obra e, de outra, reconhecer que a essência do estético não é ‘algo originário e unitário desde o primeiro momento” (COTRIM, 2013COTRIM, L. Apresentação de “Lukács e o Cinema”. In: CHAGAS, R. (Org.). Cinema, Educação e Arte. Boa Vista: Editora da UFRR, 2013., p. 48).
Lukács explica que a reflexão sobre a estética possui dois momentos: o de apreensão dos princípios filosóficos estéticos gerais e o de tratamento a formas específicas que se manifestam, como a música, a literatura, a pintura e o filme. Ao partir de cada objetivo, em sua peculiaridade, surgem as novas categorias. Assim, Lukács (1978) LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.aponta ser a particularidade a questão central que envolve o processo de criação estética. O autor indica doze importantes conexões para debatê-la: 1) a caracterização mais geral da forma artística; 2) maneira e estilo; 3) técnica e forma; 4) a subjetividade estética e a categoria de particularidade; 5) originalidade artística e reflexo da realidade; 6) partidarismo; 7) essência e fenômeno; 8) duração e transitoriedade; 9) individualidade da obra e particularidade; 10) o típico: problemas de conteúdo; 11) problemas de forma; 12) arte como autoconsciência da humanidade. Contudo ressaltamos que tais conexões não se estabelecem como um método estático para análise, trata-se de sugestões de conexões e que podem não se esgotar em si mesmas e nem mesmo possuírem hierarquia e complementaridade (LUKÁCS, 1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.). Portanto optamos por partir das peculiaridades das conexões para construir uma única análise.
Ressaltamos que esse filme apresenta um diferencial em relação à orientação da indústria cinematográfica hegemônica, uma vez que aborda temas do cotidiano com uma postura de denúncia e de crítica ao sistema econômico e à condição humana. Reis (2005, p. 110, grifos do autor) aponta que “[...] há que se considerar criteriosamente no contexto da disputa ideológica que há tempos vem sendo travada na área cinematográfica, o caráter daquilo que está sendo apreendido e tipificado como resistência, oposição ou recusa etc.” Tais características lhe renderam prêmios (Palma de Ouro no Festival de Cannes) e reconhecimento perante a crítica especializada.
Neste artigo, após uma breve explanação acerca da estética, discutimos a centralidade da particularidade na estética de Lukács, buscando confrontar o nosso objeto com as categorias da filosofia da arte lukacsiana. Posteriormente, realizamos a análise do filme e as considerações finais.
Noções de Estética e Arte
Lukács (1966LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 1. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1966.) concebe a estética, mais especificamente a arte, como um modo peculiar de manifestação do reflexo da realidade, um modo entre tantos outros que existem e que são resultado das relações entre o ser humano e a realidade. Vale ressaltar que a formação dos cinco sentidos, isto é, da sensibilidade humana, é “[...] um trabalho de toda a história do mundo até aqui”, como elucida Marx (2004MARX, K. Manuscritos Econômico-filosóficos. São Paulo: Boitempo , 2004., p. 110). Assim, a percepção estética está vinculada à produção da vida em sua objetividade e subjetividade, sobretudo quando a forma desloca-se de sua atividade cotidiana para se tornar apenas um meio de auto percepção do gênero humano - ou da generidade humana -, conforme a terminologia marxiana. Em Lukács (1966LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978., p. 24), a arte é entendida como um fenômeno social, pois: “Del mismo modo que el trabajo, que la ciencia y que todas las actividades sociales del hombre, el arte es un producto de la evolución social, del hombre que se hace hombre mediante su trabajo”. Segundo Cotrim (2013COTRIM, L. Apresentação de “Lukács e o Cinema”. In: CHAGAS, R. (Org.). Cinema, Educação e Arte. Boa Vista: Editora da UFRR, 2013., p. 49), “[...] para Lukács a arte é uma forma de apropriação do mundo pelos homens, por isso mimética, forma sócio historicamente desenvolvida, cuja peculiaridade, responde a necessidades humanas diferentes das que outras formas de apropriação do mundo buscam satisfazer”.
Acerca da formação da sensibilidade, Marx (2011MARX, K. Grundrisse. São Paulo: Boitempo, 2011., p. 62-63) dilucida que:
[...] no domínio da própria arte, certas formas significativas da arte só são possíveis em um estágio pouco desenvolvido do desenvolvimento artístico. Se esse é o caso na relação dos diferentes gêneros artísticos no domínio da arte, não surpreende que seja também o caso na relação do domínio da arte como um todo com o desenvolvimento geral da sociedade.
Marx (2011MARX, K. Grundrisse. São Paulo: Boitempo, 2011.) usa a arte grega para explicar o fato de que, ainda que vivamos em condições de reprodução de vida tão distintas dos idos em que o mundo era explicado com base nos deuses mitológicos, nos tempos presentes (ele refere-se ao século XIX), continua-se a tomar aquela forma artística como o belo. Mesmo que se entenda que uma obra como a Odisseia não poderia ser produzida nas condições atuais, o arrebatamento decorrente de sua fruição se mantém, pois “[...] o encanto de sua arte, para nós, não está em contradição com o estágio social não desenvolvido em que cresceu. Ao contrário, é seu resultado e está indissoluvelmente ligado ao fato de que as condições sociais imaturas sob as quais nasceu, e somente das quais poderia nascer, não podem retornar jamais” (MARX, 2011MARX, K. Grundrisse. São Paulo: Boitempo, 2011., p. 64).
O belo tem relação com o fato de a história da arte representar o próprio engendramento da generidade humana. Nesse caso, ainda que as condições socio-históricas da produção da arte grega não existam mais, esta continua despertando os sentidos, pois reflete as condições que abriram espaço para o desenvolvimento das complexidades das próprias relações humanas. Assim, embora a particularidade da época tenha se encerrado, procurar no complexo mais desenvolvido similitudes - que são reais, mesmo que não deem conta da totalidade - com o menos desenvolvido permite a produção de uma identidade explicativa que corresponde, por exemplo, a uma angústia humana desde aqueles tempos: de onde viemos e para onde vamos. A arte grega, portanto, ainda nos é cara tanto pelas condições socio-históricas sob as quais foi construída, como também pelo fato de representar a infância da humanidade (MARX, 2011MARX, K. Grundrisse. São Paulo: Boitempo, 2011.). Vale ressaltar que não há necessariamente uma correspondência entre o grau de desenvolvimento das forças produtivas e das manifestações artísticas. Ou seja, a universalidade não se vincula a uma possível transcendência dos indivíduos, mas sim à historicidade de um tempo da humanidade em que as explicações das coisas do mundo decorriam da imaginação e da criatividade e não da ciência.
Com base nas colocações estéticas de Marx e de Lukács, refletimos que a apreciação do belo está estreitamente vinculada à reprodução da vida, de maneira que, no decorrer da história, com o desenvolvimento das forças produtivas, transformam-se igualmente os sentidos humanos e, portanto, a forma de produzir, de distribuir e também de consumir arte. Reportando-nos ao período atual, cujas relações sociais são pautadas pelo capital, dá-se a contradição que envolve os instrumentos e as técnicas de trabalho, pois, se por um lado há muito mais possibilidades de criações artísticas, por outro, o estranhamento sobre o qual essas relações se dão é o solo para produção de obras identicamente reificadas.
Desde já, assumimos o cinema como uma expressão artística, concordando com o reconhecimento de Lukács (1967LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 4. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1967.) à sétima arte. O cinema, diferentemente da literatura ou da pintura, não só é reprodutível, como esta é uma condição pressuposta, ou seja, é uma forma artística cuja produção já nasce voltada para o consumo em massa.
Wellen (2016WELLEN, H. “Melancolia”, Lars von Trier e a humanidade à beira do abismo. In: WELLEN, H; WELLEN, E. Arte e Emancipação: ensaio sobre cinema. Maceió: Coletivo Veredas, 2016., p. 78) aponta outro aspecto importante: “[...] é fato que o cinema pode ser considerado a arte do diretor. É o diretor que conduz e manipula o sentido central dos filmes, estando envolvido em várias partes do seu processo de produção, desde a escolha do elenco até a edição e a montagem das cenas”. Entretanto, se um filme possui o potencial de representar a realidade, especialmente na atualidade, ele não pode ser tratado somente sob esse viés, como alerta Rosenfeld (2013ROSENFELD, A. Cinema: arte e indústria. São Paulo: Perspectiva, 2013.), pois certamente os grandes estúdios de cinema hollywoodianos não possuem, via de regra - entre seus principais estímulos para a realização de um filme -, intenções estéticas, menosprezando, por vezes, o fenômeno artístico.
Paço-Cunha (2011PAÇO-CUNHA, E. As propriedades estéticas do trabalho como emanação de sua relação com o capital. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO, 25., Rio de Janeiro, 2011. Anais... Rio de Janeiro; Anpad, 2011., p. 2) indica que “[...] por mediação das forças produtivas, as propriedades estéticas convertem-se também em força produtiva do capital, modo de ser do capital no seu relacionamento com o trabalho que emprega produtivamente”. Isso fica mais evidente quando analisamos a função de mercadoria que os filmes assumem. Assim, como toda mercadoria, os aspectos mercadológicos - que podem aumentar as vendas - são destacados, sobretudo para os grandes estúdios que investem o capital necessário à produção e à distribuição dos filmes. Esses estúdios “[...] não chegam, portanto, a se oporem a uma moderada dose de elementos estéticos, mas tais aspectos se subordinam a outros interesses, geralmente alheios à arte” (ROSENFELD, 2013ROSENFELD, A. Cinema: arte e indústria. São Paulo: Perspectiva, 2013., p. 35). Passemos à questão da particularidade.
Particularidade na Estética de Lukács
Lukács (1966LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 1. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1966.) sustenta a necessidade de elucidar o lugar do elemento estético dentro da totalidade das atividades humanas e dos sentimentos humanos na realidade em que está inserido. O filósofo húngaro aponta que “El comportamiento cotidiano del hombre es comienzo y final al mismo tiempo de toda actividad humana” (LUKÁCS, 1966LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 1. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1966., p. 11) e, por uma analogia, indica que a cotidianidade é como um grande rio de onde surgem formas superiores para se reproduzir a realidade e, assim, a ciência e a arte. Ambas, portanto, provêm das imposições da vida social, que, por sua vez, retorna influenciando diretamente a vida humana, novamente desembocando na corrente da vida cotidiana (LUKÁCS, 1966LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 1. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1966.). É na vida cotidiana que se manifestam as necessidades práticas do ser humano. Logo, ao se observar o resultado final de obras artísticas e científicas, faz-se necessário estudar as necessidades sociais que despertaram e ocasionaram a sua confecção. Convém ressaltar que, para o autor, essa tarefa só poderá ser realizada caso tenha como ponto de partida a gênese social e a vida humana, pois apenas a partir daí é possível obter as peculiaridades categóricas da realidade que o ser humano procura refletir nas formas artísticas e/ou científicas, sobretudo a arte com capacidade para refletir a generidade humana tem esse caráter antropomórfico e materialista.
Relacionando a reflexão estética com outras formas reflexivas realizadas pelo indivíduo, Lukács (1966LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 1. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1966.) entende que a realidade é composta por um múltiplo de determinações que se inter-relacionam. Cada fenômeno estético possui uma essência objetiva, resultado de um processo real, social e histórico, que exerce as determinações mais incisivas. Sendo assim, é impossível conceituar a estética de modo apartado de todo o composto em que ela está inserida, e é por esse motivo que ele relaciona a estética principalmente com a ciência, e também com a ética e com a religião. Igualmente a influência da análise marxiana por meio do materialismo histórico para investigar a gênese e o desenvolvimento das artes, ou seja, atentar-se aos problemas da estética com base em suas particularidades e determinações históricas.
Lukács (1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.) explica o papel central da particularidade na análise estética. Nela a arte alcança sua forma, e nela é possível verificar se o trabalho realizado pelo artista corresponde à materialidade objetiva, ao ponto/tema que se pretendeu retratar, entendendo como se dá a relação entre a expressão artística e a representação de maneira coerente com a realidade do cotidiano vivido. O particular tem ainda o potencial de revelar a relação entre determinada situação social (singular) e determinada condição produtiva (universal).
O particular, o singular e o universal partem da imediaticidade, na vida cotidiana, em constante movimento mútuo. Nesse sentido, a arte, em sua originalidade reflexiva, é reflexo objetivo desse movimento particular sintético entre o singular e o universal, cada particularidade é expressa em uma obra de arte de maneira peculiar, dado que seu campo é composto por diversas determinações presentes na objetividade. Lukács (1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978., p. 161) aponta que:
Tal como gnosiológico, o reflexo estético quer compreender, descobrir e reproduzir, com seus meios específicos, a totalidade da realidade em sua explicitada riqueza de conteúdos e formas. Modificando decisivamente [...] o processo subjetivo, ele provoca modificações qualitativas na imagem reflexa do mundo. A particularidade é sob tal forma fixada que não mais pode ser superada: sobre ela se funda o mundo formal das obras de arte. O processo pelo qual as categorias se resolvem e se transformam uma na outra sofre uma alteração: tanto a singularidade quanto a universalidade aparecem sempre superadas na particularidade.
Evidenciamos que a superação da singularidade e da universalidade na particularidade, como apontado por Lukács (1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.), não se refere à extinção destas formas, mas sim a uma síntese que conserva estes dois movimentos superando-os no movimento particular estético. É justamente a maneira como o singular e o universal objetivam-se na obra de arte que definirá o seu nível de eficácia em expressar os complexos e as mediações da vida humana, em causar interesse e identificação com quem está tendo contato. Nas palavras de Lukács (1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978., p. 164):
Quanto maior for o conhecimento que o artista tiver dos homens e do mundo, quanto mais numerosas forem as mediações que ele descobrir e (se necessário) acompanhar até a extrema universalidade, tanto mais acentuada será esta superação. Quanto maior for a sua força criadora, tanto mais sensivelmente ele retransformará as mediações descobertas numa nova imediaticidade, concentrando-as organicamente nela: ele formará um particular partindo do singular.
A grandeza de uma obra de arte, o seu real conteúdo, coloca-se em sua posição frente à realidade, conforme aponta Lukács (1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.). As escolhas de um artista são decisões tomadas dentro de uma gama de tantas outras postas na objetividade particular, na totalidade social. Uma obra de arte toma forma em torno da particularidade escolhida pelo autor, o singular e o universal serão retratados em momentos específicos, entretanto o resultado final que revela a unidade de uma obra deve estar relacionado à particularidade refletida pelo artista.
Assim, a arte é corolário da produção humana, depois que ela é realizada e colocada em sua forma final perante os demais, se constituirá em um mundo de ficção, ou seja, como uma criação que, de modo único e específico, eleva e representa esteticamente uma particularidade constituída de questões singulares e questões universais. O resultado final de uma obra de arte é uma realidade refletida, um mundo estético específico, por isso cada obra de arte pode retratar a realidade de maneiras específicas, e também por isso ela não é passível de mudança por aqueles com quem está em contato, podendo, no máximo, ser rechaçada, e aqui entra a questão do gosto, da fruição em sua individualidade. Entretanto, isso não impede, como aponta Lukács (1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.), que sejam criados critérios para mensurar a riqueza, a receptividade e a profundidade com que uma obra refletiu a realidade objetiva, o mundo. Dentre esses critérios: o ordenamento; a hierarquia dos conteúdos e das formas; a técnica utilizada; a tomada de posição do artista frente aos problemas que procurou retratar; etc. Investigaremos estes elementos a seguir, discorrendo acerca da estética na arte cinematográfica.
Estética e cinema
Lukács (1967LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 4. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1967.) parte dos princípios gerais de sua reflexão estética para tratar da arte cinematográfica. Ele aponta que cada imagem criada e retratada precisa fazer parte de uma unidade total previamente estabelecida; desse modo, um amontoado de cenas fora de série não constitui expressão estética, denotando, por suposto, a importância dos diretores cinematográfico e de fotografia. A partir deste ponto o esteta ressalta a contraposição entre o cinema e as demais artes visuais:
[...] éstas la autenticidad no se consigue sino como resultado final del proceso mimético-artístico de transformación en la refiguración de la realidad; si la dación de forma fracasa, no se obtiene absolutamente ninguna autenticidad; ésta tiene que producirse mediante principios puramente estéticos, creadoramente; tiene que confirmarse en la inmanencia de la obra de arte; mientras que la peor fotografía posee ya y no puede perder una autenticidad en el otro sentido descrito. Así se expresa claramente la profunda afinidad, cargada de consecuencias, entre la cotidianidad y el film (LUKÁCS, 1967LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 4. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1967., p. 181).
Com a proximidade entre o filme e o cotidiano, o diálogo/linguagem, a fotografia e as cenas retratadas estão relacionadas diretamente com a duração de um “tempo real”, ou seja, em permanente movimento. Porém isso aparece de forma condensada para que seja possível se retratar em um curto período de tempo a ligação entre presente, passado e futuro. Por sua proximidade com a vida - por meio da representação mimética da realidade2 2 “Toda imagen fílmica se vive como mimesis de una realidad, garantizada como tal realidad ya por el mero hecho de estar fotografiada: puesto que se la pudo fotografiar, tuvo que darse realmente, y precisamente en esa forma” (LUKÁCS, 1967, p. 199). Cotrim (2013, p. 19) menciona que a mimese estética “[...] implica antropomorfizar a imagem fotográfica, aproximá-la das ‘formas aparências do cotidiano’, com o que se cria o meio homogêneo, a ‘linguagem’ artística do filme”, pelo desenvolvimento e aprimoramento de equipamentos e técnicas. -, o filme traz uma tendência para reproduzi-la a partir das múltiplas mediações que circundam o ser humano, a natureza, todo o ambiente social, em sua cotidianidade. Tal engendramento culmina como o determinante último do reflexo estético do filme; em resumo, a relação recíproca entre forma e conteúdo.
Tais apontamentos permitem entender as possibilidades específicas que o cinema possui no campo da estética:
La autenticidad de lo fotografiado produce un medio homogéneo que acerca el ‘mundo’ conformado al mundo de la cotidianidad mucho más intensamente de lo que es posible y admisible en las demás artes. Por eso en el film pueden coexistir diversos modos de relación entre esencia y apariencia, y llegar a una colaboración artísticamente legítima: pues para la vida cotidiana es obvio que objetos de diversa estructura en cuanto a la relación entre esencia y apariencia existen simultáneamente con la misma realidad y obran los unos sobre otros. El cine traslada esa peculiaridad de la visión de la vida cotidiana al medio homogéneo de su dación de forma, y consigue, puesto que se trata de una transposición artística, que esas diferencias den de sí efectos importantes (LUKÁCS, 1967LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 4. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1967., p. 188).
Lukács (1978LUKÁCS, G. Introdução a uma Estética Marxista: sobre a categoria de particularidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.) trata do potencial de autoconsciência humana que o reflexo estético possui diante da possibilidade de o artista, na individualidade de sua obra, retratar as questões do cotidiano e da individualidade humana. Dizer que o cinema pode representar a realidade justifica-se pelo seu potencial de refleti-la, mas cabe ressaltar, igualmente, o papel da ideologia, pois o filme também pode ser um meio eficaz de ação ideológica (LUKÁCS, 1967LUKÁCS, G. Estética 1: la peculiaridad de lo estético. v. 4. Barcelona: Ediciones Grijalbo, 1967.):
[...] pois sob o capitalismo, a extraordinária capacidade de o cinema remunerar o capital não apenas revela a classe que o controla ideologicamente, como o torna, dada a sua capacidade de refigurar o mundo, um instrumento de fundamental importância para realizar os ajustes necessários à manutenção do projeto teleológico da burguesia (REIS, 2015REIS, R. R. Ideologia e educação estética. Revista Crítica Marxista, n. 41, p. 105-122, 2015. , p. 105).
Se a explicação do grau de desenvolvimento da humanidade está, em sua gênese, nas forças produtivas, podemos inferir, por suposto, que a arte mais popular dos nossos tempos reflete o ethos burguês e seu estatuto social classista, isto é, “[...] o cinema recria a imagem do burguês no mundo” (REIS, 2015REIS, R. R. Ideologia e educação estética. Revista Crítica Marxista, n. 41, p. 105-122, 2015. , p. 108).
Atualmente, o cinema consiste em uma das formas artísticas mais populares e acessíveis para consumo, haja vista, entre outros fatores, o advento da internet e do progresso tecnológico. Se, por um lado, sua produção e distribuição concentram-se em grandes estúdios cinematográficos e grandes redes de cinema, constituindo-se como um efetivo instrumento para a difusão da ideologia burguesa; por outro lado, seu potencial em indicar suas contradições é maior do que em qualquer outra época.
Análise da Particularidade Estética do Trabalho Assalariado e da Mediação da Burocracia do Estado em Eu, Daniel Blake
O filme Eu, Daniel Blake, do diretor Ken Loach, foi lançado em 2016MORAES, A.F.G.; GOMES, D.C.; HELAL, D.H. Brazilian Jeitinho and Culture: an analysis of the films Elite Squad 1 and 2. RAM, v. 17, n. 3, p. 84-104, 2016. e conta a história de Daniel Blake (Dave Johns), um marceneiro viúvo de 60 anos, que, após sofrer um ataque cardíaco, é desaconselhado por seus médicos a voltar ao trabalho. Por tal motivo, busca acessar os benefícios trabalhistas do Estado.
Nossa análise fílmica materialista consistirá, no primeiro momento, em mostrar as conexões sugeridas por Lukács para identificar se há uma particularidade estética (que não é estática e nem limitante) na obra - forma e conteúdo. No segundo momento, procuramos explorar a categoria de particularidade no pensamento do autor, para, no terceiro momento, a partir do objeto - isto é, assistirmos ao filme repetidas vezes - conseguirmos extrair suas próprias categorias: i) a função do trabalho para o ser humano; ii) a burocracia do Estado. A análise será exposta a seguir.
Os críticos da sétima arte apontam que a primeira cena de um filme diz muito sobre a obra. Em Eu, Daniel Blake, mesmo antes de aparecer alguma imagem, podemos ouvir Daniel respondendo a uma série de perguntas superficiais para aquisição do benefício (“você consegue ligar um despertador?”). Demos o predicado “superficiais” às perguntas pois elas não têm nenhuma relação com o ataque cardíaco que o protagonista sofreu. Ele tenta argumentar com a atendente, mas ela o ignora e continua repetindo as perguntas. Daniel, então, questiona se ela era médica ou enfermeira. Ela responde que é uma “profissional de saúde” e que é funcionária de uma empresa americana contratada pelo governo inglês para o serviço.
Em uma única cena nos deparamos com a terceirização dos serviços públicos, com a intensificação da exploração do trabalho (afinal, o que seria uma “profissional de saúde” senão uma alternativa para intensificar a extração da massa de mais-valor ao criar profissões cuja “prática” é um não tratamento de saúde?). A burocracia faz de Daniel apenas um número de identificação dentre todos os demais, torna-o um indivíduo abstrato3 3 Sobre a questão da dicotomia entre o cidadão (o indivíduo abstrato) e o indivíduo real, recomendamos a leitura de Sobre a Questão Judaica, de Karl Marx, e Para Uma Ontologia do Ser Social II, de G. Lukács. - um cidadão - cujas respostas devem coincidir com o script do governo, sob pena de ser impedido de acessar um direito - daqueles cujos defensores do estado de bem-estar tanto se orgulham.
Na cena posterior, já ciente da resposta negativa do benefício, remetido via carta, Daniel telefona para o Departamento de Trabalho e Pensões. Depois de 1h40min de espera ao telefone - em uma ligação que é cobrada -, é informado que não possui pontos suficientes (em um ‘questionário’ sobre sua incapacidade) para receber benefício. E, assim, ele inicia sua saga em busca do agendamento do recurso.
Ao analisar a cena em sua aparência, vemos a burocracia estatal. É pouco provável que um espectador não sinta empatia por Daniel quando, durante uma longa espera, acompanhada pela música de fundo da empresa telefônica, “não desligue, sua ligação é importante para nós”, o protagonista faz atividades rotineiras, toma um café, lava a xícara, reclama do vizinho, como muitos de nós faríamos para ajudar a passar o tempo. Mas, ao analisar a cena em sua essência, percebemos que, sendo paga a ligação, alguém está ganhando dinheiro com a chamada. Ou seja, o Estado atua como mediador entre o explorador (capital) e o explorado (trabalhador). Daniel, já sem condições físicas para trabalhar, ainda precisa pagar à empresa telefônica (que provavelmente é privada) ao longo da busca por conseguir receber sua assistência. A tentativa de resolução pelo telefone não logra êxito, pois o roteiro para acesso ao benefício impedia que fosse feito qualquer procedimento antes que o personagem recebesse (passivamente) uma ligação do Departamento. Mesmo com a carta de recusa nas mãos, a pessoa do outro lado da linha, um trabalhador, assim como Daniel, diz que não pode fazer nada.
Daniel encontra dificuldades para acessar seus direitos, seja pelas filas de espera, pela utilização de sistemas online cujo acesso é dificultado para pessoas como ele, que não possuem habilidade com a tecnologia, ou ainda com a transferência de um setor para o outro. Em determinado momento, um vizinho diz a Daniel que isso “faz parte do plano do Estado para que as pessoas desistam de buscar seus direitos”.
Quando finalmente é concedido a Daniel o benefício do seguro-desemprego, ele se depara com a obrigação de ter que possuir um currículo impresso e comprovar que está à procura de emprego por ao menos 35 horas semanais. Por não saber como montar seu currículo, ele é encaminhado a um workshop no qual o instrutor repete frases como “não há trabalho suficiente”, “você precisa se destacar dentre a multidão”, “provar que é dedicado”. Podemos perceber, neste caso, como é transferido ao trabalhador a responsabilidade não só pela condição de desempregado, como por ter de se destacar dentre os demais na busca por um emprego. Uma contradição, pois, mesmo não havendo trabalho suficiente para todos, quem fica desempregado arca com toda a culpa. É a lógica da meritocracia que permeia a sociedade capitalista.
Fica implícito que há uma inversão entre a máquina e o indivíduo, na medida em que o Estado se vale da tecnologia da informação como uma ferramenta que exclui trabalhadores como Daniel ao acesso de um direito. Ora, não seria a tecnologia - uma criação humana - uma ferramenta para auxiliar os sujeitos na reprodução da vida? No caso do protagonista, a tecnologia é motivo de preocupação, de sofrimento e uma barreira entre ele e seu benefício. Deveria, neste caso, por ser uma demanda entre cidadão e Estado, estar a cargo do segundo dar as condições conforme a necessidade do primeiro de pleitear por aquilo a que faz jus. Não estamos, com isso, fazendo apologia a um retorno aos formulários de papel ou coisa parecida, o que estamos salientando é o estranhamento gerado pela sociabilidade capitalista e, por conseguinte, pelo Estado burguês, que não serve aos indivíduos; ao contrário, os indivíduos devem adaptar-se às demandas das máquinas.
Como Daniel precisa do seguro, faz um currículo à mão e começa a distribuí-lo, até que recebe uma ligação para ser convidado a uma entrevista de emprego. O que é mais um motivo de sofrimento, pois, constrangido, explica ao empregador que não pode trabalhar por ordens médicas, mas precisou passar por aquilo para conseguir o benefício do afastamento. Do outro lado da linha, o possível contratante reclama pelo tempo que Daniel o fez desperdiçar. Ao voltar para a avaliação das obrigações no Departamento, não consegue provar que passou as horas obrigatórias procurando um emprego, sendo punido com o corte temporário do recebimento do benefício. Contudo a funcionária aponta que ele pode - novamente mediante formulários, filas e pedidos - solicitar uma “assistência à pobreza”.
Mais uma vez vemos a burocracia estatal em ação, são as “metas de recusa” conforme relatadas nas entrevistas dos ex-funcionários do Departamento (SEYMOUR, 2017SEYMOUR, T. I, Daniel Blake ‘doesn’t represent reality’. The Guardian, New York, 10 fev. 2017. Disponível em: <Disponível em: https://www.theguardian.com/film/2017/feb/10/i-daniel-blake-doesnt-represent-reality-says-jobcentre-manager
> Acesso em: 04 ago. 2017.
https://www.theguardian.com/film/2017/fe...
), que muitas vezes precisam ir “contra a própria consciência” para cumprir as ordens do Estado. Com isso, ferem a própria individualidade e ao mesmo tempo são impelidos a desumanizar a quem estão atendendo. Isso ocorre pois há uma relação conflituosa entre o cidadão da vida pública e o indivíduo da vida privada, como se houvesse um indivíduo real (Daniel) e um indivíduo abstrato (o requerente do benefício que precisa cumprir os pontos para acessar o direito). Assim, o Estado burguês, que deveria ser o gestor dos interesses universais, surge em oposição ao cidadão Daniel Blake, que reivindica seus “direitos universais”.
No desenrolar de toda a sua batalha para conseguir o auxílio, Daniel vai mais uma vez ao Departamento e, descrente de que seu caso teria algum andamento, leva consigo uma lata de tinta spray. Ao sair de lá, novamente sem a resposta pela sua solicitação de recurso, em um ato de revolta, picha na fachada do prédio: “Eu, Daniel Blake, exijo a data do meu recurso antes que eu morra de fome e a mudança da música de merda dos telefones”. Daniel - que após o ocorrido é detido e levado à delegacia, mas dispensado por não ter antecedentes - busca, desta forma, mostrar que ele é alguém, um indivíduo real. Ele, Daniel Blake, é mais um dentre todos que buscam seus direitos perante o Estado e que encontrou, nesta ação, uma forma de lutar contra um sistema que o impossibilita de adquirir as condições básicas para sua sobrevivência. Em adição, ele ainda registra, em sua pichação, o insulto à música de fundo na espera do atendimento por telefone, expressando sua insatisfação com o tempo e o dinheiro gastos ouvindo “música de merda” enquanto aguardava por um atendimento ineficaz.
Neste ínterim, Daniel vende móveis e objetos particulares para conseguir dinheiro e se manter. Acaba se enfraquecendo e se afastando do convívio de seus amigos, até que um dia recebe a comunicação do agendamento de seu recurso. Ao chegar o dia do julgamento, Daniel pergunta ao advogado se poderia dizer algumas palavras no momento da reunião, mas sofre outro ataque cardíaco e acaba falecendo antes de saber se conseguiria ganhar o recurso. Percebemos que, entre batalhar por seu auxílio ou voltar a trabalhar sem liberação médica correndo risco de vida, o desfecho para Daniel não seria diferente em nenhuma das duas situações.
Katie (Hayley Squires), uma trabalhadora desempregada com quem Daniel faz amizade, é quem lê sua carta durante seu velório. Considerando que “[...] a linguagem é a materialização da consciência, que por sua vez é forjada na prática e é produto social” (MARX e ENGELS, 2007MARX, K.; FRIEDRICH, E. A ideologia alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.), analisemos a [derradeira] fala de Daniel, registrada em carta:
Não sou um cliente, consumidor ou usuário dos serviços. Eu não sou um desistente, um fujão, um mendigo ou um ladrão. Não tenho meu número de seguro social marcado na tela. Pago minhas obrigações, faço meus centavos e tenho orgulho disto. Não me curvo a ninguém, olho meus vizinhos nos olhos e ajudo-os se puder. Eu não aceito ou procuro caridade. Meu nome é Daniel Blake, eu sou um homem, não um cão. Portanto, exijo meus direitos. Exijo que me tratem com respeito. Eu, Daniel Blake, sou um cidadão, nem mais e nem menos.
Fica evidente o sentimento de estranhamento e de desumanização sob o qual Daniel padeceu em seus últimos dias. A incapacidade para o trabalho e a submissão a situações descabidas para continuar vivo abalaram a subjetividade do personagem, que se viu tal como um animal e não como um homem que trabalhou como carpinteiro e que era reconhecido e admirado por seus amigos, um homem que “pagava suas obrigações, fazia seus centavos e se orgulhava disso”, mas que, aos olhos do Estado, não tinha importância. Explicita-se a condição da alienação estatal quando o que seria um direito universal a ser operado pelo Estado precisa ser tomado por meio da luta de um cidadão (abstrato), mas que contraditoriamente é um homem de carne e osso, que morreu antes de conseguir o que lhe era devido. Qualquer um de nós - que trabalha para viver - poderia ser o protagonista desta história.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: “NÓS, DANIEL BLAKE”
Objetivamos realizar uma análise do filme Eu, Daniel Blake, tendo como foco o tratamento do diretor Ken Loach acerca da particularidade do trabalho assalariado e da burocracia do Estado no capitalismo contemporâneo, apoiados no tratamento dado à estética por Lukács. Nosso primeiro apontamento é quanto ao trato do diretor, caracterizando o aspecto materialista presente na particularidade estética de Lukács. Loach é conhecido no meio cinematográfico por tratar em seus filmes temas que afligem o cotidiano humano tomando partido através da crítica e da denúncia à condição de precarização das franjas mais pauperizadas da classe trabalhadora - suas lutas pelos direitos sociais - e sobretudo à lógica capitalista de acumulação baseada no lucro4
4
São alguns exemplos: Em Jimmys’s Hall (2014), o diretor retrata a vida de Jimmy Gralton, uma figura importante entre os grupos que deram origem ao Partido Comunista da Irlanda. Em The Wind That Shakes The Barley [Ventos da Liberdade] (2006), retrata a organização de trabalhadores irlandeses no movimento de independência do país. Em Bread and Roses [Pão e Rosas] (2000), retrata a realidade miserável de um trabalhador mexicano que migra para os EUA em busca de uma vida melhor, e por melhor condições de trabalho se engaja na luta sindical. Em Route Irish [Rota Irlandesa] (2010), seu foco é o interesse financeiro do Estado e dos grupos privados empresariais britânicos na Guerra do Iraque.
. Em Eu, Daniel Blake, o tema central é o desmonte do estado social de bem-estar inglês orquestrado pelas demandas do capital, especialmente após as políticas neoliberais. De acordo com Loach (GUIMON, 2017GUIMON, P. Ken Loach: “O Estado cria a ilusão de que, se você é pobre, a culpa é”. El País, Londres, 05 jan. 2017. Disponível em: <Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2016/10/22/cultura/1477145409_049665.html
> Acesso em 02 ago. 2017.
https://brasil.elpais.com/brasil/2016/10...
, não paginado):
[...] um processo inevitável, é a forma como o capitalismo se desenvolveu. As grandes corporações dominam a economia e isso cria uma grande leva de pessoas pobres. O Estado deve apoiá-las, mas não quer ou não tem recursos. Por isso cria a ilusão de que, se você é pobre, a culpa é sua. Porque você não preencheu seu currículo direito ou chegou tarde a uma entrevista. Montam um sistema burocrático que te pune por ser pobre. A humilhação é um elemento-chave na pobreza. Rouba a sua dignidade e a sua autoestima. E o Estado contribui para a humilhação com toda essa burocracia estúpida.
Ou seja, o diretor explicita as intenções que o guiaram e as situações que pretendeu retratar no filme. Assim, não foi nosso intento “desvendar” uma lógica interna da obra apartada da intenção do artista; pelo contrário, é a tomada de partido do diretor o nosso ponto inicial da análise. Loach (SEYMOUR, 2017SEYMOUR, T. I, Daniel Blake ‘doesn’t represent reality’. The Guardian, New York, 10 fev. 2017. Disponível em: <Disponível em: https://www.theguardian.com/film/2017/feb/10/i-daniel-blake-doesnt-represent-reality-says-jobcentre-manager
> Acesso em: 04 ago. 2017.
https://www.theguardian.com/film/2017/fe...
, não paginado) faz uma provocação: “I challenge anyone to find a single word in that film that isn’t true”. O diretor aponta que, para a produção do filme, contou com um trabalho árduo de pesquisa em busca da capacidade de refletir a realidade com rigor. Esse processo envolveu entrevistas aos atuais e também aos ex-funcionários dos jobcenters, que relataram a situação vivida naquele local. Disse Loach na coletiva de imprensa em Cannes:
Encontrar o tom certo para um filme é realmente importante. Para esse, nós sentimos que a história era tão forte que tínhamos que ser muito simples, muito claros, muito econômicos, e que o filme não precisava de qualquer embelezamento. Então, Robbie [Ryan, diretor de fotografia]… nós procuramos encontrar um estilo que fosse absolutamente claro, e simples, e sem adornos, sem qualquer movimento estranho ou com qualquer coisa que distraísse, impedindo de captar a essência das pessoas em frente à câmera, e de descrever a situação delas com economia e simplicidade. Há uma citação de Bertold Brecht que eu creio ser muito boa e nos guiou em mais de uma ocasião [...] “E eu sempre pensei que as palavras mais simples devem bastar. Quando eu digo como são as coisas, partirá o coração de todos”. E creio ter sido isso que nós tentamos fazer. Dizer como são as coisas, porque não apenas parte seu coração, mas deveria lhe fazer sentir raiva (ESCOREL, 2017ESCOREL, E. Eu, Daniel Blake - corações despedaçados e revolta. Piauí, São Paulo, 20 jan. 2017. Disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/eu-daniel-blake-coracoes-despedacados-e-revolta/> Acesso em 28 jul. 2017.
https://piaui.folha.uol.com.br/eu-daniel... , não paginado).
Como segundo apontamento acerca da particularidade da obra, sustentamos que a realidade retratada por Loach não se difere, em seu núcleo, do que ocorre no Brasil, diante, por exemplo, da atual conjuntura, em que um conjunto de contrarreformas políticas (teto dos gastos públicos, reforma trabalhista e reforma previdenciária) tem sido proposto e implementado pelos governos em exercício. Isso denota o aspecto universal caracterizado por Lukács. Para este, “[...] o universal não aparece na realidade existente em si de maneira imediata ou isolada, independentemente dos objetos e das relações singulares, sendo, portanto, necessário obtê-lo mediante a análise de tais objetos, relações etc.” (LUKÁCS, 2012LUKÁCS, G. Ontologia do ser social I. São Paulo: Boitempo, 2012., p. 43). Da Inglaterra ao Brasil, essas similitudes postas nos objetos que delimitamos refletem a particularidade da arte cinematográfica, possuindo, assim, o potencial de se fazer presente em qualquer país regido pelo sistema de capital.
Evidenciamos que, pela estética lukacsiana, a particularidade do Estado burguês se manifesta na sua condição de atravessador do capital (compra e uso de tecnologia, telefonia, workshop), de mediador do mais-valor (gerindo a mercadoria força de trabalho para o capital), de gestor do fundo público dos impostos (fruto da extração do mais-valor). Nesse caso, não tem por intuito “devolver” nenhuma parte ao trabalhador (dificuldade em acessar o benefício), elevando assim a taxa de exploração. A ideologia que tem no “cidadão” o “cliente” a ser atendido é cega para a vulnerabilidade à qual seus “clientes” estão expostos (CHAVES, 2018CHAVES, R. H. S. A impotência da administração pública. 2018. Dissertação (Mestrado em Administração) - Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais, 2018. Disponível em: <Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/BUOS-B3DL27/1/disserta__o___vers_o_final_p_s_banca.pdf
>. Acesso em: 16 nov. 2018.
https://repositorio.ufmg.br/bitstream/18...
) - esta é a particularidade da mediação da burocracia no Estado burguês. Mészáros aponta (2011MÉSZÁROS, I. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. São Paulo: Boitempo , 2011., p. 108) que “[...] o Estado moderno altamente burocratizado, com toda a complexidade do seu maquinário legal e político, surge da absoluta necessidade material da ordem sociometabólica do capital e depois, por sua vez - na forma de uma reciprocidade dialética - torna-se uma precondição essencial para a subsequente articulação de todo o conjunto”. Para Daniel, assim como homens e mulheres das franjas mais pauperizadas das classes trabalhadoras, a burocracia do Estado atua para perpetuar e aprofundar as desigualdades, na medida em que contribui com a (re)produção do capital.
No que tange à questão do trabalho assalariado, pudemos perceber que Daniel, ao descobrir sua doença, é tomado por um sentimento de inabilidade diante das pessoas do seu convívio. A mercadoria “força de trabalho” vendida por Daniel durante um longo período refletia-se agora para o Estado e em sua subjetividade como “ultrapassada” e incapaz. Sobre essa particularidade da função do trabalho humano no capitalismo, Marx (2013MARX, K. O capital: crítica da economia política: livro I: o processo de produção do capital. São Paulo, Boitempo: 2013., p. 120) indica que “[...] como criador de valores de uso, como trabalho útil, o trabalho é, assim, uma condição de existência do homem, independente de todas as formas sociais, eterna necessidade natural de mediação do metabolismo entre homem e natureza e, portanto, da vida humana”. Logo, é por meio dessa condição particular do trabalho humano que se constroem as subjetividades individuais e coletivas. Entretanto, na sociabilidade capitalista, a centralidade do trabalho substitui aquilo que seria a própria realização da generidade humana, num processo de alienação.
Acerca do método de análise fílmica materialista a partir da estética lukacsiana, justificamos que, dado seu caráter ontológico, limita-se a obras de arte cujo nexo interno encontra-se na objetividade; isto é, para ser considerado um elemento artístico, o real deve atuar por meio do singular para representar o universal.
No final das contas, Loach, em sua obra cinematográfica, consegue transmitir em 1h40min (o mesmo tempo que Daniel esperou na ligação) a reprodução material sensível (fotografia, sons, luzes, etc.) e subjetiva (projeção e reflexão por já termos vivido situação semelhante) de um trabalhador como tantos outros, que tão somente buscam sobreviver numa sociedade em que as máquinas e os números se tornaram mais importantes que a vida humana. Embora há quem possa entender que o problema é o Estado, se olharmos no fundo da cena, é a sociabilidade capitalista que engendra todas essas relações.
REFERÊNCIAS
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» https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/BUOS-B3DL27/1/disserta__o___vers_o_final_p_s_banca.pdf - COTRIM, L. Apresentação de “Lukács e o Cinema”. In: CHAGAS, R. (Org.). Cinema, Educação e Arte. Boa Vista: Editora da UFRR, 2013.
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» https://brasil.elpais.com/brasil/2016/10/22/cultura/1477145409_049665.html - I, DANIEL Blake. Direção: Ken Loach. Produção: Rebecca O’Brien. Reino Unido: Wild Bunch, Why Not Productions, BBC Films, 2016. 1 DVD (100 min), widescreen, son. color.
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O trabalho assalariado pode ser caracterizado pela venda da força de trabalho, uma vez que o trabalhador não detém os meios de produção e se vê impelido(a) a ter de laborar para sobreviver.
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“Toda imagen fílmica se vive como mimesis de una realidad, garantizada como tal realidad ya por el mero hecho de estar fotografiada: puesto que se la pudo fotografiar, tuvo que darse realmente, y precisamente en esa forma” (LUKÁCS, 1967, p. 199). Cotrim (2013, p. 19) menciona que a mimese estética “[...] implica antropomorfizar a imagem fotográfica, aproximá-la das ‘formas aparências do cotidiano’, com o que se cria o meio homogêneo, a ‘linguagem’ artística do filme”, pelo desenvolvimento e aprimoramento de equipamentos e técnicas.
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Sobre a questão da dicotomia entre o cidadão (o indivíduo abstrato) e o indivíduo real, recomendamos a leitura de Sobre a Questão Judaica, de Karl Marx, e Para Uma Ontologia do Ser Social II, de G. Lukács.
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São alguns exemplos: Em Jimmys’s Hall (2014), o diretor retrata a vida de Jimmy Gralton, uma figura importante entre os grupos que deram origem ao Partido Comunista da Irlanda. Em The Wind That Shakes The Barley [Ventos da Liberdade] (2006), retrata a organização de trabalhadores irlandeses no movimento de independência do país. Em Bread and Roses [Pão e Rosas] (2000), retrata a realidade miserável de um trabalhador mexicano que migra para os EUA em busca de uma vida melhor, e por melhor condições de trabalho se engaja na luta sindical. Em Route Irish [Rota Irlandesa] (2010), seu foco é o interesse financeiro do Estado e dos grupos privados empresariais britânicos na Guerra do Iraque.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
10 Jul 2020 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 2020
Histórico
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Recebido
05 Dez 2018 -
Aceito
27 Jun 2019