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EDITORIAL

Este terceiro número de 2014 da Revista Ciência & Educação apresenta 15 artigos nacionais e internacionais sobre temas relativos ao Ensino de Ciências e Matemática, cujas discussões nos fornecem subsídios relevantes.

Em Las imágenes inadecuadas de ciencia y de científico como foco de la naturaleza de la ciencia: estado del arte y cuestiones pendientes, os autores pretendem dar conta do estado da arte da linha de pesquisa denominada Natureza da Ciência. A intenção do projeto é investigar como as ideias de professores de ciências sobre a ciência e o ensino podem ser obstáculos à aprendizagem dos alunos que entram na escola em desvantagem em termos de capital cultural. A partir dos resultados deste estudo, cobra-se dos professores maior grau de profundidade nestas questões.

No segundo artigo, Una aproximación a la concepción de ciência en la contemporaneidad desde la perspectiva de la educación científica, a autora argumenta que a melhoria dos sistemas de ensino, no presente estágio de desenvolvimento social, revela a necessidade de renovação do ensino de ciências, por sua contribuição para a formação de cidadãos que possam agir reflexivamente à crescente mudança científica e tecnológica. Esta nova visão da educação científica envolve o reconhecimento da ciência como um empreendimento de construção humana contínua no âmbito de um contexto social, político, econômico e histórico que determina a sua evolução. A autora aborda tais questões, esclarecendo ideias sobre os conceitos de ciência e método científico, assim como visões distorcidas sobre a ciência ainda transmitidas nas escolas.

Os autores de Projeto Genoma Humano: um retrato da construção do conhecimento científico sob a ótica da revista Ciência Hoje objetivam relatar a evolução do conhecimento científico que culminou na proposição da sequência de nucleotídeos do genoma humano sob a ótica da revista Ciência Hoje (CH), pioneira na popularização de ciência no Brasil. Para tanto, analisaram a divulgação do Projeto Genoma Humano (PGH) na revista CH, de dezembro de 1984 a dezembro de 2010, intervalo que compreende: a motivação do sequenciamento do genoma humano, a fundação das instituições responsáveis pelo projeto e prosseguimento do PGH, a rivalidade com a empresa privada Celera Genomics,a publicação do primeiro rascunho, e consequências imediatas do projeto. Espera-se que a compreensão do pensamento reinante na época e dos estilos envolvidos nesse processo contribua para uma visão mais adequada da produção do conhecimento científico relacionado ao PGH e para a melhoria da educação científica de professores de biologia e de ciências.

No quarto artigo, Atividades práticas e o ensino-aprendizagem de ciência(s): mitos, tendências e distorções, a autora argumenta que, quando se fala em deficiências na educação científica, logo se remete à ausência de aulas experimentais na Educação Básica, de modo que as atividades práticas investigativas são vistas, na atualidade, como sinônimo de inovação no ensino. Nesse artigo, de cunho teórico, dialoga-se com os referenciais teóricos da educação em ciência, e discutem-se as tendências, mitos e concepções sobre a natureza da ciência presentes nas diversas modalidades de atividades práticas, assim como os tipos de interatividade que tais atividades propiciam. Nesse sentido, a autora parte de sua vivência como professora e pesquisadora da Educação Básica, e como formadora de professores de ciências naturais.

Em Uma análise cruzada de três estudos de caso com professores de física:a influência de concepções sobre a natureza da ciência nas práticas didáticas, os autores investigam possíveis relações entre as concepções sobre a natureza da ciência de professores de Física, e suas práticas docentes, por meio de uma análise cruzada de três estudos de caso do tipo etnográfico. A observação etnográfica deu-se por imersão nas aulas de Física de três professores de Ensino Médio atuando em diferentes tipos de escolas: particular, pública e militar. Os resultados do cruzamento indicaram: que as práticas didáticas observadas não incluem aspectos sobre a natureza da ciência; que a Epistemologia e a História da Física ainda não se fazem presentes de forma explícita nas aulas de Física do Ensino Médio; que as relações entre as visões epistemológicas dos professores e suas práticas são frágeis e se manifestam de forma implícita. No entanto, foi possível vislumbrar algumas diferenças nas práticas daqueles professores que têm uma visão epistemológica mais contemporânea, pois tendem a manter um espírito mais aberto à inovação didática.

No sexto artigo, Os três momentos pedagógicos e o contexto de produção do livro "Física", os autores revelam que, com a publicação, no final dos anos 1980, dos livros Metodologia do Ensino de Ciências, e Física, a dinâmica conhecida como Três Momentos Pedagógicos (3MP) passou a ser disseminada. Ambas as obras se inserem na Coleção Magistério - 2º grau, que é resultado do "Projeto diretrizes gerais para o ensino de 2º grau: núcleo comum e habilitação magistério". É no decorrer desse projeto que ocorre interação entre o grupo de pesquisadores que implementou a perspectiva freireana no contexto da educação escolar e educadores alinhados com a perspectiva crítico-social dos conteúdos, que conceberam o desenvolvimento da Coleção Magistério 2º grau. Esse contexto de interação é objeto de investigação no presente artigo, a partir da análise de como os 3MP foram abordados na obra Física.

Em Sequências didáticas descritas por professores de matemática e de ciências naturais da rede pública: possíveis padrões e implicações na formação pedagógica de professores, os autores têm como objetivo analisar sequências de atividades ou sequências didáticas descritas por professores de escolas do Ensino Fundamental e Médio de Presidente Prudente (São Paulo, Brasil), na tentativa de identificar padrões implícitos que possam revelar concepções de ensino destes professores. Ao analisarem como 76 professores de Matemática e 61 de Ciências Naturais descrevem a sequência que utilizam em sala de aula, os autores constataram que a ação predominante é do professor nos três principais momentos da aula (início, desenvolvimento e avaliação). O professor inicia o conteúdo, estabelece a sequência, expõe, determina procedimentos, conclui e avalia, cabendo, ao aluno, a execução de atividades. Há diferença entre as sequências descritas nas duas áreas e algumas tentativas periféricas de superação do modelo tradicional de ensino. Essa questão é discutida tendo como foco os saberes da docência e a formação pedagógica do professor.

Os autores do oitavo artigo, Educação em Astronomia: investigando aspectos de conscientização socioambiental sobre a poluição luminosa na perspectivada abordagem temática, apresentam uma pesquisa que consistiu na elaboração de uma sequência didática temática, aplicada em uma turma de Ensino Médio, objetivando investigar os aspectos de tomada de consciência socioambiental que podem ser promovidos acerca deste tema. Seguindo alguns pressupostos da perspectiva da Abordagem Temática Freiriana, que propõe a escolha de um tema que represente um problema para os sujeitos, iniciou-se esta sequência a partir da falta de iluminação pública próxima à escola participante da investigação. Para as análises, foram utilizadas as atividades desenvolvidas pelos alunos e as observações dos diários do pesquisador. Mediante a metodologia da Análise Textual Discursiva, os resultados revelam que: os alunos desconhecem a poluição luminosa e seus efeitos sob o céu noturno; não possuem uma postura inicial de preocupação com questões ligadas ao meio ambiente; apresentaram, progressivamente, noções acerca da poluição luminosa, apesar de certa resistência com relação às práticas dialógicas do professor.

A Educação Ambiental tem sido apontada há algum tempo como uma grande aliada para solucionar a crise ambiental vivida atualmente. A pesquisa discutida em Percepção sobre meio ambiente por alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental: considerações à luz de Marx e de Paulo Freire teve como objetivo discutir a percepção de meio ambiente apresentada por alunos dos 1º e 5º anos do Ensino Fundamental com referência na Educação Ambiental Crítica. Os instrumentos de coleta de dados foram: elaboração de desenhos, entrevistas e análise de gravuras. Os resultados mostraram que os alunos de 1º e 5º anos do Ensino Fundamental apresentam uma percepção naturalista de meio ambiente. Entretanto, os alunos também demonstraram perceber problemas ambientais presentes no cotidiano.

As autoras de Crianças pequenas no processo de significação sobre borboletas: como utilizam as linguagens? discutem, a partir do referencial de Vigotski, como ocorreu o processo de significação sobre borboletas em duas crianças de quatro anos, que se diferenciam de modo contrastante pelas formas de utilizarem as lingua-gens: um menino que desenhava muito e falava pouco, e uma menina que falava muito e desenhava pouco. Levar em conta as duas formas de expressão permitiu a constatação de que, nos dois casos, houve internalização de conhecimentos. Considera-se que só foi possível fazer essas constatações em decorrência do cuidado metodológico de "dar voz" às crianças por meio de linguagens diferentes, o que possibilitou que tanto a menina como o menino pudessem atribuir significados aos insetos estudados. A partir desta análise, são apontadas algumas das condições necessárias para o desenvolvimento de atividades de ciências com o público infantil.

Em As escalas local e global apresentadas em teses e dissertações brasileiras de educação ambiental as autoras mapearam e discutiram a produção acadêmica voltada para estas escalas em trabalhos de Educação Ambiental (EA), a partir de teses e dissertações constantes no Banco de Teses da CAPES, um relevante instrumento de divulgação do conhecimento científico brasileiro. Identificou-se um número considerável de trabalhos acadêmicos que apresentam referências a essas escalas, especialmente a local. Porém, o modo como a maioria dessas menções é feita pode ser caracterizado como difuso e desarticulado, o que pode comprometer as contribuições da EA para o enfrentamento da crise ambiental vigente. Isto aponta para a necessidade de novos esforços que possam elucidar e efetivar as articulações entre as escalas local, global e EA.

No décimo segundo artigo deste número, As pesquisas sobre aprendizagemem museus: uma análise sob a ótica dos estudos da subjetividade na perspectiva histórico-cultural, as autoras comentam a produção científica na área de aprendizagem em museus à luz dos estudos da subjetividade na perspectiva histórico-cultural, conforme proposta por González Rey. Em primeiro lugar, apresentam uma revisão da produção científica da área, identificando e comentando as concepções teóricas predominantes. Em segundo, discutem as pesquisas relacionadas ao tema de identidade de aprendizagem em museus e às inter-relações museu-escola. Para as autoras, esta perspectiva teórica oferece contribuições para a aprendizagem em museus na medida em que consiste em uma nova aproximação à compreensão da participação do emocional na aprendizagem museal, e considera as formas altamente singulares em que se constituem processos de aprendizagem; e, por fim, permite um novo olhar sobre questões da inter-relação entre a aprendizagem escolar e museal.

Em O curso de licenciatura em Ciências Naturais e a organização de seusestágios supervisionados, as autoras discutem a necessária formação de Licenciados em Ciências Naturais para atuar em toda a Educação Básica, e a estruturação dos Estágios Supervisionados do referido curso. Profissionais diversos têm ocupado o cargo de professores de Ciências sem, no entanto, ter formação específica para tal. Este fato pode ser responsável pelo baixo rendimento evidenciado na área, repercutindo em toda a vida escolar do educando. Nesse cenário, o estágio supervisionado pode ser um forte eixo articulador na melhoria da formação inicial dos docentes, sobretudo no que tange ao rompimento da dicotomia entre a teoria e a prática e na constituição do estágio como espaço de pesquisa para a elaboração de projetos coletivos de formação do educador.

No décimo quarto artigo, Análise de tarefas matemáticas em uma proposta de formação continuada de professoras que ensinam matemática, as autoras discutem como as atividades desenvolvidas em uma proposta de formação continuada podem auxiliar professores que ensinam matemática, nos anos iniciais do Ensino Fundamental, a (re)pensar a sua prática pedagógica. Para tanto, investigaram um grupo de 14 professoras que atuam nos anos iniciais do Ensino Fundamental em uma escola da rede municipal de ensino no Paraná, no desenvolvimento de uma proposta de formação continuada, constituída na perspectiva de um grupo de estudos que tinha como objetivo analisar tarefas matemáticas. As reflexões e as discussões ocorridas nesse grupo de estudos permitiram identificar indícios de mudanças quanto: à escolha/elaboração de tarefas, ao trabalho com os alunos, e ao enfrentamento das crenças que permeiam a prática pedagógica. O compromisso/engajamento mútuo em torno de um empreendimento articulado e um repertório compartilhado foram elementos centrais da prática dessas professoras no processo de formação continuada, e revelaram aspectos do seu desenvolvimento profissional.

Encerrando este número, em Aproximando universidade e escola pormeio do uso da produção acadêmica na sala de aula, os autores, ao considerarem o aumento da produção acadêmica voltada ao contexto escolar e às dificuldades dos professores em utilizá-la em suas práticas, apresentam uma experiência de formação continuada. Trata-se de uma pesquisa-ação, realizada em uma escola pública, voltada para a formação de professores em serviço. As ações tiveram caráter interdisciplinar e foram realizadas em dois módulos interligados. Inicialmente, foram realizados encontros para capacitar os docentes a buscar artigos em periódicos. Posteriormente, os professores desenvolveram uma prática baseada na problematização e transposição dos textos para a realidade da escola. Os resultados indicam que o uso da produção acadêmica pelos professores se mostrou efetivo, apesar das dificuldades iniciais, proporcionando um processo de reflexão em torno das práticas na escola, além da incorporação da produção ao cotidiano pedagógico.

Bauru, São Paulo, julho de 2014.

O editor

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2014
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